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TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE SANTA CATARINA DIRETORIA DE CONTROLE DA ADMINISTRAÇÃO ESTADUAL INSPETORIA 3 DIVISÃO 8 |
PROCESSO |
ACI 06/00307395 |
UNIDADE GESTORA |
SECRETARIA DE ESTADO DA SEGURANÇA PÚBLICA E DEFESA DO CIDADÃO |
INTERESSADO |
SECRETARIA DE ESTADO DA FAZENDA |
ASSUNTO |
RELATÓRIO DE AUDITORIA (SEF) Nº 062/97 |
RELATÓRIO DE INSTRUÇÃO |
DCE/INSP3/DIV8 N.° 69/2006 |
A Secretaria de Estado da Fazenda encaminhou a esta Corte Contas, com fundamento nos artigos 60 e seguintes da Lei Complementar nº 202/00 e, ainda, no artigo 4º, parágrafo 2º, do Decreto nº 425, de 05 de agosto de 1999, o resultado da auditoria de controle interno autuada no processo PSEF nº 57846/979 (nele apensado o de nº PSEF 61910/996).
A instrução do presente processo demonstra que, desde o exercício de 1997, por meio do relatório nº 062/97, de 24/10/97, fs. 04 a 10 dos autos, a Diretoria de Auditoria Geral (DIAG), da Secretaria de Estado da Fazenda, tem suscitado uma diretriz legal para o pagamento de honorários aos médicos e psicólogos que realizam, respectivamente, os exames de aptidão física e mental, para habilitação e renovação da Carteira Nacional de Habilitação no Departamento Estadual de Trânsito e Segurança Viária - DETRAN, conforme o exigido pelo Código de Trânsito Brasileiro.
A conclusão destes trabalhos integra a informação SEF/DIAG nº 052/2005, de fs. 295 a 307, que comporta observações distintas, quanto à alocação de profissionais necessários à realização dos exames físicos e de aptidão psicológica, atinentes, ambos, à habilitação para o trânsito.
Quanto ao exame de aptidão física, a já mencionada Diretoria de Auditoria Geral aponta como restrições a possibilidade de formação de vínculo empregatício, a "eventual" acumulação de funções públicas, uma vez que alguns dos médicos credenciados seriam servidores do Estado e, por fim, a constatação de que o Estado estaria suportando todos os ônus da arrecadação, assim considerados a remuneração dos servidores responsáveis pela consolidação dos documentos de receita com os valores efetivamente pagos, o espaço físico utilizado para as consultas e os custos bancários.
De acordo com o declinado na Informação SEF/DIAG nº 052/2005, f.306, a solução advogada pela Diretoria de Auditoria Geral, produto da longeva discussão a respeito da matéria, que já perfaz quase dez anos, seria a "retirada da estrutura do Estado da prestação dos serviços destinados ao fornecimento dos exames médicos aos candidatos à Carteira Nacional de Habilitação" e, ainda, a realização de licitação precedente à contratação de médicos e psicólogos, nos termos do artigo 137 da Constituição Estadual e da Lei nº 12.291, de 21/06/02 (fs. 306 e 307 dos autos).
Ao final de seu completo relato, a senhora auditora sugere o encaminhamento da matéria a esta Corte de Contas e à Procuradoria Geral de Justiça do Estado, sugestão esta examinada pela Douta Consultoria Jurídica da Secretaria de Estado da Fazenda que, no parecer de fs. 314 a 318 dos autos, expressou-se pelo encaminhamento a esta Casa, relegando a seus respectivos encargos a deliberação quanto à representação da matéria junto ao Ministério Público do Estado.
Efetivado o encaminhamento do procedimento de auditoria a esta Corte de Contas, segue a análise do feito por este Corpo Instrutivo.
2.1 O Regime de Contratação dos Profissionais Credenciados / art. 148, do Código de Trânsito Brasileiro - CTB
É de se examinar, em primeira análise, o mérito das questões colacionadas pela Diretoria de Auditoria Geral da Secretaria de Estado da Fazenda.
Neste mister, tem-se como ancoragem inicial a data em que se principiaram os questionamentos produzidos pela Diretoria de Auditoria Geral, em 24/10/1997, por meio do relatório de Auditoria nº 062/97, fs. 04 a 09.
Como cerne da controvérsia se identifica, preliminarmente, algumas disposições insertas no Código de Trânsito Brasileiro - CTB, Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997.
A primeira destas questões a examinar é a que diz respeito à exigibilidade de realização de licitação precedente aos exames de aptidão física e mental, nas situações enumeradas do artigo 147 do Código de Trânsito Brasileiro - CTB, sobretudo para a habilitação.
A outra norma legal se reporta à permissão impressa no artigo 148, também do Código de Trânsito Brasileiro, de que estes exames de habilitação, exceto os de direção veicular, possam ser aplicados por entidades públicas ou privadas, credenciadas pelo órgão executivo do trânsito dos Estados e do Distrito Federal, condicionado isto, apenas, ao estabelecimento de normas pelo CONTRAN.
Este poder regulamentar conferido ao Conselho Nacional de Trânsito - CONTRAN, por sua vez, advém do artigo 12 do CTB.
Nesta senda, a Resolução nº 80, de 19/11/1998, expedida pelo CONTRAN, fs. 325 a 333, circunscreve os critérios para realização dos exames de aptidão física e mental e, ainda, os requisitos para o credenciamento dos médicos e psicólogos avaliadores.
Desde a sua primeira leitura se denota claramente que o Diploma normativo acima aludido comporta todas as regras que fundamentam à larga as restrições apostas pelo pela Diretoria de Auditoria Geral da Secretaria de Estado da Fazenda.
Para os profissionais médicos, a mencionada Resolução 80/98 comporta os regramentos aplicáveis ao caso em tema que, em breve resumo, seguem listados:
- os profissionais já credenciados tiveram até a data de 1º de janeiro de 2000 para se adequarem aos requisitos de qualificação profissional naquela Resolução impostos (item 13, do anexo I, da Resolução nº 80/98);
- aos serviços médicos dos Órgãos Executivos de Trânsito - DETRAN se atribui a tarefa de fiscalização dos credenciados (item 14, do anexo I, da Resolução nº 80/98);
- para o efeito de padronização nacional o preço da Avaliação de Aptidão Física e Mental será o equivalente ao de uma consulta médica, determinado nas lista de procedimentos médicos da Associação Médica Brasileira, fixado pelos Órgão Executivo de Trânsito (item 15, do anexo I, da Resolução nº 80/98);
- a exigência de que todas as avaliações, física, mental e psicológica sejam realizadas em ambiente exclusiva e específico para este fim (item 16, do anexo I, da Resolução nº 80/98);
- os psicólogos já credenciados tiveram um prazo de dois anos para se adaptarem ao artigo 148 do CTB, como pessoa jurídica (item 5.1.1, do anexo II da Resolução nº 80/98);
- os novos credenciados deverão obedecer às regras estabelecidas pelos Órgãos Executivos de Trânsito e aos requisitos profissionais estabelecidos pela Resolução ora em comento (item 5.2, do anexo II, da Resolução nº 80/98);
- cumprimento, pelos psicólogos da carga horária de 120 horas, com a distribuição eqüitativa de exames entre os credenciados (itens 5.4 e 5.7, do anexo II, da Resolução nº 80/98);
- o preço da Avaliação Psicológica é o equivalente à Tabela Referencial de Honorários dos Psicólogos que consta no Conselho Federal de Psicologia, e será fixado pelos Órgãos Executivos de Trânsito (item 6.1, do anexo II, da Resolução nº 80/98);
- a fiscalização dos psicólogos credenciados é realizada de forma integrada entre os Conselhos Regionais de Psicologia e os setores de Psicologia dos órgãos de Trânsito Estaduais (item 6.2, do anexo II, da Resolução nº 80/98);
- os psicólogos já credenciados poderiam ser mantidos habilitados desde que adaptados ao novos regramentos e prazos de adequação (item 6.12, do anexo II, da Resolução nº 80/98).
Por todo o exposto, ressoa clara a configuração da afronta à legislação de regência, por parte do DETRAN no que concerne ao credenciamento de médicos e psicólogos para a realização de exames de habilitação.
De outra parte, cumpre agora examinar a exigibilidade de licitação precedente ao credenciamento dos profissionais médicos e psicólogos.
A Lei Estadual nº 12.291/2002, regulamentada pelo Decreto nº 1.638, de 5 de abril de 2.004 incluiu, entre o rol de serviços de trânsito delegáveis, por meio do instituto da permissão, o credenciamento de médicos e psicólogos, foi revogada pela Lei Estadual nº 13.721, de 16 de março de 2.006.
Ainda assim, a despeito desta revogação, subsiste a permissão impressa no artigo 148 do Código de Trânsito Brasileiro, para o credenciamento de profissionais.
Sob a égide da tentativa de regulação já revogada, na esfera estadual, concebeu-se que, como fruto deste credenciamento, fosse possível celebrar contrato no regime de permissão para a execução de serviços públicos.
Também não se pode deixar de observar que o contrato de permissão de serviços públicos deve ser, por força de mandamento constitucional, consubstanciado no artigo 175 da Constituição Federal, precedido de licitação.
De outra parte, tem-se que o credenciamento é uma construção do repertório doutrinário, não possuindo regramento específico, na Lei nº 8.666/93 ou em qualquer outro Diploma Legal.
O projeto de Lei nº 146/2003, possível substituto da Lei nº 8.666/93, ainda em trâmite no Congresso Nacional, reconhece o instituto de credenciamento classificando-o como um dos "procedimentos auxiliares à licitação", oferece disciplina que, embora ainda não promulgada, absorve e revela os conceitos já consagrados pela doutrina e pela jurisprudência, in verbis:
Art. 32. O credenciamento é ato administrativo de chamamento público, processado por edital, destinado à contratação de serviços junto àqueles que satisfaçam os requisitos definidos pela Administração, observado o prazo de publicidade de no mínimo 10 (dez) dias úteis, aplicando-se as regras do art. 42 desta Lei.
§ 1º O credenciamento é indicado quando o mesmo objeto possa ser realizado por muitos contratados simultaneamente, como a execução de serviços médicos, jurídicos ou treinamento comum.
§ 2º O pagamento dos credenciados é realizado de acordo com a demanda, tendo por base o valor pré-definido pela Administração, a qual pode utilizar-se de tabelas de referência.
De fato, este instituto se constitui em um processo seletivo, que guarda razão de equivalência com a licitação dispensada, mediante a ausência de competição, uma vez que todos os profissionais que preencherem as condições mínimas divulgadas poderão ser credenciados.
A respeito desse assunto já se pronunciou o Tribunal de Contas da União, por meio da Decisão nº 656/95, sob a relatoria do Ministro Homero Santos, nos termos que se seguem:
Especificamente sobre a questão da inexigibilidade de licitação, concluiu-se, com base nos posicionamentos doutrinários a respeito desse tema, que o credenciamento de serviços de assistência médico-hospitalar pode ser incluído entre os que atendem às condições legais ensejadoras da exceção à regra de observância prévia do procedimento licitatório, considerando-se, ainda, as particularidades de que se reveste o procedimento, com a contratação irrestrita de todos os prestadores de serviços médicos, pessoas físicas ou jurídicas, que preencham as condições exigidas; a fixação, de forma antecipada, do preço dos serviços; a escolha, pelos próprios beneficiários, entre os credenciados, de profissional ou instituição de sua preferência.
Nesta ordem, restam algumas considerações atinentes ao tema, a se perceber a necessidade de universalização destes credenciamentos, com a inescusável ampla publicidade de suas normas, a instrumentalização deste ajustes e a definição da temporalidade dos contratos decorrentes.
Estas questões estão claramente disciplinadas pela Lei nº 8.666/93, sob a letra dos artigos 57, 60 e 61.
Por último, quanto à de acumulação irregular de funções públicas por médicos contratados pelo DETRAN, esta possível irregularidade pode e deve ser apurada em procedimento próprio, uma vez que os dados atinentes à matéria não integram o presente caderno processual.
Pelo exposto, infere-se que o procedimento de contratação de psicólogos e médicos pertinentes à habilitação para o trânsito fere o disposto no artigo 148 do Código de Trânsito Brasileiro , com a regulamentação produzida pela Resolução CONTRAN Nº 80, de 19/11/1998.
2.2. A Apuração de Irregularidades pelo Controle Interno/art. 62, parágrafo primeiro da Constituição Estadual de 1.989
É oportuno colacionar importante observação registrada no relatório preambular, de 1997, exarado pela Diretoria de Auditoria Geral da Secretaria de Estado da Fazenda ( fs. 06 e 08):
A forma da cobrança dos exames necessários à obtenção da Carteira Nacional de Habilitação não é igualitária. O Exame Psicotécnico está previsto na Lei de taxas estaduais (10 UFIR) e na portaria SEF nº 16/89, sendo portanto uma Receita Orçamentária. Como o Exame de Sanidade Física e Mental apenas está previsto na portaria ora mencionada a receita é extra - orçamentária e todo o seu valor, com exceção do Imposto de Renda Retido na Fonte, é repassado aos médicos que prestam os serviços. Nesse caso, a estrutura do Estado é colocada à disposição com o intuito de, talvez, facilitar o acesso dos cidadãos que necessitam do documento que se está a comentar. O que acaba ocorrendo, é que o benefício ainda maior fica para os médicos credenciados, não somente pelos valores envolvidos mas pela facilidade de efetuar a cobrança com a utilização da estrutura, como dito, do Estado.
Os exames realizados pela junta Médica do Detran caracterizam a cobrança de "taxa", segundo a definição dessa espécie de tributo prevista nos artigos 77 e 78 do Código Tributário Nacional, a exemplo da que é cobrada para o Exame Psicotécnico, mas que aquela não vem se constituindo em receita do Estado principalmente pela inexistência de disposição legal assim disciplinando.
Outra necessidade de disciplinar o tema é que, por não haver formalmente a definição do horário de trabalho dos médicos credenciados pelo Detran, e por considerar que muitos deles são servidores do Estado com carga horária semanal de 40 horas, fica difícil de verificar se não há choque de horários entre o cargo no Estado (não analisada a possibilidade de vínculo com a União ou Municípios) e o credenciamento no Detran.
Em mesmo diapasão do que foi antes discutido, obtém-se, já em primeira leitura, a constatação inequívoca de irregularidade, face à farta prova documental que então instruiu a referida informação.
Em sentido contrário, a Secretaria de Estado da Fazenda, nos dez anos subseqüentes, submeteu-se a exaustivo debate com a Secretaria de Segurança Pública e o DETRAN, em busca da formação de um consenso para a regularização da forma de realização dos referidos testes.
Neste interregno, observa-se a superveniência da Lei Estadual nº 12.291, de 21 de junho de 2001, que autoriza o Poder Executivo a se utilizar do instituto da permissão para a execução de serviços públicos delegados de credenciamento de aptidão física e mental para o trânsito.
Na seqüência, tem-se a edição do Decreto Estadual nº 1.638, de 5 de abril de 2.004, com a missão inscrita de "regulamentar a atividade de psicólogo perito examinado do trânsito no Estado de Santa Catarina".
O aludido diploma regulamentar - que se reporta, apenas, é de se frisar, aos peritos psicólogos - normatiza as condições de habilitação e credenciamento, critérios de seleção, contratualização e remuneração e, por fim, exonera as instalações físicas do Detran da realização destes exames, ao incluir, no processo de credenciamento, um local especificamente destinado à realização destes testes, aos encargos do permissionário (artigo 15 e seguintes).
Contudo, subsistiram sem combate um dos problemas nucleares identificados pela Secretaria de Estado da Fazenda, quais sejam, ausência de licitação precedente ao credenciamento de médicos e psicólogos e a evasão de receitas - neste caso especialmente quanto aos peritos médicos.
Por fim, com o advento da Lei nº 13.721, de 16 de março de 2006, f. 322, o credenciamento de médicos e psicólogos é excluído do rol de possibilidades de delegação de serviços, sob o regime de permissão, com a revogação da Lei nº 12.291/2005, conforme disposição expressa inscrita no artigo 9º.
Esses fatos, todos, reunidos, bem compõem uma situação onde claramente se identifica a ausência de uma medida fática e compromissada com a resolução das irregularidades anotadas.
É de se observar que esta irregularidade não se opera, apenas, em juízo de adequabilidade ou eficiência, mas de ilegalidade.
Por derradeiro, é de se considerar que a Constituição Estadual de 1989 impõe, por meio do parágrafo do artigo 62, parágrafo 1º, aos responsáveis pelo Controle Interno, a ciência a esta Corte de Contas de Contas, sob pena de responsabilidade solidária.
3 CONCLUSÃO
Ante o exposto, sugere-se:
3.1. Seja procedida Audiência nos termos do art. 29, § 1º, da Lei Complementar nº 202/00, do Senhor Dejair Vicente Pinto, com CPF nº 155082699-91, atual Secretario de Estado da Segurança Pública e Defesa do Cidadão, com endereço na rua Campolino Alves, nº 956, Bairro Abraão, em Florianópolis, SC, CEP nº 88085-110, para apresentação de justificativas, em observância ao princípio do contraditório e da ampla defesa, a respeito da irregularidade constante do presente Relatório, sujeita à aplicação de multas, previstas na Lei Orgânica do Tribunal de Contas e no seu Regimento Interno, conforme segue:
3.1.1. Realização de procedimentos de contratação e remuneração de médicos e psicólogos, para a realização de exames de habilitação para o trânsito, afrontatórios ao disposto no artigo 148 do Código de Trânsito Brasileiro e na Resolução CONTRAN Nº 80, de 19/11/1998, pertinentes ao credenciamento destes peritos examinadores e à irregular manutenção de profissionais médicos na estrutura do Estado e sistemas de remuneração não compatíveis com o referenciado pela Associação Médica Brasileira e pelo Conselho Federal de Psicologia, conforme item 2.1 do presente relatório.
3.2. Dar ciência do presente relatório ao Senhor Alfredo Felipe da Luz Sobrinho, atual Secretário de Estado da Fazenda.
É o Relatório.
DCE, em 27 de setembro de 2006.
Auditor Fiscal de Controle Externo
Eliane Rollim da Silva Silveira
Auditor Fiscal de Controle Externo
DCE, Inspetoria 3, em ___/ ___/____
Auditor Fiscal de Controle Externo
Coordenador de Controle
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Disp. em<http://cspsc.org.br/pagina.php?=exercicioprofissional/perito_exminador_transito.php>.Acesso em 01.set.2006