Processo n.: |
REP 12/00528228 |
Unidade Gestora: |
Câmara
Municipal de Barra Velha
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Responsável: |
Sr. Nivaldo José
Ramos |
Interessado: |
Sr. Wilson Rogério Wan-Dall |
Assunto: |
Irregularidades em atos de pessoal no Poder Legislativo. |
I – Relatório
Cuida-se de representação proposta pelo Conselheiro Wilson Rogério Wan-Dall, então Supervisor da Ouvidoria desta Corte de Contas, relatando supostas irregularidades em atos de pessoal na Câmara Municipal de Barra Velha, mais especificamente com relação ao excessivo número de servidores comissionados na unidade gestora, em desrespeito ao previsto no art. 37, caput, e incisos II e V, da Constituição Federal.
Em seu Relatório n. 397/2013, subscrito pelo Auditor Fiscal de Controle Externo Alicildo dos Passos, a Diretoria de Controle de Atos de Pessoal (DAP) exarou as seguintes conclusões:
4.1 - Em Preliminar conhecer da Representação formulada pelo Sr. Wilson Rogério
Wan-Dall, Conselheiro Supervisor da Ouvidoria, acerca de irregularidades
atinentes a servidores comissionados na Câmara de Vereadores de Barra Velha,
nos termos dos arts. 100, 101 e 102, do Regimento Interno desta Casa (Resolução
n° TC-06/2001), com nova redação dada pelo art. 5º, da Resolução n° TC-05/2005
c/c artigos 65, § 1º e 66 da Lei Complementar n. 202/2000;
4.2 Determinar que seja procedida AUDIÊNCIA, nos termos do Art. 29, § 1º, combinado com o Art. 35 da
Lei Complementar nº 202/00, do Sr. Nivaldo José Ramos (Presidente da Câmara de
Vereadores de Barra Velha), para apresentação de justificativas a este Tribunal
de Contas, em observância ao principio do contraditório e da ampla defesa, no
prazo de 30 (trinta) dias a contar do recebimento desta, a respeito da
irregularidade constante do presente Relatório, conforme segue:
4.2.1 - Excessivo número de servidores comissionados, sendo 9 (nove)
servidores comissionados para 3 (três) servidores ocupantes de cargo efetivo,
em desrespeito ao instituto do concurso público e da contratação temporária,
previstos no art. 37, incisos II e V, da Constituição Federal; (item 3.1 deste
relatório).
4.2.2 - Existência de servidor no exercício do Cargo Comissionado de Assessor
Jurídico, quando, em razão das funções desempenhadas pelo mesmo, deveria ser
provido por servidor em cargo de provimento efetivo, infringindo ao disposto no
art. 37, inciso II e V da Constituição Federal e aos Prejulgados TCE/SC nº 1807
e nº 1911; (item 3.2 deste relatório).
Em parecer da lavra do Procurador Aderson Flores, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas (MPTC) concordou com o posicionamento da área técnica.
A representação foi conhecida e a audiência do responsável autorizada por meio do Despacho n. GASNI 15/2013.
Em sua manifestação, o Sr. Nivaldo José Ramos esclareceu, inicialmente, que assumiu interinamente o cargo de Presidente da Câmara Municipal de Barra Velha por força de decisão judicial que afastou o Presidente eleito, Sr. Valdir Tavares. Nesse cenário, afirmou que a estrutura de 9 (nove) servidores comissionados e 3 (três) servidores efetivos foi por ele mantida “em razão da continuidade do contexto assumido provisoriamente pelo Representado” e que “em nenhum momento houve um aumento no número de nomeações aos cargos comissionados, no entanto, a permanência dos servidores era de suma importância para a continuidade dos trabalhos do Legislativo Municipal”. Quanto ao cargo de Assessor Jurídico, explicou que foi criado por Lei Municipal com natureza semelhante ao cargo de Procurador Jurídico e que “por se tratar de cargo com remuneração inferior, e objetivando a economia da instituição, optou-se por utilizar o cargo de assessor jurídico (remuneração mensal de R$ 3.600,00) ao invés do cargo de Procurador Geral (remuneração mensal de R$ 3.700,00)”.
Por meio do Auditor Fiscal de Controle Externo Raphael Périco Dutra, a DAP exarou o Relatório Conclusivo n. 2.536/2015, com as seguintes sugestões de encaminhamento:
3.1 Considerar irregular, com fundamento no
art. 36, § 2º, alínea “a”, da Lei Complementar n. 202/2000:
3.1.1 – o excessivo número de servidores comissionados, sendo 9 (nove) servidores
comissionados para 3 (três) servidores ocupantes de cargo de provimento
efetivo, em desrespeito ao instituto do concurso público e em
desacordo ao previsto no art. 37, caput, incisos
II e V, da Constituição Federal;
3.1.2
– a existência de servidor no exercício do Cargo
Comissionado de Assessor Jurídico, quando, em razão das funções desempenhadas
pelo mesmo, deveria ser provido por servidor em cargo de provimento efetivo,
infringindo ao disposto no art. 37, inciso II e V da Constituição Federal e ao
Prejulgado TCE-SC n. 1911;
3.2 – Aplicar
multa ao Sr. Nivaldo José Ramos (CPF
799.259.959-49), Presidente da Câmara Municipal de Barra Velha de 07/07/2011 a
06/12/2012 e de 01/01/2013 a 31/12/2014, na forma do disposto no art. 70,
incisos II , da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, e art. 109, II e VII, do
Regimento Interno, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias a contar da
publicação do acórdão no Diário Oficial
Eletrônico do Tribunal de Contas, para comprovar a este Tribunal o recolhimento
da multa ao Tesouro do Estado, sem o
que fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança
judicial, observado o disposto nos art.
43, inciso II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000, face às irregularidades
constantes dos itens 3.1.1 e 3.1.2 deste relatório.
3.3 – Determinar à Câmara Municipal de
Barra Velha que:
3.3.1
- no prazo de 01 (um) ano, comprove a este Tribunal de Contas a adoção
das providências cabíveis a fim de reduzir e/ou substituir por cargos de
provimento efetivo os cargos de provimento em comissão, em observância da regra
constitucional do concurso público como forma de ingresso na Administração
Pública, nos termos do art. 37, incisos II e V, da Constituição Federal e das
decisões exaradas pelo Supremo Tribunal Federal nos autos do Agravo Regimental
em Recurso Extraordinário n. 365.368/SC (Rel. Min. Ricardo Lewandowski,
publicado no DJ em 29/06/2007) e da Ação Direta de Inconstitucionalidade n.
4.125/TO (Rel. Min. Carmem Lúcia, publicada no Diário da Justiça em
15/02/2011), para que o número de servidores comissionados não exceda o
quantitativo existente de servidores ocupantes de cargo de provimento efetivo;
3.3.2 – no prazo de 01 (um) ano, comprove a este
Tribunal de Contas a adoção das providências cabíveis a fim de promover a realização
de concurso público para o cargo de Advogado Legislativo, com a consequente
abstenção em admitir servidor ocupante de cargo comissionado de Assessor
Jurídico na Câmara Municipal de Barra Velha, tendo em vista a permanência das
atividades jurídicas da unidade gestora e em respeito às atividades de direção,
chefia e assessoramento que devem permear o desempenho de cargo comissionado,
em cumprimento ao art. 37, incisos II e V, da Constituição Federal.
3.4. Determinar à Diretoria de Controle de
Atos de Pessoal – DAP que monitore o cumprimento das determinações expedidas
nesta decisão, mediante diligências e/ou inspeções in loco e, ao final
dos prazos nela fixados, se manifeste pelo arquivamento dos autos quando
cumprida a decisão ou pela autuação de processo de monitoramento específico, se
for o caso, quando verificado o não cumprimento da decisão, submetendo os autos
ao Relator para que decida quanto às medidas a serem adotadas.
3.5. Alertar à Câmara Municipal de Barra Velha, na pessoa do Presidente da Câmara, da imprescindível tempestividade e
diligência no cumprimento das determinações exaradas por este Tribunal, sob
pena de aplicação das sanções previstas no art. 70, inciso III e § 1º da Lei
Complementar Estadual n. 202/2000;
3.6 – Dar ciência da presente decisão à Câmara
Municipal de Barra Velha, ao responsável e ao Coordenador Técnico da Ouvidoria
desta Corte de Contas.
Em linhas gerais, o Procurador Aderson Flores concordou com a análise da área técnica. Porém, em complemento, fez algumas observações quanto ao excessivo número de servidores comissionados (nove) em relação ao número de servidores ocupantes de cargos de provimento efetivo (três). Ao final, o Parquet de Contas sugeriu o seguinte:
Dessa feita, no que
concerne à proporcionalidade entre cargos efetivos/comissionados, peço vênia
para opinar por DETERMINAÇÃO ao gestor que, no prazo de 180 dias, adote medidas
para redução de cargos comissionados existentes, ou transformação em cargos
efetivos, não se admitindo a existência de cargos comissionados em número
superior aos de cargos efetivos, em observância à regra constitucional do
concurso público como forma de ingresso na Administração Pública, nos termos do
art. 37, II e V, da Constituição e da jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal (RE nº 365368 ArR/SC, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 22-5-2007).
É o relatório.
II – Fundamentação
Vindo o
processo à apreciação desta Relatora, verifico inicialmente que as questões
postas nos autos dizem respeito à responsabilização do Presidente da Câmara
Municipal de Barra Velha em relação ao excessivo número de servidores ocupantes
de cargos em comissão e ao provimento em comissão do cargo de Assessor Jurídico
da mencionada Câmara Municipal.
De
modo a sistematizar a presente Proposta de Voto, passo a analisar as restrições
apontadas pela DAP, as alegações de defesa apresentadas pelo responsável e o
posicionamento do Ministério Público de Contas.
1. Da possibilidade de responsabilização
do atual Presidente da Câmara Municipal de Barra Velha
Como
já visto, o Responsável alegou preambularmente que a situação questionada nos
autos é anterior ao seu período na Presidência da Câmara e que, por ter
assumido o cargo de chefia inicialmente em caráter interino, optou por manter a
estrutura idealizada pelo titular do cargo, Sr. Valdir Tavares.
O tema
foi analisado pela área técnica, que rejeitou as alegações com base nos
seguintes argumentos:
As justificativas
apresentadas pelo responsável não afastam as irregularidades apontadas no
Relatório de Audiência n. 00397/2013, pois mesmo que o gestor tenha assumido a
Presidência da Câmara Municipal de forma transitória, tal fato perdurou por
quase um ano e meio, sendo que o Sr. Nivaldo José Ramos assumiu, de forma
definitiva, a Presidência da Casa Legislativa para o biênio 2013/2014, não
tomando quaisquer medidas concernentes à regularização do quadro funcional da
unidade gestora, mantendo o número excessivo de servidores comissionados [...].
De
acordo com o relatado nos autos, o Sr. Nivaldo José Ramos ocupou interinamente
a presidência da Câmara Municipal de Barra Velha, de 07 de julho de 2011 até 06
de dezembro de 2012, por força de decisão judicial que afastou o então
Presidente eleito, Sr. Valdir Tavares. E, de acordo com o seu entendimento, a
atitude mais adequada foi dar continuidade à prática até então consolidada no
Município, mantendo a proporção de 9 (nove) servidores comissionados para 3
(três) efetivos, bem como mantendo a chefia jurídica da Câmara por ele
presidida ao Assessor Jurídico, também nomeado livremente para cargo em
comissão.
Pondero
inicialmente que a situação política de um Presidente interino realmente não é
a mesma de um Presidente eleito, o primeiro titularizando o cargo de forma
precária e temporária e o segundo, com maior ânimo de definitividade, titularizando
o cargo pelo tempo que durar o mandato. Porém, não se pode negar que, mesmo de
forma interina, o titular da chefia do Legislativo não pode fechar os olhos
para eventuais irregularidades ocorridas na Câmara Municipal, tendo o dever de
corrigir situações ilegais, sobretudo quando a situação configurar ofensa a
preceitos básicos insculpidos na Constituição Federal.
Dessa
forma, por mais que seja compreensível a opção política do ora Responsável – de
manter a situação tal como deixada pelo Presidente anterior –, não se pode
deixar de reconhecer que eventuais consequências jurídicas de tal opção devem
ser arcadas por ele, sob pena de se admitir ilegalidades em situações de
transição. Ademais, é pertinente a constatação da área técnica, no sentido de
que “o Sr. Nivaldo José Ramos assumiu, de forma definitiva, a Presidência da
Casa Legislativa para o biênio 2013/2014, não tomando quaisquer medidas
concernentes à regularização do quadro funcional da unidade gestora, mantendo o
número excessivo de servidores comissionados”.
Assim,
antes de adentrar nas questões de fundo discutidas na presente representação,
deixa-se assentado que eventual responsabilidade por ilegalidades ou
irregularidades cometidas na gestão da Câmara Municipal de Barra Velha desde o
ano de 2011 deve sim ser atribuída ao Sr. Nivaldo José Ramos.
2. Do suposto número excessivo de
servidores comissionados na Câmara Municipal de Barra Velha
A área
técnica fixou entendimento de que é desproporcional a existência de 9 (nove)
servidores comissionados na Câmara Municipal de Barra Velha, sobretudo quando
se leva em consideração que existem lá apenas 3 (três) servidores efetivos.
O
fundamento de tal entendimento seria a jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal, no sentido de que é inconstitucional, por ofensa aos princípios
constitucionais da proporcionalidade e da moralidade administrativa, a
existência de cargos comissionados em número maior do que cargos efetivos.
Com
efeito, embora não se discorde que, idealmente, os órgãos públicos devam
observar o princípio da proporcionalidade na distribuição de cargos públicos
entre servidores efetivos e comissionados, penso que tal orientação não seja
capaz de criar uma regra fechada, no sentido de que o número de servidores
efetivos sempre deva ser
maior do que o número de servidores comissionados.
Nessa
linha de raciocínio, pondero que os precedentes trazidos pela área técnica e
pelo Ministério Público de Contas não se amoldam ao caso em apreço.
Senão
vejamos.
Na ADI
4.125/TO, o próprio STF assentou a inconstitucionalidade da norma no fato de “o
número de cargos em comissão inicialmente criados (35.419) é maior do que o
total de cargos efetivos preenchidos no Estado (29.944), o que poderia levar à
constatação absurda de que para cada subordinado há, pelo menos, um ‘chefe,
assessor ou diretor’, ocupante de cargo comissionado”.
Já no
RE 365.368/SC, a ofensa à Constituição se configurou a partir da constatação de
que houve “inadequação entre o motivo gerador do ato administrativo e o ato
praticado, vale dizer, se o cargo em comissão criado não se enquadra entre
aqueles que exigem absoluta confiança daquele com quem vai trabalhar e mais se
adequa aos de provimento efetivo preenchido via concurso público, emergem
violados os princípios constitucionais que balizam o preenchimento dos cargos
públicos”.
Como
se nota, no primeiro caso acima transcrito, a inconstitucionalidade restou
configurada a partir da exorbitância do número de cargos comissionados criados
(mais de trinta mil!) e, no segundo, identificou-se inconstitucionalidade na
criação de cargos comissionados para desempenhar funções típicas de cargos
efetivos.
Por
essa razão é que se afigura inadequada a transposição dos entendimentos
esposados nos casos acima citados para a situação configurada no Município de
Barra Velha, pois são contextos bastante distintos.
Para
resolver a situação dos autos, penso ser necessário analisar cargo por cargo, a
fim de averiguar a compatibilidade de cada um deles com a Constituição Federal.
Contudo, salienta-se, de antemão, que os cargos de Procurador Geral e Assessor
Jurídico serão tratados em tópico próprio.
Inicialmente,
analisa-se a natureza do cargo de Diretor
Geral, previsto no art. 5º da Lei Complementar Municipal n. 82/2009:
Art. 5º o Diretor Geral
e seus cargos subordinados tem como objetivos planejar, coordenar e executar os
sistemas de administração quanto:
I - Fazer cumprir as
disposições legais, regimentais e regulamentares, bem como as determinações do
Presidente e da Mesa Diretora;
II - Assistir o
Presidente, a Mesa Diretora e os Vereadores no desempenho de suas atribuições
parlamentares;
III - Planejar,
coordenar, acompanhar, avaliar e fazer executar com qualidade e presteza as
atividades referentes ao orçamento, finanças, materiais, contratações,
licitações, compras, patrimônio, recursos humanos, informática, serviços gerais
e segurança institucional, enfim todos os serviços de natureza administrativa e
financeira no âmbito deste Poder Legislativo, podendo disciplinar através de
Portarias e Ordens de Serviço o funcionamento das atividades;
IV - Adotar políticas e
ações que possibilitem o aperfeiçoamento e a melhoria da qualidade dos serviços
da Câmara Municipal;
V - Praticar, em
conjunto com a Presidência, os atos relacionados com empenhos, pagamentos,
prestação de contas e aqueles atinentes à movimentação bancária;
VI - Promover os
procedimentos licitatórios, respeitando a legislação específica;
VII - Determinar às
chefias ou servidores que lhe são subordinados, mediante Portarias ou Ordens de
Serviço, atribuições, tarefas e responsabilidades, conforme a necessidade dos
serviços e conveniência da administração.
VIII - Promover na
Câmara, a implantação e valorização dos programas de recrutamento, seleção,
admissão e capacitação de pessoal;
IX - Estabelecer normas
de controle de freqüência do pessoal da Câmara, para efeitos de pagamento,
merecimento e tempo de serviço;
X - Examinar e opinar,
em segunda instância, sobre questões relativas a direito, vantagens, deveres e
responsabilidades do pessoal, enviando a Procuradoria Geral da Câmara aquelas
questões para as quais não haja jurisprudência firmada;
XI - Promover estudos e
aperfeiçoamento e a administração do Plano de Cargos, Carreira e Remuneração -
PCCR, mantendo-o permanentemente atualizado; e
XII - Realizar outras
competências que lhe sejam atribuídas, desde que compatíveis com a natureza de
suas funções.
Na
Câmara Municipal de Barra Velha, o aludido cargo de Diretor Geral compõe o
primeiro escalão da administração do órgão. Inclusive, por ser cargo de
direção, pressupõe a existência de subordinados hierárquicos, numa clara
demonstração de que o provimento mediante comissão é adequado.
Quanto
aos demais cargos comissionados previstos na Lei Complementar Municipal n.
82/2009, observa-se que, por falha na técnica legislativa, eles não possuem
previsão específica de atribuições. A ausência de atribuições no documento
legislativo é mácula que, a meu ver, torna inconstitucional os cargos criados.
Entretanto, é sabido que a questão já foi levada ao Tribunal de Justiça de
Santa Catarina, que acabou considerando constitucional tal prática legislativa,
desde que, da nomenclatura do cargo em análise, seja possível aferir suas
atribuições. Cito como precedente a ação direta de inconstitucionalidade n.
2010.048695-7, de Relatoria do Des. Luiz Cézar Medeiros, cuja ementa é a
seguinte:
AÇÃO DIRETA DE
INCONSTITUCIONALIDADE - LEI QUE REESTRUTUROU ADMINISTRATIVAMENTE O MUNICÍPIO -
CRIAÇÃO DE CARGOS DE PROVIMENTO EM COMISSÃO - ATRIBUIÇÕES DE DIREÇÃO, CHEFIA E
ASSESSORAMENTO - AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO DOS ARTS 16 E 21, INC. I, DA CARTA
ESTADUAL E, POR VIA REFLEXA, DO ART. 37, CAPUT E INC. V, DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL.
Não se mostra ilegal a
criação dos cargos de provimento em comissão se pelas denominações recebidas -
inclusive a de coordenador e supervisor - é possível depreender o caráter de
funções de chefia, assessoramento ou direção, que demandam confiança entre o
nomeante e a pessoa nomeada, acrescido ao fato de as atividades a serem
exercidas pelos servidores nomeados não serem meramente técnicas.
Cumpre salientar que a
questão de os nomes dados aos cargos não corresponderem às funções que
efetivamente serão exercidas transborda os limites do controle abstrato de
constitucionalidade. A matéria poderá, e deverá, se for o caso, ser agitada por
meio de ação civil pública, ação de improbidade administrativa ou ação popular,
em face da necessidade de dilação probatória e análise do caso concreto. (TJSC,
Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 2010.048695-7, de Gaspar, rel. Des.
Luiz Cézar Medeiros, j. 15-06-2011).
Assim
sendo, os cargos de Secretário
Legislativo, Diretor de Secretaria,
Diretor de Engenharia, Chefe de Gabinete, Assessor de Comunicação e Assessor
Parlamentar são cargos cujas atribuições, ao menos à primeira vista,
parecem se compatibilizar com a Constituição Federal, na medida em que é
plausível o entendimento de que se prestam a dirigir, chefiar ou assessorar a
Câmara de Vereadores de Barra Velha.
Diante
dos documentos constantes nos autos, não há como considerar inconstitucional qualquer
dos cargos acima mencionados. Assim sendo, também não é possível dizer que os
cargos comissionados constantes na estrutura da Câmara Municipal de Barra Velha
estão em desconformidade com o ordenamento jurídico pátrio.
3. Do provimento do cargo de Assessor Jurídico
da Câmara Municipal de Barra Velha
Por
fim, cumpre analisar os cargos de Procurador
Geral e Assessor Jurídico, cujas
atribuições estão no art. 6º da Lei Complementar Municipal n. 82/2009:
Art. 6º À Procuradoria
Geral compete:
I - observar e fazer
cumprir as disposições legais, regimentais e regulamentares, bem como as
determinações superiores;
II - representar a
Câmara Municipal em juízo ou fora dele, nos assuntos de seu interesse, quando
receber delegação;
III - prestar
assessoria à Presidência, à Mesa Diretora, aos Vereadores, ao Secretário Geral
da Câmara Municipal, nos assuntos relativos ao exercício de suas funções
públicas;
IV - prestar assessoria
jurídica às comissões de natureza sindicante ou disciplinar e às comissões
previstas nas normas sobre licitação;
V - prestar
assessoramento jurídico ao Processo Legislativo;
VI - atender as
diligências oriundas de instituições de controle externo, especialmente, do
Tribunal de Contas do Estado, contando com a colaboração da Controladoria
Interna;
VII - auxiliar e
orientar na redação de pareceres das Comissões Permanentes e Temporárias,
propondo minutas quando for o caso;
VIII - realizar outras
competências que lhe sejam atribuídas, desde que compatíveis com a natureza de
suas funções.
IX - coordenar a propositura
de medidas de caráter jurídico que visem proteger o patrimônio dos órgãos da
Câmara Municipal;
X - coligir elementos
de fato e de direito e preparar, em regime de urgência, as informações que
devam ser prestadas em Mandados de Segurança;
XI - oficiar, no
interesse da Câmara Municipal, aos órgãos do Judiciário e do Ministério
Público;
XII - promover o exame
de ordens e sentenças judiciais e orientar quanto ao seu exato cumprimento;
XIII - assessorar
juridicamente às demais unidades administrativas da Câmara Municipal;
XIV - examinar,
previamente, a legalidade dos contratos, concessões, acordos, ajustes ou
convênios nos quais a Câmara seja parte, promovendo a respectiva rescisão,
quando for o caso;
IX - zelar pela fiel
observância e aplicação das Leis, decretos, portarias e regulamentos existentes
no Município, principalmente no que se refere ao controle da legalidade dos
atos praticados pelos agentes públicos;
X - atender aos
encargos de consultoria e assessoria jurídica da Câmara Municipal, providenciando
a emissão de pareceres sobre questões jurídicas em processos que versem sobre o
interesse do Poder Legislativo, examinando anteprojetos de Leis, justificativas
de vetos, decretos, contratos, projetos de regulamentos e outros documentos de
natureza jurídica;
XI - propiciar a
unificação de pareceres sobre questões jurídicas e de interpretação sobre as
quais haja controvérsia;
XII - promover a
organização e atualização da coletânea de Leis municipais, bem como da
legislação estadual e federal de interesse da Câmara Municipal;
XIII - sugerir revisões
na legislação e promover os estudos necessários, quando for o caso.
Parágrafo Único - A
Procuradoria Geral da Câmara de Vereadores de Barra Velha, contará com apoio de
um Assessor Jurídico.
À
primeira vista, as atribuições de ambos os cargos parecem ser compatíveis com o
provimento em comissão.
Todavia,
esta Corte de Contas já fixou entendimento, espelhado no Prejulgado n. 1911, no
sentido de que “Nas Câmaras de Vereadores cuja demanda de serviços jurídicos é
reduzida, os serviços jurídicos poderão ser executados por servidor com
formação específica e registro no Órgão de Classe (OAB), com a carga horária
proporcional ao volume dos serviços (item 6.2.2.1 desta Decisão), nomeado para
exercer cargo de provimento efetivo, através de prévio concurso público (art.
37, II, da Constituição Federal)” e que “Sempre que a demanda de serviços
jurídicos – incluindo a defesa judicial e extrajudicial – for permanente e
exigir estrutura de pessoal especializado com mais de um profissional do
Direito, é recomendável a criação de quadro de cargos efetivos para execução
desses serviços, com provimento mediante concurso público (art. 37, II, da
Constituição Federal), podendo ser criado cargo em comissão (art. 37, II e V,
da Constituição Federal) para chefia da correspondente unidade da estrutura
organizacional (Procuradoria, Departamento Jurídico, Assessoria Jurídica, ou
denominação equivalente)”.
Ou
seja: se o setor jurídico da Câmara Municipal contar com apenas um servidor
(Procurador Jurídico), o cargo deverá ser provido mediante prévio concurso
público; se contar com mais de um servidor (Corpo de Procuradores Jurídicos),
todos os cargos deverão ser providos mediante prévio concurso público, ficando
à critério da lei, neste último caso, criar um cargo comissionado de Procurador
Geral da Câmara Municipal.
Do
exposto, constata-se que o provimento do cargo de Assessor Jurídico da Câmara
Municipal de Barra Velha está em desacordo com o Prejulgado n. 1911 desta Corte
de Contas, devendo-se, assim, reconhecer a irregularidade apontada pela DAP,
fixando-se multa ao responsável no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais),
considerando-se, para tanto, a gravidade da conduta e os parâmetros
estabelecidos no Regimento Interno do TCE/SC.
Ainda,
buscando regularizar a situação irregular constatada, é devida a determinação
para que, no prazo de 1 (um) ano, a Câmara Municipal de Barra Velha promova
concurso público para o cargo de Procurador Jurídico.
III – Proposta de Voto
Diante do exposto, divergindo
em parte do entendimento da Diretoria de Controle de Atos de Pessoal (DAP) e do
Ministério Público junto ao Tribunal de Contas (MPTC), submeto ao egrégio
Plenário a seguinte Proposta de Voto:
1. Considerar irregular, com fundamento no art. 36, § 2º, “a”, da Lei Complementar n. 202/2000:
1.1. A existência de servidor no exercício do Cargo Comissionado de Assessor Jurídico, quando, em razão das funções desempenhadas pelo mesmo, deveria ser provido por servidor em cargo de provimento efetivo, infringindo ao disposto no art. 37, II e V, da Constituição Federal, e ao Prejulgado TCE-SC n. 1911;
2. Aplicar multa no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais) ao Sr. Nivaldo José Ramos (CPF 799.259.959-49), Presidente da Câmara Municipal de Barra Velha de 07/07/2011 a 06/12/2012 e de 01/01/2013 a 31/12/2014, na forma do disposto no art. 70, II, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, e art. 109, II e VII, do Regimento Interno, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias a contar da publicação do acórdão no Diário Oficial Eletrônico do Tribunal de Contas, para comprovar a este Tribunal o recolhimento da multa ao Tesouro do Estado, sem o que fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto no art. 43, II, e 71, da Lei Complementar n. 202/2000, face à irregularidade constante no item 2.3. desta Proposta de Voto.
3. Determinar à Câmara Municipal de Barra Velha que, no prazo de 01 (um) ano, contado a partir da publicação desta deliberação no Diário Oficial Eletrônico desta Corte de Contas, comprove a este Tribunal de Contas a adoção das providências cabíveis a fim de promover a realização de concurso público para o cargo de Procurador Legislativo, com a consequente abstenção em admitir servidor ocupante de cargo comissionado de Assessor Jurídico na Câmara Municipal de Barra Velha, tendo em vista a permanência das atividades jurídicas da unidade gestora e em respeito às atividades de direção, chefia e assessoramento que devem permear o desempenho de cargo comissionado, em cumprimento ao art. 37, II e V, da Constituição Federal.
4. Determinar à Diretoria de Controle de Atos de Pessoal (DAP) que monitore o cumprimento da determinação expedida nesta decisão, mediante diligências e/ou inspeções in loco e, ao final do prazo nela fixado, se manifeste pelo arquivamento dos autos quando cumprida a decisão ou pela autuação de processo de monitoramento específico, se for o caso, quando verificado o não cumprimento da decisão, submetendo os autos ao Relator para que decida quanto às medidas a serem adotadas.
5. Alertar à Câmara Municipal de Barra Velha, na pessoa do Presidente da Câmara, da imprescindível tempestividade e diligência no cumprimento da determinação exarada por este Tribunal, sob pena de aplicação das sanções previstas no art. 70, III, e § 1º, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000;
6. Dar ciência da presente decisão à Câmara Municipal de Barra Velha, ao responsável e ao Coordenador Técnico da Ouvidoria desta Corte de Contas.
Florianópolis, 25 de agosto de 2015.
Relatora