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TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE SANTA CATARINA DIRETORIA DE CONTROLE DA ADMINISTRAÇÃO ESTADUAL INSPETORIA 3 DIVISÃO 8 |
PROCESSO Nº | AOR - 01/01916400 |
UNIDADE GESTORA | SECRETARIA DE ESTADO DA SEGURANÇA PÚBLICA |
INTERESSADO | DEJAIR VICENTE PINTO |
RESPONSÁVEL | ANTENOR CHINATO RIBEIRO |
ASSUNTO | AUDITORIA IN LOCO - ANULAÇÃO DE AUTOS DE INFRAÇÃO DE TRÂNSITO |
Relatório de instrução | TCE/DCE/INSP 3/DIV 8 - nº 03/2007 |
Sr. Coordenador,
1 INTRODUÇÃO
Cuida-se os autos de auditoria procedida na EXTINTA Secretaria de Estado da Segurança Pública, no período de janeiro a maio de 2001, de que trata o relatório nº 109/2001, datado de 31/08/2001, às fs. 60 a 62 dos autos.
Os trabalhos de auditoria, que visaram à verificação da execução do convênio nº 8277/1997-2, evidenciaram anulações indevidas de autos de infrações de trânsito, conforme demonstrativo arrolado à f. 61, o que ensejou a sugestão da instauração do procedimento de tomada de contas especial, nos termos do artigo 10, parágrafo 1º , da Lei Complementar nº 202/2000.
Este egrégio Tribunal Plenário, acolhendo o voto do senhor relator (fs.167/168), alinhou-se ao posicionamento do Corpo Instrutivo, ao determinar a instauração de Tomada de Contas Especial, "em face da existência de dano causado ao erário em razão de alterações indevidas no Sistema Integrado de Multas", conforme o consubstanciado na Decisão nº 0136/2002, de 18/02/2002, f. 169.
O senhor Gestor, em contrapartida, interpôs o recurso de fs. 174 a 183, propugnando a reconsideração da decisão plenária acima aludida, assim fundamentando:
A referida peça recursal foi submetida aos cuidados da douta Consultoria Geral, que assim ementou o seu parecer COG- 054/06 (fs. 184/186):
O senhor relator da matéria, por meio do despacho de fs. 187 a 189, anuiu ao entendimento esposado pela Consultoria Geral desta Casa, determinando a desautuação do processo de recurso e o subseqüente envio dos autos principais à Diretoria de Controle da Administração Estadual para a instrução das justificativas apresentadas pelo senhor Gestor para a não instauração da Tomada de Contas Especial.
Na seqüência, reconduzidos os autos a este Corpo Instrutivo, segue o reexame da matéria nas epígrafes seguintes.
2 REINSTRUÇÃO
2.1. O Pólo Passivo em sede de Tomada de Contas Especial
A par do que já foi antes relatado, o senhor Conselheiro Relator do processo REC 02/07877823, agora acostado aos presentes autos, evocou a possibilidade de "insubsistência da Decisão nº 0136/2006", em razão, também, da deliberação desta Corte de Contas contida nos autos TCE 01/02057303 E LAVRADA NO aCÓRDÃO Nº 2507/2005, que teria firmado a ilegitimidade passiva do senhor Secretário de Estado da Segurança Pública no que pertine à anulação indevida dos autos de infração, "ante a total independência da atuação dos órgãos do Sistema Nacional de Trânsito".
Por isso, em considerações iniciais são necessárias algumas reflexões a respeito do consubstanciado no voto que subsidia o mencionado acórdão nº 2507/2005 (agora costado ao presente processo às fs. 191 a 204).
Na preliminar de seu parecer de voto o r. Julgador aduziu, em breve resumo, a uma, inferindo a total independência dos órgãos integrantes do Sistema Nacional de Trânsito e, a outra, que os convênios de trânsito firmados entre a Secretaria de Estado da Segurança Pública - com interveniência do DETRAN - a Polícia Militar e os Municípios, assentam, no que concerne aos autos de infração do trânsito, lata competência ao Comandante da Organização da Polícia Militar sediada no Município.
No entanto, s.m.j., a presença do senhor Secretário de Estado da Segurança Pública não tem gênese em responsabilização por débito, configurando-se o pólo passivo, o que é possível em sede de julgamento da Tomada de Contas Especial, mas, sim, na ordem de autoridade à qual foram submetidos os encargos de apuração do dano e das responsabilidades.
Observe-se atentamente o que preconiza o artigo 10 da Lei Orgânica desta Casa, Lei Complementar nº 202/2000:
A disciplina legal acima aludida é de ser entendida em duas instâncias, quais sejam, a uma, impõe aos administradores o dever legal de cuidado estrito na apuração de irregularidades trazidas ao seu conhecimento e, a outra, que, até então, a este gestor não é atribuída nenhuma responsabilidade, ou seja, a sua inclusão na seara do pólo passivo demanda que tais administradores tenham adotado uma conduta comissiva, autorizando, aprovando, ratificando, praticando o ato ou, ainda, deixando de praticar ato afeto à sua responsabilidade que, diretamente, oportunizou a lesão.
No momento processual conhecido pela decisão nº 0136/2006, que determinou à Secretaria de Estaria de Estado da Segurança Pública a instauração da Tomada de Contas Especial, reputava-se saber o valor do débito, não sendo possível, contudo, identificar-se um dos seus principais elementos, qual seja, a apuração dos responsáveis por este dano.
Por outro lado, cabe, por fim, registrar que, no que concerne aos termos do convênio atinente ao caso ora submetido a exame, convênio nº 8277/1997-5, fs. 06 a 09, a Polícia Militar figura apenas como agente da autoridade de trânsito, no exercício de seu poder de polícia (fiscalização e autuação das infrações). Senão, veja -se :
Ao assentar as competências recíprocas das entidades convenentes, cincunscreve, entre outras atribuições, as seguintes (f.7):
- à Secretaria de Estado da Segurança Pública, a aplicação das penalidades decorrentes de infração de trânsito, cometidas nas vias públicas do município ( cláusula terceira, item 1, alínea b, do convênio 8277/1997-5);
- à Polícia Militar de Santa Catarina, a expedição de autos de infrações, aos condutores e proprietários de veículos, por infrações de trânsito cometidas, nos termos da legislação em vigor (cláusula terceira, item 1, alínea b, do convênio 8277/1997-5);
- à Prefeitura Municipal, a arrecadação das multas aplicadas por infrações cometidas nas vias pública do município e das taxas decorrentes dos serviços de guincho (cláusula terceira, item 1, alínea a, do convênio 8277/1997-5).
Nesta perspectiva, coube à então Secretaria de Estado da Segurança Pública, por meio do seu Departamento de Trânsito-DETRAN, em breve resumo, conforme o reproduzido acima, os atos remanescentes, atinentes ao processamento da infração constatada, à exceção da arrecadação das multas e das taxas decorrentes dos serviços de guincho.
De outra parte, são necessárias algumas palavras acerca da efetiva superveniência de dano ao erário.
O voto acolhido pelo aCÓRDÃO Nº 2507/2005, mencionado pelo senhor relator designado para o recurso desautuado, faz importante observação quanto à irregularidade ensejadora de débito, fundamental para a presente análise, ao descaracterizar os valores atribuídos aos autos de infração como expectativa de receita pública.
De fato, este Tribunal de Contas do Estado ao fixar as regras para a instauração e organização dos processos de Tomada de Contas Especial, por meio da Instrução Normativa nº 01/2001, de 01/10/2001, circunscreve, em seu artigo 1º, que este procedimento tem lugar para a apuração de responsabilidades em caso de omissão no dever de prestar contas ou na verificada intercorrência de dano ao erário.
No caso ora submetido a exame o fato ensejador da determinação deste Tribunal de Contas à Unidade Gestora em epígrafe, de instauração de Tomada de Contas Especial, é, na orbe do presente procedimento de auditoria ordinária e dos fatos submetidos a exame, o dano ao erário, pertinente ao repasse de 30% (trinta por cento) à Secretaria de Segurança Pública e 30% (trinta por cento) à Polícia Militar do produto da arrecadação das multas que teriam sido anuladas indevidamente.
Com esta configuração, por óbvio, a apuração do dano, configurado pelo fato inquinado, prende-se ao objetivo precípuo de recomposição do prejuízo efetivo.
Neste mister, este dano deve ser valorado e quantificado; é recurso público que, na ausência da irregularidade constatada, comporiam, com liquidez e certeza, o erário.
Mas, com efeito, prepondera perceber que o auto de infração nada mais é que a declaração da infração de trânsito, firmada pelo agente da autoridade de trânsito, e que é submetida a julgamento, seguido da posterior notificação, para a constituição regular da abertura ao contraditório, na forma prevista pelos artigos 280 e seguintes do Código de Trânsito Brasileiro.
Tão somente após o transcurso de todas as fases acima assinaladas é que o auto de infração pode incorrer em débito, e, eventualmente, converter-se em receita para o Estado, apenas considerando-se a instância administrativa.
Destarte, ainda que subsista constatada e indiscutível a anulação dos autos de infração - juridicamente reprovável e que suscita averiguação administrativa e penal, inclusive - é, de mesma forma, inconteste que inexistiu dano ao erário porque o auto de infração de trânsito não é fato gerador de recursos; entre os seus efeitos jurídicos possíveis, não se inclui a constituição imediata e inconteste de débito para o infrator.
Em acréscimo, também se registra que o então Secretário de Estado da Segurança Pública, ao apresentar a esta Corte de Contas as suas justificativas comprovou que os autos de infração antes anulados, foram reinseridos no sistema, fs. 181 a 183.
Quanto à titularidade do cometimento do ato ilegal não se infere qualquer desídia do então Administrador Público nesta investigação, conforme se depreende dos documentos de fs. 177 a 180.
Portanto, estão claramente ausentes os fatos ensejadores de tomada de contas especial declinados pela decisão 0136/2006.
2.3 Da Insubsistência da Decisão nº 0136/2006
O Tribunal de Contas da União, em situações análogas, a exemplo do colacionado nos processos TC ns. 349.072/92-2, 007.707/89-4, 250.540/1995-9, 251.199/1995-9 e 475.626/1997-4, entre outros, tem deliberado pela insubsistência dos acórdãos que determinaram a instauração de tomada de contas especial, e nos quais, a par da questão ora submetida a exame, verificou-se, posteriormente, a perda do objeto da causa determinante desta decisão.
Com isso, outra importante questão se alinha para exame, a mutabilidade das decisões exaradas por esta Corte de Contas.
Por óbvio, tornar insubsistente uma decisão significa torná-la sem efeito, retirá-la do universo jurídico.
Mas é imperioso perceber que as decisões do Tribunal de Contas são produto inegável de atividade judicante, alçadas as suas decisões aos efeitos de uma sentença.
Assim é, que o Supremo Tribunal Federal2, já há muito, inscreveu importante decisão, hoje validada pelo Poder Judiciário como verdadeiro princípio, pela qual assentou que "AO APURAR A ALCANCE DOS Responsáveis PELOS DINHEIROS PÚBLICOS, O TRIBUNAL DE CONTAS PRATICA ATO INSUSCEPTÍVEL DE REVISÃO NA VIA JUDICIAL A NÃO SER QUANTO AO SEU ASPECTO FORMAL OU TISNA DE ILEGALIDADE MANIFESTA".
Produto disso é que a mutabilidade das decisões do Tribunal de Contas somente é juridicamente possível na via recursal.
Jorge Ulisses Jacoby Fernandes3 (op. cit. p.394) oferece importante reflexão acerca da recorribilidade das decisões exaradas pelo Tribunal de Contas, in verbis:
Na verdade, são as mesmas razões que norteiam os princípios da finalidade e da legalidade, hoje erigidos a mandamento constitucional pelo caput do artigo 37 da Magna Carta.
Mas, como já foi relatado, foi denegado o prosseguimento do recurso interposto pelo senhor gestor, quando do juízo de admissibilidade (fs. 187 a 189), determinado-se a desautuação do recurso e acostamento de seus documentos ao presente processo AOR 01/01916400.
Ainda assim, é inegável a necessidade de se rever decisão eivada de equívoco que aqui pode ocorrer somente sob o manto do postulado da autotutela administrativa.
Neste ponto, é de se evocar novamente a lição do eminente publicista Jorge Ulissses Jacoby Fernandes4 que, em já indispensável tratado sobre a Tomada de Contas Especial, consigna, entre os princípios informativos deste procedimento, o da razão suficiente ab-rogável, egresso da doutrina alemã e pelo qual se assenta "a afirmação de que nada acontece sem que tenha uma causa ou razão determinante".
Este princípio, abrigado sob o manto do Direito Administrativo suscita, explica o respeitado administrativista, no encerramento do procedimento na verificada ausência de sua "causa determinante", sem prejuízo da apuração das condutas disciplinares puníveis, se for o caso.
Em situação similar, o Tribunal de Contas da União para proclamar a insubsistência de decisão anterior, considerou, por meio do Acórdão 4/2000 - Plenário, os pressupostos insertos no parecer do Ministério Público, então exarado, como recurso de revisão.
Esta fungibilidade é, por certo, possível, quando o apego à formalidade pode resultar em prejuízo à segurança jurídica e à própria finalidade do ato, conferindo-lhe coerência e certeza.
Neste paradigma, vê-se que o despacho prolatado pelo senhor Conselheiro Relator, ao instruir o recurso de reexame já mencionado, pugna, de fato, pela insubsistência da decisão plenária nº 0136/2002 (fs. 188/189), podendo-se recepcioná-lo, nos presentes autos, como o recurso de reeexame de Conselheiro, presentes que estão os requisitos inscritos no artigo 81 da Lei Complementar nº 202/2000 e artigo 142 do Regimento Interno desta Casa, para reformar a decisão aqui debatida.
3 conclusão
Ante o exposto:
Considerando que a decisão plenária nº 0136/2002, exarada por esta Corte de Contas, reputou prejuízo ao erário consubstanciado na anulação indevida de autos de infração e que, sujeitos ao contraditório e ampla defesa, não incorrem, necessariamente, na consecução de recursos públicos, por meio da aplicação da penalidade de multa,
Considerando, por essas razões, que inexiste o fato ensejador para a instauração da Tomada de Contas Especial, qual seja, o dano quantificável para débito, conforme o inscrito no artigo 10, da Lei Complementar nº 202/2000 e, também, o disposto no artigo 1º da Instrução Normativa nº TC 01/2001,
Considerando, ainda, que os princípios da razão ab-rogável, da finalidade, da legalidade e da autotutela-administrativa, informam e evocam a reforma da decisão nº 0136/2002, sugere-se,
3.1 conhecer como recurso de revisão o despacho de fs. 187 a 189, exarado pelo senhor Conselheiro relator nos autos do recurso desautuado e pertinente ao presente processo, para, dando-lhe provimento, tornar insubsistente a deliberação desta Corte de Contas registrada na decisão plenária nº 0136/2002, de 18/02/2002, pela ausência de seus requisitos ensejadores para a instauração de Tomada de Contas Especial e, ainda,
3.2 Conhecer do Relatório de Auditoria realizada na extinta Secretaria de Estado da Segurança Pública, que se ocupou do levantamento e acompanhamento dos controles sobre os registros e baixas de multas, no que tange à execução do convênio nº 8277/1997-2, relativa ao período de janeiro a maio de 2001, para considerá-los regulares, com fundamento no art. 36, § 2º, "a", da Lei Complementar nº 202/2000.
3.3. Dar ciência desta decisão à Secretaria de Estado da Segurança Pública e Defesa do Cidadão, e ao senhor Antenor Chinato Ribeiro, ex- Secretário de Segurança Pública.
É o relatório.
DCE/ Insp.3/Div.08, em 01/02/2007.
Patrycia Byanca Furtado
DCE, Inspetoria 3, em ___/ ___/______
Odilon Inácio Teixeira
Auditor Fiscal de Controle Externo
Coordenador de Controle
2
MA 7280. Rel. Min. Henrique D' Avila. J. em 20/06/1960. Disponível em http://www.stf.gov.br/jurisprudencia/nova/pesquisa.asp. Acesso em 20/11/2006. 3
Tribunal de Contas do Brasil: Jurisidição e Competência. Belo Horizonte: Ed. Fórum, 2003. P. 394 4
Tomada de Contas Especial: processo e procedimento nos tribunais de contas e na administração pública.2.ed.Brasília, DF: Editora Brasília Jurídica, 1998, p. 73.
Na ponderação de todos esses ângulos de uma complexa temática, até porque seu julgamento, na verdade, sobrepõe-se ao das altas autoridades administrativas e pode reformá-lo, as Cortes de Contas devem encontrar no próprio desenvolvimento de atividades um modo de expurgar do julgamento o erro, criando a possibilidade de reapreciação dos fatos, apontando os desacertos da decisão.
Auditor Fiscal de Controle Externo
DE ACORDO,
À elevada consideração do Sr.Relator, ouvido, preliminarmente, o Douto representante do Ministério Público junto a este Tribunal de Contas.
1
fs. 180 a 183