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TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE SANTA CATARINA

GABINETE DO CONSELHEIRO WILSON ROGÉRIO WAN-DALL

PROCESSO Nº	REC-03/00324740
UNIDADE GESTORA:	Secretaria de Estado da Saúde
INTERESSADO:	Sr. João José Cândido da Silva
ASSUNTO:	Recurso de Reexame (art. 80) do processo nº AOR-01/01935455
PARECER Nº	GC-WRW-2008/096/EB

1. RELATÓRIO

Tratam os autos de Recurso de Reexame, interposto pelo Sr. João José Cândido da Silva, contra o Acórdão nº 0909/2002 do Pleno desta Corte de Contas, nos autos do Processo AOR-01/01935455, proferido na Sessão de 04/11/2002, que decidiu por aplicar multas ao Responsável, em face da deficiência no controle da Tesouraria pelo uso indevido de recursos do caixa; inexistência de comissão responsável pela avaliação, controle e levantamento dos bens móveis, deficiência no controle de patrimônio e pela irregularidade com relação aos veículos da entidade.

Analisando preliminarmente os autos, a Consultoria Geral, através da Informação nº 213/07 (fls. 166/167), sugeriu o encaminhamento do processo à Diretoria de Controle da Administração Estadual – DCE, para a análise dos documentos juntados ao recurso, que foi acolhida por este Relator (fls. 168)

A Diretoria de Controle da Administração Estadual – DCE, após a análise dos documentos, manifestou-se através do Relatório nº 072/2007 (fls. 175/188).

Seguindo os trâmites regimentais, a peça recursal foi encaminhada à Consultoria-Geral, que se manifestou por meio do Parecer n. 715/07, entendendo preenchidos os pressupostos que autorizam o seu conhecimento e, no mérito, propôs dar-lhe provimento, modificando a decisão recorrida e cancelamento as multas aplicadas (fls. 190/205).

A Consultoria Geral deste Tribunal de Contas, após considerar as alegações apresentadas no Recurso pelo Responsável, em seu Parecer, aduz que:

1) Em relação à sugestão de aplicação de multa, em face do uso indevido de recursos do Caixa, caracterizando deficiências no controle da Tesouraria do Instituto,

Cabe ressaltar que a multa foi aplicada ao Recorrente, cujo ato foi praticado pelo Diretor Administrativo e Financeiro do Instituto Psiquiátrico.

A cerca do assunto, a Consultoria Geral deste Tribunal de Contas, após considerar as alegações apresentadas no Recurso pelo Responsável (fls. 02/04), em seu Parecer, aduz que:

[...]

Nesse sentido, deve ser observado o disposto no art. 112, caput, da Resolução nº TC-06/01 - Regimento Interno desta Corte de Contas, que determina:

Art. 112 - A multa cominada pelo Tribunal recairá na pessoa física que deu causa à infração e será recolhida ao Tesouro do Estado no prazo de trinta dias a contar da publicação da decisão no Diário Oficial do Estado. (grifamos)

Resta claro que somente poderá ser penalizado aquele que, por ação ou omissão, der causa à infração. In casu, a própria decisão confirma a ausência dos elementos "culpa" e "autoria" na conduta do Sr. João José Cândido da Silva. Frise-se que o Recorrente exercia a função de Secretário de Estado da Saúde e não de Diretor Financeiro do Instituto Psiquiátrico.

Sobre o tema, esta Consultoria Geral já se manifestou reiteradas vezes em seus pareceres. Vejamos, por exemplo, o Parecer COG nº 1017/05 (exarado nos autos nº REC-03/07424391 - Recurso de Reexame interposto, também, pelo Sr. João José Cândido da Silva):

"(...) Com relação ao item 6.1.2, da mesma forma, assiste ao Recorrente o direito ao cancelamento da penalização imposta, tendo em vista que, em situação idêntica, este Tribunal de Contas assim decidiu:

(...)

'(...) À fl. 92 dos Autos nº TCE-00/02898764 foi anexado o organograma estrutural da Maternidade Carmela Dutra, ali se verifica que a Seção de Patrimônio está diretamente subordinada ao Serviço de Manutenção, que por sua vez está à Gerência Administrativa e Financeira e esta ao Diretor Geral; igualmente a Seção de Almoxarifado, ligada ao Serviço de Administração de Material, por sua vez subordinada à Gerência Administrativa e Financeira e esta ao Diretor Geral. Pelo exposto, não parece ter sido acertada a indicação do Secretário de Estado como o agente causador da infração, já que o controle interno passava por vários níveis de comando. Portanto, considerando que na apuração da responsabilidade dos administradores e gestores por prática de condutas sancionadas pela jurisdição administrativa, deverá o Tribunal de Contas pautar-se, sempre, pela tipicidade, antijuridicidade, voluntariedade e pelo exame do bem jurídico tutelado pela norma supostamente violada, não se pode afirmar, com a contundência que a penalidade exige, que o art. 112, do Regimento Interno foi bem aplicado - "A multa cominada pelo Tribunal recairá na pessoa física que deu causa á infração (...)".

Oportuno transcrever-se o ensinamento desenvolvido por Benjamin Zymler acerca dos pressupostos da imputação de responsabilidade no âmbito dos Tribunais de Contas:

'Os aplicadores do direito convergem para o entendimento de que há necessidade de que seja configurada a culpa do agente público para que se possa puni-lo. Nem por isso há de se concluir que a avaliação da gestão pública é isenta de dificuldades.

Na verdade, a avaliação da conduta do gestor, sob a perspectiva da responsabilidade subjetiva, exige do julgador extrema cautela. Exatamente porque pressupõe avaliação pormenorizada dos contornos fáticos e normativos concernentes aos atos examinados. As dificuldades concretas consistem justamente na identificação de peculiaridades que circundam tais atos.

Aponta-se, a propósito, a sensível evolução do TCU em direção ao aprimoramento da atividade de deliberar sobre a regularidade ou não da gestão pública. Pode-se dizer que já se encontra sedimentada, no âmbito do Tribunal, a percepção de que a mera identificação de irregularidade não é requisito suficiente para a apenação do responsável.

Há várias etapas a serem superadas para que se possa concluir pela necessidade de apenação do gestor. Esquadrinho, em seguida, tal rotina de investigação da conduta dos agentes públicos, quais sejam: existência da irregularidade, autoria do ato examinado, culpa do agente e grau de culpa do agente.

Existência da irregularidade: [...] a norma violada deve ser sempre identificada e explicitamente mencionada. Deve-se dizer, ainda, que a ilicitude pode resultar não somente de ato comissivo, mas também de omissão (falta de ação) do gestor.

[...] Nessa primeira etapa de investigação, o julgador é chamado a avaliar a compatibilidade de determinado ato com as normas jurídicas que o regulam.

Autoria do ato examinado: [...] Com intuito de aferir a participação do gestor no cometimento da irregularidade, impõe-se aferir se ele efetivamente foi o signatário do ato impugnado. Há de se verificar se a irregularidade está inserida no âmbito de sua esfera de competência. Na hipótese de omissão, deve-se investigar, por meio do exame dos normativos que explicitam o conjunto de competências afetas a determinado cargo ou função, ou ainda dos termos de ajuste ou convênio, se estava o gestor realmente obrigado a agir.

Interessantes questões são freqüentemente enfrentadas pelo TCU. Por vezes, discute-se a pertinência de se proceder à apenação de governadores de Estado, ou prefeitos de grandes cidades, signatários de convênios, em razão de vícios em licitações. Nessas circunstâncias, há de se avaliar a natureza da ilicitude e indagar: era exigível que tal agente, pessoalmente, impedisse a ocorrência da infração cometida?

A culpa do agente: Verificada a ocorrência de ilicitude e também que determinado agente foi responsável pelo seu cometimento, impõe-se, ainda, indagar se o agente operou com culpa. Não é possível, como registrei anteriormente, a apenação de responsável sem que tenha sido demonstrada a culpa em senso estrito ou o dolo.

Freqüentemente, o agente depara-se com situações em que é chamado a extrair de norma de difícil interpretação uma conseqüência jurídica. Pode ocorrer, por exemplo, que conclua pela necessidade de pagamento de gratificação a certos servidores, a partir de razoável interpretação do preceito legal. Tal interpretação, porém, pode também revelar-se, posteriormente, inadequada. Não se poderia, nessa hipótese, ainda que daí resultasse dano ao Erário, cogitar de apenação do responsável.

Pode ainda o gestor, em mais um exemplo, vivenciar excepcional desorganização administrativa plenamente comprovada (por hipótese, repentina exoneração a pedido de grande parte dos servidores nele lotados). E, nesse ambiente, cometer irregularidade grave que justificasse ordinariamente a apenação pelo TCU. É possível, nessa circunstância, dependendo da natureza da ocorrência e a despeito da ilicitude verificada, deixar de apenar o gestor responsável pela prática do respectivo ato.

(...)1

À vista disso, tem-se como correto o cancelamento das multas." (Parecer COG n. 548/2005 - Processo n. REC-01/02083991 - Acórdão n. 1894/2005 publicado no DOE de 07/11/2005)

Conforme se denota pela leitura acima, a responsabilidade pela deficiência no controle de patrimônio da 17ª Regional de Saúde de Jaraguá do Sul não pode ser atribuída exclusivamente ao Secretário Estadual da Saúde, simplesmente porque seria humanamente impossível ao ordenador primário da despesa abarcar tantas funções sozinho e as competências devem ser delegadas.

No caso em tela, é sabido que em cada Regional há um Coordenador, conforme a própria DCE relata e, em uma análise mais minuciosa, deveria ser atribuída a penalização a esse Coordenador, visto que a responsabilidade direta de controlar a Regional seria dele. De qualquer forma, trataria-se de penalização administrativa por parte da própria Secretaria da Saúde, visto que o responsável não é jurisdicionado direto do Tribunal de Contas, cabendo a esta Corte de Contas, apenas, determinar à Unidade a adoção de providências com vistas a não ocorrência de novas irregularidades.

(...), razão pela qual esta Consultoria posiciona-se no sentido de cancelar a multa aplicada ao Recorrente no item 6.1.2 do Acórdão n. 11252/2003."

Diante dos comentários acima, nos posicionamos pelo cancelamento da multa.

[...]

2) Em relação à sugestão de aplicação de multa, em face da inexistência de comissão responsável pela avaliação, controle, levantamento dos bens móveis permanentes e baixa dos bens permanentes e de consumo.

[...]

Além das considerações expostas pela DCE e sua conclusão pelo cancelamento da multa, esta Consultoria Geral entende mister trazer à baila que nenhuma penalidade pode ser fundada em descumprimento a texto de Instrução Normativa. Vejamos os ensinamentos de Celso Antônio Bandeira de Mello¹ sobre o assunto:

"(...) O próprio processo de elaboração das leis, em contraste com o dos regulamentos, confere às primeiras um grau de controlabilidade, confiabilidade, imparcialidade e qualidade normativa muitas vezes superior ao dos segundos, ensejando, pois, aos administrados um teor de garantia e proteção incomparavelmente maiores.

(...)

São visíveis, pois, a natural inadequação e os imensos riscos que adviriam para os objetivos essenciais do Estado de Direito - sobreposse, repita-se, em um país ainda pouco afeito a costumes políticos mais evoluídos - de um poder regulamentar que pudesse definir, por força própria, direitos ou obrigações de fazer ou não fazer imponíveis ao administrados.

Resoluções, instruções e portarias

Tudo quanto se disse a respeito do regulamento e de seus limites aplica-se, ainda com maior razão, a instruções, portarias, resoluções, regimentos ou quaisquer outros atos gerais do Executivo. É que, na pirâmide jurídica, alojam-se em nível inferior ao próprio regulamento. Enquanto este é ato do Chefe do Poder Executivo, os demais assistem a autoridades de escalão mais baixo e, de conseguinte, investidas de poderes menores.

Tratando-se de atos subalternos e expedidos, portanto, por autoridades subalternas, por via deles o Executivo não pode exprimir poderes mais dilatados que os suscetíveis de expedição mediante regulamento.

Assim, toda a dependência e subordinação do regulamento à lei, bem como os limites em que se há de conter, manifestam-se revigoradamente no caso de instruções, portarias, resoluções, regimentos ou normas quejandas. Desatendê-los implica inconstitucionalidade. A regra geral contida no art. 68 da Carta Magna, da qual é procedente inferir vedação a delegação ostensiva ou disfarçada de poderes legislativos ao Executivo, incide e com maior evidência quando a delegação se faz em prol de entidades ou órgãos administrativos sediados em posição jurídica inferior à do Presidente e que se vão manifestar, portanto, mediante atos de qualificação menor.

Se o regulamento não pode criar direitos ou restrições à liberdade, propriedade e atividades dos indivíduos que já não estejam estabelecidos e restringidos na lei, menos ainda poderão fazê-lo instruções, portarias ou resoluções. Se o regulamento não pode ser instrumento para regular matéria que, por ser legislativa, é insuscetível de delegação, menos ainda poderão fazê-lo atos de estirpe inferior, quais instruções, portarias ou resoluções. Se o Chefe do Poder Executivo não pode assenhorear-se de funções legislativas nem recebê-las para isso por complacência irregular do Poder Legislativo, mesmo ainda poderão outros órgãos ou entidades da Administração direta ou indireta."

No artigo entitulado "Poder Regulamentar ante o Princípio da Legalidade" (publ. na RTDP nº 4, 1993), o mestre Celso Bandeira de Mello, ainda acrescenta:

"(...) São inconstitucionais as disposições regulamentares produzidas na conformidade de delegações disfarçadas, resultantes de leis que meramente transferem ao Executivo o encargo de disciplinar o exercício da liberdade e da propriedade da pessoas

Considerando toda argumentação supra, nos posicionamos pelo cancelamento da multa. [...]

3) Em relação à sugestão de aplicação de multa, em face das deficiências no controle de patrimônio.