PROCESSO Nº

PCA 08/00236572

UNIDADE GESTORA

Fundação Municipal de Saúde de Itapiranga

RESPONSÁVEL

Luis Carlos Steffenon – gestora da Unidade à época

ESPÉCIE

Prestação de Contas de Administrador

ASSUNTO

Exercício de 2007

 

 

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS DO ADMINISTRADOR. CONTRATAÇÃO E CELEBRAÇÃO DE CONVÊNIOS PARA A PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE SAÚDE. COMPLEMENTARIEDADE DOS SERVIÇOS DEMONSTRADA. MONITORAMENTO DA NATUREZA DOS SERVIÇOS PRESTADOS. RECOMENDAÇÃO.

As despesas realizadas pela unidade gestora com prestação de serviços na área da Saúde, neste ponto, estão em conformidade como artigo 199, §1º da Constituição Federal, pois guardam complementaridade aos serviços prestados pelo Fundo Municipal de Saúde, não havendo o que falar em afronta ao inciso II do artigo 37 da Constituição Federal, sendo prudente a recomendação à unidade gestora para que avalie periodicamente se os serviços contratados mantêm seu caráter subsidiário em face do atendimento de saúde do Município.

 

PROGRAMA DE SAÚDE DA FAMÍLIA. . CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA. REALIZAÇÃO DE CONCURSO PÚBLICO. CONTRATOS COM PRAZO INDETERMINADO. RESTRIÇÃO RELEVADA.

A contratação de profissionais do Programa de Saúde da Família deve ser realizada mediante concurso público e por tempo indeterminado, nos termos do que prevê o inciso II e inciso IX do artigo 37 da Constituição Federal.

 

AGENTES COMUNITÁRIOS DE SAÚDE. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA. EMENDA CONSTITUCIONAL. TRANSPOSIÇÃO DOS CONTRATOS PARA LAPSO INDETERMINADO. PROCESSO SELETIVO ANTERIOR. RESTRIÇÃO RELEVADA.

A contratação de pessoal necessário para o atendimento do Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS) deve ser realizada mediante processo seletivo, utilizando-se do regime jurídico regido pela CLT desde que lei municipal não disponha em contrário, tendo o contrato de trabalho tempo indeterminado, sendo vedada a contratação temporária, nos termos dos artigos 8º e 16º da Lei (Federal) nº 11.350/2006.

 

 

 

 

 

I – RELATÓRIO

 

Tratam os autos em exame de Prestação de Contas do Fundo Municipal de Saúde de Itapiranga referente ao exercício de 2007, nos termos do art. 31 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, do art. 113 da Constituição do Estado de Santa Catarina de 1989 e do inciso III do art. 1º, arts. 7º, 8º e 9º da Lei Complementar (Estadual) nº 202/2000.

A Diretoria de Controle de Municípios sugeriu a citação do Sr. Luís Carlos Steffenon, gestor da unidade na época, para apresentar justificativas quanto às seguintes restrições (fls. 313-321):

1.1 - contratação de pessoal por tempo determinado para atendimento ao Programa de Saúde da Família - PSF e Programa dos Agentes Comunitários de Saúde - PACS, em desacordo ao estabelecido no artigo 16 da Lei nº 11.350, de 05/10/2006 (item A.1);

1.2 - contratação de entidade privada para prestação de serviços na área da Saúde (médicos), cujas atribuições são de caráter não eventual e inerentes às funções típicas da administração, devendo estar previstas em Quadro de Pessoal, traduzindo afronta às disposições do inciso II do artigo 37, c/c o 199, §1º da Constituição Federal (item A.2).

 

O responsável apresentou suas alegações de defesa nas fls. 324-333, que foi complementada pelos documentos de fls. 334-420.

Os autos foram novamente analisados pela DMU, a qual exarou o Relatório de Reinstrução nº 3.438/2012 (fls. 421-441), nos seguintes termos:

1 - JULGAR REGULARES, fundamentado no art. 18, I c/c o art. 19 da Lei Complementar nº 202/2000, as contas anuais referente aos atos de gestão do exercício financeiro de 2007 do Fundo Municipal de Saúde de Itapiranga, dando quitação ao Sr. Luís Carlos Steffenon – Gestor da Unidade à época, CPF 771.533.679-34, Titular da Unidade à época, de acordo com os pareceres emitidos nos autos;

2 - RESSALVAR que o exame das contas em questão não envolve o resultado de eventuais auditorias oriundas de denúncias, representações e outras, que devem integrar processos específicos, a serem submetidos à apreciação deste Tribunal de Contas, bem como não envolve o exame de atos relativos à Pessoal, Licitações e Contratos;

3 - DAR CIÊNCIA da decisão com remessa de cópia do Relatório de Reinstrução n.º 3.438/2012 e do Voto que o fundamentam ao Responsável à época, bem como o atual Gestor da Unidade. (grifos do original)

 

A prestação de contas seguiu ao Ministério Público junto ao Tribunal de Contas (MPjTC), por meio do Parecer nº MPTC/13.406/2012 (fls. 442-458), divergiu a manifestação da área técnica, e opinou pela seguinte proposta de voto:

1) julgar irregulares as contas do Fundo Municipal de Saúde de Ituporanga, nos termos do art. 18, III, b da Lei Complementar nº 202/2000, em razão:

1.1) da contratação de pessoal por tempo determinado de dois anos para atendimento ao Programa de Saúde da Família e Programa dos Agentes Comunitários de Saúde, em desacordo com o disposto no art. 16 da Lei 11.350/2006;

1.2) da contratação terceirizada de serviços de saúde, sem comprovação do caráter subsidiário das referidas contratações.

2) aplicar multa ao Sr. Luís Carlos Steffenon, Gestor do Fundo Municipal de Saúde à época pela irregularidade descrita no item 1, com amparo no art. 21, parágrafo único da Lei Complementar 202/2000;

3) determinar à Unidade Gestora que restrinja os valores firmados em convênio com particulares àqueles correspondentes ao que restar inviável a prestação de serviços pelo Município;

4) dar ciência da decisão com remessa do voto que o fundamenta ao Responsável à época, bem como à atual Gestora, Sr.ª Maria Carolina Lopes.

 

Diante da necessidade de subsídios complementares para esclarecer a regularidade das contratações de pessoal por tempo determinado para atendimento ao Programa dos Agentes Comunitários de Saúde, determinei a realização de diligência para a vinda dos documentos pertinentes (fls. 459-461), que foi efetivada por meio do Relatório nº 3.293/2013 (fls. 462-463). O responsável apresentou os documentos de fls. 466-638.

A DMU, por meio do Relatório nº 067/2014/2013 (fls. 640-641), manifestou-se pela conformidade da contratação dos agentes comunitários de saúde com a lei específica sobre o tema bem como em relação à Constituição Federal.

O Ministério Público Especial, por sua vez, manteve o posicionamento anterior, opinando pelo julgamento irregular das contas e aplicação de multas.

É o relatório.

 

II – FUNDAMENTAÇÃO

Passo a analisar as restrições apontadas conforme o Relatório DMU nº 6263/2008 (fls. 313-321).

 

II.1 – Contratação de pessoal por tempo determinado para atendimento ao Programa de Saúde da Família - PSF e Programa dos Agentes Comunitários de Saúde - PACS, em desacordo ao estabelecido no artigo 16 da Lei nº 11.350, de 05.10.2006 (item 1.1 do do Relatório DMU nº 6263/2008).

A área técnica constatou o empenhamento de R$ 826.107,44 (oitocentos e vinte e seis mil, cento e sete reais e quarenta e quatro centavos) para a contratação de pessoal por tempo determinado para o atendimento do Programa de Saúde da Família (PSF) e Programa dos Agentes Comunitários de Saúde (PACS).

Em relação às contratações realizadas nos dois programas, o responsável inferiu que elas deveriam ter caráter temporário tendo em vista que os programas não seriam permanentes. A temporariedade e excepcionalidade das contratações de profissionais para o PSF e o PACS é rechaçada, inicialmente pelo tempo que as iniciativas perduram no Brasil, lapso que ultrapassa a barreira de uma década, além do fato de que tais programas são tratados como política de governo permanente promovida pela esfera federal com vistas à promoção da saúde em todos os meios sociais e regiões brasileiras. Assim, inexistente a excepcionalidade na contratação de profissionais para compor os quadros destes programas, e sendo o serviço de saúde atividade-fim dos entes estatais, não resta outra alternativa senão a observância dos ditames do inciso II do artigo 37 da Constituição Federal[1].

Vencido o argumento que buscava demonstrar a regularidade da contratação temporária nos dois programas, entendo ser necessária, a partir deste ponto, a divisão da análise da presente restrição, dada a existência de circunstâncias específicas relacionadas a cada programa. Inicio pelo exame das contratações temporárias de pessoal para o Programa de Saúde da Família (PSF).

No caso do PSF, o gestor encaminhou o Edital de Concurso Público nº 001/2009 (fls. 391-404), que teve como objeto a contratação em regime de emprego público de 4 (quatro) enfermeiros, 2 (dois) técnicos em enfermagem, 4 (quatro) odontólogos e 5 (cinco) médicos, bem como o Decreto nº 50/2009 homologando o resultado final do referido concurso (fls. 405-406), motivo pelo qual a restrição estaria sanada.

A DMU sugeriu a desconsideração do apontado, pois a unidade gestora já teria tomado as providências cabíveis para o saneamento da restrição, qual seja a realização de concurso público para o preenchimento dos cargos relacionados ao Programa de Saúde da Família de forma permanente. O Ministério Público Especial, por sua vez, alegou que "em que pese a regularização das contratações a partir de 2009, a restrição permanece em relação aos anos que lhe precederam" (fl. 647).

Ainda que o concurso tenha sido realizado somente no exercício de 2009, entendo pelo saneamento da restrição, haja vista a própria correção da irregularidade, apesar de tardia, bem como o fato de que o dispositivo legal indicado na oportunidade da citação não foi violado pelas contratações em causa, não se olvidando que a conduta aqui delineada, se perdurasse sem as devidas providências, consistiria em afronta ao inciso II do artigo 37 da Constituição Federal. .

Passo ao exame da contratação de pessoal necessário para o atendimento do Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS).

O §5º do artigo 198 da Constituição Federal, dispôs:

Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes:

[...]

§ 4º Os gestores locais do sistema único de saúde poderão admitir agentes comunitários de saúde e agentes de combate às endemias por meio de processo seletivo público, de acordo com a natureza e complexidade de suas atribuições e requisitos específicos para sua atuação.

§ 5º Lei federal disporá sobre o regime jurídico, o piso salarial profissional nacional, as diretrizes para os Planos de Carreira e a regulamentação das atividades de agente comunitário de saúde e agente de combate às endemias, competindo à União, nos termos da lei, prestar assistência financeira complementar aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, para o cumprimento do referido piso salarial. (grifei)

 

O aludido parágrafo foi acrescentado pela Emenda Constitucional nº 51 de 14 de fevereiro de 2006, cujo parágrafo único do artigo 2º dispôs:

Os profissionais que, na data de promulgação desta Emenda e a qualquer título, desempenharem as atividades de agente comunitário de saúde ou de agente de combate às endemias, na forma da lei, ficam dispensados de se submeter ao processo seletivo público a que se refere o § 4º do art. 198 da Constituição Federal, desde que tenham sido contratados a partir de anterior processo de Seleção Pública efetuado por órgãos ou entes da administração direta ou indireta de Estado, Distrito Federal ou Município ou por outras instituições com a efetiva supervisão e autorização da administração direta dos entes da federação.

 

A Lei (Federal) nº 11.350/2006, a qual regulamentou o § 5º do artigo 198 da Constituição Federal, além de reforçar a necessidade de processo seletivo público para a contratação de agentes comunitários de saúde no artigo 9º[2], dispôs no dispositivo 16[3] acerca da vedação à contratação temporária ou terceirizada destes profissionais, impossibilidade esta a qual esta Corte de Contas já se manifestou no processo nº CON 05/00173222[4], que culminou no Prejulgado nº 1867.

Logo, a primeira conclusão que pode ser empreendida é sobre a inviabilidade de contratação temporária de agentes comunitários de saúde, haja vista o caráter permanente da atividade por eles desempenhada dentro das diretrizes nacionais de saúde junto aos municípios.

Por outro lado, o artigo 8º da Lei (Federal) nº 11.350/2006[5] inferiu que a contratação dos agentes comunitários de saúde se submeteria ao regime jurídico estabelecido pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), salvo no caso de Lei Estadual, Municipal e Distrital disporem de forma diversa.

Nesta senda, é rememorado o artigo 39 da Constituição Federal, o qual dispõe que "os Municípios instituirão, no âmbito de sua competência, regime jurídico único e planos de carreira para os servidores da administração pública direta, das autarquias e das fundações públicas". 

Destaco que a contratação de pessoal por meio de regime jurídico diverso daquele adotado para os servidores da administração direta municipal, caso do emprego público regido pela Consolidação das Leis do Trabalho, foi possível no interregno da vigência da Emenda Constitucional nº 19/1998, a qual alterou o artigo 39 da Constituição, até decisão cautelar do Supremo Tribunal Federal proferida em 02.08.2007 e publicada em 07.03.2008 na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2135/DF, que restaurou a anterior e agora vigente redação do dispositivo constitucional em debate.

Na referida decisão cautelar em ação constitucional, foi reiterada a necessidade da adoção de regime jurídico único para servidores da administração direta, e feita a ressalva de que, "em decorrência dos efeitos ex nunc da decisão, à subsistência, até o julgamento definitivo da ação, da validade dos atos anteriormente praticados com base em legislações eventualmente editadas durante a vigência do dispositivo ora suspenso".

Diante deste quadro, o Tribunal de Contas do Estado do Mato Grosso decidiu que, superado o lapso decorrido entre a Emenda Constitucional nº 19/98 e a Decisão Cautelar na ADI nº 2135/DF, o regime jurídico a ser adotado para os agentes comunitários de saúde a partir daquele momento deveria ser o estatutário, por força do artigo 39 da Constituição Federal. Neste sentido:

TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MATO GROSSO. CONSULTA. REEXAMES DE TESES PREJULGADAS NAS RESOLUÇÕES DE  CONSULTAS NºS 48/2008, 67/2011 E 02/2012. PESSOAL. AGENTES COMUNITÁRIOS DE SAÚDE E AGENTES DE COMBATE ÀS ENDEMIAS. REGIME JURÍDICO DE TRABALHO. REGIME JURÍDICO PREVIDENCIÁRIO. ADMISSÃO EM CARÁTER PERMANENTE. PROCESSO SELETIVO PÚBLICO. ADMISSÃO EM CARÁTER TEMPORÁRIO. PROCESSO SELETIVO SIMPLIFICADO. REGULARIZAÇÃO DE VÍNCULO DOS AGENTES CONTRATADOS ANTES DA EC 51/2006.

1) Regime jurídico de trabalho. 1.1) Os agentes comunitários de saúde e os agentes de combate às endemias podem estar vinculados à Administração Pública pelo regime estatutário, pelo regime celetista ou de forma temporária pelo regime administrativo especial (contratação temporária por excepcional interesse público). 1.2) O vínculo pelo regime celetista somente é possível se o emprego público tiver sido criado antes da decisão liminar na ADI 2135-4 do STF (14-8-2007), que revigorou o regime jurídico único estatutário na Administração Pública. Após essa data, só é possível a criação de cargos públicos com vínculo estatutário. 1.3) Caso o município ainda não tenha criado as carreiras de agente comunitário de saúde e de agente de combate às endemias, deve fazê-lo por meio de lei de iniciativa do Poder Executivo que estabeleça a quantidade de cargos, a estrutura remuneratória, o vínculo estatutário, as atribuições, os direitos, as obrigações, além dos requisitos para exercício do cargo previstos na Lei nº 11.350/2006.[6] (grifei)

 

A respeito do mesmo tema, decidiu em sentido diverso o Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul, ao considerar que o artigo 198 da Constituição Federal permitiu exceção ao artigo 39 também da Carta Magna, ao prever que Lei Federal definiria o regime jurídico a ser adotado nas contratações de Agentes Comunitários de Saúde, e a Lei (Federal) nº 11.350/2006 conferiu à contratação destes profissionais o regime jurídico estabelecido pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), salvo se lei local dispuser de forma diversa. Veja-se:

e) havendo lei local que tenha sido editada (incluída a respectiva publicação) no período entre 04-06-1998, data da promulgação e entrada em vigor da EC nº 19/98, e o dia imediatamente anterior (06-03-2008) ao da publicação da mencionada Decisão do STF, no DJe, criando empregos (regime celetista) para determinadas funções, tal norma subsiste “mas apenas para preservar a validade, no mínimo até a decisão de mérito, dos atos admissionais até então praticados sob o regime celetista”. A partir de 07-3-2008, as normas “perderam sua validade porque não mais respaldadas pelo texto constitucional”;

[...]

g) a partir de 07-3-2008, o entendimento a vigorar seria o anterior à EC nº 19/98, no que tange ao regime jurídico único, no caso, o estatutário, ressalvadas:

g.1) a contratação para “Programas Temporários de Governo, de qualquer nível da federação”, os quais, considerando sua transitoriedade e “singularidade (...) permitem exceção à regra - ainda que transitória decorrente da decisão do STF - de admissibilidade no serviço público por regime jurídico único e que permite a contratação pelo regime celetista, precedido de processo seletivo, desde que tais Programas tenham vinculação às Ações e Serviços Públicos de Saúde previstos na Emenda Constitucional nº 51/2006 e regulamentados pela Lei nº 11.350, de 05/10/2006, porque o texto constitucional e sua lei regulamentadora autorizam esta forma de admissão de pessoal destinada a estes Programas.”

A Lei Federal nº 11.350/06, por sua vez, é, da mesma forma que a EC 51/06, norma especial, precípua à regulamentação deste comandoconstitucional e deixa claro, em seu art. 8º, que os Agentes de Saúde e de Endemias são admitidos pelo regime celetista, regulado pela Consolidação das Leis do Trabalho, salvo se Estados, Distrito Federal e Municípios disponham ser outro o regime, no caso, o estatutário”;[7] (grifei)

 

A convivência entre o regime jurídico único disposto no artigo 39 e a sua exceção aberta no artigo 198 decorre do princípio da unidade constitucional, o qual evita o confronto das normas constitucionais no viés interpretativo e na sua aplicabilidade. A importância deste princípio de interpretação constitucional é lecionada por Canotilho, ao dispor que o princípio da unidade constitucional "obriga o intérprete a considerar a constituição na sua globalidade e a procurar harmonizar os espaços de tensão existentes entre as normas constitucionais a concretizar"[8].

Por outro lado, o raciocínio de que o artigo 39 da Constituição Federal poderia afastar a aplicabilidade da Lei Federal nº 11.350/2006, cuja origem advém do disposto no §5º do artigo 198 da Carta Magna, vai de encontro ao princípio da máxima efetividade das normas constitucionais, pois retira totalmente a eficácia do último preceito constitucional citado. Segundo Canotilho:

[O princípio da máxima efetividade] "também designado por princípio da eficiência ou princípio da interpretação efectiva, pode ser formulado da seguinte maneira: a uma norma constitucional deve ser atribuído o sentido que maior eficácia lhe dê. É um princípio operativo em relação a todas e quaisquer normas constitucionais [...]"[9]

 

Em verdade, a mudança constitucional inserida pela Emenda Constitucional nº 51/2006 no artigo 198 da Constituição Federal trata-se de novidade no ordenamento jurídico ao permitir regime jurídico diverso daquele delineado pelo Artigo 39 para o caso específico da contratação de agentes de saúde e de combate a endemias. O Supremo Tribunal Federal assim definiu a aplicabilidade do aludido princípio:

Não obstante, de há muito tenho frisado que, na solução dos problemas de transição de um para outro modelo constitucional, deve prevalecer, sempre que possível, a interpretação que viabilize a implementação mais rápida do novo ordenamento: parece ser um corolário iniludível do princípio da efetividade máxima das normas constitucionais.[10] (grifei)

 

Portanto, além de as normas constitucionais terem unidade na sua aplicação, elas não podem ter a efetividade derruída uma pela outra com o afastamento de lei infraconstitucional que confere aplicabilidade a uma delas[11]..

Assim, entendo que a decisão do tribunal gaúcho é mais acertada, pois cotejou de forma correta os princípios constitucionais da unidade da constituição e da efetividade máxima das normas constitucionais ao reconhecer a excepcionalidade de contratação de agentes comunitários de saúde e de combate a endemias por regime jurídico diverso daquele previsto no artigo 39, por força do § 5º do artigo 198 da Constituição Federal.

Em razão disso, por força do artigo 8º da Lei (Federal) nº 11.350/2006, os Agentes Comunitários de Saúde de Itapiranga podem ser contratados por regime celetista, desde que lei municipal não disponha de modo diverso, além da observância dos demais dispositivos da lei federal em comento.

Feita esta introdução acerca do regramento e das decisões judiciais relacionadas ao exercício da função de agente comunitário de saúde no ordenamento jurídico brasileiro, passo ao exame das manifestações do responsável, da área técnica e do parquet ministerial.

O responsável pelo Fundo Municipal de Saúde sustentou que apesar dos agentes comunitários de saúde estarem na condição de contratados temporários no exercício de 2007, estes foram admitidos antes do advento da Emenda Constitucional nº 51/2006 e da Lei (Federal) nº 11.350/2006, podendo serem admitidos por tempo indeterminado nos termos já explanados.

Quanto à necessidade de correção da irregularidade relacionada ao contrato temporário, o gestor alegou que ocorreu atraso na tomada de providências, pois estaria impossibilitado de nomear servidor público no interregno do dia 05.07.2008 até o dia 31.12.2008, por força da Resolução nº 22.579 do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a qual regulou as eleições municipais daquele ano. Acrescentou que, respectivamente no final do exercício de 2008 e início do ano de 2009, foi empreendida a regularização da situação com a criação de empregos públicos de agente comunitário de saúde e certificação para a permanência dos servidores que realizaram processo seletivo no exercício de 2005, portanto, antes da Emenda Constitucional nº 51 de 14 de fevereiro de 2006. Assim, o gestor concluiu que estas providências afastariam a ilegalidade.

A diretoria técnica acolheu as justificativas do responsável e sugeriu a desconsideração da restrição, com a determinação para que o Fundo Municipal de Saúde tome providências, junto ao Prefeito Municipal, "no sentido de garantir a estrita obediência aos ditames da Lei nº 11.350/2006, o que já foi providenciado através da Lei Complementar nº 19, de 09 de dezembro de 2008 fls. 367 a 376 dos autos, regularizando as contratações dos agentes comunitários de saúde de acordo com a Lei nº 11.350/2006" (fl. 437).

O MPjTC opinou pela manutenção da restrição. Afirmou que não haveria excepcionalidade nas contratações realizadas, indicou que o item "d" da Resolução nº 22.579 do TSE permitia contratações necessárias "ao funcionamento inadiável de serviços públicos essenciais" (fl. 454), bem como que a correção da ilegalidade no final do exercício de 2008 e início do ano de 2009 apenas corrobora a existência de irregularidades no exercício de 2007.

Atendo-se ao caso concreto, verifiquei que o Prefeito Municipal do exercício de 2005, por meio da Lei (Municipal) nº 2.211/2005 (fl. 34), autorizou a contratação por tempo determinado de 40 (quarenta) agentes comunitários de saúde, através de processo seletivo.

Levando em conta a existência da possibilidade de transposição dos contratos temporários celebrados antes da Emenda Constitucional para vínculo com prazo indeterminado, desde que preenchidos alguns requisitos pelo processo de seleção pública efetuado antes da entrada em vigor da mudança constitucional, determinei a realização de diligência à Unidade para que fosse apresentada documentação relacionada aos processos seletivos de ingresso de 36 (trinta e seis) agentes comunitários de saúde contratados em 21.02.2005, 01.11.2005, 02.01.2006 e 09.02.2006 e identificados nas fls. 70-308, os quais ainda teriam contrato em vigor, trazendo, inclusive, a relação dos aprovados, os instrumentos de convocação e os contratos de trabalho de cada um, além da juntada de outros contratos de trabalho de agentes comunitários de saúde em vigor no exercício de 2007 e que porventura não tenham sido mencionados na citação, bem como toda a documentação relacionada ao processo seletivo destes. Foi enviada a seguinte listagem:

Nome

Nº do Contrato

Início de Vigência

Folhas

1

Úrsula Loeblein

078/2005

21.02.2005

70-73

2

Inês Jussara Manchini

092/2005

21.02.2005

93-97

3

Leonice Eidt Schlickmann

071/2005

21.02.2005

98-102

4

Lioba Soethe

094/2005

21.02.2005

103-107

5

Marilei Soares Nunes de Jesus

153/2006

09.02.2006

112-115

6

Bernadete Elena Etges Petzild

084/2005

21.02.2005

168-171

7

Catarina Maria Durk Walter

072/2005

21.02.2005

172-175

8

Claci Epping Hendges

068/2005

21.02.2005

176-179

9

Claudete Soethe

064/2005

21.02.2005

180-183

10

Claudina Mayer

086/2005

21.02.2005

184-187

11

Daniela Wesendonck Becker

070/2005

21.02.2005

190-193

12

Ereni Caspers Staub

073/2005

21.02.2005

194-197

13

Ilga Eidt Schwendler

096/2005

21.02.2005

200-203

14

Ivonete Welter

066/2005

21.02.2005

204-207

15

Jacinta Utzig Pauli

213/2005

01.11.2005

211-214

16

Janice Maria Klein

093/2005

21.02.2005

217-220

17

Joana Imelda Klauck Wolfart

065/2005

21.02.2005

221-225

18

Lia Lucrécia Rauber da Silva

082/2005

21.02.2005

226-229

19

Lisane Konrad Reis

081/2005

21.02.2005

230-233

20

Lori Teresinha Zilles Rockenbach

090/2005

21.02.2005

234-237

21

Lúcia de Fátima Becker Sgarabotto

081/2006

02.01.2006

242-244

22

Lúcia Hochscheidt Thomé

080/2005

21.02.2005

245-248

23

Maria Celoni Krug

085/2005

21.02.2005

249-252

24

Marilice Feil Grave

087/2005

21.02.2005

253-256

25

Marizane Terezinha Priester Basso

099/2005

21.02.2005

257-260

26

Nanci Piffer Jones

079/2005

21.02.2005

261-264

27

Neiva Teresinha Muller Petzold

083/2005

21.02.2005

265-268

28

Nelsi Francisca de Cezaro

069/2005

21.02.2005

269-271

29

Nides Oberger Giehl

089/2005

21.02.2005

272-275

30

Odete Arnhold Flach

088/2005

21.02.2005

276-279

31

Ivanir Fank Thomé

076/2005

21.02.2005

280-283

32

Rosália de Azevedo Birck

095/2005

21.02.2005

284-287

33

Salete Hennig Eidt

097/2005

21.02.2005

288-291

34

Silésia Staub Teloeken

077/2005

21.02.2005

293-296

35

Lúcia Welter Hofer

063/2005

21.02.2005

301-304

36

Zélia Koerbes Schwendler

075/2005

21.02.2005

305-308

 

Toda a documentação solicitada foi enviada (fls. 476-488), atestando a conformidade das contratações anteriores com o parágrafo único do artigo 2º da Emenda Constitucional nº 51/2006 e com a Lei (Federal) nº 11.350/2006.

No reexame, tanto a DMU quanto o Ministério Público Especial mantiveram seus respectivos posicionamentos, respectivamente pela regularidade e irregularidade da circunstância em exame.

Diante dos documentos trazidos, faço o seguinte histórico: a Lei Complementar (Municipal) nº 19, de 9 de dezembro de 2008 (fls. 367-376) dispôs sobre a "criação de empregos públicos para o atendimento da Estratégia de Saúde da Família e do Programa de Agentes Comunitários", com a previsão de 40 (quarenta) vagas de agente comunitário de saúde a serem contratados sob o regime de emprego público.

A Portaria (Municipal) nº 30 de 05 de janeiro de 2009 exarada pelo Prefeito (fls. 377-379), por sua vez, determinou no seu artigo 1º a certificação de que a contratação dos 30 (trinta) agentes comunitários de saúde listados no Anexo Único do documento decorreu de processo seletivo realizado antes da entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 51/2006, e que eles se encontravam em exercício na referida data. O parágrafo único, por sua vez, determinou que os 30 (trinta) profissionais indicados no Anexo Único fossem lotados no quadro de pessoal como empregados públicos, nos termos da Lei Complementar (Municipal) nº 19/2008.

Portanto, diante do raciocínio acima empreendido, a manutenção dos agentes comunitários de saúde contratados mediante processo seletivo antes da Emenda Constitucional nº 51/2006 é viável no caso em tela, nos termos do artigo 2º do referido regramento, e a adequação empreendida pela Lei Complementar (Municipal) nº 19/2008, por meio do enquadramento dos agentes em empregos públicos, também se mostra legal e constitucional, haja vista a aplicabilidade do §5º do artigo 198 da Constituição Federal, conjugada com o Artigo 8º da Lei (Federal) nº 11.350/2006.

Com estas conclusões, entendo adequado relevar a restrição, haja vista que o responsável, apesar da demora em corrigir a ilegalidade, afastou a temporariedade dos contratos de agentes comunitários de saúde, conferindo-lhes caráter permanente por meio do regime de emprego público a que os profissionais foram enquadrados com a edição da Lei Complementar  (Municipal) nº 19, de 9 de dezembro de 2008 e da Portaria (Municipal) nº 30 de 05 de janeiro de 2009, tendo sido as contratações corrigidas nos termos do artigo 14[12] da Lei (Federal) nº 11.350/2006 e da Emenda Constitucional nº 51/2006.

 

II.2 – Contratação de entidade privada para prestação de serviços na área da Saúde (médicos), cujas atribuições são de caráter não eventual e inerente às funções típicas da administração, devendo estar previstas em Quadro de Pessoal, traduzindo afronta às disposições do inciso II do artigo 37, c/c o 199, § 1º da Constituição Federal. (item 1.2 do Relatório DMU nº 6263/2008).

O Sr. Luís Carlos Steffenon sustentou que os serviços prestados pela Sociedade Sulina Divina Providência - Hospital e Maternidade Sagrada Família, situado no Município de Itapiranga, não afrontariam os artigos 37, inciso II[13], e 199, §1º[14], ambos da Constituição Federal, pois a atividade da referida entidade da iniciativa privada ocorria de  forma a complementar ao Sistema Único de Saúde.

O responsável inferiu que, no exercício de 2007, o Município aplicou recursos financeiros com atendimento à saúde no total de R$ 2.229.538,99 (dois milhões, duzentos e vinte e nove mil quinhentos e trinta e oito reais e noventa e nove centavos), sendo os valores aplicados nos termos do Convênio nº 001/2007 (fls. 409-411), de R$ 400.564,00 (quatrocentos mil, quinhentos e sessenta e quatro reais - fls. 409-411), demonstrariam a complementaridade dos serviços contratados, em consonância com os ditames constitucionais.

O gestor à época destacou que os serviços objeto de convênio com o hospital não poderiam ser realizados dentro dos postos de saúde do Município, os quais não teriam instalações adequadas, e exemplificou a consecução de procedimentos cirúrgicos. Alegou, ainda, que, além da ausência de instalações físicas e técnicas apropriadas ao desenvolvimento das atividades contratadas mediante o convênio, a contratação de profissionais para a execução dos serviços, mediante concurso público, seria inviável dada a escassez de recursos financeiros do Município.

A DMU, diante da especificidade e complexidade dos serviços prestados, bem como a formalização do convênio para a prestação dos referidos serviços, entendeu pela regularidade da contratação, citando os artigos 24 a 26 da Lei (Federal) nº 8080/1990[15], haja vista a complementaridade dos serviços de saúde prestados pelo hospital contratado em face do atendimento prestado pelas unidades de saúde do Município.

O Ministério Público Especial, por sua vez, concluiu não estar demonstrada, nos termos do Prejulgado nº 2055 desta Corte de Contas, a atuação complementar e subsidiária da iniciativa privada contratada para a prestação dos serviços de saúde no Município de Itapiranga.

A contratação de terceiros para a prestação de serviços que seja atividade-fim da Unidade Gestora é ilegal e afronta o art. 37, II, da Constituição Federal, haja vista que tais serviços deveriam ser prestados por servidores legalmente investidos em cargo público. O artigo 199, §1º, da Constituição Federal permite à iniciativa privada a exploração direta de serviços de assistência à saúde e, de forma complementar, através do sistema único de saúde, mediante contrato de direito público ou convênio.

Neste ponto, oportuno transcrever parte do convênio celebrado entre o Município e o instituto hospitalar, o qual foi autorizado pela Lei (Municipal) nº 2.356/2006, notadamente o objeto do repasse que delimita a natureza dos serviços prestados e a sua complementaridade:

Cláusula Primeira - Do Objeto

Constituem objeto deste convênio a cooperação financeira, técnica e física com o objetivo de estabelecer:

1) Sobreaviso durante 14 horas, em todos os dias úteis e 24 horas nos pontos facultativos, feriados, sábados e domingos, no Hospital e Maternidade Sagrada Família de Itapiranga para atendimento dos casos de urgência e emergência, para o qual o município repassará um total até de R$ 23.550,00 (vinte e três mil e quinhentos e cinqüenta reais), sendo que R$ 10.800,00 (dez mil e oitocentos reais) serão destinados para custear despesas com manutenção do hospital; R$ 250,00 (duzentos e cinqüenta reais) por plantão, serão destinados aos profissionais que ficarão de sobreaviso no período noturno das 17 às 7 horas do dia seguinte e de R$ 500,00 (quinhentos reais) por plantão nos pontos facultativos, sábados, domingos e feriados durante 24 horas e R$ 1.500,00 (Hum mil e quinhentos reais), serão destinados aos profissionais que permanecerão de sobreaviso nos dias úteis, das 7 às 17 horas, para atendimento dos casos de urgência e emergência (ferimentos, acidentes e ou doenças que represente iminente risco de vida) e que não possam ser atendidos nos postos de saúde públicos municipais, R$ 1.250,00 (Hum mil duzentos e cinqüenta reais) para o autorizador das AIH's. [grifei]

[...]

2) Autorizações de Internações Hospitalares Municipais (AIH), até o total de 35 mensais, para custear despesas hospitalares e médicas em internações hospitalares com durações de até 36 horas. O município repassará ao Hospital e Maternidade Sagrada Família o valor total de R$ 100,00 (Cem reais), por AIH, sendo R$ 60,00 (Sessenta Reais) serão destinados a custear despesas hospitalares e R$ 40,00 (Quarenta Reais) para custear despesas com os profissionais médicos. [grifei]

[...]

3) (Autorizações para realização de cirurgias autorizadas pela Secretaria Municipal da Saúde, num total de até 11 (onze) mensais distribuídas de comum acordo entre o Município de Itapiranga, Hospital e Maternidade Sagrada Família e Profissionais). Para cada cirurgia do grupo de cirurgias poderá ser realizada até 05 (cinco) cirurgias mensais (herniórrafias, hemorroidectomias, laqueaduras, ressecção nódulos de mama), o município repassará ao Hospital e Maternidade Sagrada Família, um total de R$ 700,00 (Setecentos reais), para cada cirurgia do grupo de cirurgias poderão ser realizadas até 03 (três) cirurgias mensais (perineoplastias, histerectomias e colecistectomias) realizadas, o município repassará ao Hospital e Materinadade Sagrada Família o valor R$ 1.000,00 (Hum mil reais), para cada cirurgia do grupo de cirurgias poderão ser realizadas até 03 (três) cirurgias mensais (postectomia) realizadas, o município repassará ao Hospital e Maternidade Sagrada Família o valor R$ 420,00 (quatrocentos e vinte reais) sendo que dos valores repassados: [grifei]

50% (cinqüenta por cento), para custear despesas hospitalares;

27,5% (vinte e sete vírgula cinco por cento) será o repasse para o cirurgião;

13,5% (treze vírgula cinco por cento) será o repasse para o anestesista e,

9,0% (nove por cento), será o repasse para o auxiliar.

 

Quanto ao repasse, a delimitação do objeto deixa clara a complementaridade do serviço, tendo em vista que o convênio fixou que os serviços de plantão de pronto socorro, urgência e emergência serão prestados, em regime de sobreaviso, nos dias de feriado, ponto facultativo e finais de semana, bem como no período noturno (das 17 às 7 horas), bem como "das 7 às 17 horas, para atendimento dos casos de urgência e emergência (...) que não possam ser atendidos nos postos de saúde públicos municipais".

Em vista disso, e verificando a ausência de indícios de que o referido contrato não foi cumprido nos seus termos no exercício de 2007, entendo que as despesas realizadas pela unidade gestora com prestação de serviços na área da Saúde em análise neste item estão em conformidade como artigo 199, §1º da Constituição Federal, guardando complementaridade aos serviços prestados pelo Fundo Municipal de Saúde, não havendo também o que falar em afronta ao inciso II do artigo 37 da Constituição Federal. Logo, a restrição é afastada.

Todavia, deve o Fundo Municipal de Saúde atentar para o item 2.2, alínea "a", do Prejulgado nº 2055, o qual dispõe que

"a dimensão do serviço público deve ser reavaliada periodicamente, tendo em conta variáveis como a evolução populacional, evolução da demanda, evolução científica etc., de forma que o volume físico e/ou financeiro dessas contratações não descaracterize o caráter subsidiário em relação às atividades estatais."

 

Em vista disso, necessária se faz recomendação ao Fundo Municipal de Saúde de Itapiranga para que, ao realizar contratações de serviços de saúde em caráter subsidiário às atividades estatais, observe os ditames do Prejulgado nº 2055 deste Tribunal.

Por fim, é de se destacar que o presente feito analisou tão somente as demonstrações contábeis da Unidade, motivo pelo qual, ressalvo ainda que, a análise da legalidade, legitimidade e economicidade dos atos de gestão do responsável, resultado de auditorias, inspeções ou aqueles oriundos de denúncias, representações e outras, poderão ser objeto de processos específicos, submetidos a julgamento deste Tribunal de Contas.

 

III – PROPOSTA DE VOTO

 

Por todo o exposto e estando os autos apreciados na forma regimental, instruídos por equipe técnica da DMU e acrescidos das considerações do MPjTC, submeto a matéria à apreciação do Egrégio Plenário, propugnando pela adoção da seguinte Proposta de Voto:

1 – Julgar regulares com ressalva, com fundamento no art. 18, II, c/c o art. 20 da Lei Complementar (Estadual) nº 202/2000, as contas anuais de 2007 referentes a atos de gestão do Fundo Municipal de Saúde de Itapiranga, no que concerne ao Balanço Geral composto das Demonstrações de Resultados Gerais, na forma dos anexos e demonstrativos estabelecidos no art. 101 da Lei (Federal) nº 4.320/1964, e dar quitação ao Responsável.

2 – Ressalvar que o exame em questão não envolve o resultado de eventuais auditorias oriundas de denúncias, representações e, mesmo, ordinárias, que devem integrar processos específicos, submetidos a julgamento deste Tribunal de Contas.

3 – Recomendar ao Fundo Municipal de Saúde de Itapiranga que, ao realizar contratações de serviços de saúde em caráter subsidiário às atividades estatais, observe os ditames do Prejulgado nº 2055 deste Tribunal (item II.2 da Fundamentação).

4 Dar ciência da Decisão, do relatório e proposta de voto que o fundamentam, bem como do Relatório DMU nº 3.438/2012, ao Fundo Municipal de Saúde de Itapiranga, ao Sr. Luís Carlos Steffenon, gestor da unidade à época e à Prefeitura Municipal de Itapiranga. 

Gabinete, em 1º de dezembro de 2014

Auditor Gerson dos Santos Sicca

Relator



[1] Art. 37 [...] II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração

[2] A contratação de Agentes Comunitários de Saúde e de Agentes de Combate às Endemias deverá ser precedida de processo seletivo público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade de suas atribuições e requisitos específicos para o exercício das atividades, que atenda aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.

[3] Fica vedada a contratação temporária ou terceirizada de Agentes Comunitários de Saúde e de Agentes de Combate às Endemias, salvo na hipótese de combate a surtos endêmicos, na forma da lei aplicável.

[4] Relator: Conselheiro Otávio Gilson dos Santos; Sessão Ordinária de 18.04.2007; Publicado no Diário Oficial do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina nº 18116 de 07.05.2007.

[5] Os Agentes Comunitários de Saúde e os Agentes de Combate às Endemias admitidos pelos gestores locais do SUS e pela Fundação Nacional de Saúde - FUNASA, na forma do disposto no § 4o do art. 198 da Constituição, submetem-se ao regime jurídico estabelecido pela Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, salvo se, no caso dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, lei local dispuser de forma diversa.

[6] TCE/MT – Processo nº 21.887-1/2013; Tribunal Pleno; Rel. Conselheiro Substituto Luiz Henrique Lima; Resolução de Consulta nº 19/2013; Julgada em 17.09.2013.

[7] TCE/RS – Processo nº 06185-0200/10-7; Tribunal Pleno; Rel. Conselheiro Victor J. Faccioni; Decisão nº TP-0595/2011; Julgada em 13.07.2011. Parecer da Auditoria acolhido de nº 31-2010; Auditor Pedro Henrique Poli de Figueiredo.

[8] CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7. ed., Coimbra: Edições Almedina, 2003. p. 1223

[9] CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7. ed., Coimbra: Edições Almedina, 2003. p. 1224

[10] STF. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2596/PA; Rel. Min. Sepúlveda Pertence; Tribunal Pleno; Julgado na Sessão Ordinária de 15.08.2002. Publicado no Diário de Justiça nº 162 de 27.09.2002.

[11] O que seria o caso de o artigo 39 da Constituição Federal afastar a Lei (Federal) nº 11.350/2006, quando teve origem em dispositivo do §5º do artigo 198 da Constituição inserido pela EC nº 51/2006.

[12] O gestor local do SUS responsável pela contratação dos profissionais de que trata esta Lei disporá sobre a criação dos cargos ou empregos públicos e demais aspectos inerentes à atividade, observadas as especificidades locais.

[13] Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: [...] II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração;

[14] Art. 199. A assistência à saúde é livre à iniciativa privada. § 1º - As instituições privadas poderão participar de forma complementar do sistema único de saúde, segundo diretrizes deste, mediante contrato de direito público ou convênio, tendo preferência as entidades filantrópicas e as sem fins lucrativos.

[15] CAPÍTULO II - Da Participação Complementar

Art. 24. Quando as suas disponibilidades forem insuficientes para garantir a cobertura assistencial à população de uma determinada área, o Sistema Único de Saúde (SUS) poderá recorrer aos serviços ofertados pela iniciativa privada.

Parágrafo único. A participação complementar dos serviços privados será formalizada mediante contrato ou convênio, observadas, a respeito, as normas de direito público.

Art. 25. Na hipótese do artigo anterior, as entidades filantrópicas e as sem fins lucrativos terão preferência para participar do Sistema Único de Saúde (SUS).

Art. 26. Os critérios e valores para a remuneração de serviços e os parâmetros de cobertura assistencial serão estabelecidos pela direção nacional do Sistema Único de Saúde (SUS), aprovados no Conselho Nacional de Saúde.

§ 1° Na fixação dos critérios, valores, formas de reajuste e de pagamento da remuneração aludida neste artigo, a direção nacional do Sistema Único de Saúde (SUS) deverá fundamentar seu ato em demonstrativo econômico-financeiro que garanta a efetiva qualidade de execução dos serviços contratados.

§ 2° Os serviços contratados submeter-se-ão às normas técnicas e administrativas e aos princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS), mantido o equilíbrio econômico e financeiro do contrato.

§ 3° (Vetado).

§ 4° Aos proprietários, administradores e dirigentes de entidades ou serviços contratados é vedado exercer cargo de chefia ou função de confiança no Sistema Único de Saúde (SUS).