Processo n.:

TCE 09/00672153

Unidade Gestora:

Prefeitura Municipal de Florianópolis

Recorrente:

Sr. Mário Roberto Cavallazzi

Assunto:

Inexigibilidade de Licitação n. 519/2009 e Contrato n.1056/2009

I - Relatório

Os presentes autos tratam da análise da Inexigibilidade de Licitação n. 519/2009, promovida pela Prefeitura Municipal de Florianópolis, visando “contratação da empresa para a criação, execução, montagem e desmontagem de Árvore de natal, com aproximadamente 60 metros de altura e estrutura em alumínio, fabricada para suportar em total segurança adversidades climáticas, perfazendo mais de 3000 metros de estrutura metálica e tecido desenvolvido especialmente para funcionar como difusor de luz, iluminada em 18.324 clusters LEDs RGB e com interatividade, apresentando conteúdo audiovisual exclusive, conforme especificações constantes da proposta – Anexo I” (fl. 06).

Em decorrência do referido procedimento de Inexigibilidade, foi firmado o Contrato n. 1056/2009 com a empresa Palco Sul Ltda., pelo valor de R$ 3,7 milhões.

Com base no Relatório  DLC/INSP.2/Div.4 n. 300/2009, elaborado pela Diretoria de Controle de Licitações e Contratações (DLC), determinei, por meio do despacho singular GASNI n. 54/2009, publicado no DOTC-e n. 399, de 15/12/2009, à Prefeitura Municipal de Florianópolis, com a finalidade de prevenir futuras lesões ao erário, que não fossem pagas as parcelas pendentes do Contrato n. 1056/2009 até que este Tribunal de Contas se posicionasse sobre a sua legalidade. Tal determinação teve fundamento no poder geral de cautela, que é inerente à atuação dos Tribunais de Contas, além da existência de urgência, já que o próximo pagamento à contratada estava previsto para ocorrer em 20/12/2009, e da ameaça de grave lesão ao erário.

Após as devidas comunicações feitas pela SEG, os autos seguiram ao MPTC, que se manifestou por acompanhar na íntegra o despacho proferido por esta Relatora (Pareceres n. 7.444/2009 e 15/2010).

Posteriormente, após a apresentação de defesa pelos responsáveis, a DLC elaborou novo Relatório (n. 164/2010) e o MPTC apresentou o Parecer n. 3732/2010, os quais subsidiaram proposta de voto apresentada por esta Relatora e ratificada pelo Egrégio Plenário quando da edição da Decisão n. 4557/2010, nos seguintes termos:

Decisão n. 4557/2010

[...] O TRIBUNAL PLENO, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro no art. 59 c/c o art. 113 da Constituição do Estado e no art. 1° da Lei Complementar n. 202/2000, decide:

6.1. Ratificar a determinação à Prefeitura Municipal de Florianópolis, com a finalidade de prevenir futuras lesões ao erário, para que não sejam pagas as parcelas pendentes do Contrato n. 1056/2009 até que esse Tribunal de Constas se posicione sobre a sua legalidade.

6.2. Converter o presente processo em "Tomada de Contas Especial", nos termos do art. 32 da Lei Complementar n. 202/2000, tendo em vista as irregularidades apontadas pelo Órgão Instrutivo, constantes do Relatório de Reinstrução DLC n. 164/2010.

6.3. Definir a RESPONSABILIDADE SOLIDáRIA, nos termos do art. 15, I, da Lei Complementar n. 202/00, dos Srs. MáRIO ROBERTO CAVALLAZZI - ex-Secretário Municipal de Turismo, Cultura e Esporte de Florianópolis, CPF n. 092.801.549-15, e ALOYSIO MACHADO FILHO - ex-Secretário Adjunto de Turismo, Cultura e Esporte de Florianópolis, CPF n. 070.268.979-34, e da empresa PALCO SUL EVENTOS LTDA., CNPJ 03.923.579/0001-52, por meio de seu representante legal, Sr. Carlos Eduardo Custódio, por irregularidades verificadas nas presentes contas.

6.3.1. Determinar a CITAçãO dos Responsáveis nominados no item 6.3 acima, nos termos do art. 15, II, da Lei Complementar n. 202/00, para, no prazo de 30 (trinta) dias, a contar do recebimento desta deliberação, com fulcro no art. 46, I, b , do mesmo diploma legal c/c o art. 124 do Regimento Interno, apresentarem alegações de defesa, em observância ao princípio do contraditório e da ampla defesa, acerca de indícios de superfaturamento do Contrato n. 1056/09 e execução do objeto em desacordo com as especificações e prazos fixados no contrato, em afronta aos princípios da economicidade, eficiência e moralidade e contrariando o disposto no art. 66 da Lei 8.666/93 (item 2.2.8.2 do Relatório DLC); irregularidade essa ensejadora de imputação de débito e/ou aplicação de multa prevista nos arts. 68 a 70 da Lei Complementar n. 202/2000.

 6.4. Definir a RESPONSABILIDADE INDIVIDUAL, nos termos do art. 15, I, da Lei Complementar n. 202/00, dos Srs. MáRIO ROBERTO CAVALLAZZI e ALOYSIO MACHADO FILHO - qualificados anteriormente, por irregularidades verificadas nas presentes contas.

6.4.1. Determinar a CITAçãO dos Responsáveis nominados no item 6.4 desta decisão, nos termos do art. 15, II, da Lei Complementar n. 202/00, para, no prazo de 30 (trinta) dias, a contar do recebimento desta deliberação, com fulcro no art. 46, I, b , do mesmo diploma legal c/c o art. 124 do Regimento Interno, apresentarem alegações de defesa, em observância ao princípio do contraditório e da ampla defesa, acerca das irregularidades abaixo discriminadas, ensejadoras de aplicação de multa prevista nos arts. 69 ou 70 da Lei Complementar n. 202/2000:

6.4.1.1. Ilegalidade da Inexigibilidade de Licitação n. 519/2009 frente aos arts. 37, XXI, da Constituição Federal e 25, incisos I a III, da Lei n. 8.666/93 (item 2.2.1 do Relatório DLC);

6.4.1.2. Descumprimento dos incisos II e III do parágrafo único do art. 26 da Lei n. 8.666/93, aplicáveis ao processo de Inexigibilidade de Licitação n. 519/2009 (item 2.2.2 do Relatório DLC);

6.4.1.3. Ausência de elementos que demonstrem a qualificação técnica da empresa contratada para a execução do objeto, em detrimento do art. 30 da Lei n. 8.666/93 (item 2.2.3 do Relatório DLC);

6.4.1.4. Ausência de projeto básico do objeto e orçamento detalhado em planilhas que expressem a composição de todos os seus custos unitários, nos termos do art. 7º § 2º, I e II, c/c § 9º, da Lei n. 8.666/93 (item 2.2.4 do Relatório DLC);

6.4.1.5. Ausência do regime de execução do objeto, nos termos do art. 40, caput, e 55, II, da Lei n. 8.666/93 (item 2.2.5 do Relatório DLC);

6.4.1.6. Realização de contratação por inexigibilidade de licitação com previsão de captação de recursos da iniciativa privada para custear o objeto, em desacordo com o disposto no art. 7°, § 3°, da Lei n. 8.666/93 (item 2.2.6 do Relatório DMU);

6.4.1.7. Divergência entre a altura da árvore de natal que foi prevista no contrato (60 metros) e a efetivamente executada (máximo de 46 metros), demonstrando que não foram observadas as especificidades do edital e do Contrato n. 1056/2009, contrariando o art. 66 da Lei (federal) n. 8.666/93 e ensejando a aplicação dos arts. 77 e 78 da Lei (federal) n. 8.666/93 (item 2.2.7 do Relatório DMU).

6.5. Definir a RESPONSABILIDADE INDIVIDUAL, nos termos do art. 15, I, da Lei Complementar n. 202/00, do Sr. DáRIO ELIAS BERGER - Prefeito Municipal de Florianópolis, CPF n. 341.954.919-91, por irregularidade verificada nas presentes contas.

6.5.1. Determinar a CITAçãO do Responsável nominado no item 6.5 acima, nos termos do art. 15, II, da Lei Complementar n. 202/00, para, no prazo de 30 (trinta) dias, a contar do recebimento desta deliberação, com fulcro no art. 46, I, b , do mesmo diploma legal c/c o art. 124 do Regimento Interno, apresentar alegações de defesa, em observância ao princípio do contraditório e da ampla defesa, acerca da abertura de crédito adicional especial no valor de R$ 13.000.000,00 (treze milhões de reais), em desacordo com os arts. 42 da Lei n. 4.320/64 e 167, V e VI, da Constituição Federal (item 2.3.1 do Relatório DLC); irregularidade essa ensejadora de aplicação de multa prevista nos arts. 69 ou 70 da Lei Complementar n. 202/2000.

6.6. Dar ciência desta Decisão, do Relatório e Voto do Relator que a fundamentam, bem como do Relatório de Reinstrução DLC n. 164/2010:

6.6.1. aos Responsáveis nominados no item 3 desta deliberação;

6.6.2. Assessoria Jurídica da Prefeitura Municipal de Florianópolis;

6.6.3. ao responsável pelo Controle Interno do Município de Florianópolis.

Após devidamente citados, os responsáveis apresentaram suas alegações de defesa perante esta Corte de Contas. O Sr. Aloysio Machado Filho encaminhou os documentos que constam das fls. 513 a 750; o Sr. Dário Elias Berger encaminhou os documentos de fls. 754 a 884; e o Sr. Mário Roberto Cavallazzi encaminhou os documentos de fls. 917 a 997. A empresa Palco Sul não atendeu à nova citação, deixando de exercer seu direito à ampla defesa. Registre-se, contudo, que anteriormente à citação referida empresa já havia encaminhado a esta Corte de Contas os documentos de fls. 126 a 331.

Por sua vez, a DLC elaborou o Relatório n. 172/2011, por meio do qual analisou as irregularidades que haviam sido apontadas, a luz dos novos documentos e informações juntados aos autos, tendo se manifestado, ao final, nos seguintes termos:

Considerando que as irregularidades apontadas no Relatório n. DLC 164/2010 permanecem após a sua reanálise.

Considerando que a empresa Palco Sul Ltda. não apresentou justificativas, deixando de exercer seu direito ao contraditório e a ampla defesa.

Diante do exposto, a Diretoria de Controle de Licitações e Contratações sugere ao Exmo. Sr. Relator:

 3.1. Condenar, solidariamente, os Srs. Mario Roberto Cavallazzi, Aloysio Machado Filho e a empresa Palco Sul Ltda,da Prefeitura Municipal de Florianópolisao pagamento do débito abaixo especificado, fixando-lhe o prazo de 30 dias, a contar da publicação do Acórdão no Diário Oficial Eletrônico - DOTC-e, para comprovar perante o Tribunal de Contas o recolhimento do montante aos cofres do (Município/Estado/Entidade), atualizado monetariamente e acrescido de juros legais, calculados a partir da data da ocorrência do fato gerador do débito (arts. 40 e 44 da Lei Complementar n. 202, de 15 de dezembro de 2000, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial (art. 43, II, do mesmo diploma legal).

3.1.1.   R$ 1.979.151,96 (Um milhão, novecentos e setenta e nove mil, cento e cinquenta e um reais, noventa e seis centavos), em face do superfaturamento do Contrato n. 1056/09 e execução do objeto em desacordo com as especificações e prazos fixados no contrato, em afronta aos princípios da economicidade, eficiência e moralidade, e contrariando o disposto no art. 66 da Lei n. 8.666/93 (item 2.2.8.2 do Relatório DLC 164/2010 e item 6.3.1 da Decisão n. 4557/2010);

3.2. Aplicar multas aos Srs. Mario Roberto Cavallazzi e Aloysio Machado Filho, com fundamento no art. 70, II, da Lei Complementar n. 202, de 15 de dezembro de 2000, c/c o art. 109, II do Regimento Interno (Resolução n. TC-06, de 28 de dezembro de 2001), em face das restrições relacionadas, fixando-lhe o prazo de 30 dias, a contar da publicação do Acórdão no Diário Oficial Eletrônico - DOTC-e, para comprovar ao Tribunal de Contas o recolhimento ao Tesouro do Estado das multas cominadas, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts. 43, II, e 71 da citada Lei Complementar:

3.2.1.    Ilegalidade da Inexigibilidade de Licitação n. 519/2009 frente aos arts. 37, XXI, da Constituição Federal e 25, incisos I a III, da Lei n. 8.666/93 (item 2.2.1 do Relatório DLC 164/2010 e item 6.4.1.1 da Decisão n. 4557/2010);

3.2.2.    Descumprimento dos incisos II e III do parágrafo único do art. 26 da Lei n. 8.666/93, aplicáveis ao processo de Inexigibilidade de Licitação n. 519/2009 (item 2.2.2 do Relatório DLC 164/2010 e item 6.4.1.2 da Decisão n. 4557/2010);

3.2.3.    Ausência de elementos que demonstrem a qualificação técnica da empresa contratada para a execução do objeto, em detrimento do art. 30 da Lei n. 8.666/93 (item 2.2.3 do Relatório DLC 164/2010 e item 6.4.1.3 da Decisão n. 4557/2010);

3.2.4.     Ausência de projeto básico do objeto e orçamento detalhado em planilhas que expressem a composição de todos os seus custos unitários, nos termos do art. 7º § 2º, I e II, c/c § 9º, da Lei n. 8.666/93 (item 2.2.4 do Relatório DLC 164/2010 e item 6.4.1.4 da Decisão n. 4557/2010);

3.2.5.     Ausência do regime de execução do objeto, nos termos do art. 40, caput, e 55, II, da Lei n. 8.666/93 (item 2.2.5 do Relatório DLC 164/2010 e item 6.4.1.5 da Decisão n. 4557/2010);

3.2.6.    Realização de contratação por inexigibilidade de licitação com previsão de captação de recursos da iniciativa privada para custear o objeto, em desacordo com o disposto no art. 7°, § 3°, da Lei n. 8.666/93 (item 2.2.6 do Relatório DLC 164/2010 e item 6.4.1.6 da Decisão n. 4557/2010);

3.2.7.   Divergência entre a altura da árvore de natal que foi prevista no contrato (60 metros) e a efetivamente executada (máximo de 46 metros), demonstrando que não foram observadas as especificidades do edital e do Contrato n. 1056/2009, contrariando o art. 66 da Lei n. 8.666/93 e ensejando a aplicação dos arts. 77 e 78 da Lei n. 8.666/93 (item 2.2.7 do Relatório DLC 164/2010 e item 6.4.1.7 da Decisão n. 4557/2010);

3.3. Aplicar multa ao Sr. Dário Elias Berger  , com fundamento no art. 70, II, da Lei Complementar n. 202, de 15 de dezembro de 2000, c/c o art. 109, II do Regimento Interno (Resolução n. TC-06, de 28 de dezembro de 2001), em face do descumprimento de normas legais ou regulamentares abaixo, fixando-lhe o prazo de  30 dias, a contar da publicação do Acórdão no Diário Oficial Eletrônico - DOTC-e, para comprovar ao Tribunal de Contas o recolhimento ao Tesouro do Estado das multas cominadas, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts. 43, II, e 71 da citada Lei Complementar:

3.3.1. Abertura de crédito adicional especial no valor de R$ 13.000.000,00 (treze milhões de reais), em desacordo com os arts. 42 da Lei n. 4.320/64 e 167, V e VI, da Constituição Federal (item 2.3.1 do Relatório DLC 164/2010 e item 6.5.1 da Decisão n. 4557/2010);

3.4. Dar ciência da Decisão, do Relatório Técnico ao Sr. Aloysio Machado Filho, ao Sr. Dário Elias Berger, ao Sr. Mario Roberto Cavallazzi, a empresa Palco Sul Eventos Ltda., à Prefeitura Municipal de Florianópolis, à Câmara de Vereadores de Florianópolis e ao Ministério Público Estadual.

Já o Ministério Público de Contas exarou o Parecer n. 2624/2011, no qual destacou o fato de não ter acatado a sugestão de imputação de débito no valor de R$ 1.979.151,96 (Um milhão, novecentos e setenta e nove mil, cento e cinquenta e um reais, noventa e seis centavos) aos responsáveis, considerando, em suma, que não houve o pagamento integral do preço avençado e que não há como se afirmar que as irregularidades constatadas se traduziram em prejuízo ao erário municipal. Contudo, o Sr. Procurador se manifesta pela anulação da Inexigibilidade de Licitação n. 519/2009 e do Contrato n. 1056/2009, em virtude das irregularidades neles verificadas.

Ao analisar novamente os autos, esta Relatora constatou a necessidade de se apurar, de forma mais exata, a responsabilidade pelo pagamento à empresa Palco Sul Eventos Ltda., em decorrência do Contrato n. 1056/2009, que foi realizado anteriormente à determinação oriunda desta Corte e do Poder Judiciário catarinense no sentido de que não fossem mais realizados quaisquer dispêndios.

Destaquei que a responsabilidade por eventual dano ao erário a ser apurado por esta Corte de Contas poderá advir não só das ações provenientes daqueles que elaboraram a inexigibilidade de licitação e firmaram o contrato, mas também daqueles que determinaram os pagamentos, de forma antecipada, de contrato com indícios de superfaturamento e que foi executado em desacordo com as especificações e prazos fixados no contrato, em afronta aos princípios da economicidade, eficiência e moralidade, e contrariando o disposto no art. 66 da Lei 8.666/93.

Nesse sentido e considerando a ausência de manifestação da empresa Palco Sul Eventos Ltda., que também havia sido citada, e no intuito de promover a regular instrução dos presentes autos, determinei, mediante despacho exarado em 05/09/2011, que fosse realizada nova citação à empresa Palco Sul Eventos Ltda., em atendimento à Decisão n. 4557/2010, e que fosse promovida diligência à Prefeitura Municipal de Florianópolis, para que fossem encaminhadas cópias “[...] dos documentos relativos ao pagamento realizado à empresa Palco Sul Eventos Ltda. em razão do contrato decorrente da Inexigibilidade de Licitação n. 519/2009, em especial: comprovante da liquidação da despesa (nota fiscal), termo de recebimento, autorização de pagamento e ordem bancária”.

Os documentos solicitados foram encaminhados pela Prefeitura Municipal por meio do Ofício n. 006/SMFP/AT/2011 (fls. 1080 a 1083) e pela empresa Palco Sul Eventos Ltda. por meio do expediente de fls. 1085 a 1160.

Em 14/02/2012, considerando a possibilidade da definição de responsabilidade solidária e da citação dos Srs. Dário Elias Berger, Prefeito Municipal de Florianópolis, e Augusto Cézar Hinkel, Secretário Municipal de Finanças e Planejamento, em face de indícios de superfaturamento do Contrato n. 1056/09 e execução do objeto em desacordo com as especificações e prazos fixados no contrato, em afronta aos princípios da economicidade, eficiência e moralidade e contrariando o disposto no art. 66 da Lei 8.666/93, foi apresentado pelos Srs. Dário Elias Berger e Augusto Cézar Hinkel o expediente de fls. 1172 a 1180, que contém suas alegações.

Por ordem desta Relatora, os autos retornaram à DLC para análise.

Em seu novo Relatório (n. 702/2014 - fls. 1190 a 1199), a DLC manifestou-se pela irregularidade das contas apresentadas, sem imputação de débito, com aplicação de multa aos gestores em face das irregularidades identificadas, considerando, em suma, que não há certeza da caracterização do débito e que os documentos constantes dos autos indicam que ao menos parte dos serviços contratados foi realizada, fazendo jus a empresa ao recebimento dos valores correspondentes às despesas realizadas.

O MPTC (Parecer n. 29.700/2014 - fl. 1200) reiterou sua manifestação anterior nos autos, consistentes no Parecer n. 2.624/2011 (fls. 1040 a 1074).

Posteriormente, em 08/04/2015, submeti nova Proposta de Voto no sentido de incluir os Srs. Dário Elias Berger, ex-Prefeito Municipal de Florianópolis, e Augusto Cézar Hinckel, ex-Secretário Municipal de Finanças e Planejamento de Florianópolis, entre os responsáveis solidários definidos no item 6.3 da Decisão n. 4557/2010, e determinar à Secretaria Geral deste Tribunal que promovesse a citação dos responsáveis para apresentarem alegações de defesa acerca da seguinte irregularidade, ensejadora de imputação de débito e/ou aplicação de multa prevista nos artigos 68 a 70 da LC n. 202/00:

Ilegalidade da Inexigibilidade de Licitação n. 519/2009, frente aos arts. 37, XXI, da Constituição Federal e 25, incisos I a III, da Lei n. 8.666/93, e indícios de superfaturamento do Contrato n. 1056/09 e execução do objeto em desacordo com as especificações e prazos fixados no contrato, em afronta aos princípios da economicidade, eficiência e moralidade e contrariando o disposto no art. 66 da Lei 8.666/93.

A proposta apresentada por esta Relatora foi acolhida pelo Egrégio Plenário e resultou na Decisão n. 320/2015.

Após a publicação e as comunicações de praxe, foram encaminhados documentos e justificativas pelo Sr. Dário Elias Berger (fls. 1213 a 1221) e pelo Sr. Augusto César Hinckel (fls. 1223 a 1227).

A DLC reanalisou novamente os autos e elaborou o Relatório n. 363/2015 (fls. 1230 a 1240), no qual se manifestou por acatar as manifestações do Sr. Dário Elias Berger e do Sr. Augusto César Hinckel com relação à irregularidade ensejadora de imputação de débito. A Diretoria Técnica manifestou-se também por rejeitar as alegações do Sr. Dário Elias Berger em relação à abertura do crédito adicional de R$ 13 milhões, considerada em desacordo com o artigo 42 da Lei n. 4.320/64 e com o artigo 167, V e VI, da Constituição Federal e por ratificar o Relatório n. 702/2014 (fls. 1190 a 1199).

O Ministério Público de Contas (Parecer n. 35878/2015 - fls. 1242 a 1245) reiterou o seu Parecer n. 2624/2011 (fls. 1040 a 1074), especialmente no tocante à ausência de dano ao erário.

Posteriormente, o Sr. Augusto Cézar Hinckel encaminhou os documentos de fls. 1269 a 1249, por meio dos quais referiu-se ao Acórdão n. 0789/2016, exarado no processo n. REC 15/00547341, relativo ao processo n. TCE 09/00654848, que tratou da contratação do maestro Andrea Bocelli, realizada na mesma época da contratação sob exame. O Responsável assevera que naquele processo sua responsabilidade foi excluída quando analisado o recurso de Embargos de Declaração e requer que os mesmos critérios sejam novamente aplicados no presente processo, tendo em vista a semelhança do contexto e dos atos por ele praticados.

Ainda que se reconheça a independência das instâncias, destaco que tramitam no Poder Judiciário três ações nas quais se discute a legalidade da contratação, a responsabilização dos ex-gestores e da empresa Palco Sul, e ainda os efeitos decorrentes de eventual declaração de nulidade da inexigibilidade de licitação e do contrato. Tratam-se da Ação Popular n. 023.09.079179-0, da Ação Civil de Improbidade Administrativa n. 023.10.001594-0 e da Ação de Cobrança n. 023.10.045527-4, que se encontram conexas e em relação as quais foi realizada audiência de testemunhas dos autores no dia 18/07/2017. Está prevista para o dia 22/08/2017 a audiência das testemunhas dos réus.

A decisão a ser exarada por esta Corte de Contas, que é a instância especializada na análise da regularidade dos atos administrativos, poderá ser considerada pelo Poder Judiciário, o qual analisa inclusive a pretensão da empresa Palco Sul de obter ressarcimento.

É o relatório.

II - Fundamentação

 

Vindo os autos novamente à apreciação desta Relatora, passo inicialmente à análise das irregularidades que foram objeto das citações decorrentes da Decisão n. 4557/2010 e da Decisão n. 0320/2015.

II.1. Irregularidade passível de imputação de débito:

Ilegalidade da Inexigibilidade de Licitação n. 519/2009, frente ao artigo 37, XXI, da Constituição Federal e ao artigo 25, I a III, da Lei n. 8.666/93, e indícios de superfaturamento do Contrato n. 1056/09 e execução do objeto em desacordo com as especificações e prazos fixados no contrato, em afronta aos princípios da economicidade, eficiência e moralidade e contrariando o disposto no art. 66 da Lei 8.666/93 (item 2.2.8.2 do Relatório DLC)

Por meio das Decisões n. 4557/2010 e 320/2015 foi definida a responsabilidade solidária por esta irregularidade, que sujeita à imputação de débito, dos Srs. Mário Roberto Cavallazzi, ex-Secretário Municipal de Turismo, Cultura e Esporte de Florianópolis, Aloysio Machado Filho, ex-Secretário Adjunto de Turismo, Cultura e Esporte de Florianópolis, da empresa Palco Sul Eventos Ltda., do Sr. Dário Elias Berger, ex-Prefeito Municipal de Florianópolis, e do Sr. Augusto Cézar Hinckel, ex-Secretário Municipal de Finanças e Planejamento de Florianópolis.

II.1.1. Análise da DLC - Relatório n. 300/2009

O apontamento inicial foi feito por meio do Relatório DLC n. 300/2009 (fls. 65 e seguintes), tendo sido destacado pela Diretoria que foram adotados como fundamento para a realização da inexigibilidade de licitação os incisos I e III do artigo 25 da Lei n. 8.666/93, que tratam da contratação de fornecedor exclusivo e de profissional do setor artístico, respectivamente. Foi destacado ainda pela DLC que o parecer jurídico emitido pela assessoria da Secretaria Municipal de Turismo, Cultura e Esportes (fls. 37 a 39) indicava como fundamentação legal da contratação o inciso II do artigo 25, que diz respeito aos serviços técnicos enumerados no artigo 13 do citado diploma legal.

Segundo a DLC, a adoção do inciso I do artigo 25 da Lei n. 8.666/93 demonstrava-se inadequada, pois referido inciso trata de fornecimento de bens e produtos, e não da prestação de serviços, a qual é objeto da Inexigibilidade de Licitação n. 519/2009.

Além disso, a Diretoria Técnica destacou que o atestado de exclusividade acostado aos autos (fls. 53/54) deveria ter sido emitido por órgão ou autoridade competente, e não por empresa privada (Feeling Eventos, que posteriormente veio a ser subcontratada pela Palco Sul), destacando ainda que o documento refere-se somente à estrutura de alumínio que sustenta a árvore, enquanto que o objeto do Contrato n. 1056/2009 é bem mais abrangente.

Foi apontada ainda pela DLC a ausência de caracterização de serviços técnicos regulares, prestados por profissionais ou empresa de notória especialização nos termos do inciso II do artigo 25 da Lei n. 8.666/93, pois não existe nos autos qualquer comprovação de que a empresa contratada execute serviços singulares ou que detenha notória especialização na área do objeto contratado, o que se comprova diante da subcontratação quase integral deste.

Por fim, a DLC apontou a ausência de caracterização de contratação de profissional do setor artístico, nos termos do inciso III do artigo 25 da Lei n. 8.666/93, destacando que a empresa Palco Sul pertence ao ramo de promoção de eventos, prestando serviços que costumeiramente são licitados.

II.1.2. Defesas apresentadas:

Por meio das justificativas apresentadas, o Sr. Mário Roberto Cavallazzi (fls. 917 a 946) buscou descrever o processo de contratação da montagem da árvore de natal. Destacou que todos os elementos (projeto, preços e inclusive a apresentação do Maestro Andrea Bocelli, que fazia parte do projeto de comemoração do Natal elaborado pela prefeitura no exercício de 2009) estavam sendo propostos pela empresa Beyondcomm e foram levados ao conhecimento do ex-Prefeito Sr. Dário Elias Berger, que buscou recursos junto ao Governo do Estado para viabilizar a execução.

O ex-Secretário Municipal informou também que a empresa Beyondcomm, titular dos direitos autorais da árvore, ao ser cientificada de que não poderia receber todos os valores pretendidos no exercício de 2009, realizou uma cessão onerosa de tais direitos à empresa Palco Sul, que posteriormente veio a ser contratada pelo município.

O responsável alegou ainda que o processo de contratação se deu por meio de inexigibilidade de licitação amparada no artigo 25 da Lei n. 8.666/93 sob a justificativa, constante do parecer jurídico, de que a proponente apresentaria "[...] experiência singular no desenvolvimento e consecução de eventos, sendo a única no Brasil a criar e gerenciar o projeto proposto.".

O Sr. Mário Roberto Cavallazzi defende que nenhuma responsabilidade deve lhe ser imputada, ou ao seu então Secretário Adjunto, sob o argumento de que agiu “[...] no estrito cumprimento de suas atribuições e observadas as normas legais pertinentes, atuando, de resto, sob autorização e vontade de autoridades superiores no Município e no Estado.” (fl. 927).

A defesa do Sr. Aloysio Machado Filho (fls. 513 a 526) se centrou no fato de que este teria assinado o Contrato n. 1056/2009 somente para representar o titular da pasta de Turismo, Esporte e Cultura, limitando-se a aquiescer parecer técnico jurídico a ele apresentado, com aparência, até então, de legalidade e constitucionalidade.

Foi destacado ainda pelo Sr. Aloysio Machado Filho que houve a prévia intervenção de outras autoridades (Sr. Mário Cavallazzi, ex-Secretário de Turismo, que assinou o termo de inexigibilidade de licitação, além de parecer emitido pela SETUR e do deferimento do Grupo Gestor), razão pela qual a contratação lhe pareceu inteiramente regular, lícita e constitucional.

Dentre as alegações apresentadas pela empresa Palco Sul (fls. 126 a 331 e 1085 a 1160), destaco que esta afirma ter agido com transparência e boa-fé; ter arcado com custos da montagem e da manutenção da árvore durante o período em que esteve instalada; que a subcontratação era possível, nos moldes do artigo 72 da Lei n. 8.666/93; já estar discutindo judicialmente a questão de possível indenização a ser paga pelo Poder Público Municipal. Suscita a empresa, preliminarmente, sua ilegitimidade passiva e a inexistência de responsabilidade solidária e a inaplicabilidade da sanção prevista no inciso II do artigo 70 da LC n. 202/00, tendo em vista que não realizou nenhum ato capaz de gerar dano ao erário público.

Destaca ainda a empresa Palco Sul Eventos que não contribuiu para a realização da inexigibilidade de licitação e que esta teria guarida no inciso II do artigo 25 da Lei n. 8.666/93, que trata da contratação de serviços técnicos enumerados no artigo 13, de natureza singular, com profissionais de notória especialização, eis que seria a detentora do projeto da árvore de natal montada em Florianópolis.

A empresa alegou ainda que não houve prejuízo ao erário; que as subcontratações realizadas revestiram-se de legalidade e que a montagem e manutenção da árvore de natal em dezembro de 2009 geraram custos que devem ser indenizados pela Prefeitura Municipal em caso de declaração da nulidade do contrato.

Por oportuno, cito alguns trechos da resposta apresentada pela empresa Palco Sul:

[...] a empresa Palco Sul não foi a mentora do processo de inexigibilidade de licitação, ou emitiu qualquer parecer ou opinião, ou ainda foi em busca da Prefeitura Municipal de Florianópolis pedindo para ser contratada. (fl. 435)

A empresa Palco Sul não concorreu com qualquer ato que pudesse sugerir sua com conduta de má-fé em possível nulidade de contrato. (fl. 436)

Para a conclusão do projeto de instalação e funcionamento da obra, a Empresa Palco Sul contou com participações, e não com subcontratadas.

Essas empresas, com o condão de auxiliar a montagem e desenvolvimento da ‘Árvore de Natal’, realizaram atividades condizentes as que foram solicitadas, executando os serviços secundários para o desenvolvimento da obra. Frise-se: as mesmas não possuem qualquer participação no projeto e não são as detentoras dessa realização. (fl. 437)

Destaco, da defesa apresentada pelo Sr. Dário Elias Berger (fls. 1172 a 1180 e 1213 a 1218), a alegação de que os então Secretários Municipais possuíam competência originária para ordenar as despesas públicas, conforme disposto no artigo 20, III e IV, da Lei Complementar Municipal n. 348/09, e que o Secretário de Turismo foi quem decidiu acerca da realização de inexigibilidade de licitação, ratificando os seus termos, assinando o contrato (no qual constava a forma de pagamento), ordenando a despesa, assinando a nota de empenho e liquidando a despesa.

Nesse contexto, o Sr. Dário Elias Berger busca afastar a sua responsabilidade sobre o processo em questão, alegando que não teve nenhuma influência sobre a despesa efetuada e trazendo aos autos jurisprudência do TCU de acordo com a qual a delegação de competência afastaria a sua responsabilidade.

Com relação aos atos praticados pelo Sr. Dário Elias Berger, este alega que limitaram-se "[...] quase que exclusivamente à abertura da conta corrente, necessária ao recebimento do aporte financeiro do Estado, bem como a autorização para pagamento de títulos devidamente liquidados pelos gestores do contrato." (grifos no original).

O ex-Prefeito alegou ainda que a figura do Ordenador de Despesas se refere àquele que praticou atos que originem uma despesa e dos quais resultem a emissão da nota de empenho, a autorização de pagamento e o suprimento ou o dispêndio de recursos. Afirma também que efetuou o pagamento por força do cargo que ocupava, viabilizando o pagamento de uma despesa já liquidada.

Ainda de acordo com o Sr. Dário Elias Berger, a árvore de natal foi criada, executada, montada e desmontada pela empresa contratada, o que justifica o pagamento efetuado e impossibilita a determinação de devolução dos recursos pela empresa, sob pena de enriquecimento ilícito da Administração.

O ex-prefeito afirma ainda que os agentes públicos envolvidos na contratação estavam convencidos da natureza singular do objeto contratado, tendo optado pela realização de inexigibilidade de licitação com fulcro no artigo 25 da Lei n. 8.666/93, não havendo indício de que esta escolha tenha ocorrido por dolo ou má fé.

Quanto à abertura de crédito adicional, o Sr. Dário Elias Berger afirma que se deu com base na competência estabelecida pelo artigo 165, §8º, da Constituição Federal, pelo artigo 7º, I, da Lei n. 4.320/64 e pelos artigos 28, 32, 36 e 37 da Lei Municipal n. 7.791/2008. Assevera também que foi orientado pelo setor de contabilidade da prefeitura e que o ato visou dar cobertura aos eventos e festividades comandados pela pasta do turismo que ocorria no final do ano.

Em suas alegações de defesa, o Sr. Augusto César Hinckel (fls. 1172 a 1180 e 1223 a 1227) repisa a maioria das argumentações apresentadas pelo Sr. Dário Elias Berger e acrescenta que a responsabilidade pela conferência da materialidade do objeto gerador da despesa era do secretário municipal que atuou como ordenador primário; e ainda que a ordem bancária tinha suporte no contrato firmado e em documento contábil devidamente aceite por agente público que tinha competência para tal.

O Sr. Augusto Cézar Hinckel também se referiu ao Acórdão n. 0789/2016, exarado no processo n. REC 15/00547341, relativo ao processo n. TCE 09/00654848, que tratou da contratação do maestro Andrea Bocelli, realizada na mesma época da contratação sob exame (fls. 1269 a 1249). Asseverou que sua responsabilidade foi excluída naquele processo, no qual foi analisado o recurso de Embargos de Declaração, e requereu que os mesmos critérios sejam novamente aplicados no presente processo, tendo em vista a semelhança do contexto e dos atos por ele praticados.

II.1.3. Análise da DLC - Relatórios n. 172/2011, 702/2014 e 363/2015:

Por meio do Relatório n. 172/2011 (fls. 1000 a 1026), a DLC analisou as justificativas apresentadas pelos Srs. Mário Roberto Cavallazzi e Aloysio Machado Filho:

Em síntese, os Srs. Mário Roberto Cavallazzi e Aloysio Machado Filho dizem que não são responsáveis solidários, porquanto somente seguiram ordens de autoridades superiores e/ou apenas assinaram o Contrato n. 1056/2009.

Primeiramente, impende observar que de acordo com os documentos acostados aos autos (fls. 06 a 10, 11 22, 23, 24 e 63), constata-se que as autoridades responsáveis pela contratação foram os Secretários Municipal (ordenador da despesa) e Adjunto (autoridade contratante), Srs. Mário Roberto Cavallazzi e Aloysio Machado Filho.

Assim, cumpre ao ordenador da despesa e a autoridade contratante responderem por vícios e irregularidades constantes no procedimento de inexigibilidade em questão. O ato de celebrar um contrato administrativo envolve o exame da legalidade e da regularidade da despesa pública, bem como dos atos integrantes do procedimento e da conveniência da contratação. E nesse sentido, os gestores públicos imbuídos na função de gerir recursos públicos devem deter conhecimentos e informações à altura das atribuições que lhes foram confiadas, motivo pelo qual devem ser responsabilizados pela prática desses atos.

No caso concreto, não cabe se eximir da responsabilidade tentando transferir o ônus aos seus superiores ou subordinados, haja vista que a responsabilidade decorre também da culpa in eligendo ou da culpa in vigilando. Dessarte, segundo os documentos acostados aos autos, verifica-se que as autoridades responsáveis são os Secretários Municipal (ordenador da despesa) e Adjunto (autoridade contratante).

Quanto às alegações apresentadas pelo Sr. Mário Roberto Cavallazzi, a DLC verificou que não há prova documental demonstrando que a empresa Palco Sul é a única no ramo com capacidade para criar e gerenciar o projeto proposto, tendo destacado que existem no mercado outras empresas capazes de oferecer produto similar.

Em relação às alegações oferecidas pelo Sr. Aloysio Machado, a DLC ressaltou que a celebração de um contrato administrativo envolve o exame da legalidade e da regularidade da despesa pública, bem como dos atos integrantes do procedimento e da conveniência da contratação, razão pela qual propôs a condenação solidária dos Responsáveis em face do débito apurado.

Por fim, a DLC conclui que existem no mercado brasileiro inúmeras empresas capazes de executar o objeto do Contrato n. 1056/2009 e que os serviços contratados possuem caráter meramente técnico, considerando inadequada a aplicação do artigo 25 da Lei n. 8.666/93 ao presente caso.

Em seu Relatório n. 702/2014 (fls. 1190 a 1199), a DLC conclui que a contratação, antieconômica, traria prejuízos ao erário, mas que em face da sustação dos pagamentos não seria possível a imputação de débito, tendo em vista que ao menos parte dos serviços contratados foi realizada.

A Diretoria Técnica também se manifesta pela determinação de anulação da Inexigibilidade de Licitação n. 519/2009 e do Contrato n. 1.056/2009.

Já por meio do Relatório n. 363/2015 (fls. 1230 a 1240), a DLC analisou as justificativas encaminhadas pelo Sr. Dário Elias Berger e pelo Sr. Augusto César Hinckel e concluiu que em face da existência de lei municipal anterior que atribuiu formalmente a responsabilidade pela contratação, ordenação e fiscalização da despesa ao então Secretário Municipal do Turismo e que essas atribuições foram de fato executadas pelo Sr. Mário Roberto Cavallazzi, a responsabilização do ex-Prefeito e do ex-Secretário Municipal de Finanças não deve prosseguir. 

II.1.4. Pareceres do Ministério Público de Contas - n. 2624/2011 e 25878/2015:

Em seu Parecer n. 2624/2011 (fls. 1040 a 1074), ratificado pelo Parecer n. 25878/2015 (fls. 1242 a 1245), o MPTC destacou que a responsabilidade solidária, definida no item 6.3 da Decisão n. 4557/2010, decorre de previsão legal contida no artigo 18, §2º, “a e “b, da LC n. 202/00, que assim prescrevem:

Lei Complementar n. 202/00

Art. 18. As contas serão julgadas:

[...]

III - irregulares, quando comprovada qualquer das seguintes ocorrências:

[...]

c) dano ao erário decorrente de ato de gestão ilegítimo ou antieconômico injustificado; e

d) desfalque, desvio de dinheiro, bens ou valores públicos.

[...]

§ 2º Nas hipóteses do inciso III, alíneas c e d, deste artigo, o Tribunal, ao julgar irregulares as contas, fixará a responsabilidade solidária:

a) do agente público que praticou o ato irregular e

b) do terceiro que, como contratante ou parte interessada na prática do mesmo ato, de qualquer modo, haja concorrido para a ocorrência do dano apurado.

Foi destacado ainda pelo representante do Ministério Público de Contas que:

No caso, o ato de gestão viciado foi a Inexigibilidade de Licitação n. 519/2009, perpetrado no âmbito da Secretaria Municipal de Turismo, cujo titular e ordenador da despesa foi o Sr. Mário Cavallazzi (fls. 55/63).

O Sr. Aloysio Machado concorreu para que a irregularidade se consumasse, na medida em que firmou o Contrato de Prestação de Serviço n. 1056/2009 (fls. 6/10), consagrando o procedimento licitatório viciado.

Indícios de que o serviço contratado seria ruinoso ao Erário municipal, por ter sido superfaturado e executado em desacordo com o avençado, foram levantados pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina (fls. 362-v/365-v) e por auditores do Tribunal (fl. 450).

Dessa forma, restam preenchidos os requisitos legais para responsabilização dos citados agentes públicos.

Ainda de acordo com o Procurador do MPTC, a sustação dos pagamentos determinada por esta Relatora surtiu os efeitos desejados, prevenindo, à época, futuras lesões ao erário municipal. Nesse sentido, considerando o não pagamento integral do preço avençado, pois foi paga somente a primeira parcela, no valor de R$ 540.000,00 (Quinhentos e quarenta mil reais), e que ainda que haja possibilidade de superfaturamento ou que a execução do contrato tenha ocorrido em desacordo com as especificações e prazos fixados, o MPTC considerou que não há como se afirmar que houve dano ao erário e, mesmo que se considere a existência de dano, não há como quantificá-lo.

O Procurador Aderson Flores alertou que a ausência de consumação de lesão aos cofres públicos não elide os defeitos verificados na Inexigibilidade de Licitação n. 519/2009, ensejando a aplicação do artigo 49 da Lei n. 8.666/93, segundo o qual, em caso de ilegalidade, a Inexigibilidade n. 519/2009 e o Contrato n. 1056/2009, dela decorrente, deveriam ser anulados.

O representante do MPTC concluiu ainda que a empresa Palco Sul concorreu para a consecução da ilegalidade na medida em que afirmou ter desenvolvido e ser detentora do projeto, além de ter apresentado Declaração de Exclusividade para a montagem e locação da árvore de natal.

Destaco do Parecer do Ministério Público de Contas:

Das justificativas apresentadas pela empresa Palcosul Eventos Ltda, destaco os seguintes trechos (fls. 126/169):

Como já dito, a Empresa detém a exclusividade do projeto da Árvore de Natal. Toda a estrutura, cenografia, criação, produção visual, pertence à empresa Palcosul. Essa é uma árvore exclusiva, projeto único em todo o Brasil, logo, somente a mesma poderia promovê-lo.

[...]

Além disso, a árvore (objeto do contrato) deve ser entendida como um todo, e são várias partes que a compõe, e estas poderiam ser realizadas tão somente pela Empresa Palcosul, a qual é detentora do projeto que ela mesma desenvolveu. (Os grifos constam do original)

Lógico inferir que as mesmas argumentações foram apresentadas ao Município para situá-lo da pretensa exclusividade que envolvia os serviços a serem contratados.

Dos autos consta a Declaração de Exclusividade de fls. 53/54, apresentada ao Município pela empresa Palcosul, firmada por Feeling Eventos Ltda, atestando que ela (Palcosul) possuía “a exclusividade para a contratação da declarante para a montagem e locação do Sistema Estrutural [...] que compõem (sic) a Árvore de Natal de Florianópolis, Santa Catarina, no ano de 2009”.

Todos esses detalhes comprovam que as ações encetadas pela empresa Palcosul concorreram para consumação da irregularidade aqui tratada.

Esse fato deve ser considerado para eventuais desdobramentos que o caso possa ter.

No âmbito do Tribunal de Justiça, quanto à possibilidade de nulidade do Contrato aqui tratado, em despacho proferido nos autos dos Agravos de Instrumento nºs 2009.075728-5 e 2009.075729-2, que abarcou a matéria aqui ventilada, foi consignado:[1][8]

[...]

Há sérios indícios de que a inexigibilidade da licitação ocorreu de forma indevida.

[...]

Já se vê, então, que a possibilidade de ser anulado o contrato é considerável.

A anulação do procedimento licitatório, e consequentemente do contrato que dele decorreu, justifica-se não só pelo aspecto da legalidade, mas também por se tratar de ato antieconômico.[2][9]

Diante do exposto, propugno possam os conselheiros do Egrégio Tribunal Pleno determinar a anulação da Inexigibilidade de Licitação nº 519/2009, e do Contrato nº 1056/2009, celebrado entre o Município de Florianópolis e a empresa Palcosul Eventos Ltda.

Faço-o com supedâneo nos arts. 2º, 3º e 49, caput e §§ 2º e 4º, da Lei nº 8.666/93, no art. 59, IX, da Constituição Estadual, no art. 29, § 3º, da Lei Complementar nº 202/2000, e nos arts. 32 e 33 da Resolução nº TC-6/2001.

Nessa direção a jurisprudência do Tribunal de Contas da União:[3][10]

Ementa: Auditoria. CPRM. Área de licitação, contratos e controle interno. Contratação de pessoal com dispensa de licitação sem estar comprovada a inviabilidade de competição ou a singularidade do objeto. Não comprovação da existência jurídica dos participantes do processo licitatório e da regularidade fiscal dos vencedores do certame. Ausência de controle de gastos com combustíveis. Ausência de critérios objetivos para classificação de propostas. Manutenção de contrato antieconômico. Fixação de prazo para adoção de providências. Multa. Determinação. Recomendação. Juntada às contas.

[...]

8.1 - com base no artigo 71, inciso IX, da Constituição Federal, c/c o artigo 45 da Lei nº 8.443/92 e o artigo 195 do Regimento Interno deste Tribunal, assinar o prazo de 15 (quinze) dias para que os responsáveis, se assim já não fizeram, adotem as providências necessárias ao exato cumprimento do disposto nos artigos 2º, 3º, 49, caput, e §§ 2º e 4º, e 59, da Lei nº 8.666/93, promovendo a anulação do procedimento de inexigibilidade de licitação realizado para a contratação do Consultor Hugo Augusto Spinelli, em desacordo com o artigo 37, inciso II, da Carta Magna, e com o artigo 25, inciso II, da Lei de Licitações, com a consequente anulação do respectivo contrato.

A tese conta com amparo na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal:[4][11]

I.                  Tribunal de Contas: competência: contratos administrativos (CF, art. 71, IX e §§ 1º e 2º).

O Tribunal de Contas da União – embora não tenha poder para anular ou sustar contratos administrativos – tem competência, conforme o art. 71, IX, para determinar à autoridade administrativa que promova a anulação do contrato e, se for o caso, da licitação de que se originou.

Tendo em vista as peculiaridades do caso, é possível que, em virtude da anulação, tenha que ser aplicada pela Administração a regra do art. 59, parágrafo único, da Lei de Licitações.[5][12]

Isso porque, pelo que consta dos autos, parte dos serviços contratados foi executada.

Como constam dos autos indícios de prática de sobrepreço, prudente que a determinação formulada pelo Tribunal de Contas contemple alerta à autoridade encarregada da anulação e da apuração de eventuais valores a indenizar, que proceda à rigorosa pesquisa de preços de mercado, vigente à época dos fatos, e promova os ajustes necessários em relação aos dados constantes do contrato, sob pena de responsabilização em caso de eventual prejuízo ao erário.

O Procurador manifestou-se também pela determinação da anulação da Inexigibilidade de Licitação n. 519/2009 e do Contrato n. 1056/2009, com fundamento nos artigos 2º, 3º e 49, caput e §§ 2º e 4º, da Lei n. 8.666/93, no artigo 59, IX, da Constituição Estadual, no artigo 29, §3º, da LC n. 202/00 e nos artigos 32 e 33 da Resolução n. TC-06/2001 (RITC).

Por fim, o Procurador alertou que tendo sido executada parte dos serviços contratados, pode ser aplicada a regra do parágrafo único do artigo 59 da Lei n. 8.666/93, que trata de eventual indenização ao contratado pelo que tiver sido executado até a data da declaração da nulidade.

II.1.5.  Análise da Relatora:

Analisando novamente os autos, constato que, efetivamente, a determinação contida no Despacho GASNI n. 54/2009, exarada em 10/12/2009, para que a Prefeitura Municipal de Florianópolis deixasse de pagar as parcelas pendentes do Contrato n. 1056/2009, até manifestação ulterior deste Tribunal de Contas, surtiu os efeitos desejados, pois evitou-se que uma parcela maior de recursos fosse despendida.

Com efeito, a determinação mostrou-se eficiente na proteção ao erário municipal, sobretudo por sua tempestividade, contribuindo com a eficácia do controle realizado por este Tribunal de Contas.

Contudo, cabe ponderar se a despesa de R$ 540.000,00 (Quinhentos e quarenta mil reais), realizada com fundamento na Inexigibilidade de Licitação n. 519/2009 e no Contrato n. 1056/2009, caracteriza ou não dano ao erário municipal, considerando-se que parte dos serviços contratados foi realizada.

Verifico que as últimas manifestações da Diretoria Técnica e do MPTC convergem para a manutenção do apontamento das irregularidades verificadas na Inexigibilidade de Licitação n. 519/2009 e no Contrato n. 1056/2009, além da declaração de nulidade desses atos e do julgamento pela irregularidade, sem imputação de débito, das contas analisadas.

Deve ser analisada, portanto, a possível nulidade da Inexigibilidade de Licitação n. 519/2010 e do Contrato n. 1056/2010, em decorrência da inaplicabilidade do artigo 25 da Lei n. 8.666/93 ao caso e, consequentemente, da burla à necessária licitação. Além disso, deve-se verificar as consequências dessa possível nulidade, considerando-se que parte dos serviços contratados foi executada, pois a árvore de natal chegou a ser montada, e a concorrência dos agentes públicos e da empresa contratada para a irregularidade da contratação.

II.1.5.1. Inexigibilidade de Licitação n. 519/2008 e do Contrato n. 1056/2009 - Ilegalidade e Nulidade

Com relação à proposta de declaração de nulidade da inexigibilidade de licitação e do contrato sob exame, constato que se sustenta essencialmente na sua ilegalidade frente aos artigos 37, XXI, da Constituição Federal e ao artigo 25 da Lei n. 8.666/93, além da existência de indícios de superfaturamento e da execução do objeto em desacordo com as especificações e prazos fixados no contrato.

Nos termos do inciso XXI do artigo 37 da Constituição Federal, a Administração Pública somente está autorizada a contratar sem licitação nos casos especificados na legislação. Nesse contexto, uma das hipóteses legalmente previstas é a contratação mediante inexigibilidade de licitação quando for caracterizada a inviabilidade de competição, nos termos do artigo 25 da Lei n. 8.666/93, que assim dispõe:

Art. 25.  É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial:

I - para aquisição de materiais, equipamentos, ou gêneros que só possam ser fornecidos por produtor, empresa ou representante comercial exclusivo, vedada a preferência de marca, devendo a comprovação de exclusividade ser feita através de atestado fornecido pelo órgão de registro do comércio do local em que se realizaria a licitação ou a obra ou o serviço, pelo Sindicato, Federação ou Confederação Patronal, ou, ainda, pelas entidades equivalentes;

II - para a contratação de serviços técnicos enumerados no art. 13 desta Lei, de natureza singular, com profissionais ou empresas de notória especialização, vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e divulgação;

III - para contratação de profissional de qualquer setor artístico, diretamente ou através de empresário exclusivo, desde que consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública.

§ 1o  Considera-se de notória especialização o profissional ou empresa cujo conceito no campo de sua especialidade, decorrente de desempenho anterior, estudos, experiências, publicações, organização, aparelhamento, equipe técnica, ou de outros requisitos relacionados com suas atividades, permita inferir que o seu trabalho é essencial e indiscutivelmente o mais adequado à plena satisfação do objeto do contrato.

§ 2o  Na hipótese deste artigo e em qualquer dos casos de dispensa, se comprovado superfaturamento, respondem solidariamente pelo dano causado à Fazenda Pública o fornecedor ou o prestador de serviços e o agente público responsável, sem prejuízo de outras sanções legais cabíveis.

No caso em tela, vale lembrar que foi contratada a "criação e execução de árvore de natal em led com interatividade", objeto que aliou o fornecimento da estrutura e a prestação dos serviços de criação e operacionalização relacionados com a tecnologia envolvida na interatividade.

Nesse contexto, a análise da negociação e dos termos em que a Inexigibilidade de Licitação n. 519/2009 foi editada e, consequentemente, do Contrato n. 1056/2009, é essencial para que se possa avaliar a sua legalidade.

O chamado projeto do “Natal dos Sonhos”, lançado pela Prefeitura Municipal em 2009, previa a instalação de uma árvore de natal interativa, cujo projeto pertencia à empresa Beyondcomm. O início da contratação foi assim descrito pelo Sr. Mário Roberto Cavallazzi (fl. 919):

A empresa Beyondcomm, integrando o mesmo grupo econômico da Beyondpar, que tem os mesmos sócios daquela, apresentou-se à PMF com o idealizadora de uma árvore de Natal semelhante, montada em Belo Horizonte, no ano de 2008, e também como sendo detentora exclusiva de uma tecnologia inédita capaz de possibilitar a interatividade da população com a grandiosa árvore de natal proposta para Florianópolis. (grifei)

Conforme explicitou o ex-Secretário Municipal de Turismo, após ter sido definida a contratação da empresa Beyondcomm para a realização do show do maestro Andrea Bocelli, esta teria transferido (onerosamente) à empresa Palco Sul o know-how da montagem da árvore, tendo em vista que a Prefeitura Municipal não poderia garantir que todo o pagamento fosse realizado no exercício de 2009.

Nesse contexto foi editado o Termo de Inexigibilidade de Licitação n. 519/2009, o qual foi fundamentado no caput do artigo 25 da Lei n. 8.666/93, em face da "inviabilidade de competição".

De acordo com o Sr. Mário Cavallazzi, "[...] o produto ofertado exigia trabalho técnico e até artístico especializado" e ainda "[...] a proponente seria a única no Brasil a criar e gerenciar o projeto proposto" (fls. 924 e 928).

Além disso, afirma que “[...] a inexigibilidade de licitação está prevista em lei para situações análogas às da contratação em causa, em que o produto ofertado exigia trabalho técnico e até artístico especializado, como foi exaustivamente explanado nos itens 21 a 25 supra, bem como nos itens 26 e 27” (fl. 928).

Contudo, tanto o Poder Público quanto a empresa Palco Sul sabiam que esta não possuía notória especialização em relação ao objeto contratado, tampouco era fornecedora exclusiva. A sua participação deu-se somente porque a empresa Beyondcomm assumiu a contratação do maestro Andrea Bocelli e permitiu que a árvore de natal fosse contratada com outra empresa.

Os envolvidos na contratação tinham ciência de que o contrato somente poderia ser executado mediante a transferência quase integral das atividades para outras empresas. No caso em tela, no decorrer da execução do projeto, a empresa Palco Sul transferiu a terceiros praticamente todo o objeto contratado, o que descaracteriza a alegação de que referida empresa pudesse ter notória especialização ou mesmo pudesse ser considerada “fornecedora exclusiva” do objeto contratual.

Acrescento que a empresa Palco Sul foi contratada com base num “atestado de exclusividade” que lhe foi concedido, de forma onerosa, pela empresa Feeling Eventos (fl. 53), a qual detinha a estrutura da árvore e que, ao final, seria subcontratada para realizar a sua montagem. Referida declaração diz respeito somente à estrutura da árvore de natal, a qual, por si só correspondia a apenas 22% do valor do contrato. Conforme foi apontado pela DLC, o citado “[...] documento refere-se somente à estrutura de alumínio que sustenta a árvore, enquanto que o objeto do Contrato n. 1056/2009 é bem mais abrangente”.

Note-se ainda que os atestados de capacidade juntados posteriormente pela defesa da empresa Palco Sul (fls. 173 a 207) referem-se essencialmente à montagem de palco e arquibancada, iluminação, sonorização e serviços afins, os quais não se assemelham com o objeto principal da inexigibilidade.

Em suas alegações de defesa, a empresa Palco Sul alega que contou apenas com participações e não realizou subcontratação (fl. 1117) e ainda que as outras empresas apenas auxiliaram secundariamente na execução da obra, e não na confecção do projeto (fl. 1118).

Contudo, conforme se verifica nos autos, tanto o projeto quanto a execução foram realizadas quase integralmente por terceiros. A empresa Feeling Eventos foi subcontratada pela Palco Sul para a locação da estrutura da árvore de natal, além da sua montagem e desmontagem, pelo valor de R$ 800.000,00 (fl. 209). A empresa On Projeções foi também subcontratada pela Palco Sul para fornecer e instalar o sistema audiovisual da árvore, pelo valor de R$ 896.700,00 (Oitocentos e noventa e seis mil e setecentos reais) - (fl. 222). Por fim, a empresa Beyondcomm foi subcontratada pelo valor de R$ 650.000,00 (Seiscentos e cinquenta mil reais) para os serviços de interatividade da árvore (fl. 227). De acordo com os itens especificados na proposta da Palco Sul (16), restaram-lhe a montagem do canteiro da obra e o pagamento dos impostos.

O contrato firmado entre a empresa Palco Sul e a Feeling Eventos, por exemplo, estabeleceu em sua cláusula 1.1, que tratou do objeto (fl. 209):

1.1 O presente CONTRATO tem como objeto:

1.1.1 A locação de equipamentos e seus componentes destinados a eventos em geral, descritos na PROPOSTA COMERCIAL Nº. 12.197 (ANEXO I) firmada entre as PARTES, que discriminará a quantidade e o tipo das peças objeto deste CONTRATO;

1.1.2 O fornecimento de mão-de-obra especializada para a montagem, manutenção e desmontagem dos equipamentos e seus componentes destinados a eventos em geral mencionados na PROPOSTA COMERCIAL Nº. 12.197 (ANEXO I).

Ao tratar da exclusividade do fornecedor nos casos de inexigibilidade de licitação, Joel de Menezes Niebuhr[6] defende que:

Outrossim, a Administração deve ser cuidadosa na instrução de tais processos de inexigibilidade, mormente no que tange ao cabedal probatório da exclusividade de fornecedor. O inciso I do art. 25 da lei nº 8.666/93 enuncia que "a comprovação de exclusividade deve ser feita através de atestado fornecido pelo órgão de registro de comércio do local em que se realizaria a licitação ou a obra ou o serviço, pelo Sindicato, Federação ou Confederação patronal, ou, ainda, pelas entidades equivalentes".

O dispositivo em comento remete a atestado fornecido pelo órgão de registro de comércio do local da licitação, que, por suposto, só aponta os fornecedores cujos contratos forem registrados no local, sem ter os meios de indicar outros fornecedores espraiados em outros locais. Como a exclusividade deve, em regra, ser apurada em todo o território nacional, vê-se, às claras, a insuficiência dos dados fornecidos pelo órgão de registro de comércio, já que parciais, restritos em seu âmbito territorial.

[...]

De resto, avulta que os critérios enlaçados pelo legislador não servem para efetivamente comprovar a exclusividade do fornecedor. Na melhor das hipóteses, devem ser admitidos como indicativos ou como um elemento de prova entre outros realmente comprometidos com a realidade dos fatos. Convém lembrar que a inexigibilidade se configura com a efetiva inviabilidade de competição, independentemente dos termos da legislação. Nesse sentido, só é lícito contratar diretamente ao argumento da exclusividade do fornecedor se ele for verdadeiramente exclusivo. Se o critério enfeixado pelo legislador para aferir a exclusividade não é suficiente, não se deve contentar com ele, pelo que é forçoso procurar outros elementos, que digam o que faltou ser dito. Aí vale todo tipo de prova, especialmente os resultantes dos esforços empreendidos na pesquisa dos produtos ofertados no mercado.

Do ponto de vista jurisprudencial, o Tribunal de Contas da União já se posicionou de forma recorrente sobre a necessidade de que a Administração adote, com fulcro no princípio da igualdade e da proposta mais vantajosa, medidas cautelares no sentido de confirmar a veracidade das declarações prestadas pelos órgãos e entidades emitentes das informações constantes dos atestados de exclusividade (Decisão n. 47/1995 – TCU – Plenário; Decisão n. 578/2002 – TCU – Plenário; Acórdão n. 200/2003 – TCU – 2ª Câmara; Acórdão n. 838/2004 – TCU – Plenário; e Acórdão n. 95/2007 – TCU – Plenário).

Disso decorre como dever inarredável do gestor a pesquisa junto ao mercado sobre a veracidade das informações constantes do atestado, bem como sobre a possibilidade de que o serviço fosse prestado por outras empresas, o que não foi feito.

No caso, a verificação nem sequer foi realizada, pois houve um arranjo para que a empresa Palco Sul, que não possuía notória especialização em relação ao objeto principal, fosse contratada e viabilizasse a montagem da árvore de natal interativa com o projeto que era da Beyondcomm. O ajuste que foi feito entre a empresa Beyondcomm e a empresa Palco Sul, chancelado pela Administração Municipal, visou evitar que uma licitação fosse realizada e fez com que o objeto principal do contrato fosse subcontratado.

A incompatibilidade entre a subcontratação quando a contratação é realizada por meio de inexigibilidade de licitação já foi objeto de debate neste Tribunal de Contas, conforme se extrai do voto prolatado pelo Conselheiro César Filomeno Fontes no Processo n. REP 13/00099620, nos seguintes termos:

Ademais, cumpre salientar que, tendo-se em vista a modalidade em que a contratação foi realizada (por inexigibilidade de licitação), ainda que irregular, tem-se que a subcontratação é vedada, uma vez que, em teoria, apenas o contratado teria condições técnicas para a execução dos serviços contratados.

Ao estabelecer o ajuste diretamente à empresa Palco Sul, a Administração Municipal direcionou a contratação e evitou indevidamente a realização de um procedimento licitatório, o que viola o disposto no artigo 37, XXI, da CF, no artigo 25 da Lei n. 8.666/93 e, inclusive, caracteriza crime, conforme previsto no artigo 89 da Lei de Licitações e Contratos Públicos.

A possibilidade de competição existia, pois se a empresa Palco Sul foi contratada para gerenciar os serviços, não se responsabilizando diretamente pela sua execução, cobrando, inclusive, uma taxa de administração (fl. 16), outras empresas existentes no mercado também poderiam ter atuado dessa forma.

A existência de indícios de superfaturamento, irregularidade que também foi objeto de citação por ser passível de imputação de débito, está relacionada com a constatação de que houve empreendimentos semelhantes em Brasília e em Belo Horizonte, com valores abaixo dos contratados pela Prefeitura Municipal de Florianópolis. No presente caso, a ausência de projeto básico e de orçamento detalhado em planilhas combinada com a ausência de justificativa do preço contratado, prevista no inciso III do artigo 26 da Lei n. 8.666/93, prejudicou a avaliação dessa questão pela falta de parâmetros. Porém, o quadro demonstra que os preços foram estabelecidos sem avaliação técnica ou pesquisa de mercado, o que agrava a conduta dos responsáveis e reforça o entendimento pela ilegalidade da inexigibilidade de licitação e do contrato dela decorrente.  

Foi apontada também como irregularidade passível de imputação de débito a execução do objeto em desacordo com as especificações e prazos fixados no contrato, posto que a árvore que foi montada na avenida Beira Mar Norte tinha altura real de no máximo 46 metros, enquanto que no contrato havia sido especificada árvore com 60 metros.

Em suas justificativas (fl. 939), o Sr. Mário Cavallazzi assevera que:

Divergência na altura da árvore

Nas primeiras declarações públicas a respeito do projeto de montagem da árvore e mesmo no contrato inicial, houve, de fato, afirmações de que ela teria 60 metros. A declaração de exclusividade de fls. 388, contudo, refere ter a árvore 50 metros de altura.

Não se sabe que tipo de medição a que lhe atribuiu a altura de 46 metros, que não corresponde à verdade entretanto.

Trata-se, em realidade, de projeto grandioso, com inovações tecnológicas significativas, correspondendo sua altura a de um edifício de cerca de 15 andares, isto em se considerando um pé direito de 3 metros por andar.

Com a devida vênia, tal irregularidade não ocorreu ou, de qualquer forma, não houve má intenção no atribuir a "árvore" a altura de 60 metros.

No caso, cabe lembrar que a cláusula segunda do Contrato n. 1056/2009 estabeleceu que a árvore teria altura aproximada de 60 metros, o que envolvia cerca de 3000 metros de estrutura metálica e tecido, além de 18.324 clusters LED RGB com interatividade. A medição (46 metros) feita por vereador da capital, amplamente divulgada na mídia, não foi questionada pelos responsáveis à época. Além disso, aproxima-se da medida que consta da declaração de exclusividade fornecida pela empresa Feeling Eventos (50 metros) e demonstra que o ajuste contratual não foi devidamente cumprido.

Assim, confirmada a ilegalidade da inexigibilidade de licitação, cabe determinar a sua anulação e, por conseguinte, do contrato dela decorrente, conforme estabelece o artigo 49 da Lei n. 8.666/93:

Art. 49.  A autoridade competente para a aprovação do procedimento somente poderá revogar a licitação por razões de interesse público decorrente de fato superveniente devidamente comprovado, pertinente e suficiente para justificar tal conduta, devendo anulá-la por ilegalidade, de ofício ou por provocação de terceiros, mediante parecer escrito e devidamente fundamentado.

§ 1o  A anulação do procedimento licitatório por motivo de ilegalidade não gera obrigação de indenizar, ressalvado o disposto no parágrafo único do art. 59 desta Lei.

§ 2o  A nulidade do procedimento licitatório induz à do contrato, ressalvado o disposto no parágrafo único do art. 59 desta Lei.

§ 3o  No caso de desfazimento do processo licitatório, fica assegurado o contraditório e a ampla defesa.

§ 4o  O disposto neste artigo e seus parágrafos aplica-se aos atos do procedimento de dispensa e de inexigibilidade de licitação.

A competência para o Tribunal de Contas determinar a anulação da inexigibilidade de licitação e do contrato decorre do disposto nos artigos 2º, 3º e 49, caput e §§ 2º e 4º, da Lei n. 8.666/93, no art. 59, IX, da Constituição Estadual, no art. 29, § 3º, da Lei Complementar n. 202/2000 e nos artigos 32 e 33 da Resolução n. TC-6/2001.

Nesse sentido a jurisprudência do Tribunal de Contas da União[7]:

Ementa: Auditoria. CPRM. Área de licitação, contratos e controle interno. Contratação de pessoal com dispensa de licitação sem estar comprovada a inviabilidade de competição ou a singularidade do objeto. Não comprovação da existência jurídica dos participantes do processo licitatório e da regularidade fiscal dos vencedores do certame. Ausência de controle de gastos com combustíveis. Ausência de critérios objetivos para classificação de propostas. Manutenção de contrato antieconômico. Fixação de prazo para adoção de providências. Multa. Determinação. Recomendação. Juntada às contas.

[...]

8.1 - com base no artigo 71, inciso IX, da Constituição Federal, c/c o artigo 45 da Lei nº 8.443/92 e o artigo 195 do Regimento Interno deste Tribunal, assinar o prazo de 15 (quinze) dias para que os responsáveis, se assim já não fizeram, adotem as providências necessárias ao exato cumprimento do disposto nos artigos 2º, 3º, 49, caput, e §§ 2º e 4º, e 59, da Lei nº 8.666/93, promovendo a anulação do procedimento de inexigibilidade de licitação realizado para a contratação do Consultor Hugo Augusto Spinelli, em desacordo com o artigo 37, inciso II, da Carta Magna, e com o artigo 25, inciso II, da Lei de Licitações, com a consequente anulação do respectivo contrato.

 

Assim também já decidiu o Supremo Tribunal Federal[8]:

II.           Tribunal de Contas: competência: contratos administrativos (CF, art. 71, IX e §§ 1º e 2º).

O Tribunal de Contas da União – embora não tenha poder para anular ou sustar contratos administrativos – tem competência, conforme o art. 71, IX, para determinar à autoridade administrativa que promova a anulação do contrato e, se for o caso, da licitação de que se originou.

A anulação da inexigibilidade de licitação e do contrato em face da constatação de ilegalidade, a que se refere o artigo 49 da Lei n. 8.666/93, a princípio não gera obrigação de indenizar, conforme prescreve o seu parágrafo primeiro: "§ 1o  A anulação do procedimento licitatório por motivo de ilegalidade não gera obrigação de indenizar, ressalvado o disposto no parágrafo único do art. 59 desta Lei".

Entretanto, existe uma ressalva a esta regra, prevista no parágrafo único do artigo 59 do mesmo diploma legal, pois o contratado deve ser indenizado pelo que houver executado até a data da declaração da nulidade, desde que esta não lhe seja imputável. Vejamos:

Art. 59.  A declaração de nulidade do contrato administrativo opera retroativamente impedindo os efeitos jurídicos que ele, ordinariamente, deveria produzir, além de desconstituir os já produzidos.

Parágrafo único.  A nulidade não exonera a Administração do dever de indenizar o contratado pelo que este houver executado até a data em que ela for declarada e por outros prejuízos regularmente comprovados, contanto que não lhe seja imputável, promovendo-se a responsabilidade de quem lhe deu causa.

O Tribunal de Contas da União promove a responsabilização das empresas contratadas em relação ao dano ao erário nos casos em que se comprova a sua concorrência com base o entendimento de que "compete ao TCU julgar ‘as contas daqueles que derem causa a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao Erário’, por determinação do art. 72, II da Constituição Federal de 1988 e dos art. 1º, I e 5º, II, da Lei Orgânica do TCU-LOTCU" (Acórdão n. 946/2013-TCU-Plenário).

Ainda de acordo com o Acórdão n. 1465/2016, do TCU, cujo Relator foi o Ministro Benjamin Zymler:

RECURSO DE RECONSIDERAÇÃO EM TOMADA DE CONTAS ESPECIAL. RELATÓRIO DE AUDITORIA CONVERTIDO EM TCE. CONTRATAÇÃO DO IDORT PELA BR DISTRIBUIDORA PARA A PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE CONSULTORIA FINANCEIRA E DE RECUPERAÇÃO DE ATIVOS ORIUNDOS DO PAGAMENTO INDEVIDO DE DÉBITOS FISCAIS. REMUNERAÇÃO COM BASE EM CLÁUSULA DE ÊXITO. VALOR PAGO SUPEROU EM MUITO A QUANTIA INICIALMENTE PREVISTA NO AJUSTE ORIGINAL. PAGAMENTO REALIZADO APÓS CELEBRAÇÃO EXTEMPORÂNEA DE TERMOS ADITIVOS. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO TÉCNICA E JURÍDICA PARA A CONTRATAÇÃO DIRETA DA ENTIDADE. DESNECESSIDADE DA CONTRATAÇÃO. MATÉRIA OBJETO DOS SERVIÇOS JÁ DECIDIDA PELO STF. CONTAS IRREGULARES. DÉBITO. MULTAS. INABILITAÇÃO, PELO PRAZO DE 8 (OITO) ANOS, PARA O EXERCÍCIO DE CARGO EM COMISSÃO OU EM FUNÇÃO DE CONFIANÇA NO ÂMBITO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA FEDERAL. CONHECIMENTO DAS PEÇAS RECURSAIS. NÃO PROVIMENTO. MANTIDA A RESPONSABILIZAÇÃO DOS GESTORES E DO INSTITUTO DE ORGANIZAÇÃO RACIONAL DO TRABALHO NO RIO DE JANEIRO - IDORT-RJ.

[...]

Artigo 59 da Lei nº 8.666/1993 prevê indenização ao contratado pelo que foi comprovadamente executado, trata-se de indenização pelos custos, não de pagamento do que fora irregularmente acordado. Ademais, o dispositivo legal é claro ao ressalvar os casos em que a nulidade seja imputável ao contratado;

No referido acórdão o TCU cita artigo elucidativo de Renato de Lima Castro, Promotor de Justiça de Defesa do Patrimônio Público da Comarca de Londrina, o qual explicou que:

“Como raciocínio paralelo, guardadas as peculiaridades de cada ramo jurídico, no âmbito do Direito Penal impõe-se a sanção ao agente que pratica o comportamento descrito no tipo de injusto, independente da concreta lesão ao erário ou mesmo da correspondente devolução das quantias eventualmente desviadas.

A improbidade administrativa, contida no âmbito do direito administrativo sancionador, não pode desconsiderar o comportamento ímprobo (e delituoso) do agente público que, por meio de ação ou omissão, viola a igualdade dos licitantes e impede que a Administração Pública obtenha a proposta mais vantajosa, escopo da licitação pública, sem lhe impor a devida sanção: dever de indenizar.

Não é crível que o titular da Ação de Improbidade Administrativa, necessite comprovar um dano presumido pela norma de regência, quando a comprovação do dano, na espécie, é de inviável demonstração.

Nada mais exato. A simples contratação direta de uma empresa para prestar serviço ao poder público, sem a prévia licitação, elimina a participação de outros licitantes que, em igualdade de condições, poderiam ter apresentado preços mais vantajosos à Administração Pública.

Nesse vértice, quantas empresas poderiam ter participado de um processo licitatório destinado à prestação do objeto licitado, ampliando o número de ofertas à Administração Pública, possibilitando-a obter a proposta mais vantajosa? Como seria possível ao titular da ação de improbidade administrativa demonstrar que, concretamente, a Administração Pública não obteve a proposta mais vantajosa, diante da frustração da licitude do processo licitatório ou mesmo de sua dispensa indevida?

Esta produção probatória seria diabólica, porque inviável e indemonstrável.

É induvidoso que a existência de uma proposta prévia e arbitrariamente escolhida pelos agentes ímprobos, materializou dano ao erário, cuja dimensão, entretanto, não pode ser mensurada, pelas razões expostas. A presunção do dano, tal como admitido pela Lei de Improbidade Administrativa, compatibiliza-se com a natureza da matéria.

Desta impossibilidade de mensurar os danos efetivamente ocasionados resulta uma consequência inarredável: os agentes públicos devem ser condenados a pagar à Administração Pública o valor contratado (cuja contratação adveio, por óbvio, da frustração da licitude de uma licitação), em solidariedade com os particulares que tenham concorrido para a concretização do fato ímprobo (art. 59, par. único da Lei de Licitações – interpretação em sentido contrário) ”.

Nesse sentido, o STJ já assentou o entendimento segundo o qual não há o dever de indenizar por parte da Administração nos casos de ocorrência de má-fé ou de ter o contratado concorrido para a nulidade. Vejamos

AgRg no AREsp 345645 / SC AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL 2013/0152538-6 PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. CONTRATO ADMINISTRATIVO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. AUSÊNCIA DE LICITAÇÃO. NULIDADE. JULGAMENTO EXTRA PETITA NÃO CONFIGURADO. CONTRATANTE QUE DEU CAUSA À INVALIDAÇÃO DO INSTRUMENTO. DEVER DE INDENIZAR AFASTADO. SÚMULA 83/STJ. REEXAME DO CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO. INVIABILIDADE. SÚMULA 7/STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. NÃO COMPROVAÇÃO.

1. O Tribunal a quo, em virtude da nulidade de contrato administrativo celebrado sem realização de procedimento licitatório devido, afastou o dever de indenizar da Administração ao entender que o agravante deu causa à invalidação do instrumento.

2. Não configurou julgamento extra petita a decisão do Tribunal de origem que apreciou o pleito inicial interpretado em consonância com a pretensão deduzida na exordial como um todo. Ademais, é pacífico neste Tribunal Superior o entendimento de que não importa o nome dado pelo autor à ação, devendo o magistrado atentar para a causa de pedir e para o pedido, aspectos que definem a natureza jurídica da ação.

3. No tocante à levantada contrariedade ao art. 22 da Lei 8906/94 e ao art. 59 da Lei 8666/93, o acórdão recorrido harmoniza-se com a orientação pacífica do STJ de que não há o dever de indenizar por parte da Administração nos casos de ocorrência de má-fé ou de ter o contratado concorrido para a nulidade. Incidência da Súmula 83/STJ

4. A pretensão recursal - afastar a tese de que a invalidade do contrato é imputável ao agravante - esbarra no reexame dos aspectos fáticos da lide, vedado ao STJ, nos termos de sua Súmula 7.

5. O dissídio jurisprudencial deve ser comprovado, cabendo ao agravante demonstrar as circunstâncias que identificam ou assemelham os casos confrontados, com indicação da similitude fático-jurídica entre eles. Ausente in casu a paridade entre os acórdãos confrontados, uma vez que o acórdão recorrido analisou a controvérsia com base no fato de que o agravante contribuiu para a nulidade do contrato, enquanto os arestos paradigmáticos tratavam de situações em que ficou configurada a boa-fé do contratante, hipótese afastada nos presentes autos.

6. Agravo Regimental não provido.

REsp 1188289 / SP RECURSO ESPECIAL 2010/0058499-2

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. OFENSA AO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. CONTRATAÇÃO DE SERVIÇOS DE TERRAPLANAGEM SEM LICITAÇÃO. NULIDADE DO CONTRATO. PREJUÍZO AO ERÁRIO. INDENIZAÇÃO PELOS SERVIÇOS EXECUTADOS. AUSÊNCIA DE BOA-FÉ. VEDAÇÃO DO ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. CUSTOS DO SERVIÇO. MODULAÇÃO DA PENA DE PROIBIÇÃO DE CONTRATAR. CRITÉRIOS. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADA.

1. Cuida-se, originalmente, de Ação Civil Pública promovida pelo Ministério Público do Estado de São Paulo contra ex-prefeito do Município de Eldorado Paulista e a empresa Trasco Construções e Comércio Ltda., na qual se alega a prática de ato de improbidade administrativa em decorrência da celebração de contrato, sem prévio processo licitatório, para a realização de serviços de terraplanagem, recuperação de rodovias, reencascalhamento, construção e reparo de bueiros etc., no valor de R$ 1.000.267,00.

2. Na petição inicial, o Parquet sustentou ter ocorrido ilegalidade na contratação direta das obras, uma vez não configurada a hipótese de dispensa  ou de inexigibilidade da licitação. Aduziu que o estado de calamidade pública causado pelos danos provocados pelas chuvas no mês de janeiro de 1995 não justificava a dispensa de licitação, visto que o contrato somente foi assinado em 10.11.1995, nove meses após as referidas enchentes, quando já havia cessado a situação emergencial que permitiria a contratação imediata sem licitação. Ao final, pugnou pela declaração de nulidade do contrato e a consequente condenação dos réus a ressarcir o Erário municipal e às sanções previstas no art. 12, II, da Lei 8.429/1992.

3. O Juízo de 1º grau julgou o pedido parcialmente procedente, declarando a nulidade do contrato de prestação de serviços de terraplanagem - celebrado entre a Prefeitura Municipal de Eldorado e a empresa ora recorrente - e condenando o ex-prefeito Donizete Antonio de Oliveira e a empresa Trasco Construções e Comércio Ltda., de forma solidária, à reparação aos cofres municipais no valor do contrato (R$ 1.000.267,00). O Tribunal de Justiça manteve a sentença, corroborando a conclusão de que houve ilegalidade na contratação sem licitação.

4. Não se pode conhecer do Recurso Especial quanto à apontada afronta ao art. 37 da CF/1988, pois o exame da violação de dispositivos constitucionais é de competência exclusiva do  Supremo Tribunal Federal, conforme dispõe o art. 102, III, da Constituição Federal.

5. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC.

6. In casu, a suposta improbidade está vinculada à irregular dispensa de licitação para a realização de obras, especificamente pela desobediência à regra contida no art. 24, IV, da Lei 8.666/1993.

7. A Corte de origem, com base na prova dos autos, concluiu que na ocasião da celebração do contrato já não existia a situação emergencial ou calamitosa que permitiria a dispensa da licitação. A revisão desse entendimento implica reexame de fatos e provas, obstado pelo teor da Súmula 7/STJ.

8. O Tribunal a quo reconheceu expressamente a existência de dano ao patrimônio público, tanto que determinou o ressarcimento ao Erário. Concluiu que o prejuízo decorreu da própria contratação ilegal, feita sem licitação.

9. No caso vertente, a responsabilidade pela nulidade da avença é imputada à Administração e também à empresa ora recorrente, por terem celebrado contratação direta sem que estivesse configurada hipótese de dispensa ou inexigibilidade da licitação.

10. O acórdão recorrido foi contundente ao afastar a arguição de boa-fé da empresa Trasco, aduzindo não ser crível que a empresa desconheça a necessidade de licitação para contratar com a Administração Pública. Eis excertos do voto condutor do julgado: "Os réus violaram todos os princípios constitucionais, e não cabe qui, o argumento da boa-fé da contratante, pois, alguém, em sã consciência, não pode crer que alguma empresa, desconheça a necessidade de licitação para contratar com a administração Pública, tanto mais uma da envergadura da autora, capaz de executar obra do porte daquela que foi feita no Município e daquele valor? É do conhecimento geral, que a contratação com a administração pública deve ser precedida de uma licitação ou uma justificação para sua ausência. E a justificativa apresentada é, sem dúvida, insuficiente e descabiba"(fl. 71, e-STJ). Ademais, o Tribunal de origem acrescentou no julgamento dos Embargos de Declaração: "O v. Acórdão abordou esta questão, determinando que não se justifica devolução de valores, salientado pela jurisprudência colacionada que não caberá invocação de enriquecimento ilícito da Administração, quando alguém gastar em desacordo com a lei, havendo de fazê-lo por sua conta e risco. Além do mais, não cabe aqui, a ressalva de que o ato pode ser revalidado, se a empresa agui de boa-fé, uma vez que o V. Acórdão embargado também abordou esta questão, ao afastar a argüição de boa-fé da empresa TRASCO, aduzindo não ser crível que aquela desconheça a necessidade de licitação para contratar com a Municipalidade" (fl. 786, e-STJ).

11. Rever a orientação do Tribunal a quo, de modo a concluir pela existência de boa-fé da empresa, requer revolvimento do conjunto fático-probatório, inadmissível na via estreita do Recurso Especial, ante o óbice da Súmula 7/STJ.

12. Por força da incidência do art. 59, parágrafo único, da Lei 8.666/1993, o STJ sedimentou entendimento de que a invalidação do contrato garante ao contratado de boa-fé que iniciou a execução do contrato o dever de indenizar o que foi executado até a data em que a nulidade for declarada, desde que não lhe seja imputável o vício. Já para o contratado de má-fé, como no presente caso, e à luz do princípio da vedação do enriquecimento sem causa, é assegurado apenas o retorno ao status quo, equivalente ao custo básico do produto ou serviço, sem nenhuma margem de lucro. No mesmo sentido: REsp 1.153.337/AC, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJe 24.5.2012.

12. Nesse contexto, considerando que foi assentada a má-fé pelo Tribunal de origem, merece parcial provimento o recurso para que a pena de ressarcimento ao Erário corresponda, até a declaração da nulidade, ao que exceder o custo básico do serviço efetivamente prestado.

13. Com efeito, a modulação da pena de proibição de contratar pode ser feita por elementos do caso concreto, como ocorrência de: gravidade da conduta, possibilidade de sua repetição nas demais esferas da Administração, interesse público de caráter nacional. Sobre ser viável modular a citada penalidade: EDcl no REsp 1.021.851/SP, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 6.8.2009.

14. Neste feito e tendo em vista os critérios acima, os elementos assentados pelo Tribunal de origem indicam exacerbação da penalidade imposta, de forma que é de rigor a modulação da pena de proibição de contratar com a Administração Pública para restringi-la à esfera municipal.

15. A divergência jurisprudencial deve ser comprovada, cabendo a quem recorre demonstrar as circunstâncias que identificam ou assemelham os casos confrontados, com indicação da similitude fática e jurídica entre eles. Indispensável a transcrição de trechos do relatório e do voto dos acórdãos recorrido e paradigma, realizando-se o cotejo analítico entre ambos, com o intuito de bem caracterizar a interpretação legal divergente. O desrespeito a esses requisitos legais e regimentais (art. 541, parágrafo único, do CPC e art. 255 do RI/STJ) impede o conhecimento do Recurso Especial, com base na alínea "c" do inciso III do art. 105 da Constituição Federal.

14. Recurso Especial parcialmente conhecido e provido em parte.

Nesses termos também está a doutrina de Marçal Justen Filho[9], que ensina:

Antes de tudo, restringe-se a proteção jurídica para situações fáticas ilícitas geradas por colusão entre a Administração Pública e um particular. Ou seja, se a Administração e o particular estiverem conluiando para fraudar a regra legal, não é possível dar à situação concreta o tratamento reservado precisamente para uma contratação válida. Ou, por outra via, não se poderia invocar a tese da responsabilidade civil do Estado aquele sujeito que tivesse atuado de modo reprovável para fraudar a lei e produzir situação concreta qualificável como ilícita.

Assim, a indenização é cabível somente quando a ilegalidade não for imputável ao contratado, o que, conforme já visto, não se verifica no presente processo, pois a empresa Palco Sul participou efetivamente da fraude que levou à contratação sem que fosse realizada licitação, conforme se tratará no item a seguir, relativo às responsabilizações.

 

 

II.1.5.2. Análise da Responsabilidade

Ao tratar da responsabilização em face de dano ao erário, este Tribunal tem decidido por meio da análise da culpabilidade do agente que lhe deu causa, em face do seu caráter subjetivo.

Esse é o caso do Processo n. TCE 10/00299659, no qual o Conselheiro Julio Garcia, com base em manifestação do Conselheiro Luis Eduardo Cherem, parcialmente transcrita abaixo, apresentou voto divergente ao proposto pelo Auditor Substituto de Conselheiro Cleber Muniz Gavi:

Tenho me manifestado pela imprescindibilidade da presença do elemento subjetivo para fins de estabelecimento do dever de ressarcir aos cofres públicos, ou seja, de que a ação ou omissão da qual resultou o dano ao erário tenha sido praticada com culpa ou dolo. Outros membros deste Plenário coadunam com tal entendimento, que é unânime no Tribunal de Contas da União, cuja decisão - Acórdão da lavra do Ministro Relator Benjamin Zymler, no Processo n° 003.114/2001-3, Tomada de Contas Especial, Acórdão 1830/2006 - Plenário - transcrevo por considerar oportuna, posto que traz estudo sobre os critérios para definição de responsabilidade dos agentes públicos:

[...]

IV - Critérios para definição de responsabilidade dos agentes públicos

12. Feitas essas considerações, passo a examinar a conduta dos agentes públicos relacionados nesta TCE. Preliminarmente, ressalto que a responsabilidade desses agentes é subjetiva. Nesse sentido, cito trecho do Acórdão nº 386/1995 - 2ª Câmara (TC nº 574.084/93-2), no qual foi afirmada a impossibilidade de ser invocada a responsabilidade objetiva do agente público pela prática de atos administrativos, in verbis:

“Por outro lado, o art. 37, § 6º, da Constituição Federal disciplina a responsabilidade objetiva do risco administrativo das pessoas jurídicas de direito público e das legatárias, por atos praticados pelos agentes públicos, violando direitos de outras pessoas, causando-lhes danos ou prejuízos, uma evolução da responsabilidade civilista. In fine, o citado parágrafo disciplina que o agente público praticante do ato responde perante a pessoa jurídica responsável por culpa lato sensu. No caso em exame, não se trata de lesão singular a direito, mas à sociedade, por descumprir um dever implícito na função pública, fundado em princípios que norteiam o Direito Público, cujo controle ab initio cabe ao Tribunal, nos termos do retromencionado art. 71 e seguintes da Constituição Federal.

Preleciona o mestre HELY LOPES MEIRELLES: "A responsabilização de que cuida a Constituição é a civil, visto que a administrativa decorre da situação estatutária e a penal está prevista no respectivo Código, em capítulo dedicado aos crimes funcionais (arts. 312 a 317)."

13. Tal entendimento foi reiterado no Acórdão nº 67/2003 - 2ª Câmara (TC nº 325.165/1997-1), do qual extrai o seguinte trecho:

“49. A responsabilidade dos administradores de recursos públicos, escorada no parágrafo único do art. 70 da Constituição Federal e no artigo 159 da Lei nº 3.071/1916, segue a regra geral da responsabilidade civil. Quer dizer, trata-se de responsabilidade subjetiva. O fato de o ônus de provar a correta aplicação dos recursos caber ao administrador público não faz com que a responsabilidade deixe de ser subjetiva e torne-se objetiva. Esta, vale frisar, é responsabilidade excepcional, a exemplo do que ocorre com os danos causados pelo Estado em sua interação com particulares - art. 37, § 6º, da Constituição Federal.

50. A responsabilidade subjetiva, vale dizer, possui como um dos seus pressupostos a existência do elemento culpa. Neste sentido, permito-me transcrever Silvio Rodrigues (Direito Civil, Responsabilidade Civil, pág. 16):

Culpa do agente. O segundo elemento, diria, o segundo pressuposto para caracterizar a responsabilidade pela reparação do dano é a culpa ou o dolo do agente que causou o prejuízo. A lei declara que se alguém causou o prejuízo a outrem por meio de ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, fica obrigado a reparar. De modo que, nos termos da lei, para que responsabilidade se caracterize mister se faz a prova de que o comportamento do agente causador do dano tenha sido doloso ou pelos menos culposo.

14. Aduzo que a responsabilidade solidária do agente público também não se presume, como se depreende da leitura do retromencionado Acórdão nº 67/2003 - 2ª Câmara. Naquela oportunidade, foi assim discutida a responsabilidade dos administradores de recursos públicos:

“3. A solidariedade, nos termos do art. 896 do Código Civil de 1916, lei que rege os fatos ora examinados, não se presume. Resulta da vontade da lei ou da vontade das partes. Decorre, também, a teor do art. 1.518 desse mesmo código, da prática de ato ilícito - respondem pela prática do ato todos que concorreram para sua execução. No âmbito da legislação que rege os processos desta Corte, o inciso I do art. 12 da Lei nº 8.443/1992 dispõe que o Relator, verificada irregularidade nas contas, fixará a responsabilidade, que poderá ser individual ou solidária.

4. Dessa legislação que ora menciono, é possível depreender que a responsabilidade solidária só surge da lei, do contrato ou da prática de ato ilícito.”

15. Consequentemente, a imputação de débito solidário aos agentes públicos de que ora se cuida depende, fundamentalmente, da existência de dolo ou culpa. Considerando que não há nos autos indícios de locupletamento ou de dolo desses agentes, entendo haver necessidade de perquirir a existência de culpa. Tendo em vista que age com culpa quem atua com imperícia (relativa à falta de habilidade, de capacidade técnica), imprudência (ligada a ações temerárias) ou negligência (relacionada com ações desidiosas ou com omissões), analisarei em separado a conduta de cada um dos citados, procurando aferir se seus atos estão ou não eivados por uma dessas modalidades de culpa.

16. Ao analisar a existência de culpa, em qualquer uma de suas modalidades, adotarei como parâmetro para comparação a conduta esperada de um homem médio, diligente e probo - o equivalente ao princípio romano do bonus pater familiae. Ressalto ser pacífica a assimilação desse princípio pelo direito pátrio, tanto que, na época em que ocorreram os fatos ora sob exame, ele estava insculpido nos arts. 1.300 e 1.301 do Código Civil, no art. 153 da Lei das Sociedades Anônimas e no art. 142 do Código Comercial.

17. Desse princípio decorre que o agente público deverá agir como se estivesse cuidando dos seus próprios negócios, respondendo pelos danos que vier a causar em decorrência de condutas desidiosas ou temerárias. Assim, nas palavras de José Aguiar Dias, “a culpa pode ser entendida como a falta de diligência na observância da norma de conduta, isto é, o desprezo, por parte do agente, do esforço necessário para observá-la, com resultado não objetivado, mas previsível, desde que o agente se detivesse na consideração das conseqüências eventuais de sua atitude.” (Da Responsabilidade Civil. 6ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1979)

18. Impende analisar, ainda, o resultado observado e o nexo causal. Quanto ao resultado, saliento que só será possível imputar responsabilidade e, consequentemente, só haverá obrigação de indenizar se a conduta analisada ocasionar dano ou violação de interesse. Diante da inexecução contratual, comentada nos parágrafos 8 a 11 deste Voto, entendo estar caracterizado o dano ao erário.

19. O nexo causal ou relação de causalidade é o liame que une a conduta do agente ao dano, sendo, portanto, um elemento indispensável para a atribuição de responsabilidade. A determinação do nexo causal é uma situação de fato a ser avaliada em cada caso concreto, não sendo possível enunciar uma regra absoluta. Assim, a existência de nexo causal entre as condutas dos agentes públicos e o dano causado aos cofres da União será analisada individualmente no momento oportuno.

20. Aduzo que considerações de teor semelhante têm sido acolhidas por este Plenário quando do julgamento de TCE instauradas para apurar irregularidades ocorridas em contratações realizadas no âmbito do PEQ/DF-1999. Assim sendo, esse método de análise é aceito por esta Colenda Corte de Contas. (grifou-se).

Deste Tribunal destaco o Voto proferido nos autos do processo nº TCE 05/00519625, da relatoria do Conselheiro aposentado Salomão Ribas Junior:

O pressuposto jurídico da obrigação de indenizar é o dano resultante de dolo ou culpa. A regra geral está inserida no art. 186 do Código Civil: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.” E é complementada pelo art. 927 do mesmo diploma: “Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Decorre daí que a imputação de débito – que importa a geração de um título executivo extrajudicial, conseqüentemente, a obrigação de indenizar – reclama a presença, no mínimo, de culpa, seja por negligência, seja por imprudência. Sem culpa ninguém pode ser obrigado a indenizar. Este raciocínio harmoniza-se com o art. 21 da Lei Complementar n. 202/2000, quando diz: “Julgadas irregulares as contas, e havendo débito, o Tribunal condenará o responsável ao pagamento da dívida atualizada monetariamente, acrescida dos juros de mora devidos, podendo, ainda, aplicar-lhe a multa prevista no art. 68 desta Lei”. Veja-se que a lei coloca duas premissas, para efeito de condenação ao ressarcimento: a existência do débito e a responsabilidade (culpa) do agente.

Assim, para fins de imputação de débito, devem estar presentes: o dano, a ação ou omissão (causadora do dano) e o nexo de causalidade (entre a ação ou omissão e o dano), e ainda, o elemento subjetivo: a culpa (ou dolo) do responsável.

Nessa Corte de Contas, ressalto outro precedente do eminente Conselheiro Julio Garcia, que nos autos do Processo PCR 08/0062482, emitiu Voto Vista no sentido da exclusão de responsabilidade do gestor público ao argumento de que "o Gestor Público deve responder pelos atos que praticar com má-fé, dolo, culpa grave, abuso ou desvio de poder". Ressaltou o Conselheiro que é "preciso constatar indício de má-fé do agente, caracterizador de um comportamento desonesto seu, não sendo suficiente a irregularidade do ato."

Ao tratar da responsabilidade perante os Tribunais de Contas, Jessé Torres Pereira Júnior[10] leciona nesse sentido:

[...] A responsabilização dos agentes públicos pela prática de atos administrativos irregulares, perante o controle externo exercido pelos Tribunais de Contas (e também perante o controle interno), é subjetiva. Os requisitos indispensáveis à configuração da responsabilidade no âmbito das Cortes de Contas são: (a) prática de ato ilícito, comissivo ou omissivo, na gestão de recursos públicos, com prejuízo ou não ao erário; (b) existência de dolo ou culpa, elemento subjetivo da conduta; e (c) existência de nexo de causalidade entre a ação ou omissão do agente e o resultado.

A responsabilização perante os Tribunais de Contas pode ocorrer em razão de conduta comissiva (comportamento positivo) ou omissiva (comportamento negativo) do agente.

A conduta, comissiva ou omissiva, pode ser culposa ou dolosa. A conduta culposa traduz-se na inobservância de um dever de cuidado objetivo imposto ao agente. A conduta dolosa corresponde à vontade livre e consciente de alcançar o resultado. Também se caracteriza o dolo quando o agente, embora não configurada a deliberada intenção de alcançar o resultado, aceita assumir o risco de produzi-lo em razão da sua conduta. Trata-se do dolo eventual.

A conduta culposa manifesta-se sob as seguintes formas: negligência, imprudência e imperícia [...]

Este também é o entendimento que adota o Tribunal de Contas da União, como se verifica no Processo n. TC 006.310/2006-0, que teve como Relator o Ministro Augusto Sherman Cavalcanti, que tratou de Incidente de Uniformização de Jurisprudência, no qual foi discutida, entre outros aspectos, a culpa como elemento necessário à responsabilização por dano ao erário ocorrido na gestão pública. Extrai-se da manifestação do MP/TCU, chancelada no voto proferido pelo Relator, que resultou no Acórdão n. 2763-43/11:

- V -

DA CULPA COMO ELEMENTO NECESSÁRIO À RESPONSABILIZAÇÃO POR DANO AO ERÁRIO OCORRIDO NA GESTÃO PÚBLICA

Assentadas as bases constitucionais da jurisdição especial de contas do TCU, a qual vem sendo exercida em sede do procedimento da tomada de contas especial, passo a me ocupar, então, do esclarecimento de como se opera a responsabilização pelo dano ao erário. Isso, evidentemente, equivale a perquirir e apontar o suporte normativo para o estabelecimento daquilo que é determinante para a imputação de responsabilidade na TCE. Nas linhas que se seguem, tentarei fazer ver que esse procurado suporte normativo encontra-se, em verdade, incrustrado no já referido artigo 71, inciso II, parte final, da Constituição Federal.

Esse dispositivo, ao fixar a competência do TCU para julgar contas em razão das específicas ou especiais ocorrências de ‘perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário público’, estabelece que as contas que nele se consideram são as dos que ‘derem causa’ às referidas ocorrências lesivas ao erário. Isso deixa patente que somente há que se falar em levantamento e em julgamento de contas em decorrência de dano ao erário contra aquele que, atuando na gestão pública, tenha dado causa àquele dano.

 E esse dano, para fins de responsabilização, deve ter decorrido de conduta culposa do agente, conforme jurisprudência pacífica da Corte de Contas. É que a responsabilidade objetiva situa-se em seara de exceção, que se dá quando a lei estabelece a responsabilidade independentemente de culpa, a exemplo da responsabilidade do Estado, prevista no § 6º do artigo 37 da Constituição Federal.

 A responsabilização de gestor público por dano causado ao erário, portanto, somente tem lugar se restar comprovado um aspecto subjetivo da atuação do gestor, ou seja, se restar comprovado que o gestor agiu com culpa, considerando-se este conceito jurídico em seu sentido amplo, o qual compreende a culpa strictu sensu, caracterizada por negligência, imprudência ou imperícia, e o dolo.

O que acima se expôs permite concluir que, ocorrendo o prejuízo ao erário, mas sem culpa daquele a quem se confiou a gestão pública, não cabe subsumir o caso à hipótese normativa prevista no artigo 71, inciso II, parte final, da Constituição Federal. Ou seja, a aferição da conduta do gestor público constitui a verdadeira pedra de toque da responsabilização por dano ao erário em sede de tomada de contas especial.

Nesse contexto, o exame da responsabilidade da empresa contratada e dos ex-gestores sobre o dano ao erário apontado será realizado considerando o seu caráter subjetivo e a partir da avaliação da culpabilidade de cada um dos citados e do nexo de causalidade entre as condutas descritas e os resultados obtidos.

A prática de ato ilícito na gestão dos recursos públicos foi analisada no item anterior, no qual foi verificada a ilegalidade da Inexigibilidade de Licitação n. 519/2009 e do Contrato n. 1056/2009.

Resta, assim, verificar a existência ou não de dolo ou culpa, elementos subjetivos da conduta, além do nexo de causalidade entre a ação ou omissão dos agentes e o resultado, como elementos necessários à responsabilização da empresa contratada e dos agentes públicos.

II.1.5.2.1. Empresa contratada - Palco Sul Eventos Ltda.

A empresa Palco Sul sustenta que "[...] não promoveu ou conduziu o processo de inexigibilidade de licitação, mas tão somente foi contratada para prestar um de seus serviços que estão disponíveis no mercado de consumo" (fl. 154).

Entretanto, para a sua contratação, a empresa Palco Sul apresentou à Prefeitura uma proposta sem data (fls. 12/16), amparada em declaração de exclusividade (da estrutura metálica da árvore de natal) emitida pela empresa Feeling Eventos em 29/10/2009 (fl. 209), nos seguintes termos:

[...] exclusividade para a contratação da declarante para a montagem e locação do Sistema Estrutural Especial em Alumínio que compõem a Árvore de Natal de Florianópolis, Santa Catarina, no ano de 2009. [...]

Pelo conteúdo da declaração de exclusividade, verifica-se que a empresa Palco Sul não era proprietária da estrutura da árvore e não seria responsável pela execução da sua montagem. Conforme visto anteriormente, o projeto da árvore de natal interativa era da empresa Beyondcomm e a empresa Palco Sul atuou apenas como intermediária entre o Município e as empresas que efetivamente executaram o objeto contratado, tendo se responsabilizado efetivamente somente pela administração do canteiro da obra e pelo pagamento de impostos.

Esse retrospecto confirma que a empresa Palco Sul apresentou sua proposta apenas para intermediar a contratação das empresas que de fato detinham o projeto e iriam executar a árvore de natal, participando de uma contratação indevidamente direcionada e contribuindo para burlar o instituto da licitação pública. Não é crível que a empresa desconhecesse a necessidade de licitação para contratar com a Administração Pública, ainda mais quando esta não executaria diretamente o objeto contratado.

Configura-se assim o dolo da empresa, que, através dos seus responsáveis, deliberadamente apresentou ao ente municipal proposta comercial e declaração de exclusividade que propiciaram a contratação por meio da inexigibilidade de licitação, em prejuízo à necessária licitação pública. Fica caracterizado também o nexo de causalidade entre a conduta da empresa e a irregularidade ensejadora de imputação de débito. Tais constatações ainda afastam as alegações oferecidas pela empresa, segundo a qual esta não teria praticado qualquer ação.

Quanto ao argumento de que a empresa Palco Sul não teria se beneficiado da contratação, apenas sofrendo prejuízos, destaca-se que esta situação decorre da ilegalidade das ações praticadas, que levaram à suspensão dos pagamentos.

Ademais, não se sustenta a alegação de que não haveria possibilidade de competição, que a empresa possuiria capacidade técnica e que estaria prestando um serviço exclusivo. Conforme amplamente demonstrado nos autos e na presente proposta de voto, a empresa Palco Sul não executou o objeto principal contratado, isto é, a montagem e desmontagem da árvore de natal ou a criação e instalação do sistema de luzes e de interatividade. Nenhum desses serviços foi executado pela Palco Sul, que também não era proprietária da estrutura metálica, ao contrário do que alegou em sua defesa.

A co-participação da empresa Palco Sul sobre a irregularidade que enseja a anulação da inexigibilidade de licitação e do contrato demonstra que não há que se falar em indenização à empresa e é contundente para que se determine a devolução dos recursos públicos gastos ao arrepio da lei.

Acrescento ainda que por meio do Relatório n. 164/2010 (fls. 425/460), a DLC analisou os comprovantes de despesas apresentados pela empresa Palco Sul e os considerou inadequados para fins de comprovação das despesas que teriam sido realizadas na execução do Contrato n. 1056/2009.

Segundo a Diretoria Técnica, não foi possível verificar se os materiais e documentos constantes dos documentos encaminhados foram efetivamente entregues ou utilizados na execução da árvore de natal ou mesmo se as despesas foram efetivamente pagas pela empresa. A DLC asseverou ainda que havia inconsistências de datas na documentação e que alguns documentos eram ilegíveis. Destaca-se do Relatório n. 164/2010:

Um dos principais pontos que impedem a utilização dos documentos juntados como comprovantes de despesas referentes ao Contrato 1056/09 é a impossibilidade de aferir a relação entre os gastos efetuados e o objeto do Contrato n. 1056/09. Em diversos documentos não constam informações sobre a finalidade da despesa, imprescindíveis para verificar se os materiais ou serviços foram efetivamente utilizados na obra da árvore de Natal de Florianópolis.

Acerca deste aspecto, a DLC citou como exemplo as faturas de locação emitidas pela On Projeções S/A (fls. 240/260/263); a Nota Fiscal n. 021, emitida por Santos & Fomento Serviços de Topografia Ltda. (fl. 247); os cupons fiscais de combustível (fls. 290/291/305); a Nota Fiscal n. 883.506, emitida por Havan Lojas departamentos Ltda. (fls. 292); as Notas Fiscais n. 000194 e 000250, emitidas por Gilson Martins de Oliveira - ME (fl. 297); a Nota Fiscal n. 1080, emitida pela empresa Três A Com. Mat. Const. Ltda. (fl. 306); e a Nota Fiscal n. 24613, emitida por Compensados Fernandes Ltda. (fl. 308).

Destaca-se também do mencionado relatório da DLC que o contrato firmado pela empresa Palco Sul com a empresa Feeling Eventos Ltda. e o Cupom Fiscal n. 107923, emitido pela empresa Comércio de Combustíveis e Lubrificantes Arataca Ltda. (fl. 291), foram estabelecidos anteriormente ao próprio contrato firmado pela Prefeitura Municipal de Florianópolis, o que também prejudica a correlação entre as alegadas despesas e a execução do contrato propriamente dita. Além disso, foram apontadas ainda a existência de documentos ilegíveis (fls. 252 a 254, 281 e 290) e a existência de fatura sem data de emissão (fl. 275).

Nesse ponto, apesar de manifestar o mesmo posicionamento desta Relatora com relação à culpabilidade da empresa Palco Sul em face das irregularidades aqui analisadas, o Procurador de Contas Aderson Flores (Parecer n. 2624/2011) sugeriu que fosse determinada a anulação da Inexigibilidade de Licitação n. 519/2009 e do Contrato n. 1056/2009, considerando a possibilidade de existência de eventuais valores a indenizar à empresa contratada, que deveriam ser avaliados considerando a hipótese de existência de sobrepreço.

O Procurador considera que não há como se presumir que a despesa de R$ 540.000,00 tenha sido irregularmente liquidada e que ainda que haja notícia de superfaturamento contratual e de que a execução ocorreu de forma diversa das especificações e prazos fixados, não há como se afirmar quer tais irregularidades teriam se traduzido em dano ao erário municipal.

O Procurador questiona ainda qual parcela da árvore de natal deixou de ser montada; quanto custou a confecção e montagem levadas a efeito; e ainda se esse valor seria maior ou menor ao que foi efetivamente pago à empresa Palco Sul.

Entretanto, conforme visto alhures, a regra constante do parágrafo único do artigo 59 da Lei n. 8.666/93 determina que o contratado deve ser indenizado pelo que houver executado até a data da declaração da nulidade, desde que esta não lhe seja imputável. Vejamos:

Art. 59.  A declaração de nulidade do contrato administrativo opera retroativamente impedindo os efeitos jurídicos que ele, ordinariamente, deveria produzir, além de desconstituir os já produzidos.

Parágrafo único.  A nulidade não exonera a Administração do dever de indenizar o contratado pelo que este houver executado até a data em que ela for declarada e por outros prejuízos regularmente comprovados, contanto que não lhe seja imputável, promovendo-se a responsabilidade de quem lhe deu causa.

Assim sendo, é por determinação legal que nos casos em que se comprova a concorrência das empresas contratadas em relação às causas que ensejaram a nulidade do contrato, não há obrigação da Administração Pública indenizar o contratado pelo que este tiver executado.

Além disso, a declaração de nulidade do contrato administrativo retroage e impede os efeitos jurídicos que ele, ordinariamente, deveria produzir, além de desconstituir os já produzidos.

No presente caso, verificou-se o dolo da empresa Palco Sul nos procedimentos que forjaram as condições para que a Inexigibilidade de Licitação n. 519/2009 fosse realizada.

Ao tratar dessa questão, o Procurador de Contas divergiu da DLC (Relatório n. 164/2010) no que se refere à concorrência da empresa Palco Sul para a consecução da ilegalidade, nos seguintes termos:

Quanto ao item 2.2.1 do Relatório nº 164/2010, dele dissinto, na parte que concluiu que a empresa contratada não concorreu para consecução da ilegalidade.

Das justificativas apresentadas pela empresa Palcosul Eventos Ltda, destaco os seguintes trechos (fls. 126/169):

Como já dito, a Empresa detém a exclusividade do projeto da Árvore de Natal. Toda a estrutura, cenografia, criação, produção visual, pertence à empresa Palcosul. Essa é uma árvore exclusiva, projeto único em todo o Brasil, logo, somente a mesma poderia promovê-lo.

[...]

Além disso, a árvore (objeto do contrato) deve ser entendida como um todo, e são várias partes que a compõe, e estas poderiam ser realizadas tão somente pela Empresa Palcosul, a qual é detentora do projeto que ela mesma desenvolveu. (Os grifos constam do original)

Lógico inferir que as mesmas argumentações foram apresentadas ao Município para situá-lo da pretensa exclusividade que envolvia os serviços a serem contratados.

Dos autos consta a Declaração de Exclusividade de fls. 53/54, apresentada ao Município pela empresa Palcosul, firmada por Feeling Eventos Ltda, atestando que ela (Palcosul) possuía “a exclusividade para a contratação da declarante para a montagem e locação do Sistema Estrutural (...) que compõem (sic) a Árvore de Natal de Florianópolis, Santa Catarina, no ano de 2009”.

Todos esses detalhes comprovam que as ações encetadas pela empresa Palcosul concorreram para consumação da irregularidade aqui tratada.

Esse fato deve ser considerado para eventuais desdobramentos que o caso possa ter.

Sendo assim, independentemente de qual parcela do contrato tenha sido executada pela empresa Palco Sul, a nulidade da inexigibilidade de licitação e do contrato dela decorrente, para a qual a empresa concorreu, desconstitui os efeitos contratuais já produzidos, como o pagamento da primeira parcela, que foi realizado, e não gera qualquer obrigação de indenização pelo que tenha sido executado.

Caso não se aplique integralmente a regra do artigo 59 da Lei n. 8.666/93, haverá um estímulo a esse tipo de prática irregular, pois mesmo se constatada a concorrência da empresa na irregularidade ou fraude, esta poderá ficar isenta de prejuízo se tiver executado o contrato, mesmo se houver sobrepreço. Essa não é a letra da Lei n. 8.666/93, que claramente busca impedir o ressarcimento da empresa caso tenha concorrido para a fraude.

O prejuízo foi sofrido pelo Município de Florianópolis, que arcou parcialmente com os custos da contratação irregular, teve a árvore de natal montada e desmontada em poucos dias, dos quais a interatividade pouco foi ativada, em decorrência de atos irregulares praticados pelos gestores públicos da época, com a concorrência da empresa contratada.

Diante do exposto, reitero a ocorrência de dano ao erário e manifesto-me pela responsabilização da empresa Palco Sul diante do prejuízo sofrido pelo ente municipal.

 

II.1.5.2.2. Sr. Mário Roberto Cavallazzi

O Sr. Mário Roberto Cavallazzi foi responsável pela emissão da requisição de serviços (fl. 11); pelo encaminhamento da proposta da empresa Palco Sul à Diretoria de Licitação, Contratos e Convênios da Secretaria Municipal de Turismo (fl. 23) e ao Comitê Gestor (fl. 24); e pela edição da Inexigibilidade de Licitação n. 519/2009 (fls. 56 a 63).

Em suas justificativas, o ex-Secretário alega que agiu no estrito cumprimento de suas obrigações, observando as normas legais pertinentes e atuando sob a vontade e autorização das autoridades superiores (fl. 927).

Além disso, alega a existência de parecer emitido pela assessoria jurídica da SETUR, que considerou a situação em epígrafe adequada para o caso de inexigibilidade de licitação, considerando “serviços técnicos profissionais especializados trabalhos relativos a projetos e excepcionalizando a necessidade de licitação para a contratação de tais serviços através de inexigibilidade”.

Também de acordo com o Sr. Mário Roberto Cavallazzi, consta do citado parecer que a proponente “[...] apresenta experiência singular no desenvolvimento e consecução de eventos, sendo a única no Brasil a criar e gerenciar o projeto proposto” e que o parecer enquadrou o caso em tela no inciso III do artigo 25 da Lei n. 8.666/93, que trata da contratação de profissional do setor artístico, considerando que a execução da árvore de natal exigia trabalho artístico na criação de desenhos, designers gráficos, trilhas sonoras, artes plásticas e outros artistas.

Contudo, além dos documentos que se encontram nos presentes autos, de responsabilidade do ex-Secretário, verifica-se que a participação deste nas negociações e contratações ocorridas em 2009 foi ampla e determinante. Conforme consta de suas alegações de defesa (fl. 919), o ex-Secretário de Turismo negociava a prestação dos serviços com a empresa Beyondcomm, a quem atribuía a exclusividade da tecnologia de interatividade da árvore de natal:

A empresa BEYONDCOMM, integrando o mesmo grupo econômico da BEYONDPAR, que tem os mesmos sócios daquela, apresentou-se à PMF como idealizadora de uma árvore de natal semelhante, montada em Belo Horizonte, no ano de 2008, e também como sendo detentora exclusiva de uma tecnologia inédita capaz de possibilitar a interatividade da população com a grandiosa árvore de natal proposta para Florianópolis.

[...] O requerente pediu à Beyondcomm que encaminhasse um projeto da árvore e o maior número de elementos para melhor debate do assunto.

De acordo com o ex-Secretário, o projeto foi levado ao então Prefeito Municipal, Sr. Dário Berger, e ao então Governador do Estado, Sr. Luiz Henrique da Silveira, que apoiaram a proposta recebida e definiram que também seria contratado o tenor Andrea Bocelli para as comemorações do Natal.

O Sr. Mário Cavallazzi informou também que:

Ocorre que a empresa Beyondcomm, titular dos direitos autorais da árvore, com os respectivos projetos cenográfico, de comunicação visual, etc., cientificada de que não haveria possibilidade de pagamento, ainda em 2009, do total por ela pretendido para montar o palco e a árvore, em novembro do mesmo ano, um mês antes da data programada para a apresentação do maestro Andrea Bocelli, cedeu onerosamente tais direitos à empresa Palco Sul Ltda., na conformidade do contrato de fls. 227/228.

Consta desse contrato que a prestação de serviços ajustada entre Beyondcomm/Beyondpar com a Palco Sul Eventos Ltda. compreendia: a) a criação e desenvolvimento de projeto cenográfico para a árvore que deveria ser interativa e com espaço para o show; b) a criação e produção de conteúdo visual, eletrônico e interativo a ser exibido na estrutura da árvore; c) criação e programação visual de cenografia de peças impressas, cobertura em tecido da árvore com motivos temáticos e comunicação visual dos tapumes que formam a base da árvore e isolam o backstage do espaço de shows; comunicação visual da frente do palco e, finalmente, d) cessão temporária a título precário e oneroso, de computador designado X Streaming Plus, de exclusiva titularidade dela prestadora, ara uso tão somente na Árvore.

Dias depois, a empresa PALCO SUL EVENTOS LTDA. apresentou a proposta de fls. 12 a 16 dos presentes autos, para instalação da aludida Árvore de Natal, ao preço total de R$ 3.700.000,00, sendo R$ 3.500.000,00 o custo da locação e montagem da estrutura e equipamentos da árvore e R$ 200.000,00 de honorários da Eng. Luciana Garcia, da mesma empresa (fls. 236/7).

O Sr. Mário Roberto Cavallazzi, que conduziu todo o processo de contratação da montagem da árvore de natal, o qual culminou com a inexigibilidade de licitação que se examina e a contratação da empresa Palco Sul, sempre teve ciência de que o projeto era de fato da empresa Beyondcomm.  

As declarações do ex-Secretário não deixam dúvidas de que este tinha pleno conhecimento de que a empresa Palco Sul atuaria apenas como intermediadora, sem executar o objeto principal da contratação.

A conduta do Sr. Mário Cavallazzi teve caráter doloso e foi imprescindível para que se construísse o quadro de contratações irregulares que maculou os eventos natalinos de 2009 no município de Florianópolis. As negociações e os arranjos perpetrados pelo ex-Secretário, que buscavam viabilizar o Projeto do Natal dos Sonhos, violaram a Lei n. 8.666/93, além dos princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade e moralidade, e se constituem no nexo de causalidade entre a sua conduta e a irregularidade verificada.

Com relação ao parecer jurídico constante dos autos, destaco que a Sra. Daniela Secco, ex-assessora jurídica da Secretaria Municipal de Turismo, não foi citada à época porque inexistia certeza quanto à possibilidade de responsabilização do parecerista jurídico no âmbito das Cortes de Contas. Esse assunto atualmente é pacificado no âmbito do TCU e do STF, os quais consideram que a responsabilização é cabível quando comprovada culpa ou erro grosseiro[11]. A ex-consultora jurídica é parte nos processos relativos à matéria tratada nos presentes autos nos processos que se desenvolvem no Poder Judiciário.

Cabe ressaltar que a existência de parecer jurídico favorável à realização da inexigibilidade de licitação não afasta a responsabilidade do Sr. Mário Cavallazzi. Primeiro, conforme firme entendimento do TCU[12], porque o parecer jurídico não vincula a autoridade gestora:

Por sua vez, a argumentação do sr. [...] é deveras precária e reside unicamente no fato de ter agido sob a orientação de parecer jurídico. Ora, pareceres jurídicos não se prestam a isentar, por si sós, o administrador público de responsabilidade pela prática de atos de ofício, sobretudo quando velados sob a sombra negra da ilegalidade, como na hipótese.

O processo de tomada de decisão é complexo e não se circunscreve meramente ao conteúdo de parecer jurídico, lavrado, muita vez, com desiderato certo, previamente estabelecido, de acordo com a anterior determinação recebida. Afinal, uma folha branca de papel aceita qualquer coisa. O parecer deve ser apenas mais um elemento orientador para a decisão correta e não o fundamento único para a autorização de pagamentos, em moldes nitidamente ilegais, e, posteriormente, elemento de escusa de responsabilidade. O parecer jurídico não impõe conduta ao ordenador de despesas e a responsabilidade pelo ato deve ser analisada caso a caso.

Ademais, o Sr. Mário Cavallazzi agiu deliberadamente para burlar a licitação pública. Lembre-se que o ex-Secretário tinha conhecimento de que o evento de Natal contaria com a árvore de natal pelo menos desde junho de 2009 (Of. n. 376/2009 - fl. 24), quando foi solicitada manifestação do Comitê Gestor sobre a contratação de empresa que faria a criação, montagem e gerenciamento da árvore. No ofício encaminhado ao referido comitê foi feita referência a uma proposta técnica e comercial, que não consta do presente processo, mas que demonstra que o Município já contava com uma proposta desde então.

Conforme já exposto, a empresa Beyondcomm, que até então negociava a montagem da árvore de natal, acabou sendo contratada pela Administração Municipal para a realização do show do tenor Andrea Bocelli e, por motivos até agora não comprovados, acabou não sendo contratada pela Prefeitura para executar o projeto da árvore de natal, que havia apresentado anteriormente.

Tais fatos levaram à contratação irregular da empresa Palco Sul, sem que estivessem preenchidos os requisitos da Lei n. 8.666/93, contribuindo assim para a consumação da ilicitude. O dolo na conduta do ex-Secretário também não permite que este busque se refugiar no parecer jurídico constante dos autos.

II.1.5.2.3. Sr. Aloysio Machado Filho

O Sr. Aloysio Machado Filho, ex-Secretário Adjunto de Turismo, Cultura e Esporte, substituto do Secretário titular em suas ausências e impedimentos, foi signatário do Contrato n. 1056/2009 (fls. 06/10). Sua participação na contratação também se deu por meio de encaminhamento de documentos à Secretaria Municipal de Planejamento, solicitando alteração orçamentária e abertura de crédito adicional suplementar (fls. 96, 142 e 148 do Processo n. REP 09/00697903, apensado aos presentes autos) para viabilizar a contratação.

Em suas alegações de defesa, o ex-Secretário afirma que assinou, de forma isolada, o Contrato n. 1056/2009, representando o titular da pasta e se limitando a aquiescer parecer jurídico com aparência de legalidade e constitucionalidade; que a ideia da contratação foi lançada pelo ex-Prefeito  Municipal, Sr. Dário Berger, e encampada pelo então Governador do Estado; que havia parecer do comitê Gestor, composto por autoridades municipais; e que o Termo de Inexigibilidade de Licitação havia sido anteriormente firmado pelo titular da pasta.

Cabe ressaltar que o ato administrativo é formado após a manifestação de diversas áreas da Administração Pública, cada qual com a sua responsabilidade. No presente caso, foi definida a responsabilidade solidária do titular da pasta à época e do ex-Prefeito, juntamente com o Sr. Aloysio Machado Filho e com os demais atores cuja conduta foi considerada lesiva ao erário, cada um deles em face dos atos que tenham praticado.

A assinatura do instrumento contratual não pode ser considerada como peça meramente decorativa, pois enseja a responsabilização pelos efeitos decorrentes do ato, conforme já decidiu o Tribunal de Contas da União[13]:

47. O fato de o responsável praticar ato abrangido em sua competência regimental, por si só, não torna o ato legal. A competência é apenas um dentre muitos requisitos necessários à legalidade do ato. Alegar que os processos eram encaminhados para o ordenador de despesas, após percorrerem toda a tramitação necessária, sob a orientação, condução e supervisão da Procuradoria Distrital, não exime a responsabilidade do ordenador. A participação de vários agentes é um método de controle amplamente utilizado, tanto no setor público quanto no privado. Conforme a importância de um ato ou decisão, maior o número de responsáveis chamados a participar da operação. Cada agente tem sua atuação específica e é responsável pela sua ação. Quem, de fato, autoriza os atos administrativos é quem os assina: sem assinatura do ordenador de despesas, não há gestão de recursos financeiros do órgão. Quem assina um documento é responsável pelos seus efeitos; se vários agentes colaboraram para a irregularidade, são solidariamente responsáveis. A assinatura do administrador público em contratos, convênios, empenhos, ordens bancárias, cheques e demais instrumentos de administração não é meramente decorativa; tem por função garantir a responsabilidade do assinante. O Sr. Francisco Campos de Oliveira tinha a obrigação funcional de zelar pelo processamento das despesas do Distrito, pois exercia a função comissionada de Chefe do 11.º DRF/DNER/MT. Tinha a responsabilidade legal de acompanhar os principais atos administrativos praticados no âmbito da sua jurisdição, em especial os relativos a indenização por desapropriação consensual de imóveis, que atingiram a marca de 41 processos instruídos e/ou pagos indevidamente. O Sr. Francisco Campos de Oliveira efetuou o pagamento por meio de Ordem Bancária de Pagamento (OBP), cujo tipo normalmente é emitido em situações emergenciais, atípicas, ou quando não é possível o depósito bancário, quase sempre envolvendo pequenos valores. Por meio da OBP, o beneficiário recebe diretamente no Caixa, em espécie. O valor pago, R$ 13.198,26, era elevado para passar despercebido pelo Sr. Chefe. Note-se que em grande parte dos processos irregulares o pagamento foi feito por OPB. Juntando-se isso ao depoimento de beneficiários de outros processos (exemplo a fls. 367/369 e a própria defesa dos beneficiários neste processo), fica claro o motivo de os pagamentos não serem depositados em conta corrente bancária: em dinheiro vivo, é mais fácil dividir o ganho e é mais difícil identificar os beneficiários reais. Por mais inocente ou ingênuo que fosse, por ser o ordenador de despesas, ele deveria ter investigado e justificado a causa de se utilizar tal meio de pagamento. Assim, afirmar que não tomava conhecimento dos laudos topográficos e de avaliações não depõe em seu favor. Quando deu andamento ao processo, o Sr. Francisco Campos de Oliveira, à época já com 37 anos de serviço no DNER (dos quais 32 como Engenheiro), deveria saber da responsabilidade de seu cargo e, principalmente, dos seus atos. Sua responsabilidade como gestor é pessoal e intransferível.

Quanto à alegação apresentada pelo Sr. Aloysio Machado Filho, de que seria leigo na esfera jurídica, possuindo formação na área de Educação Física, verifico que esta se demonstra inaceitável, pois, ao tomar posse no cargo de Secretário Adjunto, deveria estar ciente e preparado para as responsabilidades que assumiria. Nesse sentido, constato que o Sr. Aloysio agiu no mínimo com imprudência e imperícia, realizando ato de gestão que, como se demonstra no presente processo, gerou grave prejuízo aos cofres municipais. 

II.1.5.2.4. Sr. Dário Elias Berger e ao Sr. Augusto César Hinckel

O Sr. Dário Elias Berger, ex-Prefeito Municipal,  e o Sr. Augusto César Hinckel, ex-Secretário de Finanças, foram incluídos em face de terem sido responsáveis pelos pagamentos realizados à empresa Palco Sul Eventos Ltda., em virtude do Contrato n. 1056/2009.

Por meio do documento de fl. 1.081, pode-se constatar que os ex-gestores assinaram a ordem bancária n. 1329, de 20/11/2009, autorizando o Banco do Brasil a realizar o depósito na conta corrente da empresa Palco Sul Ltda., o que lhes coloca na condição de ordenadores de despesa.

Conforme dispõe o parágrafo primeiro do artigo 80 do DL 200/67, “Ordenador de despesa é toda e qualquer autoridade de cujos atos resultarem emissão de empenho, autorização de pagamento, suprimento ou dispêndio”.

Destaco que ao emitirem a ordem bancária, autorizando o pagamento da despesa, cabia aos ex-gestores verificar a legalidade do ato que estava sendo realizado.

 

Nesse sentido, ao tratar da responsabilidade do Ordenador de Despesas nas contratações administrativas, Jessé Torres Pereira Junior[14] ensina:

Ao ordenador de despesas incumbe verificar a lisura da documentação tendente a liberar o pagamento, ou seja, previamente à autorização para pagar deverá verificar sua correção. Aposta a assinatura, passa ele a responder pelo ato praticado, caso venha a configurar-se irregular.

E ainda:

A função do ordenador de despesas, à luz das disposições do Dec.-lei nº 200/67 e do Dec. nº 93.872/86, não está adstrita ao mero acatamento ou acolhimento das solicitações de outras instâncias administrativas, devendo exercer um verdadeiro controle quanto à regularidade e à legalidade da despesa pública.

No presente caso, nem o contrato firmado com a empresa Palco Sul e nem a proposta encaminhada pela empresa, que servia como anexo ao contrato, sequer estabeleciam a data em que a árvore de natal deveria ser montada ou mesmo o período em que deveria permanecer montada. Não havia justificativa do preço contratado e nem garantias à execução contratual. Ou seja, os documentos de suporte à despesa eram visivelmente frágeis.

Sabe-se, pelas notícias veiculadas pela imprensa na época, que a árvore foi inaugurada na Beira-Mar Norte em 06/12/2009, mas, repita-se, pelos documentos que constam do processo de inexigibilidade não se pode extrair sequer o período em que esta deveria permanecer instalada.

Em sua última manifestação o Sr. Augusto Cézar Hinckel fez referência ao Acórdão n. 0789/2016, exarado no processo n. REC 15/00547341, relativo ao processo n. TCE 09/00654848, que tratou da contratação do maestro Andrea Bocelli, realizada na mesma época da contratação sob exame (fls. 1269 a 1249). Asseverou que sua responsabilidade foi excluída naquele processo, no qual foi analisado o recurso de Embargos de Declaração, e requereu que os mesmos critérios sejam novamente aplicados no presente processo, tendo em vista a semelhança do contexto e dos atos por ele praticados.

O Relator do processo n. REC 15/00547341, Conselheiro Luiz Eduardo Cherem, sustentou o afastamento da responsabilização do Sr. Augusto Cézar Hinckel sob o argumento de que o pagamento foi feito antes da publicação da decisão do Secretário Municipal de cancelar o show do maestro Andrea Bocelli e de que é comum que pagamentos de artistas de renome sejam feitos antecipadamente.

Entretanto, este não é o caso dos presentes autos, pois a contratação sob exame não se refere à artista de renome. Ademais, o pagamento antecipado - uma semana após o contrato ter sido assinado, antes da árvore de natal ter sido montada - foi efetuado de forma temerária, isto é, sem que houvesse uma data estabelecida para a montagem do empreendimento, sem que tenha sido prestada qualquer garantia da execução contratual, conforme exigido pelo artigo 56 da Lei n. 8.666/93, sem que tivesse sido apresentada justificativa do preço contratado, e com documentos de suporte visivelmente frágeis.

Por certo que o cancelamento do contrato não se deu por ato do ex-Secretário Augusto Cézar Hinckel, porém diante de sua omissão na análise dos documentos de suporte da despesa este concorreu para o prejuízo que foi suportado pelo Município. Não houve a diligência necessária frente a despesa que se estava consumando. Acrescento que não se tratava de uma despesa ordinária, corriqueira, o que demandava maior diligência por parte do responsável.

Reitero que a assinatura das ordens bancárias não tem apenas caráter formal e torna os gestores co-responsáveis pelas consequências advindas dos atos praticados, devendo ter havido a verificação da regularidade dos pagamentos que eram autorizados.

Acrescento ainda que o Sr. Dário Elias Berger era o ordenador originário de despesas do Município e que a delegação de determinadas atribuições não o exime de suas responsabilidades como chefe do Poder Executivo Municipal, que tinha o dever de adotar os cuidados necessários para evitar a ocorrência de ilegalidades.

Além disso, o Sr. Dário Elias Berger participou ativamente da contratação da empresa Palco Sul, após ter sido apresentado o Projeto do Natal de 2009 de Florianópolis ao governo estadual no intuito de obter recursos financeiros para o referido evento. O ex-Prefeito sabia das negociações com a empresa Beyondcomm e posteriormente com a empresa Palco Sul e, assim, participou do arranjo que levou à contratação desta última em detrimento de ser realizada uma licitação. Não se tratou de um ato corriqueiro, de menor relevância, que não tenha contado com a sua participação.

Acrescento, por fim, que conforme jurisprudência pacífica do Tribunal de Contas da União (TCU) a responsabilização em face da ocorrência de dano ao erário se dá tanto nos casos em que se constata o dolo ou a culpa do agente público.

O processo n. TC 006.310/2006-0, que teve como Relator o Ministro Augusto Sherman Cavalcanti, tratou de Incidente de Uniformização de Jurisprudência relativo, entre outros aspectos, à culpa como elemento necessário à responsabilização por dano ao erário ocorrido na gestão pública. Extrai-se da manifestação do MP/TCU, chancelada no voto proferido pelo Relator, que resultou no Acórdão n. 2763-43/11:

- V -

DA CULPA COMO ELEMENTO NECESSÁRIO À RESPONSABILIZAÇÃO POR DANO AO ERÁRIO OCORRIDO NA GESTÃO PÚBLICA

Assentadas as bases constitucionais da jurisdição especial de contas do TCU, a qual vem sendo exercida em sede do procedimento da tomada de contas especial, passo a me ocupar, então, do esclarecimento de como se opera a responsabilização pelo dano ao erário. Isso, evidentemente, equivale a perquirir e apontar o suporte normativo para o estabelecimento daquilo que é determinante para a imputação de responsabilidade na TCE. Nas linhas que se seguem, tentarei fazer ver que esse procurado suporte normativo encontra-se, em verdade, incrustrado no já referido artigo 71, inciso II, parte final, da Constituição Federal.

Esse dispositivo, ao fixar a competência do TCU para julgar contas em razão das específicas ou especiais ocorrências de ‘perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário público’, estabelece que as contas que nele se consideram são as dos que ‘derem causa’ às referidas ocorrências lesivas ao erário. Isso deixa patente que somente há que se falar em levantamento e em julgamento de contas em decorrência de dano ao erário contra aquele que, atuando na gestão pública, tenha dado causa àquele dano.

 E esse dano, para fins de responsabilização, deve ter decorrido de conduta culposa do agente, conforme jurisprudência pacífica da Corte de Contas. É que a responsabilidade objetiva situa-se em seara de exceção, que se dá quando a lei estabelece a responsabilidade independentemente de culpa, a exemplo da responsabilidade do Estado, prevista no § 6º do artigo 37 da Constituição Federal.

 A responsabilização de gestor público por dano causado ao erário, portanto, somente tem lugar se restar comprovado um aspecto subjetivo da atuação do gestor, ou seja, se restar comprovado que o gestor agiu com culpa, considerando-se este conceito jurídico em seu sentido amplo, o qual compreende a culpa strictu sensu, caracterizada por negligência, imprudência ou imperícia, e o dolo.

Nesse sentido diversos acórdão do TCU:

Acórdão 635/2017 - Plenário

TOMADA DE CONTAS ESPECIAL. DESVIO DE RECURSOS MEDIANTE A ELABORAÇÃO DE DOCUMENTOS FALSOS DE PAGAMENTO DE INATIVOS E PENSIONISTAS E EMISSÃO DAS RESPECTIVAS ORDENS BANCÁRIAS POR PARTE DE SERVIDORES DO COMANDO DA 1º REGIÃO MILITAR. CONTAS IRREGULARES. RECURSO DE RECONSIDERAÇÃO. CONHECIMENTO. NEGATIVA DE PROVIMENTO.

responsabilidade dos jurisdicionados perante o TCU é de natureza subjetiva, caracterizada mediante a presença de simples culpa stricto sensu, sendo desnecessária a caracterização de conduta dolosa ou má-fé do gestor para que este seja responsabilizado. Desse modo, é suficiente a quantificação do dano, a identificação da conduta do responsável que caracterize sua culpa, seja por imprudência, imperícia ou negligência, e a demonstração do nexo de causalidade entre a conduta culposa (stricto sensu) e a irregularidade que ocasionou o dano ao erário.

 

Acórdão 6211-35/15-1 - TCU

GRUPO I –  CLASSE I – Primeira Câmara - TC 028.835/2010-7

TOMADA DE CONTAS ESPECIAL. FNDE. PROGRAMA FEDERAL DE ASSISTÊNCIA À EDUCAÇÃO. AUSÊNCIA DE COMPROVANTES DE DESPESAS. REVELIA. CONTAS IRREGULARES. DÉBITO. MULTA. RECURSO DE RECONSIDERAÇÃO DO EX-PREFEITO. CONHECIMENTO. RAZÕES INSUFICIENTES PARA ALTERAÇÃO DO JUÍZO. NÃO PROVIMENTO.

[...]

7.8.   Sobre a culpabilidade do recorrente, que alega não ter havido dolo na gestão dos recursos públicos, verifica-se, no caso, que a responsabilização decorreu de conduta culposa (culpa em sentido estrito). Como se sabe, o TCU perscruta a responsabilidade subjetiva dos agentes públicos que vem a ser aquela resultante de dano decorrente de ato em que está presente pelo menos um dos elementos da   culpa  lato sensu (dolo ou culpa stricto sensu).  A culpa estrito senso (mera culpa) advém da violação de um dever jurídico por negligência, imperícia ou imprudência). A esta são atribuídas várias espécies, a exemplo da ‘culpa contra legalidade’. Na situação em apreço, pode-se afirmar que se configurou a culpa contra legalidade porque o dano ao erário resultou da violação de obrigação imposta em resoluções do FNDE (peça 1, p. 6). 

A responsabilidade nos processos dos tribunais de contas se origina de conduta comissiva ou omissiva do agente, dolosa ou culposa, cujo resultado seja a violação dos deveres impostos pelo regime de direito público aplicável àqueles que administram recursos do Estado ou ainda aos que, sem deter essa condição, causarem prejuízo aos cofres públicos.

Para fins de ressarcimento, pouco importa se a irregularidade foi praticada com dolo ou culpa. Não há diferença alguma, exatamente como ocorre no Direito Civil: o responsável deverá recompor o dano que causou à Fazenda Pública, independentemente de ter agido com a deliberada intenção de lesar o patrimônio público ou com falta de cuidado.

Sendo assim, constatados os liames ensejadores da responsabilidade do Sr. Dário Elias Berger e do Sr. Augusto César Hinckel nos atos que determinaram a ocorrência de dano ao erário da Prefeitura Municipal de Florianópolis, ratifico a sua responsabilização solidária.

 

II.1.5.2.5. Pressupostos da responsabilização solidária

A responsabilização solidária dos agentes públicos e da empresa contratada tem fundamento no artigo 1º, inciso III, artigo 6º, inciso II, e, especialmente, no artigo 18, inciso III, § 2º, alínea "b", da Lei Complementar (estadual) n. 202/2000, in verbis:

Art. 18. As contas serão julgadas:

[...]

III - irregulares, quando comprovada qualquer das seguintes ocorrências:

a) omissão no dever de prestar contas;

b) prática de ato de gestão ilegítimo ou antieconômico, ou grave infração à norma legal ou regulamentar de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional ou patrimonial;

c) dano ao erário decorrente de ato de gestão ilegítimo ou antieconômico injustificado; e

d) desfalque, desvio de dinheiro, bens ou valores públicos.

§ 2º. Nas hipóteses do inciso III, alíneas c e d, deste artigo, o Tribunal, ao julgar irregulares as contas, fixará a responsabilidade solidária:

a) do agente público que praticou ato irregular e

b) do terceiro que, como contratante ou parte interessada na prática do mesmo ato, de qualquer modo, haja concorrido para a ocorrência do dano apurado. (grifou-se)

Ressalto que a responsabilidade solidária dos ex-gestores e da empresa contratada ficou definida nas Decisões Plenárias n. 4557/2010 e n. 320/2015 e decorre do fato de que tanto a empresa contratada quanto os agentes públicos já mencionados concorreram para a ocorrência de dano ao erário.

Passo, a seguir, a tratar de cada uma das irregularidades passíveis de aplicação de multa, nos termos das Decisões n. 4557/2010 e n. 320/2015.

 

II.2. Irregularidades passíveis de aplicação de multa:

II.2.1. Descumprimento dos incisos II e III do parágrafo único do art. 26 da Lei n. 8.666/93, aplicáveis ao processo de Inexigibilidade de Licitação n. 519/2009 (item 2.2.2 do Relatório DLC).

Por meio do Relatório n. 300/2009, a DLC apontou que a razão da escolha do fornecedor ou executante foi insuficientemente demonstrada, em desacordo com o inciso II do parágrafo único do artigo 26 da Lei n. 8.666/93, que assim dispõe:

Lei n. 8.666/93

Art. 26. As dispensas previstas nos §§ 2º e 4º do art. 17 e no inciso III e seguintes do art. 24, as situações de inexigibilidade referidas no art. 25, necessariamente justificadas, e o retardamento previsto no final do parágrafo único do art. 8º desta Lei deverão ser comunicados, dentro de 3 (três) dias, à autoridade superior, para ratificação e publicação na imprensa oficial, no prazo de 5 (cinco) dias, como condição para a eficácia dos atos. (Redação dada pelo(a) Lei 11.107/2005)

Parágrafo único. O processo de dispensa, de inexigibilidade ou de retardamento, previsto neste artigo, será instruído, no que couber, com os seguintes elementos:

[...]

II - razão da escolha do fornecedor ou executante;

De acordo com a DLC, não se observam nos autos as razões da contratação da empresa Palco Sul, tendo sido informado pela Prefeitura Municipal somente que havia recebido proposta da referida empresa e que a competição era inviável.

Foi apontado também pela Diretoria Técnica que foi juntada aos autos somente a proposta financeira da empresa (fl. 16), apresentada em termos genéricos, sem que fosse especificado/detalhado cada serviço a ser prestado e o valor correspondente, tendo esta proposta sido acatada pela Administração sem que tivessem sido comprovados a razoabilidade dos preços e a sua adequação ao mercado, configurando afronta ao inciso III do parágrafo único do artigo 26 da Lei n. 8.666/93, que assim dispõe:

Lei n. 8.666/93

Art. 26. As dispensas previstas nos §§ 2º e 4º do art. 17 e no inciso III e seguintes do art. 24, as situações de inexigibilidade referidas no art. 25, necessariamente justificadas, e o retardamento previsto no final do parágrafo único do art. 8º desta Lei deverão ser comunicados, dentro de 3 (três) dias, à autoridade superior, para ratificação e publicação na imprensa oficial, no prazo de 5 (cinco) dias, como condição para a eficácia dos atos. (Redação dada pelo(a) Lei 11.107/2005)

Parágrafo único. O processo de dispensa, de inexigibilidade ou de retardamento, previsto neste artigo, será instruído, no que couber, com os seguintes elementos:

[...]

III - justificativa do preço.

A DLC destacou os seguintes excertos da defesa, que tratam da ausência da justificativa da escolha da contratada, que seguem transcritos por esta Relatora:

[...] 44. A empresa, diz o Termo de exigibilidade a fls. 58, desenvolverá o projeto promovendo a exibição do conteúdo em LED's e sua integração com a introdução de imagens interativas e pontos remotos.

45. A "árvore", em suma, transformaria a decoração do Natal da cidade "em um dos maiores painéis interativos de WEB 2.0 do mundo".

46. Adiante, diz o mesmo documento que a inexigibilidade de licitação ocorre quando impossível promover-se a competição, pois um dos que oferece seus serviços reúne qualidades que o tornam único, exclusivo, sui generis, inibindo outros participantes.

47. O colendo Tribunal de Contas do Paraná, acentuou o termo em causa, assentou no processo 4707.0200/93-5 que "os casos de inexigibilidade não se exaurem nas disposições legais, as quais consignam apenas a título de exemplo algumas situações.

48. Lapidar, por fim, a definição do notável Hely Lopes Meirelles ("Direito Administrativo Brasileiro", 26a Ed., Malheiros, p. 266):

"Ocorre a inexigibilidade de licitação quando há impossibilidade jurídica de competição entre contratantes, quer pela natureza específica do negócio, quer pelos objetivos sociais visados pela Administração".

Por meio do Relatório n. 172/2011, a DLC conclui que as argumentações apresentadas justificam a “escolha do objeto da inexigibilidade, e não a escolha do fornecedor ou executante do serviço, conforme prescreve o art. 26, §único, II, da Lei n. 8.666/93”.

Por meio do Parecer n. 2624/2011, o MPTC se manifestou pela irregularidade do ato, em razão da ausência das razões de escolha da empresa contratada e da justificativa do preço.

O Ministério Público de Contas alerta que: “Houvesse o administrador público dado a devida importância à exigência em questão, eventuais sobrepreços poderiam ser detectados na fase procedimental sob análise”.

Ao analisar os autos, destaco inicialmente que o relato de como ocorreu a contratação da empresa Palco Sul demonstra que não foi realizada qualquer consulta ou verificação acerca da razoabilidade do preço avençado por meio do Contrato n. 1056/2009 e que a razão da escolha da contratada foi a apresentação de uma “proposta comercial” à Prefeitura, que, ao adotá-la como sendo o termo para a contratação, deixou de lado a supremacia do interesse público.

Sendo assim, verifico que no processo em epígrafe foi caracterizado o descumprimento dos incisos II e III do artigo 26 da Lei n. 8.666/93, que dizem respeito à razão da escolha da empresa e à justificativa do preço contratado.

II.2.2. Ausência de elementos que demonstrem a qualificação técnica da empresa contratada para a execução do objeto, em detrimento do art. 30 da Lei n. 8.666/93 (item 2.2.3 do Relatório DLC).

Consta do Relatório DLC n. 300/2009 que não foram apresentados quaisquer elementos que demonstrassem a aptidão da empresa para executar o objeto contratual, seja pela demonstração de possuir profissionais capacitados para tanto, seja pela realização anterior de serviços similares, sendo que nem sequer foi juntada a Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) dos projetos.

Em sua análise, a DLC conclui que a empresa Palco Sul não possuía a capacidade técnica necessária para a execução do objeto, valendo-se da subcontratação para executar os serviços contratados.

Nesse ponto, foram destacados pela DLC os seguintes itens constantes das alegações de defesa apresentadas pelo Sr. Mário Roberto Cavallazzi (fls. 917 a 946):

[...] a fls. 173, declaração do ilustre Secretário de Turismo de Florianópolis, de 20.12.2007, atestando que a aludida empresa montou, para o Natal de 2002, um palco coberto de 16 x 14 x 9 metros, com dois andares, em alumínio, para comportar 5 camarins; 50 grades de proteção; 50 metros de barricada e uma torre com 6 metros de altura, etc., para realização de evento artístico denominado Reveillon, para o período de 26.12.2002 a 02.01.2003; [...]

52.  Inexistindo órgão específico para expedição de atestados da espécie, os acima referidos mostram-se exaustivamente suficientes para evidenciar a capacidade técnica da empresa Palco Sul para montagem e operação da árvore objeto do contrato em questão.

[...] 56. Não tendo havido objeções ou ressalvas para a contratação, a SETUR, cumprido o rito administrativo estabelecido em face não só do reconhecimento da exclusividade para a montagem da árvore com suas características, como pelo caráter essencialmente artístico exigido para a instalação da árvore, como acentuado no parecer da Assessora Jurídica da SETUR, celebrou o contrato de fls. 06/10, pelo Secretário-Adjunto da pasta.

57. Não são Mário Cavalazzi ou Aloysio Machado Filho, contudo, os responsáveis pela não observância da qualificação econômico-financeira da empresa.

58. A competência pela condução e análise documental nas compras e contratações da PMF é da DLCC. Não pretende o requerente transferir responsabilidades para terceiros, mas igualmente não é lícito imputar-lhe falhas ou omissões por atos que não se inseriam no seu âmbito de atividades funcionais.

59. Ao requerente Mário Cavallazzi foi ordenada a condução dos atos necessários á realização do espetáculo, tarefa de que se desincumbiu em todos os trâmites de sua competência e ao final, sem qualquer alerta de possível irregularidade, concluiu a contratação.

60. Não há como atribuir-lhe qualquer ato intencional de descumprir a lei, de privilegiar alguém ou alguma empresa ou de conduzir a realização do Projeto de Final de Ano isoladamente e, principalmente, sem obediência às determinações do Prefeito Municipal.

61. O Projeto era da Prefeitura e não da SETUR ou do Secretário Mário Cavallazzi, mas de todos os órgãos que direta ou indiretamente deveriam participar de sua execução. E tais órgãos foram de fato acionados e tiveram, além da interveniência necessária, livre e total acesso a todas as reuniões, discussões e contratações, sem que houvesse qualquer manifestação objetando os atos do então Secretário, inclusive por parte da Procuradoria-Municipal. [...]

64. Com o contrato em causa, não houve exceção, isto é, o ora requerente, Mário Cavallazzi, como Secretário da pasta de Turismo, seguiu o trâmite administrativo, não realizando nenhum pagamento ou determinando qualquer ordem de pagamento, que estivesse fora de suas atribuições funcionais.

65. O pagamento de R$ 540.000,00, uma das parcelas do empenho n° 12606, foi autorizado pelo Prefeito Municipal e pelo Secretário de Finanças, sem qualquer participação do Secretário de Turismo, o ora requerente”.

Em sua análise (Relatório DLC n. 172/2011), a DLC verifica que os documentos aos quais se referiu o Sr. Mário Roberto Cavallazzi não atendem ao que dispõe o parágrafo 1º do artigo 30 da Lei n. 8.666/93, tendo em vista que “[...] não foram emitidos por pessoas jurídicas de direito público ou privado, devidamente registrados nas entidades profissionais competentes”, além de referirem-se apenas a parte do objeto contratual, não possuindo, intrinsecamente, a mesma natureza.

Destaco do Parecer n. 2624/2011, exarado pelo MPTC:

[...]

Aos atestados de experiência profissional “genéricos” e às subcontratações levadas a efeito acresça-se o fato que a altura da árvore se apresentou inferior à contratada, de modo que a ausência de qualificação técnica da empresa efetivamente contribuiu para o resultado obtido.

Por tais razões o ato é irregular.

Sendo assim e considerando que foi demonstrado que a execução do objeto do Contrato n. 1056/2009 foi praticamente toda subcontratada pela empresa Palco Sul, é lícito se constatar que referida empresa não possuía qualificação técnica para executá-lo, o que fere o artigo 30 da Lei n. 8.666/93.

II.2.3. Ausência de projeto básico do objeto e orçamento detalhado em planilhas que expressem a composição de todos os seus custos unitários, nos termos do art. 7º § 2º, I e II, c/c § 9º, da Lei n. 8.666/93 (item 2.2.4 do Relatório DLC).

De acordo com o Relatório DLC n. 300/2009, não constam dos autos o projeto básico acompanhado do orçamento detalhado que permitam caracterizar o serviço e apurar seus custos, como prevê o artigo 7º, §2º, I e II, c/c §9º da Lei n. 8.666/93, que assim dispõe:

Lei n. 8.666/93

Art. 7º As licitações para a execução de obras e para a prestação de serviços obedecerão aos disposto neste artigo e, em particular, à seguinte seqüência:

[...]

§ 2º As obras e os serviços somente poderão ser licitados quando:

I - houver projeto básico aprovado pela autoridade competente e disponível para exame dos interessados em participar do processo licitatório;

II - existir orçamento detalhado em planilhas que expressem a composição de todos os seus custos unitários;

[...]

§ 9º O disposto neste artigo aplica-se também, no que couber, aos casos de dispensa e de inexigibilidade de licitação.

Destaca-se do Relatório elaborado pela DLC: “[...] Nesse sentido, por exemplo, cabe atentar que a árvore é locada de outra empresa, como declarado no documento de fls. 53/54. Porém, o objeto do contrato prevê também a sua criação (e a respectiva remuneração, conforme item 4.1 do instrumento contratual[15]) que, pelo teor do referido documento, não se fez necessária”.

Após a apresentação de justificativas pelo Sr. Mário Roberto Cavallazzi (fls. 917 a 946), a DLC destacou os seguintes trechos da defesa:

[...] 68. A fls. 209/216 está o contrato de locação de bens móveis e serviços especializados, no importe de R$ 800.000,00, entre a Feeling Eventos, sediada em Santo André-SP, e a Palco Sul, para montagem e locação do Sistema Estrutural Especial em Alumínio que compõe a "Árvore de Natal de Florianópolis" no ano de 2009. Vide declaração de exclusividade a fls. 53/54.

69. O valor de R$ 800 mil, conforme a cláusula terceira, ajustou-se para pagamento em três parcelas, a primeira de R$ 250 mil, em 18.11.2009; a segunda, de R$ 375 mil, para 02.12.2009; e a terceira e última, de R$ 175 mil, com vencimento para 15.12.2009.70. A fls. 217, o comprovante de remessa, pela Palco Sul à Feeling, da primeira parcela, de R$ 250 mil, via Banco do Brasil, em 23.11.2009, como "pagamento de fornecedores".

71. A fls. 218/225, o contrato entre a Palco Sul e a empresa ON Projeções, referente à locação de sistema eletrônico audiovisual para revestimento da Árvore de Natal, formado por clusters de LED (light emitting diode), para instalação na Av. Beira Mar Norte, em Florianópolis, ao custo de R$ 896.700,00, sendo R$ 800.000,00 a título de locação e R$ 96.700,00 pelo serviço de disponibilização do sistema audiovisual (cláusula quarta - Do preço e condições de pagamento). [...]

73.A fls. 226, o comprovante de remessa, pela empresa Palco Sul à ON Projeções, em 23.11.2009, da quantia de R$ 250.000,00, via banco Itaú.

74.Constata-se, pois, que a montagem do palco de apresentação do Maestro Andrea Bocelli e da "árvore" de Natal era um trabalho complexo, exigindo componentes de natureza diversa, que não poderiam, antes da definição do preço de cada um deles pelas empresas que os executariam, ser quantificados com precisão. Essa quantificação só pôde ser definida após a contratação específica de cada um desses componentes, o que se fez parte com a Feeling Eventos e parte com a ON Projeções, cujos valores, em linhas gerais, diferem muito pouco daqueles orçados a fls. 16”.

De acordo com a DLC, a defesa apresentada pelo Sr. Mário Roberto Cavallazzi, especialmente quando afirma que “[...] a quantificação só pôde ser definida após a contratação específica de cada um desses componentes”, demonstra que permanece ausente no processo o projeto básico, impossibilitando a correta caracterização do serviço contratado e a apuração dos seus custos, em desacordo com o artigo 7º, §2º, I e II, c/c o §9º, da Lei n. 8.666/93.

Em seu parecer (2624/2011), o MPTC assevera que:

[...]

Não consta dos autos qualquer documento apto a demonstrar ter a Administração elaborado projeto básico e orçamento detalhado, com a finalidade de deflagrar o procedimento licitatório.

De outro lado, os autos noticiam insucesso na obtenção do objeto pretendido, atraso de pagamento a fornecedor, controvérsias e litígios por resolver, denotando falta de planejamento adequado quando da fase interna do procedimento licitatório.

Por tais motivos, a restrição deve se traduzir em sanção aos responsáveis.

Ao analisar os autos, verifico que a planilha apresentada pela empresa Palco Sul (fl. 16) não permite que sejam verificados com clareza os itens que compõem os custos unitários da contratação, até mesmo para verificar a sua compatibilidade com os preços praticados no mercado.

Ressalto ainda que o projeto básico deve conter os elementos necessários, suficientes e precisos para caracterizar o serviço contratado (artigo 6º, IX, da Lei n. 8.666/93), o que não se verifica nos presentes autos.

Por fim, destaco que a obrigatoriedade de serem apresentados o projeto básico e o orçamento detalhado em planilhas estende-se também aos casos de inexigibilidade de licitação, conforme dispõe o parágrafo 9º do artigo 7º da Lei n. 8.666/93.

Diante do exposto, acato a manifestação da DLC pela manutenção do apontamento original, pois não foi apresentado projeto básico nem foi demonstrada a composição dos custos unitários da contratação, em desacordo com o artigo 7º, I e II c/c o §9º, da Lei n. 8.666/93.

II.2.4. Ausência do regime de execução do objeto, nos termos do art. 40, caput, e 55, II, da Lei n. 8.666/93 (item 2.2.5 do Relatório DLC).

Segundo o Relatório DLC n. 300/2009, o regime de execução não consta do processo de inexigibilidade de licitação, tendo sido fixadas quatro datas para os pagamentos (entre 18/11/2009 e 1º/01/2012), mas sem ter sido definido de que forma seriam prestados os serviços, tornando inviável verificar se o pagamento se daria por preços unitários, ou a cada etapa concluída, ou se dependeria da execução total do objeto.

Ao reanalisar os autos (Relatório n. 172/2011), a DLC destacou o seguinte trecho das alegações de defesa apresentadas pelo Sr. Mário Roberto Cavallazzi (fls. 917 a 946):

[...] 75.Como referido no item 58, supra, não é da responsabilidade da SETUR os contratos de serviços ou obras que executa, sendo essa tarefa de competência da DLCC. Também aqui cabe referir que não pretende o requerente transferir responsabilidade para terceiros, mas não há, evidentemente, como ser responsabilizado por eventuais falhas de outras pessoas ou órgãos, no âmbito da administração municipal.

Ainda por meio do Relatório n. 172/2011, a DLC reiterou a responsabilidade dos Srs. Mário Roberto Cavallazzi e Aloysio Machado Filho, decorrente do encaminhamento do processo de Inexigibilidade de Licitação n. 519/2009 e da realização do Contrato n. 1056/2009.

Por meio do Parecer n. 2624/2011, o MPTC assim se manifesta:

[...]

Como se vê, a indicação do regime de execução do objeto é elemento fundamental nos editais e nos contratos, por definir como a licitante/contratada executará sua obrigação e, ainda, por ter implicação direta na determinação dos direitos, deveres e garantias das partes contratantes.

Ora, como vai se exigir o cumprimento de uma obrigação contratual se não tem clareza acerca do modo de sua execução? E mais, como preservar os interesses da administração sem tal definição?

Assim, premente a responsabilização pela ausência de previsão do regime de execução a ser aplicado aos serviços contratados.

Analisando novamente os autos, reitero que não foi definido no Contrato n. 1056/2009 o regime de execução, em especial se a empreitada se deu por preço global ou por preço unitário, o que interfere no recebimento dos serviços, nos pagamentos e na declaração de inadimplência contratual.

Conforme ensina Marcos Juruena Villela Souto (p. 280):

[...] se a empreitada é por preço global, ainda que as partes ajustem o pagamento em parcelas, com medições do que já foi executado, o preço é fixo. Daí só ser admitida a empreitada por preço global se houver projeto executivo completo, com caracterização da obra e quantificação precisa dos seus custos, permitindo a formulação de proposta com preços definitivos para o empreendimento concluído. O parcelamento do pagamento não descaracteriza o preço global. (Lump-Sum ou marché a forfait)”.

Nesse sentido, acato a manifestação da DLC pela manutenção da irregularidade apontada inicialmente, tendo em vista que ficou demonstrada a ausência do regime de execução do objeto, contrariando o artigo 40, caput, e 55, II, da Lei n. 8.666/93.

II.2.5. Realização de contratação por inexigibilidade de licitação com previsão de captação de recursos da iniciativa privada para custear o objeto, em desacordo com o disposto no art. 7°, § 3°, da Lei n. 8.666/93 (item 2.2.6 do Relatório DMU).

Tendo em vista a divulgação de que haveria recursos privados custeando a árvore de natal objeto do Contrato n. 1056/2009 e a inclusão de cláusula contratual que dispunha que poderiam ser comercializadas cotas de patrocínio, a DLC (Relatório n. 300/2009) solicitou que fosse demonstrada a origem dos recursos que custeariam as despesas com o referido contrato, considerando ainda o teor do §3º do artigo 7º da Lei n. 8.666/93, de acordo com o qual:

Lei n. 8.666/93

Art. 7º As licitações para a execução de obras e para a prestação de serviços obedecerão ao disposto neste artigo e, em particular, à seguinte seqüência:

[...]

§ 3º É vedado incluir no objeto da licitação a obtenção de recursos financeiros para sua execução, qualquer que seja a origem, exceto nos casos de empreendimentos executados e explorados sob o regime de concessão, nos termos da legislação específica.

Nesse ponto, foram destacados pela DLC os seguintes itens constantes das alegações de defesa apresentadas pelo Sr. Mário Roberto Cavallazzi (fls. 917 a 946):

[...] A possibilidade de captação de recursos da junto à iniciativa privada chegou a ser pensada, mas na execução do projeto dela não mais se cogitou, uma vez que os recursos do FUNTURISMO, por deliberação tomada pelo então Governador do Estado, Secretário Estadual de Turismo e o Prefeito Municipal, respaldariam grande parte das despesas respectivas.

77. A irregularidade, portanto, não se consumou.

Em sua análise (Relatório n. 172/2009), a DLC destaca que “[...] é irrelevante o fato de não ter ocorrido o ingresso dos recursos privados, pois a irregularidade se consumou com a previsão contratual da captação de recursos junto à iniciativa privada (ver Contrato n. 1056/2009, Cláusula Quarta, item 4.1.4)”.

Em seu Parecer n. 2624/2011, o representante do MPTC destaca que constam dos autos diversas provas que demonstram a intenção de comercializar cotas de patrocínio para custear produtos relacionados ao Contrato n. 1056/2009, as quais haviam sido previstas nas Cláusulas 4.1.4 a 4.1.6, e que a captação de recursos certamente não ocorreu em virtude das proporções que o caso tomou.

Após transcrever o conteúdo dos parágrafos 2º e 3º do artigo 7º da Lei n. 8.666/93, o Procurador afirma:

Veja-se que o legislador foi abrangente: no § 2º, acima transcrito, estabeleceu a necessidade de previsão de recursos orçamentários para assegurar o pagamento de obras e serviços adquiridos pela administração, e no § 3º, expressamente vedou a possibilidade de obtenção de recursos de outra origem.

Mais importante: a vedação da norma refere-se à simples inclusão no objeto da licitação de obtenção de recursos financeiros provenientes de outras fontes que não o orçamento.

Portanto, não se exige para a confirmação da irregularidade, que a arrecadação dos recursos se concretize, bastando a previsão editalícia/contratual.

Ainda segundo o parecer do MPTC, “[...] eventual aporte de recursos pela empresa contratada importaria em nova contratação sem licitação pela Prefeitura, fora das hipóteses legais para dispensa/inexigibilidade”.

Analisando os autos, verifico que, de fato, conforme asseveraram a DLC e o MPTC, a previsão contida nas Cláusulas 4.1.4 a 4.1.6 do Contrato n. 1056/2009, abaixo transcritas, viola o conteúdo do artigo 7º, §§ 2º e 3º, da Lei n. 8.666/93.

Contrato n. 1056/2009

[...]

4.1.4 Além dos recursos previstos na alínea 4, poderão ser comercializadas cotas de patrocínios para subsidiar produtos adjacentes ao evento objeto deste contrato e constantes do projeto global de festividades de final de ano em Florianópolis, qual seja, Natal e réveillon dos Sonhos/09.

4.1.5 caberá exclusivamente à CONTRATANTE, ou a quem por ela seja outorgado poderes expressos e específicos, a prerrogativa de apresentação, comercialização e gestão das referidas cotas.

4.1.6 As cotas poderão ser adquiridas pela iniciativa privada, por um único patrocinador ou divididas entre patrocinadores.

A previsão da obtenção de recursos de origem diversa do orçamento público para custear as despesas contratuais, verificada no Contrato n. 1056/2009, foi expressamente vedada pelo §3º do artigo 7º da Lei n. 8.666/93.

Quanto às justificativas apresentadas pelo Sr. Mário Roberto Cavallazzi, verifico que não têm o condão de elidir o apontamento feito por esta Corte de Contas, pois a irregularidade em comento diz respeito à inclusão, no objeto da licitação, da previsão de obtenção de recursos financeiros para sua execução, fato que se confirmou diante da inclusão das Cláusulas 4.1.4 a 4.1.6 do Contrato n. 1056/2009.

II.2.6. Divergência entre a altura da árvore de natal que foi prevista no contrato (60 metros) e a efetivamente executada (máximo de 46 metros), demonstrando que não foram observadas as especificidades do edital e do Contrato n. 1056/2009, contrariando o art. 66 da Lei (federal) n. 8.666/93 e ensejando a aplicação dos arts. 77 e 78 da Lei (federal) n. 8.666/93 (item 2.2.7 do Relatório DMU).

A presente irregularidade já foi tratada como fundamento para a proposta de imputação de débito, razão pela qual se propõe o seu afastamento, evitando assim a ocorrência de bis in idem.

II.2.7. Abertura de crédito adicional especial no valor de R$ 13.000.000,00 (Treze milhões de reais) em desacordo com o artigo 42 da Lei n. 4.320/64 e com o artigo 167, V e VI, da Constituição Federal.

A irregularidade a seguir descrita foi imputada ao Sr. Dário Elias Berger, Prefeito Municipal de Florianópolis, sendo passível de aplicação de multa.

A presente irregularidade foi noticiada a esta Corte de Contas por meio de representação, apresentada nos termos do artigo 66 da LC n. 202/00, que deu origem ao Processo REP n. 09/00697903, apenso aos presentes autos.

Foi apontado no Relatório DLC n. 311/2009 (fls. 23/31 do Processo REP n. 09/00697903) que o município de Florianópolis abriu crédito adicional especial no valor de R$ 13.000.000,00 (Treze milhões de reais), através do Decreto n. 7.593/09, tendo sido anulado montante equivalente em outras dotações.

Devidamente citado, o Sr. Dário Elias Berger apresentou suas justificativas por meio dos documentos de fls. 52/187 do Processo REP n. 09/00697903, das quais se destaca que o procedimento adotado estava amparado na Lei Orçamentária de 2009 (Lei Municipal n. 7.791/2008), em especial em seus artigos 28, 32, 36 e 37, que assim dispõem:

Lei Municipal n. 7.791/2008

Art. 28. As dotações orçamentárias provenientes de recursos vinculados ou de convênios com saldos insuficientes, ou ainda não previstas no orçamento, serão adequadas às necessidades, com aberturas de créditos adicionais suplementares, criando novas fontes de Recursos e os elementos de despesas, em até 5% (cinco por cento) do valor total disposto no artigo 1° desta lei, durante o exercício financeiro, por ato do Chefe do Poder Executivo Municipal.

Art. 32. É autorizado ao Chefe do Poder Executivo Municipal alterar o QDD - Quadro de Detalhamento da Despesa do exercício de 2009, criando novas classificações de despesas, quanto a sua natureza, (Elementos), inclusive fontes de recursos e seus respectivos valores, para adequação dos Orçamentos vigentes, em até 10% (dez por cento) do valor total descrito no artigo 1° desta lei, tendo como fontes de redução àquelas apresentadas no artigo 37 desta lei.

Art. 36. Fica o Chefe do Poder Executivo, autorizado a efetuar as transposições, os remanejamentos e as transferências de recursos de uma categoria de programação para outra ou de um órgão para outro, até o limite de 15% (quinze por cento), do valor total das receitas previstas. 

 Art. 37. São recursos hábeis para atendimento às autorizações de aberturas de Créditos Adicionais Suplementares, contidas na presente Lei: as anulações totais ou parciais de recursos não mais utilizáveis, o superávit financeiro do exercício anterior, o excesso e/ou o seu provável excesso de arrecadação, apurado no exercício, o produto resultante de operações de crédito e de novos convênios. 

O responsável informou ainda que já estava comprovada a existência da Emenda Parlamentar ao Orçamento da União da Bancada Catarinense, apresentada pelo Senador Catarinense Neuto de Conto, a qual já estava cadastrada no Sistema Nacional de Convênios (SICONV), sob o n. 091148/2009, junto ao Ministério do Turismo, e que o objetivo principal do Executivo Municipal era apenas incluir no Orçamento de 2009 nova fonte de financiamento, a da Fonte de Recursos 135 — Convênio com Governo Estadual — Projeto n. 091148/2009 na Atividade: 2.039 — Participação em Feiras, Eventos e Datas Comemorativas da Secretaria de Turismo, Cultura e Esportes, pois já havia na Modalidade de Aplicação o Elemento de Despesas: 3.3.90.39 — Outros Serviços de Terceiros — Pessoa Jurídica, portanto, não se caracterizando um crédito adicional especial, autorização concedida pelos artigos 28 e 32 da Lei Orçamentária de 2009.

Acrescenta que “a expressão ‘CRÉDITO ADICIONAL ESPECIAL’ usada no Decreto n°. 7.593/2009, de 14 de novembro de 2009 e demais decretos da mesma natureza, elaboradas desde 2003, objetivam apenas o atendimento as especificações do e-SFINGE — Sistema de captação e armazenamento de informações do Tribunal de Contas de Santa Catarina, pois a criação de novas Fontes de Recursos, alocadas a Elementos de Despesas já consignados à atividades e/ou projetos, não se caracterizam como crédito adicional especial, mas sim suplementar”.

Complementa que havia saldos disponíveis em diversos órgãos da estrutura orçamentária, eis que em outubro de 2009 ainda dependiam de autorização legislativa e de aprovação da (STN) Secretaria do Tesouro Nacional (STN), e que essa prática (anulações de dotações orçamentárias ainda não comprometidas ou de recursos que não estejam garantidos) é comumente utilizada por todas as esferas administrativas e aceita pelo Tribunal de Contas do Estado. 

 Por fim, o responsável alega que a prática não trouxe nenhum prejuízo ao andamento normal das atividades, concluindo como segue: 

Conclui-se: que não houve qualquer desrespeito aos preceitos legais e/ou prejuízo ao erário, pois os recursos dispostos nas dotações orçamentárias, apresentados como forma de redução, não tinham ainda nenhuma garantia de recebimento e/ou de execução, portanto, de forma modesta e racional o Executivo Municipal neste caso, como também em outros aqui apresentados, para não aumentar o valor total do Orçamento vigente aprovado pelo Legislativo Municipal, como também em exercícios anteriores, inclusive sabendo que os recursos ora reduzidos não são fontes de financiamento para arcar com a realização dos eventos, mesmo assim decidiu-se por anular algumas dotações orçamentárias vinculadas, as quais, naquele momento, não trariam como não trouxeram qualquer tipo de prejuízo ou desrespeito as autorizações legislativas.  

Em sua análise (Relatório n. 164/2010), a DLC manifesta-se pela manutenção do apontamento da irregularidade, constatando, em suma, que a autorização contida na Lei Municipal n. 7.791/2008 refere-se somente à abertura de créditos suplementares, não sendo aplicável aos créditos especiais, e destacando que a abertura de créditos especiais é de competência da Câmara Municipal e que a previsão contida no artigo 5º do Plano Plurianual do Município de Florianópolis extrapolou o disposto no artigo 42 da Lei n. 4.320/64 e no artigo 167, V e VI, da Constituição Federal.

Quando da elaboração do Relatório n. 172/2011, a DLC reiterou as conclusões exposadas no relatório anterior, considerando que as alegações apresentadas pelo responsável eram as mesmas que já haviam sido apresentadas às fls. 52/57 do processo REP n. 09/00697903, as quais já haviam sido devidamente analisadas.

O MPTC (Parecer n. 2624/2011) destaca que a abertura de crédito adicional deveria ter sido precedida de lei em decorrência do papel constitucional deferido ao Poder Legislativo, ao qual compete realizar o controle dos atos do Poder Executivo. Destaco do citado parecer:

[...]

Caso o Poder Legislativo abdicasse da competência/prerrogativa do controle orçamentário, o Poder Executivo teria verdadeira “carta em branco” para preencher conforme a vontade de seu dirigente, propiciando o arbítrio na escolha dos gastos.

Mais que isso, a ausência de controle orçamentário pelo Legislativo significa “escantear” a sociedade, representada pelos legisladores, das escolhas do governo.

No caso em questão, a restrição que se discute adquire grande relevância na medida em que o decreto por meio do qual foi aberto crédito adicional especial, criando nova classificação de despesa, não teve autorização legal específica.

Ou seja, dotações orçamentárias no valor de R$ 13.000.000,00, originalmente destinadas a secretarias diversas para execução de obras, tendo como origem de recursos convênios com o Governo do Estado, foram anuladas, destinando-se os créditos à Secretaria Municipal de Turismo, para a atividade “participação em feiras, eventos, concursos e datas comemorativas”, leia-se “comemorações natalinas”, sem que a alteração orçamentária fosse submetida ao crivo dos vereadores.

Não é preciso dizer que a prévia discussão da matéria pela sociedade, em decorrência da apreciação pela Câmara de Vereadores, poderia ter alterado o rumo dos acontecimentos referentes aos festejos natalinos de Florianópolis em 2009, mediante adequada ponderação acerca da efetiva necessidade de alocação dos créditos orçamentários a esta finalidade.

Ainda de acordo com o MPTC, este Tribunal já se posicionou, por meio do Prejulgado n. 1312, pela necessidade de autorização legislativa para a abertura de créditos suplementares e especiais.

Analisando os autos, destaco inicialmente que a autorização genérica contida na legislação ordinária não supre a necessidade de lei específica para a abertura dos créditos, tendo em vista que os recursos, provenientes de anulações oriundas em sua maioria de créditos da Secretaria Municipal de Obras e da Secretaria Regional do Continente, foram destinados à Secretaria Municipal de Turismo, Cultura e Esportes.

Sendo assim, com base nos pareceres da DLC e do MPTC, verifico que a abertura de crédito especial por meio de decreto executivo não encontra amparo na legislação, estando em desacordo com o artigo 42 da Lei n. 4.320/64 e com o artigo 167, V e VI, da Constituição Federal.

 

Por oportuno, deve ser determinada a anulação do despacho de fl. 1163, datado de 16/11/2011, por meio do qual determinei a citação dos Srs. Dário Elias Berger e Augusto Cézar Hinckel para que se manifestassem a respeito das irregularidades verificadas, tendo em vista a sua responsabilidade por eventual dano ao erário, em virtude de ter contemplado irregularidade diversa da efetivamente apurada neste processo.

Acrescento que a Proposta de Voto a ser apresentada converge com o entendimento do Ministério Público de Contas no que se refere à necessidade de se determinar a anulação da inexigibilidade de licitação e do contrato dela decorrente e também quanto à culpabilidade da empresa Palco Sul. A divergência se apresenta em relação aos efeitos da anulação diante dessa culpabilidade, considerando o que dispõe o artigo 59 da Lei n. 8.666/93.

 

 

Manifestação da Relatora - realizada na sessão ordinária do dia 11/10/2017.

Em 13/09/2017 o Sr. Dário Elias Berger protocolou documentos (Protocolo n. 23267/2017) e requereu a sua juntada e consideração no julgamento do presente processo.

A apreciação do processo pelo Plenário já se iniciou em 09/08/2017, data em que esta Relatora realizou a leitura da sua Proposta de Voto e na qual o Conselheiro Adircélio de Moraes Ferreira Junior solicitou vista dos autos. A conclusão do julgamento está prevista para o dia 11/10/2017, data em que foi solicitada nova pauta.

Tendo sido esgotados os prazos para oferecimento de resposta às citações encaminhadas por este Tribunal de Contas, o Regimento Interno deste Tribunal permite a juntada de documento somente na hipótese de comprovar fatos novos ou supervenientes que afetem o mérito do processo, conforme estabelecido no parágrafo quarto do seu artigo 144: 

Art. 144. O interessado, o responsável ou o procurador habilitado poderão pedir vista com carga e a juntada de documentos ao Relator, bem como examinar no Tribunal e extrair cópia de processo, obedecidos os procedimentos e requisitos previstos em Resolução e em especial: (Redação dada pela Resolução n. 065/2012– DOTC-e de 11.06.12)

[...] § 4º É facultada ao responsável ou ao interessado, em qualquer etapa do processo, requerer a juntada de documentos e comprovantes de fatos novos ou supervenientes que afetem o mérito do processo, mediante expediente dirigido ao Relator. (grifei)

O expediente encaminhado pelo Responsável informa conteúdo de decisão proferida nos autos da Ação Civil Pública Pública n. 0910260-48.2013.8.24.0023 em 23/09/2016, por meio da qual foi afastada a sua responsabilidade por atos praticados durante os carnavais de 2006 e de 2008 em face de ter sido considerado que o ex-Prefeito teria praticado atos de rotina, que não demandariam um controle mais específico.

A segunda questão trazida pelo Responsável diz respeito à decisão proferida na Ação Penal n. 1011, do STF, relativa a atos administrativos praticados no carnaval de 2007, na qual a denúncia foi rejeitada por se considerar que o ex-Prefeito não tomou nenhuma decisão em relação à contratação.

No presente caso destaco que a análise da responsabilidade do Sr. Dário Elias Berger consta da Proposta de Voto elaborada por esta Relatora, em seu item II.1.5.2.4. Os argumentos apresentado pela defesa anteriormente, de que os atos praticados seriam rotineiros e não demandariam a sua responsabilização, já foram devidamente analisados, tendo sido abordada inclusive a participação ativa do ex-Prefeito na contratação da empresa Palco Sul.

Ademais, ressalto que a decisão proferida em sede de ação penal somente interfere na análise da responsabilidade civil nos casos de inexistência do delito ou de negativa de autoria, conforme disposto no artigo 935 do Código Civil,  cuja regra aplica-se subsidiariamente aos processos desta Corte de Contas (artigo 308 do Regimento Interno).

Art. 935. A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal

Desse modo, as alegações e informações trazidas pelo Sr. Dário Berger não demandam a revisão do posicionamento anteriormente externado por esta Relatora .

Por oportuno, passo a tecer algumas considerações em relação à referida Proposta de Voto e ao Voto Divergente encaminhado pelo Conselheiro Adircélio de Moraes Ferreira Junior.

A análise dos efeitos da anulação da inexigibilidade de licitação e do contrato em face da constatação de ilegalidade realizada por esta Relatora na Proposta de Voto considerou ter sido constatada a atuação de má-fé da empresa contratada. Esse fato é determinante para que se verifique a pertinência ou não de eventual indenização relativamente aos custos do que foi executado.

Foi citada jurisprudência do TCU e do STJ no sentido de que nos casos em que a empresa tenha agido de má-fé ou concorrido para a nulidade não há o dever de indenizar por parte da Administração, hipótese que se assemelha à discutida nos presentes autos.

Destaco, entretanto, que a jurisprudência não é pacífica quando se trata de indenizar os custos da empresa contratada nos casos em que tenha sido demonstrado ter agido de má-fé e concorrido para a nulidade da contratação.

Entre as diversas decisões citadas na Proposta de Voto tem-se o Recurso Especial 1188289 - SP (2010/0058499-2), no qual STJ admitiu que a pena de ressarcimento ao erário correspondesse, até a declaração da nulidade, ao que excedesse o custo básico do serviço efetivamente prestado.

É importante ter-se em conta que esse entendimento teve por base o princípio do enriquecimento sem causa da Administração.

Ao tratar do enriquecimento sem causa, Celso Antônio Bandeira de Mello leciona que este "[...] é o incremento do patrimônio de alguém à custa do patrimônio de quem o produziu sem que, todavia, exista uma causa juridicamente idônea para supeditar esta consequência benéfica para um e gravosa para outro"[16]. (grifei)

No caso, o processo que tramitou no Superior Tribunal de Justiça tratou de obras públicas (serviços de terraplanagem, recuperação de rodovias, reencascalhamento, construção e reparo de bueiros etc.), que foram efetivamente realizadas e que trouxeram como resultado um acréscimo patrimonial à Administração, o que justificaria essa "indenização" dos custos despendidos pela empresa que atuou de má-fé.

Com relação à jurisprudência citada no voto divergente, constato que ao tratar de possível indenização da empresa contratada, o Acórdão TCU 1306-2017 refere-se a "serviço que efetivamente e satisfatoriamente tenha prestado ou pelos bens que tenha fornecido".

Os demais acórdão referem-se à obra entregue à Administração (REsp 1153337/AC) e a serviço de terraplanagem (REsp 1188289/SP), nos quais a inexecução contratual não foi questionada, mas tão somente vícios que contaminaram a validade dos contratos.

A Teoria do Produto Bruto a qual fez referência o voto divergente não pode ser invocada de forma descontextualizada. Em que pese invocado essa teoria, na verdade a preocupação do voto divergente não está relacionada ao  "produto bruto" auferido, mas sim com às despesas supostamente incorridas pelo particular, que comprovadamente agiu de má-fé.

As hipóteses invocadas são diversas da que se discute nos presentes autos, no qual se verifica a inexecução contratual e não se constata qualquer acréscimo patrimonial que possa ter implicado no enriquecimento da Administração Municipal. Pelo contrário, houve grave prejuízo em decorrência da contratação irregular, tanto de ordem financeira, já que parte do valor chegou a ser pago, quanto em razão ao dano à imagem da Administração, pois a repercussão causada pela conduta dos agentes públicos e privados, que deliberadamente infringiram a lei, atingiu a população do município e os turistas, sendo inclusive noticiada em mídia nacional.

Como bem foi apontado no voto divergente, "a árvore de natal permaneceu boa parte do período de sua exposição sem iluminação à noite, em especial nas noites do natal e do réveillon [...]", o que me leva a discordar da configuração do enriquecimento ilícito em favor da Administração Pública.

A expectativa da cidade que alcança o ápice de sua atividade turística na temporada de verão era que a população e os turistas tivessem como mais um ponto de atração a árvore iluminada e interativa, situada na beira mar norte.

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Contudo, o que se verificou foi a veiculação em mídia local e nacional de notícias negativas que afetaram a imagem do município, como se verifica a seguir:

 


Não se verificou assim nenhum serviço efetiva e satisfatoriamente executado, mas sim ofensa à imagem da Administração Pública municipal. Deve portanto ser objeto de reflexão qual teria sido o enriquecimento ou o acréscimo patrimonial auferido pelo município de Florianópolis em decorrência do Contrato n. 1056/2009? Qual seria o "produto bruto" auferido pelo município?

Ademais, o caso ora analisado é bastante específico, pois além de ter sido demonstrada a conduta dos agentes públicos e privados, que concorreram para a burla aos institutos legais e para a contratação fraudulenta, não restou ao município de Florianópolis qualquer acréscimo patrimonial que pudesse ao menos ensejar o questionamento acerca da existência de um suposto enriquecimento ilícito da Administração. Isto afasta o argumento de que poderia haver enriquecimento ilícito da Administração.

Tendo a empresa contratada agido de má-fé e em conluio com os agentes públicos, no estabelecimento da contratação sob exame, assumiu o risco de ser apurada a prática de conduta censurável, o que fulmina até mesmo o direito ao ressarcimento das despesas até então efetuadas a pretexto da celebração ou execução ato/contrato administrativo, ainda mais quando verificado que desta contratação não resultou nenhum acréscimo patrimonial ao município de Florianópolis.

No que se refere às penalidades aplicadas aos ex-gestores e à empresa, devem ser observadas duas questões centrais. A primeira diz respeito à sua tipificação e a segunda refere-se à valoração das multas.

Com relação à tipificação das irregularidades, destaco que a sua configuração foi apreciada por duas vezes pelo Tribunal Pleno, tendo resultado nas Decisões n. 4557/2010 e 320/2015, que determinaram o encaminhamento de citações aos responsáveis.

Acrescento que a fase do contraditório já se esgotou, não sendo cabível a aplicação de multa em face de irregularidade que não foi objeto de citação, como proposto no voto divergente. Cite-se, por exemplo, a sugestão de aplicação de multa ao Sr. Dário Elias Berger no valor de R$ 7.103,25,00 (sete mil, cento e três reais e vinte e cinco centavos), diante do contrato mal elaborado, sendo que o mesmo não foi citado em face desta irregularidade.

Por meio da Decisão n. 4.557/2010, o ex-Prefeito foi citado em face da abertura de crédito adicional especial de forma irregular, como segue:

6.5. Definir a RESPONSABILIDADE INDIVIDUAL, nos termos do art. 15, I, da Lei Complementar n. 202/00, do Sr. DáRIO ELIAS BERGER - Prefeito Municipal de Florianópolis, CPF n. 341.954.919-91, por irregularidade verificada nas presentes contas.

6.5.1. Determinar a CITAçãO do Responsável nominado no item 6.5 acima, nos termos do art. 15, II, da Lei Complementar n. 202/00, para, no prazo de 30 (trinta) dias, a contar do recebimento desta deliberação, com fulcro no art. 46, I, b , do mesmo diploma legal c/c o art. 124 do Regimento Interno, apresentar alegações de defesa, em observância ao princípio do contraditório e da ampla defesa, acerca da abertura de crédito adicional especial no valor de R$ 13.000.000,00 (treze milhões de reais), em desacordo com os arts. 42 da Lei n. 4.320/64 e 167, V e VI, da Constituição Federal (item 2.3.1 do Relatório DLC); irregularidade essa ensejadora de aplicação de multa prevista nos arts. 69 ou 70 da Lei Complementar n. 202/2000.

Já por meio da Decisão n. 320/2015, o Sr. Dário Elias Berger foi citado em face da existência de indícios de superfaturamento e de irregularidades na execução do contrato, como se verifica a seguir:

6.2.1. Ilegalidade da Inexigibilidade de Licitação n. 519/2009, frente aos arts. 37, XXI, da Constituição Federal e 25, incisos I a III, da Lei n. 8.666/93, e indícios de superfaturamento do Contrato n. 1056/09 e execução do objeto em desacordo com as especificações e prazos fixados no contrato, em afronta aos princípios constitucionais da economicidade, eficiência e moralidade e contrariando o disposto no art. 66 da Lei 8.666/93.

Desse modo, a sugestão de aplicação de multa ao ex-Prefeito em decorrência de contrato mal elaborado, como proposto no item 4.2 do voto divergente, mostra-se inadequada. O mesmo raciocínio se aplica aos demais responsáveis, que não foram citados em face desta irregularidade.

Ademais, a aglutinação de irregularidades para fins de aplicação de multa já foi objeto de discussão pelo Plenário no processo n. SLC 07/00446192, cujo Relator Conselheiro Luiz Roberto Herbst enfrentou a questão, tendo concluído, no voto que fundamentou a Decisão n. 044/2013, nos seguintes termos:

Administrativo. Licitação. Multa.

Irregularidades.

O edital caracteriza-se como uma das fases da despesa. Contudo, a identificação de ilegalidades no exame do edital motiva a aplicação de multas que devem ser discriminadas isoladamente em função do dispositivo infringido, para facilitar eventual análise em sede de recurso. Este é o posicionamento adotado pelo Tribunal Pleno desta Corte.

Ademais, a utilização de conceitos jurídicos indeterminados como "bem" ou "mal"  na tipificação dificultaria o exercício do contraditório, caso este ainda fosse possível,  pois torna imprecisa a configuração da irregularidade.

Quanto aos valores das multas, propostos no voto divergente, verifico que as multas propostas por esta Relatora consideraram os patamares vigentes na época em que as irregularidades foram praticadas (2009), assim como a proporcionalidade em relação ao dano verificado, na forma do artigo 68 da lei Complementar n. 202/00. Contudo, esta Relatora não se opõe à alteração nos valores previamente propostos, se o Egrégio Plenário assim entender pertinente, desde que respeitada a tipificação apresentada na proposta de voto, que considera as decisões previamente exaradas.

Destaco ainda que, tendo sido constatada a participação ativa da empresa Palco Sul nas irregularidades sob exame, a aplicação de multa à contratada é medida que se impõe, o que também não foi observado no voto divergente.

Por fim, deve-se estar atento que aplica-se no caso os efeitos da nulidade estabelecidos pela lei específica (Lei de Licitações), que prevalece sobre a lei geral do Código Civil. Sendo assim, considero que inexiste qualquer elemento que justifique a alteração do entendimento já exposado na Proposta de Voto apresentada em 09/08/2017, nos seguintes termos:

 

III - Proposta de Voto

Diante de todo o exposto, submeto ao Egrégio Plenário a seguinte Proposta de Voto:

1. Julgar irregulares, com imputação de débito, na forma do art. 18, III, c, c/c o art. 21, caput, da Lei Complementar n. 202/2000, as contas pertinentes à presente Tomada de Contas Especial, acerca de irregularidades ocorridas na Inexigibilidade de Licitação n. 519/2009 e no Contrato n. 1056/2009, ambos promovidos pela Prefeitura Municipal de Florianópolis, e condenar os Responsáveis a seguir discriminados ao pagamento de débitos de sua responsabilidade, fixando-lhes o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial Eletrônico desta Corte de Contas, para comprovarem, perante este Tribunal, o recolhimento dos valores dos débitos aos cofres do Município, atualizados monetariamente e acrescidos dos juros legais (arts. 40 e 44 da Lei Complementar n. 202/2000), calculados a partir das datas de ocorrência dos fatos geradores dos débitos, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial (art. 43, II, da Lei Complementar n. 202/2000):

1.1. De responsabilidade solidária do Sr. Mário Roberto Cavallazzi, ex-Secretário Municipal de Turismo, Cultura e Esporte de Florianópolis, CPF 092.801.549-15; do Sr. Aloysio Machado Filho, ex-Secretário Adjunto de Turismo, Cultura e Esporte de Florianópolis, CPF 070.268.979-34; do Sr. Dário Elias Berger, ex-Prefeito Municipal de Florianópolis, CPF 341.954.919-91; do Sr. Augusto Cezar Hinckel, ex-Secretário Municipal de Finanças, CPF 179.230.859-00; e da empresa Palco Sul Eventos Ltda., CNPJ 03.923.579/0001-52, o montante de R$ 540.000,00 (Quinhentos e quarenta mil reais), relativo ao valor pago pela Prefeitura Municipal em decorrência da Inexigibilidade de Licitação n. 579/2009 e do Contrato n. 1056/2009, em face da nulidade da Inexigibilidade de Licitação n. 519/2009 e do Contrato n. 1056/2009, em virtude da inadequação do instituto da Inexigibilidade de Licitação para que a contratação fosse realizada, acarretando burla à licitação pública; da existência de indícios de superfaturamento do Contrato n. 1056/09 e da execução do objeto em desacordo com as especificações e prazos fixados no contrato, conforme consta dos Relatórios DLC n. 300/2009 e 172/2011, bem como do Parecer MPTC n. 2624/2011 e da fundamentação apresentada por esta Relatora.

2. Aplicar aos Responsáveis abaixo discriminados, com fundamento no art. 68 da Lei Complementar n. 202/2000 c/c o art. 108, caput, do Regimento Interno, as multas a seguir especificadas, fixando-lhes o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial Eletrônico desta Corte de Contas, para comprovarem ao Tribunal o recolhimento ao Tesouro do Estado das multas cominadas, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos artigos 43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000:

2.1. Ao Sr. Mário Roberto Cavallazzi, ex-Secretário Municipal de Turismo, Cultura e Esporte de Florianópolis, CPF 092.801.549-15, a multa no valor de R$ 10.800,00 (Dez mil e oitocentos reais), em face da inadequação do instituto da Inexigibilidade de Licitação para que a contratação fosse realizada, acarretando burla à licitação pública; da existência de indícios de superfaturamento do Contrato n. 1056/09 e da execução do objeto em desacordo com as especificações e prazos fixados no contrato, conforme consta dos Relatórios DLC n. 300/2009 e 172/2011, bem como do Parecer MPTC n. 2624/2011 e da fundamentação apresentada por esta Relatora;

2.2. Ao Sr. Aloysio Machado Filho, ex-Secretário Adjunto de Turismo, Cultura e Esporte de Florianópolis, CPF 070.268.979-34, a multa no valor de R$ 10.800,00 (Dez mil e oitocentos reais), em face da inadequação do instituto da Inexigibilidade de Licitação para que a contratação fosse realizada, acarretando burla à licitação pública; da existência de indícios de superfaturamento do Contrato n. 1056/09 e da execução do objeto em desacordo com as especificações e prazos fixados no contrato, conforme consta dos Relatórios DLC n. 300/2009 e 172/2011, bem como do Parecer MPTC n. 2624/2011 e da fundamentação apresentada por esta Relatora;

2.3. Ao Sr. Dário Elias Berger, ex-Prefeito Municipal de Florianópolis, CPF 341.954.919-91, a multa no valor de R$ 10.800,00 (Dez mil e oitocentos reais), em face da inadequação do instituto da Inexigibilidade de Licitação para que a contratação fosse realizada, acarretando burla à licitação pública; da existência de indícios de superfaturamento do Contrato n. 1056/09 e da execução do objeto em desacordo com as especificações e prazos fixados no contrato, conforme consta dos Relatórios DLC n. 300/2009 e 172/2011, bem como do Parecer MPTC n. 2624/2011 e da fundamentação apresentada por esta Relatora;

2.4. Ao Sr. Cezar Hinckel, ex-Secretário Municipal de Finanças, CPF 179.230.859-00, a multa no valor de R$ 10.800,00 (Dez mil e oitocentos reais), em face em virtude da inadequação do instituto da Inexigibilidade de Licitação para que a contratação fosse realizada, acarretando burla à licitação pública; da existência de indícios de superfaturamento do Contrato n. 1056/09 e da execução do objeto em desacordo com as especificações e prazos fixados no contrato, conforme consta dos Relatórios DLC n. 300/2009 e 172/2011, bem como do Parecer MPTC n. 2624/2011 e da fundamentação apresentada por esta Relatora;

2.5. À empresa Palco Sul Eventos Ltda., CNPJ 03.923.579/0001-52, a multa no valor de R$ 10.800,00 (Dez mil e oitocentos reais), em face da inadequação do instituto da Inexigibilidade de Licitação para que a contratação fosse realizada, acarretando burla à licitação pública; da existência de indícios de superfaturamento do Contrato n. 1056/09 e da execução do objeto em desacordo com as especificações e prazos fixados no contrato, conforme consta dos Relatórios DLC n. 300/2009 e 172/2011, bem como do Parecer MPTC n. 2624/2011 e da fundamentação apresentada por esta Relatora.

3. Aplicar multas aos Srs. Mário Roberto Cavallazzi e Aloysio Machado Filho, com fundamento no art. 70, II, da Lei Complementar n. 202, de 15 de dezembro de 2000, c/c o art. 109, II, do Regimento Interno (Resolução n. TC-06, de 28 de dezembro de 2001), em face das restrições relacionadas, fixando-lhe o prazo de 30 dias, a contar da publicação do Acórdão no Diário Oficial Eletrônico - DOTC-e, para comprovar ao Tribunal de Contas o recolhimento ao Tesouro do Estado das multas cominadas, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts. 43, II, e 71 da citada Lei Complementar:

3.1.    R$ 4.000,00 (Quatro mil reais) em face da ilegalidade da Inexigibilidade de Licitação n. 519/2009 frente aos arts. 37, XXI, da Constituição Federal e 25, incisos I a III, da Lei n. 8.666/93;

3.2.    R$ 2.000,00 (Dois mil reais) em virtude do descumprimento dos incisos II e III do parágrafo único do art. 26 da Lei n. 8.666/93, aplicáveis ao processo de Inexigibilidade de Licitação n. 519/2009;

3.3.    R$ 1.500,00 (Um mil e quinhentos reais) em razão da ausência de elementos que demonstrem a qualificação técnica da empresa contratada para a execução do objeto, em detrimento do art. 30 da Lei n. 8.666/93;

3.4.     R$ 1.500,00 (Um mil e quinhentos reais) em face da ausência de projeto básico do objeto e orçamento detalhado em planilhas que expressem a composição de todos os seus custos unitários, nos termos do art. 7º § 2º, I e II, c/c § 9º, da Lei n. 8.666/93;

3.5.     R$ 1.500,00 (Um mil e quinhentos reais) em virtude da ausência do regime de execução do objeto, nos termos do art. 40, caput, e 55, II, da Lei n. 8.666/93;

3.6.   R$ 1.500,00 (Um mil e quinhentos reais) em face da realização de contratação por inexigibilidade de licitação com previsão de captação de recursos da iniciativa privada para custear o objeto, em desacordo com o disposto no art. 7°, § 3°, da Lei n. 8.666/93; e

3.7.   R$ 2.000,00 (Dois mil reais) em virtude da divergência entre a altura da árvore de natal que foi prevista no contrato (60 metros) e a efetivamente executada (máximo de 46 metros), demonstrando que não foram observadas as especificidades do edital e do Contrato n. 1056/2009, contrariando o art. 66 da Lei n. 8.666/93 e ensejando a aplicação dos arts. 77 e 78 da Lei n. 8.666/93.

4. Aplicar multa ao Sr. Dário Elias Berger, com fundamento no art. 70, II, da Lei Complementar n. 202, de 15 de dezembro de 2000, c/c o art. 109, II, do Regimento Interno (Resolução n. TC-06, de 28 de dezembro de 2001), em face do descumprimento de normas legais ou regulamentares abaixo, fixando-lhe o prazo de 30 dias, a contar da publicação do Acórdão no Diário Oficial Eletrônico - DOTC-e, para comprovar ao Tribunal de Contas o recolhimento ao Tesouro do Estado das multas cominadas, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts. 43, II, e 71 da citada Lei Complementar:

4.1. R$ 4.000,00 (Quatro mil reais) em face da abertura de crédito adicional especial no valor de R$ 13.000.000,00 (Treze milhões de reais), em desacordo com os arts. 42 da Lei n. 4.320/64 e 167, V e VI, da Constituição Federal.

5. Determinar à Prefeitura Municipal de Florianópolis que promova a anulação da Inexigibilidade de Licitação n. 519/2009 e do Contrato n. 1056/2009, dela decorrente, com fundamento nos artigos 2º, 3º e 49, caput e §§2º e 4º da Lei n. 8.666/93, no artigo 59, IX, da Constituição Estadual, no artigo 29, §3º, da Lei Complementar n. 202/00 e nos artigos 32 e 33 da Resolução n. TC-06/2001 (RITC), em virtude da inadequação do instituto da Inexigibilidade de Licitação para que a contratação fosse realizada, acarretando burla à licitação pública; da existência de indícios de superfaturamento do Contrato n. 1056/09 e da execução do objeto em desacordo com as especificações e prazos fixados no contrato, conforme consta dos Relatórios DLC n.s 300/2009 e 172/2011, bem como do Parecer MPTC n. 2624/2011 e da fundamentação apresentada por esta Relatora.

6. Anular o despacho de fl. 1163, datado de 16/11/2011, por meio do qual foi determinada a citação dos Srs. Dário Elias Berger e Augusto Cézar Hinckel para que se manifestassem a respeito das irregularidades verificadas, tendo em vista a sua responsabilidade por eventual dano ao erário, em virtude de ter contemplado irregularidade diversa da efetivamente apurada neste processo.

7. Dar ciência da Decisão, do Relatório Técnico ao Sr. Aloysio Machado Filho, ao Sr. Dário Elias Berger, ao Sr. Mário Roberto Cavallazzi, à empresa Palco Sul Eventos Ltda., à Prefeitura Municipal de Florianópolis, à Câmara de Vereadores de Florianópolis e ao Ministério Público Estadual.

 

Gabinete, em 1º de agosto de 2017.

 

 

Sabrina Nunes Iocken

Relatora



 

 

 

 

 

[6]NIEBUHR, Joel de Menezes.  Licitação Pública e Contrato Administrativo. Belo Horizonte: Fórum 2013. p. 101/102.

[7] Processo n. 001.026/1998-4, Acórdão n. 249/2000, Primeira Câmara, 23/5/2000.

[8] MS 23550-1 DF – Rel. Min. Marco Aurélio – Redator para o Acórdão: Min. Sepúlveda Pertence - DJ: 31/10/2001.

[9] JUSTEN FILHO, Marçal.  Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. São Paulo: Dialética, 2012. p. 859.

[10] PEREIRA JUNIOR, Jessé Torres. Da responsabilidade de agentes públicos e privados nos processos administrativos de licitação e contratação. 1. ed. São Paulo: Editora NDJ, 2012, p. 28/29.

[11] Acórdão n. 1337/2011 - Plenário, TC-018.887/2008-1, Rel. Min. Walton Alencar Rodrigues, 25/05/2011; Acórdão n. 5.291/2013 – 1ª Câmara, TCU; STF - Mandado de Segurança n. 24631.

[12] Acórdão n. 93/2006 - Plenário, rel. Min. Walton Alencar Rodrigues, Processo n. 007.931/1999-9.

[13] AC-4318-41/08-1 - Primeira Câmara, rel. Min Valmir Campelo. Processo n. 018.651/2003-7.

[14] PEREIRA JUNIOR, Jessé Torres. Da responsabilidade de agentes públicos e privados nos processos administrativos de licitação e contratação. 1. ed. São Paulo: Editora NDJ, 2012, p. 28/29.

 

[15]De acordo com o relatório da DLC, do montante total, R$ 200.000,00 (Duzentos mil reais) referem-se à mão de obra utilizada na criação, produção, execução, montagem e desmontagem da árvore de natal, sendo o restante destinado à locação de materiais e tecnologia.

[16] Mello, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 20. ed. Malheiros: 2006. p. 623.