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ESTADO DE SANTA CATARINA
GABINETE CONSELHEIRO LUIZ ROBERTO HERBST |
PROCESSO : REC - 03/03355158
ORIGEM : Centrais de Abastecimento do Estado de Santa Catarina
INTERESSADO : Marli Terezinha Marçal
Assunto : Recurso (Reexame - art. 80 da LC 202/2000)
PARECER Nº : GC - LRH/2006/822
EMENTA. Recurso de Reexame. Constitucional, Administrativo e Trabalho. Auditoria in loco. Atos de Pessoal. Exigência de fundamentação, pelo cessionário, da necessidade de disposição de servidores. Manutenção de servidor aposentado como empregado. Possibilidade. Aposentadoria voluntária não extingue automaticamente vínculo empregatício. Horas extraordinárias suplantando o limite legal. Criação de gerências em desconformidade com o estatuto social, sem prévia alteração do mesmo. Cominação de multas. Conhecer. Provimento parcial.
Mediante salutar necessidade de serviço, poderá, o servidor público, ser cedido a outro órgão ou entidade dos Poderes da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, o que caracteriza, em linhas gerais, o instituto da Disposição. Todavia, para a perfectibilização do referido ato, exige-se, da entidade ou órgão cessionário, a exposição de motivos, fundamentando a necessidade de se ter disponível o servidor. Exige-se, ainda, a oitiva do órgão cedente e a posterior apreciação da demanda pelo Chefe do Poder Executivo, a quem cabe autorizar a cessão e encaminhar o ato à publicação, além do cumprimento de outros requisitos legais, conforme o caso.
O pedido de aposentadoria espontânea pelos empregados das empresas públicas e sociedades de economia mista não implica, necessariamente, a ruptura do vínculo laboral. A continuidade da prestação de serviços, após aposentadoria voluntária, seja por acordo tácito, seja expresso, não constitui novo contrato de trabalho. A existência de servidor voluntariamente aposentado, mas mantido no emprego, não constitui situação irregular, conseqüentemente, o prosseguimento initerrupto da prestação de serviços, após concessão de aposentadoria espontânea, não enseja a declaração de nulidade dos respectivos contratos. Entendimento calcado no reconhecimento, pelo Supremo Tribunal Federal, da inconstitucionalidade dos parágrafos primeiro e segundo do art. 453 da Consolidação das Leis do Trabalho.
Visando à realização ou conclusão de serviços inadiáveis ou cuja inexecução possa acarretar prejuízo manifesto, a própria legislação trabalhista autoriza a prática de horas extraordinárias que excedam o limite legal, genericamente estabelecido, ou o convencionado entre as partes. Entretanto, essa concessão proporcionada pela lei não é absoluta. A própria Consolidação das Leis do Trabalho encarregou-se de limitar essa "prerrogativa" do empregador. A fixação do limite máximo de 12 (doze) horas trabalhadas por dia, incluídas todas as horas extras legalmente admitidas, visa, primordialmente, à proteção da saúde física e psíquica do trabalhador.
As possíveis alterações no estatuto da sociedade, inclusive de economia mista, não prescidem dos trâmites legais, cabendo, sua reforma, privativamente à assembléia geral. Portanto, qualquer alteração em suas disposições, para que se revista de legalidade e aplicabilidade, deve ser, antes, realizada formal e textualmente no próprio estatuto.
Vigora, no Brasil, o princípio da organização legal do serviço público. Esse princípio decorre, basicamente, da exigência constitucional de que a criação de cargos, empregos e funções públicas seja feita por meio de lei.
A Consultoria Geral deste Tribunal de Contas elaborou o Parecer n° COG 611/06, de fls. 09/27, da lavra da Auditora Fiscal de Controle Externo Débora Cristina Vieira, procedendo à análise do presente Recurso, constatando a legitimidade do recorrente, analisando por conseguinte o mérito e sugerindo em sua conclusão o conhecimento do presente, dando-lhe provimento parcial.
No mérito, pronunciou-se a Consultoria Geral, in verbis:
Quanto ao item 6.1.1 do Acórdão:
6.1.1. R$ 100,00 (cem reais), em face da não-formalização dos atos de disposição de servidores e conseqüente não-publicação dos mesmos, e da ausência de documentação atestando a necessidade das disposições, em descumprimento ao art. 104 da Lei Federal n. 8.245/91 c/c 37, caput, da Constituição Federal e 1º, parágrafo único, do Decreto Estadual n. 49/99 .
(...)
A título de esclarecimento, constata-se que a Lei 8245/91, citada como fundamentação desse item do Acórdão, trata-se de lei estadual e não federal, como fora mencionado; ademais, o art. 104 da referida lei não se coaduna à situação fática apresentada nos autos.
A partir da exegese do dispositivo supra, observa-se que os servidores cedidos não foram convocados pelo chefe do Poder Executivo, tampouco para trabalhar nos Gabinetes do Governador, Secretários ou Procurador Geral do Estado.
Dessa forma, resta clara a impropriedade em apontar o art. 104 da Lei 8245/91 como fulcro para a supramencionada cominação. Contudo, tal inexatidão material não afeta o contraditório e a ampla defesa, por terem sido os fatos satisfatoriamente descritos e tempestivamente contestados pela responsável.
A legislação estadual, vigente à época da prática dos atos, no tocante ao assunto, assim dispõe:
Percebe-se, ainda, que a primeira parte da fundamentação do item 6.1.1 do Acórdão, " [...] não-formalização dos atos de disposição de servidores e conseqüente não-publicação dos mesmos [...] ", não deve prosperar, uma vez que a formalização e conseqüente publicação do ato de disposição não competiam à recorrente, enquanto representante da entidade cessionária, como decorre da apreciação do art.1º e seu parágrafo único, do Decreto nº 49/99.
É notório, todavia, que a comprovação da necessidade do serviço, justificada em exposição de motivos fundamentada, incumbia à companhia cessionária, a qual a recorrente dirigia.
Entretanto, não foram encontrados na entidade quaisquer documentos com os quais se pudesse aferir se aquelas justificativas foram efetivamente prestadas e se comprovavam, de fato, a real necessidade dos atos de disposição.
Conforme o ministro, "a aposentadoria não se dá às expensas de nenhum empregador senão do próprio sistema de previdência, o que já significa dizer que o financiamento ou a cobertura financeira da relação de aposentadoria, já transformada em benefícios, desenvolve-se do lado de fora da própria relação empregatícia".
Para o relator, nada impede que, uma vez concedida a aposentadoria voluntária, possa o trabalhador ser demitido. Porém, o ministro destacou que, nessa circunstância, o patrão deverá arcar com todos os efeitos legais e patrimoniais que são próprios da extinção de um contrato de trabalho sem justa motivação.
(...)
Elementar é o conhecimento de que as decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal - STF, em Ações Diretas de Inconstitucionalidade, decorrentes do controle concentrado das normas jurídicas infraconstitucionais, têm efeito erga omnes, atingindo e obrigando a todos.
Logo, dos termos da legislação trabalhista e previdenciária, convenientemente interpretada à luz do mais recente entendimento do Supremo Tribunal Federal, não se pode deduzir a eficácia extintiva da aposentadoria voluntária, conseqüentemente, a manutenção, no quadro de empregados da companhia, de servidor voluntariamente aposentado, não constitui ilegalidade.
Assim sendo, defende-se a posição de que se pode admitir a continuidade, após a aposentadoria, da prestação de serviços dos empregados das estatais, ainda que não tenham se submetido a novo concurso público e logrado aprovação.
Conclui-se, portanto, sob a égide dos imperativos da legalidade e justiça, que não deve prosperar a cominação da multa supracitada no item 6.1.2, pugnando-se pelo cancelamento da mesma.
Quanto ao item 6.1.3 do Acórdão:
6.1.3. R$ 100,00 (cem reais), em face do pagamento de horas-extras além do limite permitido em lei, em descumprimento aos arts. 37, caput, da Constituição Federal e 59 da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT.
Acerca da duração da jornada laborativa, a legislação pertinente, qual seja, a Consolidação das Leis do Trabalho (Decreto-Lei nº 5452/43) assim estabelece:
A fixação do limite máximo de 12 (doze) horas trabalhadas por dia, incluídas todas as horas extras legalmente admitidas, visa, primordialmente, à proteção da saúde do trabalhador. Portanto, mesmo se tratando de força maior, ou necessidade de serviço inadiável, aquele limite deve ser observado, constituindo, sua superação, flagrante irregularidade, por afrontar dispositivio legal.
(...)
(...)
A irregularidade vislumbrada concerne à falta de alteração do Regimento Interno da companhia, segundo art. 135, da Lei Federal 6404/76, disciplinando o aumento do número de Gerências e Gerentes de Mercado. Se havia necessidade de alteração dos padrões delineados no estatuto da entidade, por mostrarem-se superados diante do incremento das demandas, mister que os trâmites legais fossem observados, ou seja, que, mediante prévia convocação da Assembléia Geral, o estatuto sofresse a necessária reforma, consoante o art. 135 da Lei Federal 6404/76.
(...)
Ademais, tratando-se, o caso em tela, de sociedade de economia mista, é indispensável a observância das normas estatutárias da entidade, das prescrições da Lei das Sociedades Anônimas e, no que diz respeito ao ingresso no quadro de pessoal de funções permanentes, aos princípios da moralidade e impessoalidade, refletidos, precipuamente, na exigência de aprovação prévia em concurso público.
Logo, o incremento do número de funções de gerência e as respectivas gratificações, alterando o disposto no estatuto, não se perfectibilizou sob a égide da legalidade, tendo em vista a imprescindibilidade de alteração prévia das disposições estatutárias, como determina a Lei 6404/76, diploma legal no qual também devem se pautar as sociedades de economia mista.
A alteração tão somente "consuetudinária" do estatuto, sem que este houvesse sido legalmente reformado, constituiu flagrante irregularidade, passível de multa, como bem entendeu esta Corte de Contas.
A partir das explanações e argumentos acima elencados, posiciona-se no sentido de manter a multa de R$ 100,00 (cem reais) cominada à recorrente no item 6.1.4 do Acórdão.
O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas emitiu o Parecer MPTC nº 6873/2006, fls. 28/29, apresentando seu posicionamento no sentido de conhecer do Recurso, ratificando o Parecer da Consultoria Geral.
É o relatório.
VOTO
CONSIDERANDO a competência deste Tribunal de Contas, conferida pelo artigo 59 da Constituição Estadual, artigo 1º da Lei Complementar n° 202/2000, e no artigo 1°, inciso XV do Regimento Interno;
CONSIDERANDO o exposto no Parecer n° COG 611/06, de fls. 09/27;
CONSIDERANDO o parecer do Ministério Público junto a esta Corte de Contas, MPTC- 6873/06, de fls. 28/29;
Diante do exposto, e com fulcro no artigo 59 da Constituição Estadual, no artigo 1º da Lei Complementar n° 202/2000 e no artigo 7° do Regimento Interno, proponho ao Egrégio Plenário o seguinte VOTO:
1. Conhecer do Recurso de Reexame, nos termos do art. 80 da Lei Complementar nº 202/2000, interposto em face do Acórdão nº 0262/2003, prolatado na Sessão Ordinária de 26/02/2003, nos autos do Processo nº APE 02/02548147, e, no mérito, dar-lhe provimento parcial para :
1.1. Cancelar a multa constante do item 6.1.2 do Acórdão recorrido;
1.2. Dar ao item 6.1.1 a seguinte redação:
6.1.1. R$ 100,00 (cem reais), em face da ausência de documentação atestando a necessidade das disposições, em descumprimento ao art. 1º, parágrafo único, do Decreto Estadual nº 049/99 (itens 1 e 2 do Relatório DCE);
2. Manter os demais termos do Acórdão recorrido;
3. Dar ciência deste Acódão, do Relatório e Voto que o fundamentam, bem como deste Parecer, à Sra. Marli Terezinha Marçal, ex- Diretora Presidente da CEASA/SC.
LUIZ ROBERTO HERBST
Conselheiro Relator