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TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE SANTA CATARINA DIRETORIA DE CONTROLE DA ADMINISTRAÇÃO ESTADUAL INSPETORIA 3 DIVISÃO 9 |
PROCESSO | SLC - 06/00435717 |
UNIDADE GESTORA | SECRETARIA DE ESTADO DE COORDENAÇÃO E ARTICULAÇÃO |
INTERESSADO | IVO CARMINATI |
RESPONSÁVEL | JOÃO BATISTA MATOS |
ASSUNTO | SOLICITAÇÃO DE LICITAÇÃO, CONTRATOS, CONVÊNIOS E ATOS JURÍDICOS ANÁLOGOS |
RELATÓRIO DE INSTRUÇÃO | DCE/INSP.3/DIV.9/Nº 12/2007 |
1 INTRODUÇÃO
Cuidam, os autos, do atendimento de decisão plenária nº 1816/2006, fs. 2 e 3, pronunciada por esta Corte de Contas em 26/07/2006, sob a relatoria do Conselheiro César Filomeno Fontes, e consubstanciada nos autos ECO nº 05/04191454, cujo teor transcreve-se:
A decisão acima aludida se ocupou da análise prévia de edital de concorrência pública nº 044/2005, deflagrado pela Secretaria de Estado de Coordenação e Articulação, regulamentada nesta Casa por meio da Instrução Normativa nº 001/2002.
Por fim, o senhor Gestor, devidamente citado da deliberação plenária em comento, colacionou no presente processo os documentos de fs. 04 a 28.
Isto posto, segue a análise do autos.
2 ANÁLISE
2.1. Os Autos ECO nº 05/04191454
Em primeiro plano, afiguram-se algumas palavras acerca do processo ECO nº 05/04191454, que se ocupou do exame prévio do edital de concorrência n 044/2005 (fs. 29 a 48), originário da formação dos autos em apreço
O referido edital de concorrência pública visou a "cessão onerosa de direito real de uso da área edificada de 300m² (trezentos metros quadrados) destinada à instalação e funcionamento do restaurante e lanchonete, com vistas ao atendimento das necessidades do Centro Administrativo do Governo Estadual".
Em 04/11/20051 ocorreu a abertura dos envelopes de habilitação dos participantes no certame em apreço.
O exame de instrução, consubstanciado no relatório nº TCE/DCE/ECO nº 233/2005, exarado, tempestivamente, em 04/11/2005, fs. 49 a 59 (fs. 22 a 32 do processo ECO 05/04191454), colacionou as restrições a saber:
O douto representante do Ministério Público junto a esta Casa, se manifestou, em 30/11/2005, fs. 60 a 61, acompanhando o relatório de instrução.
O senhor relator só veio a se manifestar em 08/12/2005, tendo, em seu parecer de voto de fs. 62 a 65, elidido uma das restrições registradas pelo relatório do Corpo Instrutivo, que se reporta à comprovação de detenção nos quadros permanentes da empresa, de profissional de nível superior, com formação em Nutrição ou área correlata.
Esta Corte de Contas, por meio da decisão nº 3516/2005, de 12/12/2005, fs. 69 a 70, acatou o aludido parecer de voto do senhor Relator, argüindo a ilegalidade do edital de concorrência nº 044/2005 e determinando a sustação do procedimento licitatório.
Na data em que o senhor Gestor foi notificado da supracitada decisão de sustação do procedimento licitatório, já havia sido celebrada, inclusive, a contratação pertinente ao edital de concorrência então analisado (f. 68).
O exame de reinstrução (fs. 71 a 82) manteve todas as restrições antes registradas, sugerindo, contudo, que a Diretoria de Controle de Administração Estadual se ocupasse do exame integral do processo licitatório, uma vez que, quando este Tribunal de Contas se manifestou a respeito do aludido edital de concorrência, este já havia incorrido em contratação, e, por isso, já estavam exauridos os efeitos da medida cautelar preconizada pela norma de regência - Instrução Normativa nº 001/2002 - e materializada pela decisão de sustação anteriormente exarada.
O senhor relator, em nova apreciação, fs. 83 a 86, manteve o entendimento antes gravado a respeito das restrições acolhidas, acrescendo, entre outras determinações e recomendações, o encaminhamento dos contratos decorrentes, já aludidos e o encaminhamento dos autos ECO 05/04191454 à esta Diretoria de Controle da Administração Estadual para análise.
Nestes mesmos termos, foi exarada a decisão plenária nº 1816/2006, já aludida.
Isto posto, é de se prestar firme atenção ao fato de que a Unidade Gestora já havia apresentado nos autos ECO 05/04191454, antes da referida decisão plenária em comento, os contratos suscitados pela decisão plenária nº 1816/2006, bem como a integralidade do processo licitatório, já encaminhados todos pelo então gestor responsável, ao colacionar as suas justificativas.
Por isso, considerando-se que os contratos evocados pela decisão nº 1816/2006 já integravam os autos ECO 05/04191454, é possível extrair-se da referida decisão a preocupação com a repercussão das cláusulas editalícias no resultado do processo licitatório então analisado.
Este pensamento encontra, ainda, amparo no fato inarredável de que a legalidade da contratação é decorrente da regularidade do procedimento licitatório que a originou, a par do que assinala o artigo 49, parágrafo 2º, da Lei nº 8.666/93 que concebe que a nulidade do procedimento licitatório induz à do contrato.
Acresça-se, também, que a análise dos aspectos formais dos termos de ajuste e de suas respectivas condicionantes foi realizada por meio do exame da minuta contratual integrante do edital de concorrência nº 044/2005, objeto dos autos ECO 05/04191454.
Emerge, com isso, a necessidade da análise do processo licitatório, com a extração das cópias dos documentos atinentes à concorrência nº 044/2005, que passam integrar o presente caderno processual às fs. 29 a 203.
Segue, portanto, nas epígrafes seguintes, o exame do processamento do edital de concorrência nº 044/2005 e contratos decorrentes.
2.2 Processamento da Concorrência nº 44/2005
Na senda do que esta Corte de Contas determinou, por meio da decisão 1816/2006, assinalando que esta Diretoria de Controle da Administração Estadual deveria receber os autos ECO nº 05/04191454, para considerá-los "quando da análise do processo licitatório e dos atos jurídicos dele decorrentes", cumpre examinar o alcance das restrições então cotejadas no edital, no processamento da licitação.
2.2.1 Critérios de Julgamento
O exame de instrução do instrumento convocatório destacara que o instrumento convocatório assentou que o uso do espaço público, destinado à exploração de restaurante e lanchonete seria instrumentalizado por meio da "cessão onerosa de uso", instituto não conhecido pela Lei e pela Jurisprudência.
Mas a cessão de uso, ensina, uníssona, a doutrina, constitui-se em medida de colaboração entre duas entidades públicas.
No que concerne ao uso privativo de bem público, são duas as possibilidades que se aproximam da solução para o objeto licitado, admitidas pelo sistema jurídico vigente, a par do apontado no relatório de instrução do edital de concorrência pública nº 044/2005, quais sejam, a concessão de direito real de uso e a concessão de uso de bem público.
Em matéria de direito real de uso, a Administração Pública poderá se valer do instituto da concessão previsto no artigo 7º do Decreto - Lei nº 271/67, que se reporta, no entanto, ao trespasse do uso de bens dominicais, nas condições estabelecidas no citado Diploma Legal de regência.
Essa também é a inteligência do egrégio Tribunal de Justiça do Estado2 que, na voz do então relator Desembargador Nicanor da Silveira, assentou que os contratos de natureza semelhante aos aqui analisados, guardam estreita semelhança com a chamada concessão de direito real de uso, regulada pelo Decreto-Lei nº 271/67, embora o enquadramento das características e fins ali firmados não dirijam, diretamente ao caso em epígrafe.
Nota-se, por tudo isso, e a par do entendimento firmado pelo relatório de instrução do instrumento convocatório em comento (fs. 53 e 54), que, ao uso de bem público definido pelo edital, é da lei e da Jurisprudência a utilização do instituto da concessão de uso de bem público, sendo remanejáveis, para este caso, as disposições da Lei nº 8987/95.
Em mesma direção esta Corte de Contas já, há muito, lavrou prejulgado da matéria, nº 3863, in verbis:
Nesta senda, o critério de julgamento adequado ao caso e que melhor satisfaz ao interesse público é o de maior lance ou maior oferta, assinalado tanto pelo artigo 45, inciso IV, da Lei nº 8.666/93, bem como pelo artigo 15, inciso II, da Lei nº 8.987/95.
No entanto, o parâmetro adotado pela Administração Licitante foi o de menor preço (item 1.1 do edital, f. 29).
Por óbvio, não são necessários juízos mais aprofundados para se perceber que o tipo de licitação "maior lance" ou "maior oferta" é o que preconiza a proposta mais vantajosa, ou seja, a maior oferta, a maior contraprestação a ser auferida pelo Poder Público, em retorno pelo uso do espaço público concedido.
Mas a Administração Licitante fixou o preço mensal de R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais) para a área destinada ao restaurante e de R$ 500,00 (quinhentos reais), correspondentes ao uso da área destinada à lanchonete (contratos ns. 043/2005, fs. 06 a 18 e 044/2006, fs. 20 a 28, respectivamente).
O critério de julgamento, portanto, foi centrado nos preços dos produtos a serem ofertados pelos licitantes, que não têm finalidade pública e, tampouco, proveito assinalado à Administração Pública.
Com efeito, ainda que de cessão ou concessão de direito real de uso, como evoca a lei, é de se ver que o objeto declarado pelo certame em relevo, por meio do item 2 do edital - OBJETO DA LICITAÇÃO - é o uso do espaço assinalado para a exploração dos serviços de restaurante lanchonete e em torno deste é que é admissível se estabelecer o competitório.
Destas observações, emerge, cristalinamente, o desvio de finalidade da licitação, o que atinge os princípios insculpidos no caput do artigo 37 da Constituição Federal.
Alinha-se a esta ilegalidade o prejuízo materializado pela ausência de levantamentos, com fundamento nos preços praticados pelo mercado imobiliário, que justifiquem o valor concebido para a contrapartida pela denominada "cessão de uso".
A necessidade desta avaliação tem paralelo no artigo 7º, parágrafo 2º, inciso II, e no disposto no artigo 40, parágrafo 2º, inciso II, e, ainda, nos princípios fundamentais que regem a Administração Pública, inscritos no caput do artigo 37 da Constituição Federal, quais sejam, o da impessoalidade, da moralidade, o da isonomia e, sobretudo, o dever do administrador público de motivar os seus atos.
Assim é, que a necessidade de motivação está sediada no inciso LV do artigo 5º da Constituição Federal, como cerne inescapável do contraditório e da possibilidade de ampla defesa.
Nesse sentido, é a clara lição de Juarez Freitas4:
A publicista Maria Zanella de Pietro5 assevera :
Por fim, é de se perceber, em mesma monta, a irregularidade dos contratos ns. 43 e 44/2006, decorrentes da irregularidades acima arroladas e atinentes à concorrência pública n. 044/2005, seja no que toca à equivocada concepção do ajuste, que deveria ser a de concessão de uso de bem público, de acordo com a disciplina da Lei nº 8.987/95, seja no que diz respeito à forma de retribuição assentada nos contratos, que não foi produto do maior lance ou oferta no procedimento licitatório precedente, ao contrário do que impõe a lei mencionada.
É a irregularidade.
2.2.2 Restrição à participação no certame
2.2.2.1 Restrição à competição, motivado pela exclusão do empresário (atual denominação de empresa individual) ao certame /artigo 28, inciso II, da Lei Federal n. 8.666/93 c/c artigos 966 e seguintes, do Código Civil
O exame preambular do edital de concorrência nº 044/2005 apontou que o referido edital vetou a possibilidade de participação de empresa individual (artigo 28, inciso II, da Lei nº 8.666/93), hoje sob a denominação de empresário, na nomenclatura do novo Código Civil Brasileiro.
Contrariando as próprias disposições editalícias, a Unidade Gestora habilitou a empresa individual Eduardo Sobrosa ME ( f. 87).
Como se vê, a despeito do que, após o decurso da licitação este Tribunal veio a decidir, a própria Administração reconhece a inutilidade da cláusula editalícia em exame, por seu caráter limitador à participação, ao habilitar a empresa individual.
Contudo, é de se ponderar acerca do universo de participantes que se alijou do certame, por não preencher a condicionante então em vigor.
Nesta direção, a exigência inserida no edital comprometeu a competitividade da Concorrência nº 044/2005 e coloca em risco o atingimento da finalidade primordial da licitação pública, que se destina a garantir a seleção da proposta mais vantajosa para a Administração, alcançado pelo maior número de participantes, Neste mister é preciso refletir: de acordo com o próprio processo licitatório em exame, 32 (trinta e duas) empresas retiraram o edital (cópias anexas às fs. 88 a 139), mas, de acordo com a ata de habilitação, apenas 9 (nove) empresas se apresentaram no certame.
A estas observações, alinha-se o fato de que, conforme censo procedido pelo Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares6, somente a Capital do Estado comporta 1778 (um mil setecentos e setenta e oito) estabelecimentos de gastronomia, entre bares, restaurantes e lanchonetes e a região da grande Florianópolis7 comporta 2.770 (dois mil e setecentos e setenta) empresas ou pequenas empresas deste ramo.
Com efeito, a Lei nº 8.666/93 está fulcrada na competitividade, na obtenção do maior número de participantes, de onde, reputa-se, pode-se colher o melhor preço, a proposta mais vantajosa.
Do cotejo da instrução do processo e dos dados acima informados se vê, claramente, que o caráter restritivo inserto no item 3 do edital (f. 30) se concretizou no desenvolvimento do processo licitatório, elidindo da participação no certame as empresas individuais.
A exceção evocada - a participação da empresa individual "Eduardo Sobrosa ME" - em nada altera as conclusões até então exaradas, uma vez que a habilitação da referida empresa contraria as próprias disposições editalícias, possibilidade notadamente oculta dos demais interessados no certame.
2.2.2.2 Exigências excessivas de habilitação
a) Comprovação de Detenção nos Quadros Permanentes da Empresa, de Profissional de Nível Superior, com Formação em Nutrição ou Área Correlata/ artigo 30, parágrafo 1º, inciso I c/c artigo 3º, parágrafo 1º, inciso I, todos da Lei nº 8.666/93
A ata de abertura da documentação da concorrência nº 044/2005, cuja cópia, extraída dos autos ECO nº 05/04191454, passa a instruir o presente processo, registra, na voz de outros licitantes, que as empresas Eduardo Sobrosa - ME e Geraldo Schuster-ME não colacionaram, em seus respectivos documentos para habilitação na concorrência nº 044/2005, a comprovação da presença de uma nutricionista em seus quadros funcionais, na forma imposta pelo item 3.4.1 do edital em apreço.
No parecer de julgamento que agora integra o presente processo à f. 87, a Comissão de Licitação responde informando que as referidas empresas apenas cotavam propostas para a instalação de uma lanchonete e não do restaurante e que, a cláusula vigésima, item 5, dispensaria o requisito da referida contratação, em se tratando deste serviço.
Contudo, é necessário observar, de início, que o procedimento licitatório, até o momento da habilitação, não demonstrava que as referidas empresas apenas visavam a exploração dos serviços de lanchonete.
E, com ainda mais relevo, vê-se que o instrumento convocatório, ao arrolar as condicionantes de habilitação impôs, por meio do item 3.4.1, e sem estabelecer exceção ou distinção de qualquer ordem, a comprovação da presença de uma nutricionista nos quadros de pessoal da empresa licitante.
Apenas a minuta do contrato, cláusula vigésima, item 5, f. 46, discrimina, na ordem de compromisso contratual, a contratação da referida profissional.
Ora, a comissão de licitação considerou, em seu julgamento, para habilitar as empresas Eduardo Sobrosa - ME e Geraldo Schuster-ME, uma regra pertinente à contratação, em elisão às próprias condicionantes de habilitação.
É inconteste o caráter meramente discriminatório desta exigência e dos termos obscuros e ambíguos do instrumento convocatório, a par do que já observara o exame preambular do instrumento convocatório.
À época da instrução do processo ECO nº 05/04191454 a Diretoria de controle da Administração Estadual reputou que a contratação de profissional deste quilate não encontraria amparo na Lei de regência (Lei nº 8.666/93, Lei Federal nº 8.234/91 e Decreto Federal nº 84.444/80), fs. 50/51, entendimento este, em verdade, não secundado pelo então Conselheiro Relator.
Mas interessa avaliar que o Corpo Instrutivo, responsável pela análise do instrumento convocatório em comento, questionara a admissibilidade daquela exigência quando da avaliação da habilitação dos licitantes, comprovação esta pertinente à contratação do proponente vencedor.
É o momento de se aprofundar a questão.
Com efeito, a avaliação prévia dos instrumentos convocatórios, conforme o rito procedimental assinalado pela Instrução Normativa nº 001/2002, encontra cerne no disposto no artigo 113 da Lei nº 8.666/93, permitindo-se a elisão do universo jurídico, dos editais de concorrência potencialmente lesivos ao sistema jurídico vigente e, ainda, ao erário público.
Diz-se "potencialmente lesivos" porque, a despeito da ilegalidade impressa em uma determinada cláusula editalícia, esta lesividade, quando da execução do procedimento licitatório, pode ou não se manifestar.
Por óbvio, procura-se evitar o risco do não - atingimento da finalidade maior da licitação, que é a competitividade.
Por essa específica razão é que este exame prévio, consubstanciado, no caso em exame, nos autos ECO nº 05/04191454, pressupõe uma medida cautelar, preventa, capaz de sustar o edital reputado ilegal ou irregular, podendo-se determinar a sua respectiva correção ou, até mesmo, a anulação, em subordinação ao interesse público.
No caso em epígrafe, o julgamento dos documentos de habilitação trouxe a lume, cristalinamente, a lesividade operada pela restrição apontada pelo Corpo Instrutivo.
É de se frisar: Ora o instrumento convocatório evoca a imposição de prévia contratação de nutricionista para habilitação no certame, em caráter geral, ora a Comissão de Licitação, já em sede de julgamento da habilitação, excetua que esta exigência seria tão somente exigível para a contratação de serviços de exploração de restaurante, com fundamento nos termos da minuta do contrato.
O publicista José dos Santos Carvalho Filho8 em recente e já indispensável Manual de Direito Administrativo, ao discorrer sobre o fundamental e constitucional princípio do julgamento objetivo da licitação, assinala que os critérios e fatores seletivos previstos no edital devem ser adotados inafastavelmente para o julgamento, evitando-se, assim, qualquer surpresa para os participantes da competição. Nesse sentido é incontrastável o art. 45 do Estatuto.
A par disso, é de se considerar, também, os alijados do certame, mormente para a exploração dos serviços de lanchonete, não elucidados, pelo próprio instrumento convocatório, da desnecessidade da contratação de uma nutricionista, dispensa esta que só restou assentada quando do julgamento da habilitação.
Por último, é de se recordar, aqui, o magistério do Administrativista Marçal Justen Filho, evocado pelo Tribunal de Contas da União, na voz do então Ministro Relator Guilherme Palmeira, conforme o colhido do julgamento consubstanciado na decisão nº 592/20019, que assevera que a eleição das condições de habilitação técnica dos licitantes pressupõem que esta concepção está alicerçada em razões lógico-científicas, na busca da melhor proposta para a Administração Pública.
Ou seja, conclui aquela egrégia Corte de Contas da União, alicerçada na diretriz constitucional que autoriza, apenas, o mínimo de exigências em sede de licitação, artigo 37, inciso XXI, "se a Administração tiver avaliado mal a realidade, reputando como indispensável uma experiência que tecnicamente se revela dispensável, seu ato não pode prevalecer".
É a restrição.
b) indicação de dois fiadores, visando a garantia das propostas dos licitantes; contrariando o disposto nos artigos 3º, § 1º, inciso I, e 56, § 1º, todos da Lei Federal n. 8.666/93
Neste âmbito, o instrumento convocatório acolheu, entre os requisitos de qualificação econômico-financeira, a indicação de dois fiadores, com a apresentação da escritura pública atualizada do imóvel garante da dívida.
O exame prévio do edital de concorrência indicou a irregularidade desta exigência, posicionamento este acompanhado pelo egrégio Tribunal plenário.
A prima facie é necessário lembrar que não se pode confundir garantia de proposta com a garantia de contrato - a exemplo do que o fez a Administração Licitante - a primeira é exigível na habilitação dos licitantes, em sede de qualificação financeira e a segunda, pode ocorrer no momento da formalização do contrato.
No entanto, esta modalidade de garantia não tem amparo na disposições de lei aplicáveis ao caso.
De fato, observara-se, sobretudo, que o artigo 31 do Estatuto das Licitações e Contratos em vigor arrola, de forma exaustiva, as possibilidades de exigências de qualificação econômico-financeira nos editais licitatórios.
O Tribunal de Contas da União na voz do então Ministro Relator Benjamin Zymler, explica, com expressiva didática, a correta aplicação da Lei10:
Neste mister, o Superior Tribunal de Justiça11 limita ainda mais as possibilidades de exigência de qualificação econômico-financeira dos licitantes:
Já daí decorre, inquestionavelmente, a irregularidade da imposição da apresentação de dois fiadores garantes das obrigações contratadas.
Mas cabe, também, acrescer que, mormente em sede de direito consumerista, a desconsideração da personalidade jurídica somente pode ocorrer em regime de exceção e nos casos admitidos expressamente por lei, a exemplo do artigo 28 da Lei nº 8078/90.
Inexiste previsão correlata na Lei nº 8.666/93, inclusive porque a prestação de fiança em pecúnia é suficiente para a garantia das obrigações assumidas.
A imprestabilidade da modalidade de fiança acolhida pelo instrumento convocatório se revela, ainda, pelas empresas que apresentaram no processo licitatório fiadores que portaram escrituras públicas vencidas ou não atualizadas e que, mesmo nestas condições, as propostas a estes atos referentes foram habilitadas, caso da proponente "Assing Serviços Ltda. ME", f. 201, em revelado tratamento anti-isonômico dos licitantes.
Ainda mais grave e fato que demonstra a fragibilidade desta modalidade de garantia se constitui nas fianças prestadas à proposta da "Galeteria Tio Bressani Ltda. - ME", fs. 164 a 170, por fiadores casados, desacompanhadas da autorização do cônjuge, conforme o imposto pelo artigo 1647 do Código Civil Brasileiro, o que torna o ato plenamente anulável, mesmo dois anos após a dissolução da sociedade conjugal, de acordo com o imposto pelo artigo 1.649 da Código Civil Brasileiro.
A esses fatos, sobressai ressaltar que esta modalidade de exigência editalícia, por impor critério não admitido pela Lei de regência e por envolver indivíduos estranhos àquela relação obrigacional, tem evidente conteúdo restritivo à participação dos licitantes.
c) Prazo para a Interposição de Recursos
Integra a ata de abertura da propostas, de 17/11/2005 , fs. 202 a 203 do presente processo, o ato de homologação (f. 203, ao final ) pelo senhor Secretário de Estado de Coordenação e Articulação, em mesma data, de 17/11/2005, em clara supressão do prazo hábil para a interposição de recursos, assinalado pelo artigo 109 da Lei nº 8.666/93.
d) Apresentação de Alvarás Sanitários e de Funcionamento
As exigências desta natureza, de apresentação de alvarás, ainda que abrigadas por lei especial, não se reportam e não evidenciam a capacidade técnica e operacional da empresa para a consecução do objeto licitado.
O Tribunal de Contas da União já se pronunciou neste sentido, a exemplo do consubstanciado na Decisão 739/200112. Naquela oportunidade, o Ministro Ubiratan Aguiar, então relator, assim registrou, em seu parecer de voto:
3 conclusão
3.1.Ante o exposto, sugere-se que seja procedida AUDIÊNCIA, nos termos do artigo 29, parágrafo 1º, da Lei Complementar nº 202/00, do Senhor João Batista Matos, ex-Secretário de Estado de Coordenação e Articulação, CPF n. 029881869-87, Avenida Desembargador Pedro Silva, nº 2846, ap. 201,B. Itaguaçú, Florianópolis, SC, CEP 88080-700, para a apresentação de justificativas, em observância ao princípio do contraditório e da ampla defesa, a respeito das irregularidades constantes do presente relatório, sujeitas à aplicação das multas previstas na Lei Orgânica do Tribunal de Contas do Estado e no seu Regimento Interno, conforme segue:
É o relatório.
DCE/ 3º Insp./Div.09, em 05/02/2007.
Patrycia Byanca Furtado
DCE, Inspetoria 3, em ___/ ___/______
Odilon Inácio Teixeira
Auditor Fiscal de Controle Externo
Coordenador de Controle 2
Apelação Cível nº 2001.002822-6 3
parecer COG-439/96, sob a relatoria do Desembargador Otacílio Pedro Ramos. Autos nº CON-TC 0224905/60. 4
FREITAS, Juarez. Estudos de direito administrativo. São Paulo: Malheiros Editores, 1995. 5
Direito Administrativo.17ª ed. São Paulo:Ed. Atlas, 2004.p. 205. 6
Disp. Em<http://www.sindicatohrbs-fpolis.org.br/index.php?codwebsite=&codpagina=00013780. Acesso em 06.out.2006 7
assim considerados os municípios de Florianópolis, São José, Palhoça, Garopaba, Biguaçú, Governador Celso Ramos, Santo Amaro, Paulo Lopes e Águas Mornas. 8
Manual de Direito Adminsitrativo. 15.ed.Rio de Janeiro:Livraria e Editora Lumen Juris Ltda., 2006. p. 208. 9
Sessão 22/08/2001. Aprovação 05/09/2001. Dou 11/09/2001 10
Acórdão 0808/2.003, decisão de 02.07.2003. 11
REsp 822337 / MS .RECURSO ESPECIAL 2006/0039188-9. Relator(a) Ministro FRANCISCO FALCÃO (1116) Órgão Julgador T1 - PRIMEIRA TURMA Data do Julgamento 16/05/2006 Data da Publicação/Fonte DJ 01.06.2006 p. 168. 12
Disponível em <www.stf.gov.br>Acesso em 06/02/2007.
3.1. Argüir a ilegalidade contida no Edital da Concorrência Pública nº 044/2005, da Secretaria de Estado de Coordenação e Articulação, determinando, cautelarmente, ao Sr. João Batista Matos, Secretário de Estado, que promova a sustação do procedimento licitatório até pronunciamento definitivo deste Tribunal de Contas, fixando-lhe prazo para que adote as medidas corretivas necessárias ao exato cumprimento da Lei nº 8.666/93 ou promova anulação da licitação, pelos motivos abaixo relacionados:
3.1.1. Restrição a competição, motivado pela exclusão do empresário (atual denominação de empresa individual) ao certame, infringindo o pactuado no artigo 28, inciso II, da Lei Federal n. 8.666/93 c/c artigos 966 e seguintes, do Código Civil (Ítem 2.1, do presente Relatório);
3.1.2. Excessiva exigência de habilitação, mediante a exigência de a) comprovação de detenção nos quadros permanentes da empresa, de profissional de nível superior, com formação em Nutrição ou área correlata; b) apresentação de alvará sanitário e de funcionamento, e ainda, c) indicação de dois fiadores, visando a garantia das propostas dos licitantes; contrariando o disposto no artigo 30, § 1º, inciso I c/c artigo 3º, § 1º, inciso I, e artigo 56, § 1º, todos da Lei Federal n. 8.666/93; artigos 3º e 4º, da Lei Federal n. 8.234/91 e artigo 18, caput, do Decreto Federal n. 84.444/80 (Ítem 2.2, do presente Relatório);
3.1.3. Instrumento inadequado para a viabilização do uso de bem público destinado a exploração de restaurante e/ou lanchonete - "Cessão Onerosa de Direito Real de Uso", quando o correto seria a "Concessão de Uso", amparada pela Lei Federal n. 8.987/95 (Ítem 2.3, do presente Relatório);
3.1.4. Utilização de tipo de licitação não previsto em lei, e ausência de critérios objetivos de julgamento, conflitando com o disciplinado no artigo 15, inciso II, da Lei Federal n. 8.987/95 c/c artigos 40, inciso VII;....... 44, § 1º; e 45, caput e § 5º, todos da Lei Federal n. 8.66693 (item 2.4 do presente Relatório);
3.1.5. Utilização de critério de desempate em conformidade com o artigo 3º § 2º da Lei Federal 8.666/93, derrogado pela Emenda Constitucional 06/95 (item 2.5 do presente Relatório).
O uso especial de bem público por particular, a título remunerado, pode processar-se nas formas de concessão de uso ou permissão de uso.
A concessão remunerada de bem público reside em outorgar ao concessionário a exploração de um bem público, segundo sua específica destinação.
O ato de concessão de bem público sujeita-se ao prévio procedimento licitatório, em conformidade com as normas estabelecidas nas Leis Federais 8.987/95, 9.074/95 e 8.666/93, e artigo 175 da Constituição Federal. (os grifos não integram o texto original)
A inteligência do art. 93, X, da Constituição só pode ser a de que, 'a fortiori' as decisões administrativas que não sejam de tribunais precisam ser motivadas. Ambos, administrador e julgador, têm o dever de motivar os seus atos, exatamente em face da inafastável margem de subjetividade no mais vinculado dos atos, assim como em face da necessidade de tornar vinculada a sua atuação ao sistema, ainda quando se admitam, legalmente, os juízos de eqüidade ou de conveniência. "Indubitavelmente, devem os atos administrativos ser motivados, em analogia com o que sucede na prática dos atos jurisdicionais, excetuados, quiçá, os de expedição, designadamente na hipótese dos vinculados, ainda que sempre conveniente alguma fundamentação.
Pode-se concluir que a atuação da Administração Pública no exercício da função administrativa é vinculada quando a lei estabelece a única solução possível diante de determinada situação de fato; ela fixa todos os requisitos, cuja existência a Administração deve limitar-se a constatar, sem qualquer margem de apreciação subjetiva.
Referido dispositivo deixa três alternativas ao administrador para assegurar-se de que os licitantes terão condições financeiras mínimas para executar o ajuste a ser celebrado: a) capital social mínimo; b) patrimônio líquido mínimo ou c) prestação de garantia, limitada a 1% do valor estimado para o contrato. Tais hipótese não são cumulativas, mas permitem uma atuação discricionária do gestor na escolha da melhor forma de comprovar a qualificação econômico-financeira dos licitantes. Não podem ser utilizadas de forma concomitante, sob pena de transformar a discricionariedade legítima em arbitrariedade vedada pela Lei (grifo nosso)
O artigo 31, § 2º da Lei de Licitações determina que a Administração eleja um dos três requisitos, na fase de habilitação, em termos de exigência de comprovação da qualificação econômico-financeira da empresa licitante, para depois estabelecer que tal requisito também será suficiente a título de garantia ao contrato a ser posteriormente celebrado.
A esse respeito, ensina Marçal Justen Filho:
"A Lei nº 8.666 disciplinou de modo minucioso a matéria da qualificação técnica. Um dos caracteres mais marcantes da Lei nº 8.666/93 foi a redução da margem de liberdade da Administração Pública nesse campo e a limitação do âmbito das exigências. Buscou evitar que exigências formais e desnecessárias acerca da qualificação técnica constituam-se em instrumento de indevida restrição à liberdade de participação em licitação. O objetivo é eliminar distorções ocorridas no sistema anterior, onde os requisitos de qualificação técnica acabavam por inviabilizar o acesso de muitas empresas à licitação. (in Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, 5ª ed., p. 305)
3. Nesse sentido, vejo como não justificadas as exigências constantes dos seguintes itens:
"6.2.3.3. Alvará expedido pela Secretaria do Estado da Saúde - Centro de Vigilância Sanitária, acompanhado de Certidão de Anotação Técnica do Conselho Regional de Química (C.R.Q.) Exercício de 2001, conforme parágrafo 2º do art. 30 da Lei nº 8.666 de 21 de junho de 1993;
6.2.3.4. Alvará para uso de produtos químicos fornecido pela divisão de produtos controlados do Departamento Estadual de Polícia Científica da Secretaria de Segurança Pública do Amazonas ou da sede da licitante, conforme parágrafo 2º do art. 30 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993".
3.1.1. Restrição à competição, motivado pela exclusão do empresário (atual denominação de empresa individual) no certame, em desacato ao artigo 28, inciso II, da Lei Federal n. 8.666/93 c/c artigos 966 e seguintes, do Código Civil, conforme item 2.2.2.1 deste relatório;
3.1.2. Utilização, de critério de julgamento de menor preço não admitido pela Lei e incompatível com o objeto licitado, em incursão ao desvio de finalidade do ato, resguardado pelos princípios insculpidos no caput do artigo 37 da Constituição Federal e elisão ao disposto nos artigos 45, caput e parágrafo 5º, e 40, VII, todos da Lei nº 8.666/93, CONFORME ITEM 2.2.1 do presente relatório;
3.1.3. Ausência de avaliação prévia para justificação do valor de contraprestação pela "cessão de direito real de uso" estabelecido no edital de concorrência nº 044/2005, em afronta ao artigo 7º, parágrafo 2º, inciso II, E aO DISPOSTO NO ARTIGO 40, PARÁGRAFO 2º, INCISO II, TODOS DA Lei nº 8.666/93 e, ainda, ao artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal, CONFORME ITEM 2.2.1 do presente relatório;
3.1.4. Restrição à participação no certame, que resultou em efetiva elisão ao competitório, mediante as exigências de: a) comprovação de contratação precedente de nutricionista, para a habilitação dos licitantes, em afronta ao artigo 30, parágrafo 1º, inciso I c/c artigo 3º, parágrafo 1º, inciso I, todos da Lei nº 8.666/93, e, ainda, b) apresentação de dois fiadores, como garantes do contrato, compromissados, como critério de qualificação financeira, em desacato ao disposto nos artigos 3º, parágrafo 1º, inciso I, e 56, parágrafo 1º, todos da Lei nº 8.666/93, conforme item 2.2.2.2, alíneas "a", "b" e "c", respectivamente, do presente relatório;
3.1.5. Utilização de critérios de julgamento anti - isonômico e ambíguos, com a adoção, para a habilitação, de condicionantes pertinentes à contratação, e elisão das próprias regras editalícias, o que colide com o disposto nos artigo 45, caput e artigo 3º, parágrafo 1º, inciso I, todos da Lei nº 8.666/93, conforme item 2.2.2.2, alíneas "a", "b","c", e "d", respectivamente, do presente relatório.
3.2. Dar ciência do presente relatório ao senhor Ivo Carminati, atual Secretário de Estado de Coordenação e Articulação, PARA CONHECIMENTO E, se for o caso, para a adoção das PROVIDÊNCIAS que entender necessárias.
Auditor Fiscal de Controle Externo
DE ACORDO,
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Prazo inicialmente assinalado para o dia 31/10/2005, prorrogado em razão do recesso decretado para o dia 31/10/2005 (doc. f. 109).