ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO

 

 

Gabinete do Auditor Substituto de Conselheiro Cleber Muniz Gavi

 

PROCESSO:                        RLA 12/00503403

UNIDADE:                 Câmara Municipal de Imbituba

RESPONSÁVEL:      Elísio Sgrott

ASSUNTO:                Auditoria in loco relativa a atos de pessoal, referente ao exercício de 2012.

 

 

AUDITORIA DE ATOS DE PESSOAL. NÚMERO EXCESSIVO DE CARGOS EM COMISSÃO. INEXISTÊNCIA DE ATRIBUIÇÕES DE DIREÇÃO, CHEFIA, ASSESORAMENTO. DISPENSA LEGAL DE CONTROLE DE JORNADA DE SERVIDORES COMISSIONADOS. IRREGULARIDADES. APLICAÇÃO DE MULTAS AO RESPONSÁVEL.

 

 

 

 

I – RELATÓRIO

Tratam os autos de auditoria in loco realizada pela Diretoria de Controle de Atos de Pessoal - DAP na Câmara Municipal de Imbituba, para verificar a legalidade dos atos de pessoal, relativos a comissionados, cessão de servidores, controle de freqüência, remuneração/proventos e controle interno, ocorridos a partir do exercício de 2012.

Empreendida a auditoria, a DAP emitiu o Relatório nº 6774/2012 (fls. 230/246), sugerindo que se procedesse à audiência do Sr. Elísio Sgrott, então Presidente da Câmara Municipal, em face das seguintes restrições:

a)      Permitir a manutenção de um número excessivo de servidores comissionados na unidade gestora (32 servidores), superior em 250% (duzentos e cinquenta por cento) ao número de servidores ocupantes de cargo de provimento efetivo (09 servidores), propiciando a existência de excessivo número de servidores em exercício de cargos comissionados, em burla ao instituto do concurso público e aos princípios da proporcionalidade e da moralidade administrativa, em desacordo com o previsto no art. 37, caput, e incisos II e V, da Constituição Federal e também à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (conforme acórdão da ADI 4125/TO – rel. Min. Carmen Lúcia - e decisão monocrática do ArR/RE 365.368 – rel. Min. Ricardo Lewandowski) (item 2.1 deste relatório);

 

b)      Assinar as Portarias CMI n. 024/2012, 031/2012, 032/2012, 042/2012 043/2012, 061/2012, 064/2012, 067/2012 e 070/2012 e manter em vigor outras 14 Portarias, todas nomeando servidores para ocuparem cargos comissionados com funções técnicas ou operacionais, sem as atribuições de direção, chefia ou assessoramento, em descumprimento ao previsto no art. 37, caput e incisos II e V da Constituição Federal (item 2.2 deste relatório);

 

c)      Assinar a Portaria CMI n. 058/2012 e manter em vigor a Portaria n. 026/2011, ambas nomeando servidores para o exercício do cargo comissionado de Assessor Jurídico, com atribuições inerentes às funções permanentes da Câmara Municipal, em desvirtuamento aos pressupostos de direção, chefia ou assessoramento, propiciando burla ao concurso público e o desvirtuamento das atribuições inerentes às funções de direção, chefia e assessoramento, em desacordo ao art. 37, incisos II e V da Constituição Federal e ao Prejulgado 1911 desta Corte de Contas (item 2.3 deste relatório);

 

d)      Manter em vigor o recebimento de 02 (quatro) servidores oriundos da Prefeitura Municipal de Imbituba para trabalhar na Câmara Municipal de Imbituba, mediante Portarias de cessão, sem a existência de lei específica ou convênio regulamentando tais cessões, propiciando o descumprimento do art. 20 da Lei Complementar n. 1144/1991, em infração ao princípio da legalidade, previsto no art. 37, caput, da Constituição Federal, além do descumprimento de Prejulgado desta Corte de Contas que trata da cessão de servidores (item 2.4 deste relatório);

 

e)      Permitir o pagamento de remuneração mensal superior ao limite remuneratório de 01 servidor inativo da Câmara Municipal sem o redutor de teto, em descumprimento ao art. 37, inciso XI, da Constituição Federal (item 2.6 deste relatório);

 

Em atenção ao despacho do Relator (fl. 246), a audiência foi realizada e as justificativas devidamente protocoladas (fls. 248-304).

O responsável aduziu ser inadequado o exame da proporcionalidade dos cargos comissionados a partir da decisão paradigma do STF e que o número de assessores e assistentes parlamentares atende exatamente à quantidade de vereadores da Câmara e ao Presidente da Mesa Diretora. Ressalta que os atuais 9 (nove) servidores efetivos são oriundos do concurso de 2006, oportunidade em que outros 5 foram nomeados, mas exonerados, a pedido, depois de expirado o prazo de validade do concurso. Informa ter encaminhado proposta ao setor responsável para alteração da Lei n. 1.145/91 em relação aos cargos de coordenador de cerimonial, coordenador de informática, assessores jurídicos (2), assessor de comunicação, controlador interno, assim como exonerado, antes mesmo do recebimento da audiência (10/12/2012), 17 servidores e, depois, outros 4.

No tocante às funções descritas aos cargos comissionados de assessores, assistentes parlamentares e assessor parlamentar especial, aduziu que a própria nomenclatura já denota a característica explícita de assessoramento conforme apregoa a Constituição e que o atendimento a todos os vereadores se justifica em razão da inexistência de estrutura de gabinetes na respectiva Câmara. Informou ter tomado providências junto à Prefeitura para regularizar as cessões das duas servidoras originárias do Executivo, assim como notificou o servidor inativo no intuito de fazer cessar o pagamento de valores recebidos acima do teto.

Os esclarecimentos apresentados ensejaram a emissão do Relatório de Reinstrução DAP n° 1114/2014 (fls. 307-321), no qual se sugeriu o conhecimento do relatório de auditoria, considerando irregulares os atos e fatos apontados, aplicando-se multas previstas no art. 70, inc. II, da Lei Complementar n° 202/2000 c/c o art. 109, II, do Regimento Interno do Tribunal de Contas, ao então Presidente da Câmara Municipal de Imbituba, Sr. Elísio Sgrott, além de recomendações e determinações.

O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas manifestou-se por intermédio do Parecer MPTC nº 24255/2014 (fls. 322-341), da lavra da Sra. Procuradora Cibelly Farias, acompanhando a análise procedida pelo corpo técnico da DCE.

 

II – FUNDAMENTAÇÃO

A DAP e o Ministério Público Especial pugnaram pela irregularidade dos atos em apreço. Diante da análise feita pelos entes citados, passo a examinar os fatos tidos como irregulares, organizados em tópicos, contrastando os pontos de divergência entre o corpo instrutivo e o MPTC com as razões de defesa apresentadas pelo responsável.

 

II.1. Número de servidores em cargos comissionados superior aos ocupantes de cargos de provimento efetivo, em afronta ao previsto no art. 37, caput e incisos II e V, da Constituição Federal  (item 3.1 do Relatório DAP n° 1144/2014)

No trabalho de auditoria realizado pelo corpo técnico da DAP, constatou-se que a Câmara Municipal de Imbituba possuía, em outubro de 2012, o total de 41 (quarenta e um) servidores, sendo 9 (nove) ocupantes de cargos de provimento efetivo e 32 (trinta e dois) ocupantes de cargos de provimento comissionado, assim discriminados:

 

 

 

Cargo de provimento efetivo

Nº total de cargos

Nº de cargos ocupados

Analista Legislativo

9

3

Contador

1

1

Técnico Legislativo

12

1

Técnico em Contabilidade

1

1

Agente Administrativo

3

0

Telefonista Recepcionista

1

1

Motorista

1

1

Auxiliar de Serviços

2

1

TOTAL

30

9

Cargo de provimento em comissão

Nº total de cargos

Nº de cargos ocupados

Secretário(a) Administrativo

1

1

Secretário(a) de Gabinete

1

1

Coordenador(a) de Cerimonial

1

1

Coordenador(a) de Informática

1

1

Chefe de Departamento

3

3

Assessor(a) Jurídico

2

2

Assessor(a) de Comunicação

1

1

Assessor(a) Parlamentar

9

8

Assessor(a) Parlamentar Especial

4

4

Assistente Parlamentar

9

9

Controlador Interno

1

1

TOTAL

33

32

 

Na oportunidade, invocou-se precedentes jurisprudenciais do Supremo Tribunal Federal, concluindo pelo desrespeito às normas e princípios constitucionais em face da manutenção, em seu quadro de pessoal, de forma desproporcional, de um número de cargos (servidores) de provimento em comissão bem superior aos de provimento efetivo, inclusive, alguns sendo de caráter e atribuições eminentemente técnicas.

O responsável, nos seus argumentos de defesa, sustentou que até o término da referida legislatura providenciou a exoneração de 21 (vinte e um) dos 32 (trinta e dois) servidores ocupantes de cargos comissionados daquele Poder Legislativo (cópias das Portarias às fls. 265/285), tendo alertado aos futuros legisladores municipais sobre o entendimento desta Casa acerca da matéria.

Conquanto confirmada a restrição, tenho que a pronta iniciativa do Responsável em promover a exoneração de diversos servidores comissionados, tão logo ciente do resultado da apuração efetuada pelo Tribunal de Contas, deve ser considerada como circunstância apta a permitir a conversão de eventual sanção em recomendação. Registre-se que o Responsável fora notificado em 13.10.2012, sendo em 19.12.2012 expedidos vários atos de exoneração.

  Não se pretende, a partir disto, firmar a tese de que a correção posterior de dada irregularidade constitui fundamento suficiente para exclusão das sanções aos responsáveis que a praticaram. O que sobreleva para o caso é a constatação de que se está diante de matéria sobre a qual pairaram dúvidas, que passaram a ser dirimidas a partir do entendimento inaugurado pelo STF no RE 365.368 (DJ de 29.06.2007) e, aparentemente, consolidado na ADIN n. 4.125 (DJ de 15.02.2011).

A discussão gravita em torno da aplicação do princípio da proporcionalidade entre servidores efetivos e comissionados, o que, até passado recente, sequer constituía objeto de apuração por esta Corte de Contas.

É certo que anteriormente à publicação da decisão do Supremo Tribunal Federal havia, nas mais diversas unidades jurisdicionadas, situações que não se compatibilizariam com o futuro entendimento daquela Corte. Por conseguinte, também é certo que a difusão deste novo panorama de aferição de legitimidade na contratação dos servidores comissionados não se daria de forma instantânea, demandando lapso de tempo para correção das situações incompatíveis com a novel jurisprudência.

Por este motivo, conquanto reconheça como auspiciosa e promissora a jurisprudência da Corte Suprema, entendo prudente certa dose de ponderação, mormente em situações nas quais se vislumbra iniciativas para correção da irregularidade.

Antevejo, ademais, ser imprescindível que os órgãos de fiscalização (Tribunais de Contas e Ministério Público) se atenham as peculiaridades do caso concreto, evitando a mera aplicação “aritimética” para aferição da proporcionalidade compatível a cada caso.

Veja-se que a exigência sem critérios da citada proporcionalidade poderá levar determinados gestores a apenas aumentarem o número de servidores efetivos para equilibrar o resultado comparativo com os servidores comissionados. Ou seja, o que a princípio representa um escopo legítimo, pode levar a um mero aumento (ilegítimo) do gasto público. Considere-se, também, que para determinados órgãos nos quais a atividade de assessoria possui certa preponderância (Câmaras, Assembléia e Tribunais de Justiça, por exemplo), nem sempre será razoável a adoção dos mesmos critérios de aferição aplicáveis, por exemplo, a órgãos do Poder Executivo, tais como órgãos destinados à arrecadação fiscal, de segurança pública, educação ou saúde. Nestes últimos, obviamente, a absoluta predominância de servidores efetivos deve constituir meta adversa a flexibilizações.

Para o caso sob análise, verifico, por exemplo, que a existência de 09 (nove) assessores parlamentares e outros 09 (nove) assistentes parlamentares não se revela incompatível com o número de 09 (dez) vereadores que compõe o legislativo local – presume-se que há um assessor e um assistente para cada parlamentar.

Verifico, ademais, que na estrutura organizacional do órgão existe a previsão para 30 (trinta) cargos efetivos, estando ocupados 09 (nove) destes. Portanto, a nomeação do maior número possível de servidores efetivos surgiria como alternativa válida para alcance da paridade numérica com os comissionados (ao todo são 32 comissionados previsto na estrutura organizacional); no entanto, desafia a lógica e o bom senso a exortação para o aumento da despesa pública  e para a efetivação de contratações até então reputadas como desnecessárias, com o único propósito de equilibrar quantitativos de uma e outra categoria de servidores. O resultado deste raciocínio e uma boa dose de ponderação deixam claro que a análise meramente numérica nem sempre levará a resultados práticos favoráveis.

O fato é que, inevitavelmente, a análise do caso concreto será medida imprescindível para qualquer decisão acerca da matéria. Tal linha de entendimento já fora muito bem explicitada em precedente de relatoria do Exmo. Auditor Substituto de Conselheiro Gerson dos Santos Sicca, que consignou em voto proferido no Proc. TCE 10/00438799:

Em respeito à posição constitucional do Supremo Tribunal Federal, é imperioso que não se ignore a possível incidência do princípio da proporcionalidade à matéria ora objeto de julgamento, sem, contudo, chegar-se a um resultado que seja mero resultado da subjetividade do órgão de controle. Resulta daí que somente em hipóteses nas quais haja evidente e injustificável desproporcionalidade é que poderá a jurisdição de contas intervir.

Para evitar o mero juízo político por parte desta Corte de Contas, que não pode simplesmente substituir o legislador, e com o intento de harmonizar esse aspecto com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, considero que a melhor interpretação há de fundar-se não na mera aferição da proporção entre cargos efetivos e comissionados. Para o correto controle da ação administrativa nessa seara é prudente que o Tribunal de Contas tome como paradigma a avaliação da aplicação da regra geral do concurso público ao órgão submetido ao controle, em especial a natureza de suas funções.

Quanto às Câmaras de Vereadores, deve haver uma adequada verificação da natureza das atividades desempenhadas pelo Legislativo, no intento de identificar o que se trata de função de caráter permanente do órgão e, ao contrário, aquelas em que o vínculo de confiança é fundamental. Por esse motivo, conquanto não se possa admitir uma franca desproporcionalidade entre cargos efetivos e comissionados, o eixo principal de análise é a avaliação das funções desempenhadas pelos servidores. Nesse contexto, quando se trate de função permanente e cujo desempenho independa de um vínculo de confiança, tratar-se-á de hipótese na qual o vínculo efetivo é imperioso.

De outro norte, e tendo em vista que o número de Vereadores em uma Câmara Municipal pode levar a um número elevado de cargos comissionados de assessor parlamentar, sempre surgirá o perigo de haver uma desproporção excessiva entre aqueles e os cargos efetivos. Para minimizar essa disparidade e garantir o respeito à Constituição Federal, mostra-se prudente que o legislador local tenha máximo comedimento em criar cargos comissionados para chefias de serviços permanentes da Câmara Municipal. Decorre daí que é conveniente a opção pela criação de funções gratificadas, que remunerarão servidores de carreira aos quais foi repassada a incumbência a dirigir determinadas atividades da Câmara. Com isso, os cargos comissionados ficarão restritos à assessoria dos Vereadores e a atividades excepcionais, definidas na legislação.

Veja-se, ademais, que há casos em que a exceção prepondera em relação à norma diretriz do concurso público sem, todavia, significar violação ao princípio. Exemplo prático são as Câmaras de Vereadores de Municípios com população até 15.000 (quinze mil) habitantes, nas quais a Constituição Federal permite o máximo 09 (nove) Vereadores (art. 29, IV, “a”). Nessas Câmaras, que são a maioria em Santa Catarina, as atribuições permanentes são de pequena monta e demandam poucos cargos de caráter efetivo. Por sua vez, havendo a necessidade de um assessor para cada vereador, que é o mínimo possível, certamente o número de cargos em comissão será maior, senão o dobro, dos cargos em provimento efetivo. Isso se deve ao fato de a própria Constituição estabelecer um número mínimo de vereadores aos Municípios.

Como se disse, diante de tal situação, a existência de um maior número de cargos em comissão em relação aos cargos efetivos, possivelmente desproporcional, não significaria ofensa direta à Constituição Federal. Portanto, a proporcionalidade deve ser tratada como um indicativo de que em determinado caso concreto há uso abusivo da figura do cargo em comissão. Não obstante, a agressão à Constituição deverá ser demonstrada conjugando-se a desproporção com outros elementos juridicamente relevantes.

Logo, a desproporção pura e simples não significa ofensa direta à Constituição. Deve haver a conjugação de outros fatores para se decidir sobre a Constitucionalidade ou não de uma norma que prevê cargos comissionados em número maior que efetivos.

 

Conforme exposta na bem lançada fundamentação transcrita, se de um lado vigora a posição da Suprema Corte indicando a observância do critério de proporcionalidade entre efetivos e comissionados, de outro, para efeito de atuação das Cortes de Contas frente às inúmeras situações detectadas no plano concreto, não se prescinde da análise criteriosa e detalhada da peculiaridade inerente a cada órgão auditado.

Isto posto e também considerando a iniciativa adotada pelo responsável para readequação da situação fática (com a demissão de todos os servidores comissionados), não se justifica a aplicação de sanção neste primeiro momento.

De qualquer sorte, a despeito da solução adotada no plano fático, tem-se que a legislação relacionada ao quadro de servidores da Câmara Municipal de São Miguel do Oeste ainda mantém a mesma estrutura funcional, havendo possibilidade de que em futuras gestões seja reconstituída a situação (por meio da nomeação de outros servidores comissionados). Diante deste contexto, tendo em vista o entendimento do STF e a atuação do Ministério Público de Santa Catarina nesta matéria, deve ser expedida recomendação à unidade gestora para que atente para as diretrizes estabelecidas pelo Supremo Tribunal Federal, inclusive readequando seu quadro de pessoal, se for o caso.

 

II.2. Cargos de provimento comissionado com atribuições eminentemente técnicas, despidas do caráter de direção, chefia e/ou assessoramento que exige a norma constitucional - vide art. 37, inc. V, da Constituição Federal (itens 3.2 e 3.3 do Relatório DAP n° 1144/2014)

As restrições levantadas nos itens 3.2 a 3.3 questionam as atribuições de alguns cargos comissionados da Câmara.

Conforme constatou o corpo técnico, as funções descritas na lei para os cargos de coordenador de informática, controlador interno e assessor jurídico são eminentemente técnicas, de caráter geral e operacional, inerentes e próprias do órgão legislativo, sem nenhuma atribuição de direção, chefia e assessoramento, fato, inclusive, não negado pelo responsável.

Inexistindo a relação de subordinação e/ou confiança aos mandatários daquele Poder, não se justifica o provimento ad nutum, excepcionado pela lei.

Este Tribunal de Contas, por meio dos Prejulgados nº 1939 e 1232, já abordou o assunto tratado:

Prejulgado 1939

[...]

2. De acordo com o ordenamento legal vigente, a execução das funções típicas e permanentes da Administração Pública, das quais decorram atos administrativos, deve ser efetivada, em regra, por servidores de seu quadro de pessoal, ocupantes de cargos de provimento efetivo ou comissionado, estes destinados exclusivamente ao desempenho de funções de direção, chefia ou assessoramento, conforme as disposições do art. 37, II e V, da Constituição Federal.

 

Prejulgado 1232

[...]

8. Os cargos comissionados, destinados exclusivamente ao desempenho de funções de direção, chefia e assessoramento (art. 37, V, CF) serão criados e extintos por lei local, na quantidade necessária ao cumprimento das funções institucionais do órgão, limitados ao mínimo possível, evitando-se a criação desmensurada e sem critérios técnicos, obedecendo-se também aos limites de gastos com pessoal previstos pela Lei Complementar nº 101/00.

 

Para o cargo de assessor jurídico cumpre ressaltar o Prejulgado 1911 que dispõe:

Prejulgado 1911

[...]

4. Sempre que a demanda de serviços jurídicos - incluindo a defesa judicial e extrajudicial - for permanente e exigir estrutura de pessoal especializado com mais de um profissional do Direito, é recomendável a criação de quadro de cargos efetivos para execução desses serviços, com provimento mediante concurso público (art. 37, II, da Constituição Federal), podendo ser criado cargo em comissão (art. 37, II e V, da Constituição Federal) para chefia da correspondente unidade da estrutura organizacional correspondente unidade da estrutura organizacional (Procuradoria, Departamento Jurídico, ou denominação equivalente)

[...](Reformado em 24.08.2009, Decisão n. 3000/09, exarada no Processo CON 08/00526490, Rel. Conselheiro Moacir Bertoli. Sessão de 24.08/2009).

 

Conforme se depreende do Anexo III da Lei Complementar 1145/1991 (fl. 169), não existe nenhum cargo de provimento efetivo de advogado ou técnico habilitado em ciências jurídicas, capaz de atender as demandas que passam na Câmara, o que não se restringe a processos judiciais ou administrativos. Assim, o exercício dessas funções exclusivamente por servidor comissionado demonstra o desvio de finalidade na criação deste cargo.

Vale destacar que o exercício de atividades técnicas e de mero expediente por meio de cargos comissionados é forma de contrariar explicitamente o princípio constitucional da igualdade e, por consequência, infringir a regra constitucional do concurso público. Nesse mesmo sentido, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal vem decidindo pela inconstitucionalidade de normas que instituem cargos em comissão fora do contexto constitucional de direção, chefia e assessoramento, in verbis:

EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI ESTADUAL QUE CRIA CARGOS EM COMISSÃO. VIOLAÇÃO AO ART. 37, INCISOS II E V, DA CONSTITUIÇÃO. 2. Os cargos em comissão criados pela Lei nº 1.939/1998, do Estado de Mato Grosso do Sul, possuem atribuições meramente técnicas e que, portanto, não possuem o caráter de assessoramento, chefia ou direção exigido para tais cargos, nos termos do art. 37, V, da Constituição Federal. 3. Ação julgada procedente. (ADI 3706, Relator(a):  Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 15/08/2007, DJe-117 DIVULG 04-10-2007 PUBLIC 05-10-2007 DJ 05-10-2007 PP-00020 EMENT VOL-02292-01 PP-00110 LEXSTF v. 29, n. 346, 2007, p. 149-159).

 

Apesar de o Sr. Elísio Sgrott afirmar ter tomado providências para alteração da Lei Complementar n. 1145/91, visando reformular a estrutura dos cargos efetivos e comissionados para corrigir a presente irregularidade, a sanção ao gestor é devida haja vista a nomeação e manutenção no exercício de 2012 de servidores nos respectivos cargos comissionados em evidente ofensa ao disposto no art. 37, V, da Constituição Federal e consequente burla a concurso público previsto no mesmo art. 37, inciso II.

Em relação aos cargos de assessoria e assistente de parlamentares, apesar de a lei descrever o assessoramento indistintamente a todos os vereadores o que, para o corpo técnico, acaba afastando a relação de confiança necessária para o comissionamento, a inexistência de estrutura de gabinetes e separação de recursos para cada um dos nove (9) vereadores justifica a descrição das funções de assessor parlamentar e assistente parlamentar.

Entendo que se configura a relação de confiança necessária a existência do cargo comissionado, considerando que cada vereador pode solicitar a nomeação de um assessor e um assistente para seu respectivo assessoramento. Do mesmo modo, justifica-se o assessoramento do Presidente da Câmara e da Mesa Diretora por seus respectivos assessores parlamentares.

Por todo o exposto, resta inegável a constatação de que, em relação aos cargos comissionados de coordenador de informática, controlador interno e assistente jurídico, houve violação às regras previstas no art. 37, caput e incisos II, V e IX da CF, sendo que tal prática enseja a aplicação de multa prevista no art. 70, II, da Lei Complementar Estadual n° 202/2000. A sanção será aplicada acima do mínimo legal tendo em vista a gravidade da restrição considerada e o número de contratações tidas por irregulares.

 

II.3. Recebimento de 02 (dois) servidores titulares de cargo de provimento efetivo, oriundos da Prefeitura Municipal de Imbituba, sem embasamento legal específico ou termos de convênio regulamentando tais cessões, em descumprimento ao previsto no art. 37, caput, da Constituição Federal, no art. 20 da Lei Municipal n. 1144/91 e no Prejulgado n. 1009 desta Corte de Contas (item 3.4 do Relatório DAP n° 1144/2014).

Versa a presente restrição acerca da inexistência de lei específica e acordo, convênio ou ajuste entre a Prefeitura Municipal de Imbituba e a Câmara Municipal para regulamentar a cessão de servidores, estando sem amparo as Portarias n. 1/2005 e 02/2005 (fl. 186-188).

O responsável confirma que não existe qualquer convênio disciplinando os termos das disposições. Informa também que cientificou a Prefeitura Municipal para elaboração do respectivo convênio visando regulamentar a situação irregular.

A cessão é o afastamento do servidor públ ico para o exercício de suas funções em outro órgão ou entidade do poder público. Trata-se de uma forma de colaboração entre os entes estatais, submetida ao regime jurídico de direito público e, portanto, pautada pelo princípio da legalidade.

Apesar de a Lei Municipal n. 1144/1991 autorizar o Prefeito a colocar a disposição de outras pessoas jurídicas de direito público interno servidores municipais, o mesmo dispositivo determina que o processamento se realize nos termos da legislação vigente.

Desse modo, a sua efetivação deve ser antecedida por meio da correta instrumentalização, sendo materializada em Decreto ou Resolução, exigindo para tanto prévio convênio entre os órgãos e entidades envolvidos.

O tema em debate já foi analisado pela Corte de Contas por meio do Prejulgado nº 1115 (Processo 01/00391044, sessão de 18/03/2002), que elencou os requisitos necessários para a cessão de servidores públicos municipais:

Prejulgados nº 115:

1. O Município pode ceder servidores titulares de cargos efetivos para atender solicitação do Poder Judiciário Estadual, desde que atendidas as seguintes condições: a) demonstração do caráter excepcional da cessão; b) demonstração do relevante interesse público local na cessão do servidor efetivo; c) existência de autorização legislativa para o Chefe do Poder editar ato regularizando a cessão; d) desoneração do Município dos custos com remuneração e encargos sociais do servidor cedido, que devem ser suportados pelo órgão ou entidade cessionária; e) atendimento ao disposto no art. 62 da Lei Complementar nº 101/00 quando, excepcionalmente, os custos sejam suportados pelo Município (autorização na Lei de Diretrizes Orçamentárias e na Lei Orçamentária Anual e convênio, acordo, ajuste ou congênere específico); f) a cessão deve se referir a servidores efetivos, vedada a cessão de servidores contratados em caráter temporário, de qualquer natureza, e de ocupantes de cargo em comissão.


2. A colocação de pessoal à disposição da Câmara Municipal por parte do Executivo é possível, condicionando à existência de lei municipal que regule a matéria, bem como à realização de convênio entre os partícipes, atentando que tal procedimento deve ser adotado quando atenda ao interesse público. Para fins de atendimento à Lei de Responsabilidade Fiscal, as despesas com pessoal cedido serão computadas no Poder que se responsabilizará pelo pagamento da remuneração.

 

Diante do exposto, considerando que a cessão dos servidores municipais não cumpriu as exigências legais, resta configurada a presente restrição sujeita a aplicação de multa.

 

II.4. Existência de dispositivo normativo (Decreto) que dispensa o controle de jornada de trabalho dos servidores comissionados, em descumprimento ao previsto no art. 37, caput, da Constituição Federal

O art. 4º do Decreto n. 7, de 15/06/2010, da Mesa Diretora da Câmara Municipal (fl. 135), dispõe que os servidores públicos comissionados não estão sujeitos ao controle eletrônico de jornada de trabalho.

Muito embora dispensados do registro da frequência, a DAP constatou que a unidade controlava a jornada de seus servidores comissionados (fls. 59-117).

O controle de horário dos servidores permite à administração verificar o comparecimento do servidor de forma a possibilitar a regular liquidação de despesa, conforme o art. 63, §2°, inc. III, da Lei federal n° 4.320/64. Este Tribunal já se pronunciou por diversas vezes acerca da matéria: RLA nº. 11/00429996 (Decisão nº. 0754/2012); RLA 10/00655110 (Decisão nº. 0668/2012); REP 09/00545801 (Decisão nº. 5589/2010).

A DAP, acompanhada do Parecer do MPTC/SC, sugere recomendar à Câmara que se abstenha de aplicar o dispositivo normativo, situação esta que já vem sendo perpetrada pela unidade. Oportuno, todavia, que se recomende à Câmara adotar providências com vistas a revogar o citado dispositivo legal (art. 4º do Decreto n. 7, da Mesa Diretora da Câmara Municipal).

 

II.5. Existência de 1 (um) servidor que recebe proventos acima do teto remuneratório, em desacordo com o disposto no artigo 37, inciso XI, da Constituição Federal

Constatou-se o pagamento de proventos ao Sr. Célio Nunes Nascimento (fl. 216) ultrapassando o limite previsto na Constituição, que para os Municípios remete ao subsídio do Prefeito, fixados em R$ 9.000,00 pela Lei Municipal n. 3361/2008.

Diante do que dispõe o art. 37, inciso XI, da Constituição Federal, a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes dos Municípios, detentores de mandato eletivo e demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie, do Prefeito Municipal.

Em sua defesa, limita-se o responsável a informar que tomou providências objetivando notificar o beneficiário para o exercício do contraditório e ampla defesa (fl. 300), determinando a suspensão do subsequente pagamento até o final do prazo para manifestação.

Esta Corte já se manifestou sobre o tema, no Prejulgado 1665, recentemente reformado pela Decisão 1515/2014, de 30/04/2014, nos seguintes termos:

1. A Emenda Constitucional nº 19/98 não extinguiu direitos dos servidores públicos, tais como triênios, licenças-prêmio e gratificações, sendo legal o pagamento dos mesmos, considerando que tais benefícios constam do Estatuto dos Servidores Públicos da municipalidade.

2. Todas as espécies remuneratórias, incluídas as vantagens pessoais ou individuais, estão garantidas, ficando, todavia, submetidas ao teto da remuneração.
As remunerações superiores ao teto remuneratório, que porventura estejam sendo recebidas por agentes públicos, deverão ser adequadas ao limite estabelecido, não se podendo cogitar de direito adquirido a recebimento de excedentes neste particular. 

3. A remuneração dos servidores públicos municipais, seja vinculado ao Poder Executivo ou ao Poder Legislativo, incluindo as vantagens pessoais não poderão ultrapassar o subsídio do Prefeito (art. 37, XI, da CRFB). 

4. Em conformidade com a parte final do inciso XI do art. 37 da CRFB, o teto remuneratório dos procuradores municipais é o subsídio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça.

 

Diante disto, não havendo justificativas para o pagamento dos proventos a maior, tampouco dúvida quanto à configuração da grave ofensa ao dispositivo constitucional, fixo multa ao gestor, acima do mínimo legal, haja vista a gravidade do fato apurado associado ao risco de potencial dano ao erário em caso de insucesso na restituição do valores indevidamente pagos ao servidor..

Muito embora os proventos do servidor (R$ 11.249,15) tenham ultrapassado o subsídio do Prefeito à época (R$ 9.000,00), em consulta aos valores pagos atualmente ao Prefeito Municipal de Imbituba, constatei que a partir de primeiro de janeiro do ano de 2013, nos termos da Lei Municipal n. 4.091, de 25 de junho de 2012, o referido subsídio  passou a ser de R$ 11.300,00.

Desta forma, eventual bloqueio imposto aos proventos do respectivo servidor deixaria de ser necessário a partir da vigência do novo subsídio, não configurando qualquer irregularidade. Oportuno, apenas, determinar à Câmara Municipal de Imbituba para que adote providências ao ressarcimento dos valores pagos indevidamente até dezembro de 2012, o que poderá ser efetuado mediante desconto em folha.

 

III – VOTO

Ante o exposto, estando os autos instruídos na forma Regimental, submeto ao egrégio Plenário a seguinte proposta de voto:

1. Conhecer do Relatório de Auditoria realizada na Câmara Municipal de Imbituba, com referência a atos de pessoal a partir do exercício de 2012, com fundamento no art. 36, § 2º, alínea “a” da Lei Complementar n. 202/2000, para considerar irregulares os atos apontados nos itens 3.1 a 3.4 e 3.6 do Relatório DAP n° 1144/2014.

 

2. Aplicar multas, previstas no art. 70, inciso II, da Lei Complementar 202, de 15 de dezembro de 2000 c/c art. 109, II, do Regimento Interno desta Casa ao Sr. Elísio Sgrott, já qualificado nos autos, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial Eletrônico do TCE - DOTC-e, para comprovar ao Tribunal o recolhimento das multas aos cofres públicos, sem o que fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observando o disposto nos arts. 43, II, e 71 da Lei Complementar nº 202/2000, em razão das seguintes irregularidades:

2.1. R$ 1.000,00 (mil reais), em face da manutenção de servidores ocupantes de cargos de provimento em comissão de coordenador de informática, controlador interno e assessor jurídico no quadro funcional da Câmara Municipal de Imbituba, com atribuições eminentemente técnicas, em desvirtuamento aos pressupostos de direção, chefia ou assessoramento, em descumprimento ao art. 37, incisos II e V, da Constituição Federal (item 3.2 do Relatório DAP n° 1144/2014);

2.2. R$ 400,00 (quatrocentos reais), em face do recebimento de 02 (dois) servidores titulares de cargo de provimento efetivo, oriundos da Prefeitura Municipal de Imbituba, sem embasamento legal específico ou termo de convênio regulamentando tais cessões, em descumprimento ao previsto no art. 37, caput, da Constituição Federal, no art. 20 da Lei Municipal n. 1144/91 e no Prejulgado n. 1009 desta Corte de Contas (item 3.4 do Relatório DAP n° 1144/2014);

2.3. R$ 1.000,00 (um mil reais), em face da existência de 01 (um) servidor recebendo proventos acima do teto remuneratório, em desacordo com o disposto no artigo 37, inciso XI, da Constituição Federal (item 3.6 do Relatório DAP n° 1144/2014).

 

3. Determinar à Câmara Municipal de Imbituba que:

3.1. Abstenha-se de receber servidores oriundos de outras unidades gestoras sem embasamento legal ou termo de convênio que regulamente tais cessões, em respeito ao princípio da legalidade, previsto no art. 37, caput, da Constituição Federal, e Prejulgado n. 1009 desta Corte de Contas);

3.2. Adote providências para ressarcimento dos valores indevidamente recebidos pelo servidor Sr. Célio Nunes Nascimento, até dezembro de 2012, o que poderá ser efetuado mediante desconto em folha;

4. Recomendar à Câmara Municipal de Imbituba que na criação de cargos comissionados, bem como nas contratações de servidores para ocupação de tais cargos, observe os comandos da decisão exarada pelo Supremo Tribunal Federal nos autos do Recurso Extraordinário n° 365368/SC (Rel. Min. Ricardo Lewandowski, 22.5.2007), bem como adote medidas para adequar seu quadro de pessoal às determinações contidas no mesmo julgado.

5. Recomendar à Câmara Municipal de Imbituba que adote providências no sentido de revogar o art. 4º do Decreto n. 7/2010 da Mesa Diretora da Câmara Municipal, que dispensa o controle eletrônico da jornada de trabalho dos servidores públicos comissionados.

 

6. Dar ciência da Decisão, do Relatório e do Parecer do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, ao responsável e à Câmara Municipal de Imbituba.

 

Gabinete, em 04 de julho de 2014.

 

Cleber Muniz Gavi

Auditor Substituto de Conselheiro

                                                                      Relator