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Processo n°: | REC - 06/00464490 |
Origem: | Prefeitura Municipal de Santa Terezinha |
Interessado: | João Valmir Schlatter |
Assunto: | (Reexame - art. 80 da LC 202/2000) -LRF-04/03849934 |
Parecer n° | COG-609/06 |
EMENTA. Recurso de Reexame. Verificação cumprimento Lei Responsabilidade Fiscal. Relatórios Resumidos de Execução Orçamentária e de Gestão Fiscal. Aplicação de Multa por descumprimento ao art. 71 da LRF. Argüição de Preliminar. Ausência de defesa quanto ao mérito. Conhecer e negar provimento.
O artigo 70, II, da LC-202/00 tem aplicação imediata. A "grave infração" possui um conceito jurídico indeterminado de natureza discricionária que atribui ao seu intérprete e aplicador uma livre discrição, dentro dos parâmetros da legalidade, razoabilidade e proporcionalidade, valendo a sua valoração subjetiva para o seu preenchimento.
Senhora Consultora,
Tratam os autos nº 06/00464490 de Recurso de Reexame interposto pelo Sr. João Valmir Schlatter - ex-Prefeito Municipal de Santa Terezinha, contra o Acórdão nº 1422/2006 exarado no Processo nº LRF-04/03849934.
O referido Processo nº LRF-04/03849934 tratou da verificação do cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal, com abrangência aos Relatórios Resumidos de Execução Orçamentária dos 1º ao 6º bimestres de 2003 e de Gestão Fiscal dos 1º e 2º semestres de 2003 do Poder Executivo de Santa Terezinha, empreendida por esta Corte de Contas através de sua Diretoria de Controle dos Municípios - DMU.
A Prefeitura de Santa Terezinha encaminhou os dados por meio informatizado à DMU que, após a devida análise, elaborou os Relatórios nºs 299/2004, referente ao 1º semestre/2003 (fls. 03 a 12), e 924/2004, referente ao 2º semestre/2003 (fls. 13 a 23) sugerindo, neste último, a audiência do Sr. João Valmir Schlatter para apresentar defesa acerca das restrições evidenciadas (fls. 22/23).
A audiência foi procedida, entretanto, o ex-Prefeito de Santa Terezinha não ofereceu resposta.
Ato contínuo seguiram os autos para a DMU que, em seu Relatório nº 845/2006 (fls. 27 a 47), concluiu pela aplicação de multa ao Sr. João Valmir Schlatter em face do descumprimento ao art. 71 da LRF.
O posicionamento exarado pela DMU foi acatado na íntegra pelo Ministério Público (fls. 49/50) e pelo Relator do feito (fls. 51 a 53).
Na Sessão Ordinária de 19/07/2006, o Processo nº LRF-04/03849934 foi levado à apreciação do Tribunal Pleno, sendo prolatado o Acórdão nº 1422/2006 (fls. 54/55), portador da seguinte dicção:
"VISTOS, relatados e discutidos estes autos, relativos à verificação do cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal, com abrangência aos Relatórios Resumidos de Execução Orçamentária dos 1º ao 6º bimestres de 2003 e de Gestão Fiscal dos 1º e 2º semestres de 2003 do Poder Executivo de Santa Terezinha.
Considerando que foi efetuada a audiência do Responsável, conforme consta na f. 25-A dos presentes autos;
Considerando que não houve manifestação à audiência, subsistindo irregularidades apontadas pelo Órgão Instrutivo, constantes do Relatório DMU n. 845/2006;
ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro no art. 59 c/c o art. 113 da Constituição do Estado e no art. 1° da Lei Complementar n. 202/2000, em:
6.1. Conhecer dos Relatórios de Instrução que tratam da análise dos dados dos Relatórios Resumidos de Execução Orçamentária dos 1º ao 6º bimestres de 2003 e de Gestão Fiscal dos 1º e 2º semestres de 2003, encaminhados a esta Corte de Contas, por meio eletrônico, pela Poder Executivo de Santa Terezinha, em atendimento à Instrução Normativa n. 002/2001, deste Tribunal.
6.2. Aplicar ao Sr. João Valmir Schlatter - ex-Prefeito Municipal de Santa Terezinha, CPF n. 066.920.529-04, com fundamento no art. 70, II, da Lei Complementar n. 202/2000 c/c o art. 109, II, do Regimento Interno, a multa no valor de R$ 400,00 (quatrocentos reais), em face em face do aumento das despesas com pessoal do Poder Executivo, no exercício de 2003, em relação à receita corrente líquida, em percentual superior a 10% do percentual atingido no exercício anterior, em descumprimento ao art. 71 da Lei Complementar n. 101/2000, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão do Diário Oficial do Estado, para comprovar ao Tribunal o recolhimento da multa ao Tesouro do Estado, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts. 43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000.
6.3. Dar ciência deste Acórdão, do Relatório e Voto do Relator que o fundamentam, bem como do Relatório DMU n. 845/2006, à Prefeitura Municipal de Santa Terezinha e ao Sr. João Valmir Schlatter - ex-Prefeito daquele Município." (grifamos)
Visando à modificação da decisão supra, o Sr. João Valmir Schlatter interpôs o presente Recurso de Reexame.
É o breve Relatório.
II. ADMISSIBILIDADE
O Recorrente, na condição de agente político responsável pelos atos examinados por esta Corte de Contas no Processo nº LRF-04/03849934, possui plena legitimidade para pugnar pela reforma da decisão ora guerreada.
Considerando que o referido processo consiste em exame de verificação do cumprimento das disposições da Lei Complementar nº 101/2000, adequada foi a escolha pelo Recorrente da modalidade "Reexame", nos termos do artigo 79 da Lei Complementar nº 202/2000.
Considerando, ainda, que o decisum atacado foi publicado no Diário Oficial do Estado em 04/09/2006 e o presente recurso protocolado neste Tribunal de Contas em 05/09/2006, verifica-se a tempestividade do mesmo, consoante o disposto no art. 80 da LC-202/00.
Destarte, restaram devidamente preenchidas as condições legais de admissibilidade do Recurso em análise.
III. DISCUSSÃO
Tenciona o Recorrente o cancelamento da multa a ele aplicada no item 6.2 do Acórdão nº 1422/2006 e, para tanto, alega em síntese:
"(...) Portanto, nos termos do inciso II, do art. 70, da Lei Complementar n. 202/2000, o Tribunal de Contas somente poderá aplicar multa, quando apurada 'grave infração à norma legal ou regulamentar'.
Se a Lei admite a classificação de uma infração como sendo 'grave' significa também reconhecer a existência de infrações a normas legais que não são graves. Logicamente, em relação a estas últimas espécies de infração, não foi conferida capacidade para a Corte de Contas aplicar multa, mesmo que as registre.
A LO/TCSC não define o que deve ser entendido por 'grave infração à norma legal' logo, necessita primeiramente ser regulamentado que circunstâncias revestem a infração à norma legal da condição de 'grave', para poder aplicar multa. O Regimento Interno do Tribunal de Contas também não deslinda a matéria.
Por conseqüência, é inexigível: o art. 70, II, da Lei Complementar n. 202/2000, não é auto-aplicável. Depende que essa Corte regulamente o que é ou quando ocorrer 'grave infração à norma legal', as gradações possíveis de sua significância e a proporcionalidade da sanção correspondente, recomendada pelo princípio da razoabilidade....(...)"
Questiona, portanto, o Sr. João Valmir Schlatter a aplicabilidade do art. 70, II, da LC-202/00, em virtude da utilização em seu texto do termo "grave" sem a regulamentação do seu conceito.
Tal argumentação é improcedente e já fora rebatida reiteradas vezes em Pareceres desta Consultoria Geral, com o correspondente acatamento pelo Plenário desta Casa. Vejamos:
"Recurso de Reconsideração. Tomada de Contas especial. Imputação de débito e multas. Conhecer e Dar Provimento Parcial.
"(...) b) grave infração - conceito jurídico indeterminado de natureza discricionária que atribui ao seu intérprete e aplicador uma livre discrição, dentro dos parâmetros da legalidade, razoabilidade e proporcionalidade, valendo a sua valoração subjetiva para o seu preenchimento. Neste sentido, grave infração decorrerá sempre da prática de comportamento típico (se a conduta do fiscalizado adequou-se àquele descrito na norma administrativa), antijurídico (se a conduta ocasionou afronta ao ordenamento) e voluntário (se ocorreu a prévia e consciente opção pela prática ou não do comportamento censurado), que cause um dano, patrimonial ou extra patrimonial, a um bem juridicamente tutelado, que frente aos princípios jurídicos, à probidade administrativa e ao interesse público impeçam que o aplicador da norma sancionadora apresente outra resposta ao fato que não seja a cominação de uma sanção ou a imputação de um débito. (...)" (Processo nº REC - 03/06208563; Parecer COG nº 073/06; Acórdão nº 0997/2006; Relator: Conselheiro Luiz Roberto Herbst; Data da Sessão: 22/05/06; Data DOE: 13/07/06)
Na mesma linha de raciocínio, transcrevemos abaixo trecho da Informação COG nº 0172/05, exarada nos autos do Processo nº REC-04/01498034 que, com muita propriedade, elucida:
"(...) Para que se possa compreender com clareza o exame procedido, algumas premissas devem ser estabelecidas.
Primeiramente, que o art. 70, II, da LC nº 202/00, é decorrência legislativa do artigo 71, VII, da CF/88 que permite a aplicação de sanções aos responsáveis em caso de ilegalidade de despesa ou irregularidade de contas, o qual contém a seguinte redação: "o Tribunal aplicará multa de até cinco mil reais aos responsáveis por ato praticado com grave infração a norma legal ou regulamentar de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial". (...)
Dessa análise, cuja avaliação identificará o "bom" e o "mau" administrador, firma-se uma das relações jurídicas pela qual o Tribunal de Contas, usufruindo do seu poder administrativo sancionador, aplicará uma multa, denominada multa-sanção. É certo que tanto esta espécie de penalidade como a chamada multa-coerção - relacionada com o poder de polícia do Tribunal e que está voltada a garantir a efetividade de sua atuação, em especial, a de realizar auditorias e inspeções, requisitar documentos, bem como determinar que todos aqueles que venham a ser objetos de fiscalização devam ser exibidos aos seus auditores - decorrem da Constituição Federal de 1988, entretanto, seus âmbitos de incidência distinguem-se, apesar de se complementarem no exercício do controle externo.
Em segundo lugar, que as expressões utilizadas no artigo 70, II, da LC nº 202/00, devem coadunar-se com as peculiaridades da multa-sanção, assim:
a) ato praticado - representa ação, um fazer por parte do responsável de modo que as omissões/inércias e o silêncio da Administração não serão elementos caracterizadores da infração.
b) grave infração - conceito jurídico indeterminado de natureza discricionária que atribui ao seu intérprete e aplicador uma livre discrição, dentro dos parâmetros da legalidade, razoabilidade e proporcionalidade, valendo a sua valoração subjetiva para o seu preenchimento. Neste sentido, grave infração decorrerá sempre da prática de comportamento típico (se a conduta do fiscalizado adequou-se àquele descrito na norma administrativa), antijurídico (se a conduta ocasionou afronta ao ordenamento) e voluntário (se ocorreu a prévia e consciente opção pela prática ou não do comportamento censurado), que cause um dano, patrimonial ou extra patrimonial, a um bem juridicamente tutelado, que frente aos princípios jurídicos, à probidade administrativa e ao interesse público impeçam que o aplicador da norma sancionadora apresente outra resposta ao fato que não seja a cominação de uma sanção ou a imputação de um débito. (...)" (grifamos)
Ainda, acerca do mesmo assunto, trazemos a transcrição de parte do Parecer COG nº 86/04 (autos nº REC-01/01914458) que explicita:
"(...) 3) Grave infração à norma legal ou regulamentar de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional ou patrimonial - contrabalançando a intempestividade da escrituração contábil e a gravidade exigida pela norma regimental, tem-se por desarrazoada a invocação dessa conduta para subsidiar o apontamento feito no Acórdão nº 143/2001.
Com efeito, leciona a doutrina, com muita propriedade, que os poderes e deveres atribuídos ao Administrador Público, quando no exercício de suas funções, são estabelecidos pela lei, pela moral administrativa e pela supremacia do interesse público; indicando, assim, que todas as prerrogativas e sujeições a ele conferidas, só poderão ser exercidas dentro dos limites por aqueles impostos.
De outra via, o ordenamento jurídico, frente ao dinamismo do processo de produção das leis e regramento das relações sociais, ao prescrever condutas ou comandos permite no texto legal a existência de expressões gerais e, a princípio, indeterminadas, a fim de propiciar ao aplicador da norma uma maior flexibilidade no enquadramento da situação fática à regra jurídica.
Tal situação, longe de configurar uma legitimação de arbitrariedades no exercício de competências ou fragilidade ao princípio da segurança jurídica, almeja tão-só contemplar inúmeras situações censuradas pelo ordenamento, a partir da definição de parâmetros mínimos que possibilitem aos destinatários pautarem suas condutas. Além disso, uma prévia definição pelo legislador - federal, estadual ou municipal -, das hipóteses reprovadas pelo mundo jurídico, poderia implicar uma limitação na atuação do julgador quando do exame do caso concreto. Por outro lado, poder-se-ia, erroneamente, interpretar que somente os casos a priori delineados seriam passíveis de punição ou rejeição jurídico-social, encontrando-se, os demais, autorizados tacitamente pelo ordenamento.
Por conseguinte, a "grave infração", contida em vários artigos da Lei Complementar nº 202/00 e do Regimento Interno deste Tribunal, não fugindo à regra semântica adotada por outras normas jurídicas, inclusive as de caráter penal, também permitiu ao julgador deste órgão que no desempenho de sua competência constitucional, pudesse atuar, legalmente, com certa maleabilidade.
Assim sendo, "grave infração" decorrerá sempre da prática de comportamentos típicos, antijurídicos e voluntários, que causem um dano, patrimonial ou extra patrimonial, a um bem juridicamente tutelado, que frente aos princípios jurídicos, à probidade administrativa e ao interesse público impeçam que o aplicador da norma sancionadora apresente outra resposta ao fato que não seja a cominação de uma sanção ou a imputação de um débito. Motivo pelo qual o artigo 70, II, da Lei Complementar nº 202/00 possui aplicação imediata. (...)" (ressaltamos)
Nesse contexto, tendo em vista a improcedência da preliminar argüida pelo Recorrente, bem como pela ausência de defesa quanto ao mérito, nosso posicionamento é pela manutenção da penalidade imputada.
2. Dar ciência deste Acórdão, do relatório e voto que o fundamentam, bem como deste Parecer COG, ao Sr. João Valmir Schlatter - ex-Prefeito Municipal de Santa Terezinha.
COG, em 04 de outubro de 2006
Anne Christine Brasil Costa
Auditora Fiscal de Controle Externo
De Acordo. Em ____/____/____
HAMILTON HOBUS HOEMKE
Coordenador
DE ACORDO.
À consideração do Exmo. Sr. Conselheiro José Carlos Pacheco, ouvido preliminarmente o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas.
COG, em de de 2006
ELÓIA ROSA DA SILVA Consultora Geral |