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Processo n°: | CON - 06/00440710 |
Origem: | Prefeitura Municipal de Itapoá |
Interessado: | Sérgio Ferreira de Aguiar |
Assunto: | Consulta |
Parecer n° | COG-0549/06 |
CONSULTA. TRIBUTÁRIO. ADMINISTRATIVO. PRESCRIÇÃO. CRÉDITO. RECONHECIMENTO DE OFÍCIO. POSSIBILIDADE.
É possível o reconhecimento, de ofício, pela Administração Pública Municipal, da ocorrência da prescrição, nos termos do art. 174 c/c art. 156, V, do CTN, em decorrência do não-ajuizamento da ação de execução fiscal ou, caso ajuizada, não tenha ocorrida a citação do devedor no prazo de 05 anos (desde que inércia não decorra de ato do próprio executado),
Havendo o reconhecimento de ofício da prescrição do crédito tributário inscrito em dívida ativa pela Administração, devem ser adotadas as seguintes medidas administrativas: a) autorização legislativa para exclusão do crédito, em razão do princípio da legalidade; b) apuração da responsabilidade do agente público incumbido da cobrança dos créditos tributários; c) comunicar o fato ao Ministério Público Estadual, tendo em vista que créditos tributários são bens públicos indisponíveis.
Senhora Consultora,
Trata-se de Consulta interposta pelo Sr. Sérgio Ferreira de Aguiar, Prefeito Municipal de Itapoá, suscitando dúvidas acerca da prescrição de crédito tributário, nos seguintes termos:
É lícito à Administração Pública Municipal reconhecer via administrativa a ocorrência do instituto da prescrição, face ao contido no art. 174 do CTN, uma vez que não precedeu o regular lançamento de seu crédito ou porque, embora promovida a execução fiscal, não houve citação do devedor no prazo de 5 anos?
É o relatório.
II. DOS REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE
A consulta trata de matéria sujeita a exame e fiscalização desta Corte de Contas, nos termos do inciso XII, do artigo 59, da Constituição Estadual.
Considerando que a Consulta vem firmada pelo Prefeito Municipal de Itapoá, Sr. Sérgio Ferreira de Aguiar, tem-se como preenchido o requisito de legitimidade, consoante o disposto nos artigos 103, II e 104, III, da Resolução n. TC-06/2001, desta Corte de Contas.
Observa-se ainda que a consulta não veio instruída com parecer da assessoria jurídica do órgão ou entidade consulente, conforme preceitua o art. 104, V, da Resolução n. TC-06/2001 (Regimento Interno do TCE/SC), contudo, o Tribunal Pleno poderá conhecer de consulta que não atenda a esta formalidade, conforme autoriza o parágrafo 2º, do artigo 105 do referido Regimento.
III. DO MÉRITO
Preliminarmente cabe destacar que a análise da presente Consulta limita-se a análise da Prescrição do Crédito Tributário. A prescrição do crédito nasce com o lançamento do crédito; é a partir dele, observadas as normas particulares, que inicia a contagem do prazo. Portanto, está excluída da análise da presente consulta, nos termos da Consulta: "prescrição quando não procedido o lançamento do crédito", porque nesse caso trata-se de outro instituto: decadência, que é a perda do direito de lançar o crédito.
A prescrição do crédito tributário, prevista no art. 174, V, do Código Tributário Nacional CTN, dispõe:
"art. 174: A ação para cobrança do crédito tributário prescreve em 5 (cinco) anos, contados da data da sua constituição definitiva.
Parágrado único: A prescrição se interrompe:
I. pelo despacho do juiz que ordenar a citação em execução fiscal;
II. pelo protesto judicial;
III. por qualquer ato judicial em mora o devedor;
IV. por qualquer ato inequívoco ainda que extrajudicial, que importe em reconhecimento do débito pelo devedor."
A palavra prescrição, segundo Hugo de Brito Machado1 "significa a extinção do direito de ação pelo decurso do tempo desde o seu nascimento até o final do prazo legalmente estabelecido para esse fim". Para referido autor a palavra "prescreve" no art. 174 quer dizer extingue-se, ou seja, a prescrição da ação para a cobrança do crédito tributário é a extinção do direito processual de ação da Fazenda Pública, para haver do sujeito passivo da obrigação tributária o pagamento do crédito. Portanto, trata-se de extinção do direito de interpor a ação, caso não ajuizada no prazo fixado em lei, qual seja, 5 anos.
Cabe destacar assim, que a prescrição decorre da necessidade da segurança jurídica das relações, sendo uma forma de garantir a estabilidade das mesmas quando estas permaneceram sem questionamento durante o tempo legalmente estabelecido.
O art. 156, V, do Código Tributário Nacional, diz expressamente que a prescrição extingue o crédito tributário. Assim, a prescrição não atinge apenas a ação para cobrança do crédito tributário, mas o próprio crédito, vale dizer, a relação material tributária, ou seja, prescreve também administrativamente, não podendo mais o Órgão administrativo exigir ou condicionar o pagamento.
Com efeito, quando efetiva e devidamente prescrita a ação para a cobrança do crédito tributário, este estará extinto, cabendo à Administração, de ofício, determinar a baixa de todos os registros pertinentes.
Dentro desse contexto deve ser observado que a impossibilidade da cobrança do crédito não gera renúncia de receita. Dispõe o art. 14 da LRF:
Nos termos do artigo descrito, por meio de uma interpretação literal, percebe-se que a prescrição da cobrança do crédito tributário não é hipótese de concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária, portanto, desnecessário os requisitos exigidos para o caso de renúncia de receita quando prescrito o crédito tributário.
No caso em tela, a falta de ação da Administração (anterior) no sentido de ajuizar a cobrança, ocasionando a prescrição, não se caracteriza como concessão de qualquer benefício. Desta forma, nesse caso não se aplicaria ao caso a transcrita regra posta na LRF.
Por outro lado, a prescrição também pode ocorrer após o ajuizamento da ação, conforme bem dispõe o Consulente "embora promovida a execução fiscal, não houve citação do devedor no prazo de 5 anos".
Após o ajuizamento da ação executiva pode ocorrer a chamada prescrição intercorrente; trata-se de hipótese em que o processo ficou paralisado em razão da inércia da Fazenda Pública exeqüênte, quando decorreu tempo superior a 5 anos sem que o executado fosse citado.
Ainda no que diz respeito ao reconhecimento da prescrição após o ajuizamento da ação, devem ser observadas as hipóteses de suspensão e interrupção da prescrição, assim definidades segundo Hugo Machado de Brito2:
"suspensão é a paralização do curso do prazo até que cesse a causa, recomeçando em seguida a correr o prazo que estava suspenso. Já a interrupção é a desconsideração do prazo já decorrido, que fica isolado, recomeçando a correr a partir de então, pelo mesmo tempo inicialmente previsto, salvo determinação específica de lei em sentido diverso".
As hipóteses de suspensão estão previstas no art. 151 do CTN, como a moratória, depósito do montante integral, parcelamento, etc., quando o processo fica paralisado. Já no caso da interrupção despreza-se o prazo já transcorrido, iniciando-se a contagem novamente, exceto se a lei dispuser prazo diverso (art. 174 do CTN).
Com relação ao reconhecimento de ofício do instituto da prescrição, oportuno destacar que nas ações judiciais de âmbito do direito privado e especialmente quando se tratava de direitos patrimoniais, prevalecia o entendimento pelo não-reconhecimento da prescrição.
Já no âmbito do Direito Tributário (Direito Público), não era esse o entendimento, conforme destaca Rizzatto Nunes3 "o direito de cobrar tributo, por ser indisponível, e por ter que respeitar o princípio da legalidade e em estando estabelecido pelo CTN que a prescrição se opera em cinco anos, pode e deve ser avaliado e julgado ex offício".
Nesse sentido também se manifesta o Superior Tribunal de Justiça4, consagrando a possibilidade/necessidade do reconhecimento, de ofício, da prescrição do crédito tributário, nos seguintes termos:
"[...]
2. A mera prolação do despacho que ordena a citação do executado não produz, por si só, o efeito de interromper a prescrição [...]
4. Paralisado o processo por mais de 5 (cinco) anos impõe-se o reconhecimento da prescrição, ainda que de ofício, se o executado não foi citado [...]
6. Permitir à Fazenda manter latente relação processual inócua, sem citação e com prescrição intercorrente evidente, é conspirar contra os princípios gerais de direito [...]
7. A prescrição [...] faz exsurgir, por força de sua intercorrência no processo, a falta de interesse processual superveniente, matéria conhecível pelo juiz a qualquer tempo".
Apesar de tratar de hipótese de reconhecimento de ofício em ação judicial, e não pela Administração, o mesmo procedimento deve ser observado pela Administração porque, como bem destaca o acórdão, é inviável o ajuizamento de ação de execução fiscal pela Administração em razão de estarem prescritos os créditos tributários em face da ausência de interesse processual da ação.
Oportuno registrar ainda o advento da Lei n. 11.280/2006 de 17/02/2006, que revogou o art. 194 do Código Civil ("O juiz não pode suprir, de ofício, a alegação de prescrição, salvo se favorecer a absolutamente incapaz) e alterou o § 5º do art. 219, do Código de Processo Civil (O juiz pronunciará, de ofício, a prescrição). Com efeito, o entendimento que já era adotado pela jurisprudência vem chancelado pela lei, possibilitando o reconhecimento de ofício do instituto da prescrição pela autoridade judicial.
Estando prescrita a ação executiva, entende-se que não se pode dar curso a uma ação que, a priori, já se sabe inviável. O processo não pode servir como instrumento de perseguição. Não se pode perder de vista de que o rigor e a prudência devem ser observados, não somente por aqueles que detêm o poder de iniciativa das ações, mas sobretudo, por aqueles que podem decidir sobre a sua iniciativa. Ademais, quando o crédito encontra-se prescrito e a ação não foi protocolada, não existe razão para o ajuizamento de uma ação que já nascerá frustrada, demandando gastos e tempo não só à Administração como ao Poder Judiciário. Já quando estiver protocolada a execução e não sendo a razão da demora da citação atribuída ao próprio executado, ocorrendo a prescrição, também cabe a Fazenda Pública pedir a extinção do feito.
Já no que diz respeito ao procedimento a ser adotado pela Administração, quando da existência de dívida prescrita, esta Corte de Contas já se manifestou sobre o tema, conforme Prejulgado n. 15615:
O não-ajuizamento das competentes ações de execução fiscal de dívida ativa regularmente inscrita, decorrente de comprovada desídia do administrador, deixando-as prescrever, e conseqüentemente causando dano ao erário, enseja a instauração de Tomada de Contas Especial por parte da municipalidade (art. 10 da Lei Complementar nº 202/2000), com posterior encaminhamento ao Tribunal de Contas do Estado, nos termos da Instrução Normativa nº TC-001/2001.
A Tomada de Contas Especial ao ser recebida por esta Corte de Contas constitui processo, que será julgado em separado se alcançar o valor de alçada. Não atingindo o referido valor, a decisão será dada junto com as Contas Anuais, ou com as Contas de Administrador.
O município, com base em regular procedimento de Tomada de Contas Especial, independentemente de manifestação ou não do Tribunal de Contas, deve inscrever o débito em dívida ativa, promovendo, se for o caso, diretamente a execução judicial dos valores (art. 2º da Lei Federal nº 6.830/80 combinado com 39, §2º, da Lei Federal nº 4.320/64).
A partir da instauração da Tomada de Contas Especial, o serviço de contabilidade municipal pode promover a inscrição do crédito conhecido na conta "Responsabilidade Financeira" (Responsáveis), do Ativo Financeiro Realizável, integrante do Balanço Patrimonial do município
Assim, o Município deve adotar as medidas administrativas quando ocorrida a prescrição de crédito tributário inscrito em dívida ativa, contudo, para excluir os créditos tributários prescritos faz-se necessária a autorização legislativa, em razão do princípio da legalidade.
Outro procedimento que é imprescindível, é apurar a responsabilidade do servidor público incumbido da cobrança dos créditos tributários que não adotou as providências necessárias, fazendo a comunicação do fato ao Ministério Público Estadual, tendo em vista que créditos tributários são bens públicos indisponíveis.
Por fim, respondendo objetivamente a questão, na falta do ajuizamento da ação de execução fiscal ou, caso ajuizada, não tenha ocorrida a citação do devedor no prazo de 05 anos, é possível a Administração Pública Municipal reconhecer de ofício, administrativamente, a ocorrência do instituto da prescrição, nos termos do art. 174 c/c art. 156, V, do CTN.
Considerando o acima exposto, sugere-se ao Exmo. Sr. Relator, que submeta voto ao Egrégio Tribunal Pleno, sobre consulta formulada pelo Prefeito Municipal de Itapoá, nos seguintes termos:
"6.1. Conhecer da presente Consulta por preencher os requisitos e formalidades preconizados no Regimento Interno deste Tribunal.
6.2. Responder à Consulta nos seguintes termos:
6.2.1. É possível o reconhecimento, de ofício, pela Administração Pública Municipal, da ocorrência da prescrição, nos termos do art. 174 c/c art. 156, V, do CTN em decorrência do não-ajuizamento da ação de execução fiscal ou, caso ajuizada, não tenha ocorrida a citação do devedor no prazo de 05 anos (desde que inércia não decorra de ato do próprio executado),
6.2.2. Havendo o reconhecimento de ofício da prescrição do crédito tributário inscrito em dívida ativa pela Administração, devem ser adotadas as seguintes medidas administrativas: a) autorização legislativa para exclusão do crédito, em razão do princípio da legalidade; b) apuração da responsabilidade do agente público incumbido da cobrança dos créditos tributários; c) comunicação do fato ao Ministério Público Estadual, tendo em vista que créditos tributários são bens públicos indisponíveis.
Consultora Geral 2
MACHADO, Hugo de Brito. Comentários ao código tributário nacional. Vol III. São Paulo: Atlas, 2005. p. 567. 3
A possibilidade do reconhecimento de ofício da prescrição em matéria de execução fiscal, em Revista Interesse Público. Notadez, n. 25, maio/junho de 2004. p. 172. 4
Recurso Especial n. 622165/PE. Relator Min. Luiz Fux, julgado em 10/08/2004. 5
Processo: CON-03/06229560, Parecer: COG-142/04, Decisão: 1674/2004, Origem: Prefeitura Municipal de Imbuia, Relator: Auditor Altair Debona Castelan, Data da Sessão: 12/07/2004, Data do Diário Oficial: 14/09/2004
"A concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita deverá estar acompanhada de estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva iniciar sua vigência e nos dois seguintes, atender ao disposto na lei de diretrizes orçamentárias e a pelo menos uma das seguintes condições:
IV. CONCLUSÃO
COG, em 19 de outubro de 2006.
É o parecer.
Contudo, à consideração superior.
ELIANE GUETTKY
De Acordo. Em ____/____/____
DE ACORDO.
À consideração do Exmo. Sr. Conselheiro José Carlos Pacheco, ouvido preliminarmente o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas.
COG, em de de 2006.
ELÓIA ROSA DA SILVA
1
MACHADO, Hugo de Brito. Comentários ao código tributário nacional. Vol. III. São Paulo: Atlas, 2005. p. 561-562.