ESTADO DE SANTA CATARINA
    TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO
    CONSULTORIA GERAL

Processo n°: CON - 05/04260014
Origem: Prefeitura Municipal de Joinville
Interessado: Marco Antônio Tebaldi
Assunto: Consulta
Parecer n° COG-308/06

EMENTA. Consulta. Constitucional e Administrativo. Consórcio público. Área de atuação. Direito intertemporal. Aplicação de normas de contabilidade e de licitação pública.

Senhora Consultora,

RELATÓRIO

O Prefeito Municipal de Joinville, Sr. Marco Antônio Tebaldi, protocolizou consulta neste Tribunal de Contas, em 01/12/2005, conforme Ofício nº 2429/GP, indagando sobre a área de atuação do consórcio público, aplicação do direito intertemporal e das normas de contabilidade e licitação pública.

Os questionamentos são encaminhados nos seguintes termos:

1) Qual será a atual abrangência de territorialização de participação de municípios em um determinado consórcio - seguirá critérios de organização associativas, ou das definidas no Plano Diretor de Regionalização da Secretaria de Estado da Saúde de Santa Catarina, ou de participação de municípios de diversas regiões do Estado, ou também poderá encampar municípios de fronteiras de outros Estados vizinhos?

2) Reportando-se aos artigos 3º, 4º e 5º, § 4º da Lei 11.107, a citada subscrição de protocolos de intenções, terão que ser formalizadas novamente por consórcios já constituídos no Estado há mais de 05 anos e que possuem suas cartas de habilitação devidamente assinadas pelos prefeitos municipais integrantes do consórcio, e que possuem termo de adesão e compromisso coletivo formalizado e devidamente registrado em cartório, bem como todas as leis municipais autorizativas orçamentárias subscritas e aprovadas pelas suas respectivas câmaras de vereadores?

3) Reportando-se ao artigo 9º - parágrafo único, ao artigo 15 e artigo 20 da Lei Federal 11.107 de 06 de abril de 2005, o Consórcio Público de pessoa jurídica de direito privado estará sujeito a aplicação de seus recursos e ao registro de suas operações contábeis segundo o disposto na Lei 4.320 de 17/03/64, ou seja Contabilidade Pública, ainda que concomitante com a Contabilidade Privada? Como se deve proceder operacionalmente?

4) Os Consórcios Públicos de pessoa jurídica de direito privado poderão instituir o Pregão Eletrônico ou Presencial amparado na Lei Federal 10.520 de 17 de julho de 2002? Como se deve proceder operacionalmente?

5) Devem obedecer integralmente a Lei 8.666/93 ou deverá observar suas regras (art. 6º, § 2º, Lei 11.107/05)?

É o relatório.

II. PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE

A consulta apresenta-se sobre matéria sujeita a exame e fiscalização desta Corte de Contas, nos termos do inciso XII, do artigo 59, da Constituição Estadual.

Vem firmada pelo Prefeito Municipal de Joinville, Sr. Marco Antônio Tebaldi, o qual detém legitimidade para a subscrição de peça indagativa, consoante o disposto nos artigos 103, II e 104, III, da Resolução nº TC-06/2001, que aprovou o Regimento Interno deste Tribunal.

A consulta não veio instruída com parecer da assessoria jurídica do órgão ou entidade consulente, conforme preceitua o art. 104, V, da Resolução nº TC-06/2001 (Regimento Interno do TCE/SC). No entanto, o Tribunal Pleno poderá conhecer de consulta que não atenda a esta formalidade, conforme autoriza o parágrafo 2º do mesmo artigo.

III. MÉRITO

O consulente solicita parecer, a respeito do consórcio intermunicipal, indagando sobre (a) a abrangência territorial; (b) a aplicação do direito intertemporal para os protocolos de intenções; (c) a aplicação da contabilidade pública; (d) a instituição de pregão; e (e) a obediência a Lei nº 8.666/93.

O tema consórcio público foi introduzido na esfera constitucional com a edição da Emenda nº 19/98, de 04/06/1998, que acrescentou o art. 241:

Art. 241. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios disciplinarão por meio de lei os consórcios públicos e os convênios de cooperação entre os entes federados, autorizando a gestão associada de serviços públicos, bem como a transferência total ou parcial de encargos, serviços, pessoal e bens essenciais à continuidade dos serviços transferidos. (grifo nosso)

Segundo a norma constitucional, podem ser partes nos consórcios públicos e convênios de cooperação a União, o Distrito Federal, os Estados e os Municípios. Em decorrência da expressão "disciplinarão por meio de lei", há necessidade de edição de norma legal para completar a aplicabilidade da norma constitucional, trata-se, pois, de norma constitucional de eficácia limitada de princípio institutivo facultativa.1

A partir de então, os entes da Federação, especialmente os Municípios, interessaram-se pela implementação dessa novidade. Porém, por falta de orientação mais segura, o que se sucedeu foi uma diversidade de formas jurídicas, desde o ente despersonalizado até a autarquia.

Em 06/04/2005, com a finalidade de regulamentar o art. 241, CR/88, foi editada a Lei nº 11.107/05, dispondo sobre normas gerais de contratação de consórcios públicos.

O consórcio público é contrato de direito público, podendo constituir associação pública, cuja personalidade jurídica adquirir-se-á com a vigência das leis de ratificação do protocolo de intenções, ou pessoa jurídica de direito privado, sem fins econômicos, cuja personalidade jurídica adquirir-se-á preenchidos os requisitos da legislação civil. O consórcio público, constituído como pessoa jurídica de direito privado, deve obedecer as normas de direito público, quais sejam, a licitação, o contrato, a prestação de contas e a admissão de pessoal pelo regime celetista.

Tem competência, o consórcio público, de firmar convênios, contratos e outros instrumentos congêneres, receber auxílio, contribuições e subvenções, desapropriar e instituir servidões e ser contratado pelo ente da Federação por dispensa de licitação.

São duas as etapas de constituição do consórcio público. A primeira é a subscrição do protocolo de intenções e a segunda é a assinatura do contrato. Os objetivos do consórcio público serão determinados pelos entes da Federação consorciados, que, dentre outros direitos, poderão ceder servidores ao consórcio.

Os valores que determinam a classificação das modalidades de licitação (concorrência, tomada de preços e convite) serão duplicados se o consórcio for constituído por até 3 (três) membros, e serão triplicados se constituído de maior número. Será de 20% do valor a ser contratado, ao invés de 10%, o percentual para a dispensa de licitação.

Aplica-se, subsidiariamente, ao consórcio público a legislação que rege as associações civis.

O consórcio público poderá realizar licitação da qual decorra contrato para os entes da Federação consorciados (art. 112, § 1º, Lei nº 8.666/93, alterado pela Lei nº 11.107, de 6/4/05).

O contrato de gestão associada, firmado sem as formalidades legais, e o contrato de rateio, firmado sem dotação orçamentária, ou sem as formalidades legais, constituem atos de improbidade administrativa que importam prejuízo ao erário.

Este Tribunal de Contas já se manifestou sobre a matéria, constituindo o Prejulgado 1776:

Prejulgado 1776

A Lei Federal nº 11.107, de 06/04/2005, prevê que o consórcio público pode ser constituído: a) por meio de associação pública, quando adquire personalidade de direito público e integra a "administração indireta de todos os entes da Federação consorciados" (art. 6º, inc. I e § 1º); b) por meio de pessoa jurídica de direito privado (por exemplo, associação civil), que se submete "ao atendimento dos requisitos da legislação civil", não integrando a administração direta ou indireta dos entes da Federação consorciados (art. 6º, inc. II e § 2º, da Lei).

A entidade privada (associação civil) a ser constituída pelo consórcio público: a) é enquadrável no art. 1º, parágrafo único, da Lei Federal nº 8.666/93, por evidenciar-se sua condição de entidade controlada direta ou indiretamente pela Administração Pública, portanto, deve obediência às disposições da Lei de Licitações; b) sujeita-se às normas da Lei de Licitações em face do art. 6º, § 2º, da Lei nº 11.107, de 2005, que expressamente prevê que a entidade com personalidade jurídica de direito privado "observará as normas de direito público no que concerne à realização de licitação, celebração de contratos (...)".

O protocolo de intenções a ser assinado pelos entes consorciados deverá estabelecer, de acordo com deliberação da assembléia geral: a) o quadro de pessoal com a quantificação e qualificação dos servidores necessários à execução dos serviços administrativos e finalísticos para atendimento dos objetivos do consórcio, contendo, entre outros, especificações sobre a carga horária, a lotação e a remuneração do pessoal, considerando eventuais divergências de salário e de regime de horário existentes entre os entes consorciados; b) os serviços a serem executados prioritariamente pelos servidores responsáveis pelos serviços transferidos, mediante cedência pelos entes consorciados, na forma e condições fixadas na legislação de cada ente, de acordo com o previsto no § 4º do art. 4º da Lei nº 11.107, de 2005; c) as vagas a serem preenchidas através da contratação de empregados públicos, precedida de aprovação em concurso público (art. 37, inciso II, da CF), sob o regime celetista, não adquirindo o contratado a estabilidade a que se refere o art. 41 da CF, com a redação da EC nº 19, de 1998, devendo constar cláusula específica no protocolo de intenções sobre o número (de empregos), a forma de provimento e a remuneração dos empregados, nos termos do inciso IX, do art. 4º da Lei nº 11.107, de 2005, observado o art. 6º, § 2º, da Lei, prevendo, ainda, as hipóteses de rescisão do contrato, além daquelas definidas pela CLT; d) indicação das situações em que admitida a contratação por tempo determinado para atender necessidade temporária de excepcional interesse público, com limitação de vagas e prazo, mediante o regime jurídico que for estabelecido na lei municipal específica de cada ente consorciado, sem aquisição de estabilidade, em observância do inciso IX, do art. 4º, da Lei Federal nº 11.107, de 2005, e do art. 37, inciso IX, da CF.

A subscrição do protocolo de intenções deverá ser ratificada por lei de cada ente que integrará o consórcio, conforme estabelecido no art. 5º da Lei Federal nº 11.107, de 2005.

A prestação de contas acerca da aplicação de recursos públicos, de acordo com o parágrafo único do art. 70 da CF, com a redação da EC nº 19, de 1998, é exigível de qualquer pessoa física ou jurídica, pública ou privada que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens e valores públicos, devendo ser observado que: a) o caput do art. 9º da Lei nº 11.107, de 2005, determina que a execução das receitas e despesas subordina-se às normas de direito financeiro (público) e o parágrafo único sujeita expressamente o consórcio público à fiscalização do Tribunal de Contas; b) o controle externo previsto no art. 31, § 1º, da CF incide sobre todos os atos praticados pela entidade (de natureza pública ou privada) constituída pelo consórcio público.

Os Gestores Públicos devem considerar as alterações promovidas pela Lei Federal nº 11.107, de 2005, na Lei nº 8.666, de 1993, pertinentes aos consórcios públicos, destacando-se: a) o limite dos valores estabelecidos para determinar as modalidades de licitação (convite, tomada de preços e concorrência), "no caso de consórcios públicos", corresponderá ao dobro "quando formado por até 3 (três) entes da Federação, e o triplo, quando formado por maior número", conforme o § 8º do art. 23 da Lei Federal nº 8.666/93, incluído pelo art. 17 da Lei Federal nº 11.107, de 2005; b) o limite de valores para dispensa de licitação para compras, obras e serviços estabelecido no art. 24, incisos I e II da Lei de Licitações, no caso de consórcios públicos, corresponde a 20% dos limites estabelecidos na letra a dos incisos I e II do art. 23, de acordo com o parágrafo único do art. 24, da Lei nº 8.666/93, com a redação alterada pelo art. 17 da Lei nº 11.107, de 2005; c) é previsto dispensa de licitação para os consórcios públicos contratarem "programa com ente da Federação ou com entidade de sua administração indireta, para a prestação de serviços públicos de forma associada", conforme inciso XXVI da Lei n. 8.666/93, incluído pelo art. 17 da Lei n. 11.107/2005. No mesmo sentido, a norma do inc. III, § 1º, do art. 2º, da Lei n. 11.107, de 2005; d) é admitido que cada um dos "órgãos ou entidades dos entes da Federação consorciados" celebre contrato administrativo decorrente de licitação promovida pelo consórcio público, desde que previsto pelo edital, segundo o § 1º do art. 112 da Lei n. 8.666, de 1993, com a redação incluída pelo art. 17 da Lei n. 11.107, de 2005.

Para atendimento das disposições da Lei Complementar nº 101, de 2000 (LRF), os entes da Federação consorciados deverão observar, entre outras normas, o art. 8º, § 4º, da Lei nº 11.107, de 2005.

O art. 19 da Lei Federal nº 11.107, de 2005, ressalva expressamente que as disposições da Lei não se aplicam "aos convênios de cooperação, contratos de programa para gestão associada de serviços públicos ou instrumentos congêneres, que tenham sido celebrados anteriormente a sua vigência", motivo pelo qual esses atos podem ser executados de acordo com o que foi ajustado à época.

Em conformidade com o art. 156 do Regimento Interno instituído pela Resolução nº TC-06/2001, revogar: 1. o Prejulgado nº 0448, em razão de conter entendimento em desacordo com a norma do art. 4º, inciso XI, letra c, da Lei Federal nº 11.107, de 2005; 2. o Prejulgado nº 0798, em que se previa a constituição do consórcio público sob a forma de autarquia, o que diverge do art. 1º, § 1º, da Lei nº 11.107, de 2005, o qual limita a constituição dos consórcios sob a forma de associação pública (incluída no inc. IV do art. 41 do Código Civil pelo art. 16 da Lei nº 11.107) ou pessoa jurídica de direito privado (associação civil); 3. o Prejulgado nº 1545, que contém orientação geral acerca da constituição de consórcios, a qual não se ajusta plenamente às normas gerais de contratação de consórcios públicos fixadas pela Lei Federal nº 11.107, de 06/04/2005, podendo sua manutenção gerar conflitos junto aos Gestores Públicos.

Em consonância com o art. 156 do Regimento Interno instituído pela Resolução nº TC-06/2001, reformar o Prejulgado nº 1083, mediante a supressão do último parágrafo, por contrariar o § 2º do art. 6, da Lei Federal n. 11.107, de 2005, e, ainda, o inciso IX do art. 4º da Lei, os quais prevêem a admissão de empregados públicos sob o regime celetista, mediante prévio concurso público, pela entidade constituída pelo consórcio público, assim como, a contratação para atender necessidade temporária de excepcional interesse público na forma da lei, passando referido Prejulgado a ter os seguintes termos: "Para atender aos programas de caráter transitório, com recursos repassados pela União ou pelo Estado, o Município pode admitir pessoal em caráter temporário, atendidos aos pressupostos do art. 37, IX, da Constituição do Brasil. Se os programas assumirem caráter de permanência e definitividade, ou se referirem a atividades típicas do Município (saúde, educação, saneamento, trânsito, etc.), o procedimento adequado é a admissão de pessoal em cargos de provimento efetivo (mediante concurso público). No caso do Programa da Saúde da Família - PSF e do Programa de Agentes Comunitários de Saúde - PACS, ambos do Governo Federal, em razão de não estar suficientemente consolidada a perenidade dos Programas, a solução que se apresenta mais viável no momento é a contratação temporária, mediante lei específica que estabeleça as regras, os prazos de vigência dos contratos, a forma e critérios de seleção, os direitos dos contratados, a remuneração, sua vinculação ao Regime Geral da Previdência Social, entre outras normas pertinentes. Considerando que a função de professor possui caráter de atividade permanente do Poder Público Municipal, a admissão de professores deve se dar em cargos de provimento efetivo (art. 37, II, da Constituição Federal), salvo em situações excepcionais, nos termos do art. 37, IX, da Constituição Federal, em quantitativo adequado ao atendimento do universo de alunos da rede pública do município. Mediante lei autorizativa específica, é admissível a transferência de recursos, através de subvenções sociais, às Associações de Pais e Professores – APPs devidamente constituídas como pessoa jurídica, com finalidade específica de aplicação na contratação de serventes para as respectivas escolas municipais, desde que observados os preceitos da Lei Federal nº 4.320/64 e da Lei Complementar nº 101/00, disciplinamento na LDO e previsão de créditos orçamentários na Lei do Orçamento Anual. Quando o quadro de pessoal do município mantém cargos de serventes, a concessão de subvenções para Associação de Pais e Professores ou a contratação externa dessas funções caracterizam substituição de servidores, situação em que há incidência do § 1º do art. 18 da Lei Complementar nº 101/00, e as despesas devem ser consideradas na Despesa Total com Pessoal do Poder Executivo.".

Parágrafo suprimido do Prejulgado nº 1083: "O servidor público deve ter vinculação funcional a uma pessoa estatal (ente, autarquia, fundação, empresa pública ou sociedade de economia mista), não encontrando amparo legal a admissão de pessoal por consórcio intermunicipal, que não constitui pessoa jurídica integrante da Administração Pública.".

Processo: CON-01/01841809 Parecer: COG-405/05 e Pareceres do Relator nº 00548/2005 e 00041/2006 Decisão: 395/2006 Origem: Consórcio Intermunicipal de Saúde do Nordeste de Santa Catarina Relator: Conselheiro Moacir Bertoli Data da Sessão: 06/03/2006 Data do Diário Oficial: 20/04/2006
(grifo nosso)

Esse prejulgado emite orientações gerais sobre o assunto.

A Lei nº 11.107/05, no entanto, é polêmica, no sentido de fomentar discussões doutrinárias a respeito de alguns paradigmas que até o momento encontravam-se solidificados.

Miguel Reale, por exemplo, cita a subversão ao "significado tradicional que a palavra consórcio tem no direito pátrio", e que "a criação, para tal fim, de uma pessoa jurídica de direito público, equiparável às autarquias e sociedades de economia mista instituídas por lei, afigura-se-me inconstitucional".2 A análise de Miguel Reale foi feita no Projeto de Lei, no qual não havia a previsão de consórcio público constituído de pessoa jurídica de direito privado, inovação essa de caráter parlamentar, razão pela qual não foi abordada pelo eminente jusfilósofo.

Maria Sylvia Zanella di Pietro é, igualmente, crítica: "A lei é, sob todos os aspectos, lamentável e não deveria ter sido promulgada nos termos em que o foi. ... Algumas normas da lei são de difícil, se não impossível aplicação."3

A respeito do consórcio público constituir-se como pessoa jurídica de direito privado, o Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina - TCE/SC, no seu Prejulgado 1776, acima citado, conclui que ela não integra a administração direta ou indireta dos entes da Federação consorciados.

No entanto, esse esclarecimento não vem encontrando guarida na doutrina, a começar por Maria Sylvia Zanella di Pietro, que afirma:

A discussão sobre o tema merece prosperar congruo tempore et congruo loco.

Passa-se às perguntas do consulente:

1) Qual será a atual abrangência de territorialização de participação de municípios em um determinado consórcio - seguirá critérios de organização associativas, ou das definidas no Plano Diretor de Regionalização da Secretaria de Estado da Saúde de Santa Catarina, ou de participação de municípios de diversas regiões do Estado, ou também poderá encampar municípios de fronteiras de outros Estados vizinhos?

A resposta a este questionamento parece estar visível na redação do art. 4º, § 1º, I, II e IV, da Lei nº 11.107/05, com as explicações das razões de veto aos incisos III e V:

Art. 4o [...]

§ 1o Para os fins do inciso III do caput deste artigo, considera-se como área de atuação do consórcio público, independentemente de figurar a União como consorciada, a que corresponde à soma dos territórios:

I – dos Municípios, quando o consórcio público for constituído somente por Municípios ou por um Estado e Municípios com territórios nele contidos;

II – dos Estados ou dos Estados e do Distrito Federal, quando o consórcio público for, respectivamente, constituído por mais de 1 (um) Estado ou por 1 (um) ou mais Estados e o Distrito Federal;

III – (VETADO)

IV – dos Municípios e do Distrito Federal, quando o consórcio for constituído pelo Distrito Federal e os Municípios; e

V – (VETADO)

Segundo a norma supratranscrita, a área de atuação do consórcio público corresponderá à soma dos territórios dos municípios, quando somente por estes constituído, inclusive de territórios pertencentes a Estados distintos.

A respeito do assunto, merece destaque as razões de veto aos incisos III e V:

A razão do veto levou em consideração a subserviência de municípios a um Estado do qual seu território não está incluído, o que poderia violar o pacto federativo.

2) Reportando-se aos artigos 3º, 4º e 5º, § 4º da Lei 11.107, a citada subscrição de protocolos de intenções, terão que ser formalizadas novamente por consórcios já constituídos no Estado há mais de 05 anos e que possuem suas cartas de habilitação devidamente assinadas pelos prefeitos municipais integrantes do consórcio, e que possuem termo de adesão e compromisso coletivo formalizado e devidamente registrado em cartório, bem como todas as leis municipais autorizativas orçamentárias subscritas e aprovadas pelas suas respectivas câmaras de vereadores?

Os entes da Federação, caso queiram usufruir dos benefícios concedidos pela Lei nº 11.107/05, terão que constituir e operacionalizar o consórcio público nos termos impostos por ela.

Os benefícios reservados aos consórcios públicos, elencados na Lei nº 11.107/05, são, em princípio, os seguintes:

a) promover desapropriações;

b) instituir servidões;

c) ser contratado por dispensa de licitação;

d) emitir documentos de cobrança;

e) exercer atividades de arrecadação de tarifas ou preços públicos;

f) outorgar concessão, permissão ou autorização de obras ou serviços públicos;

g) duplicar os valores mencionados no caput do art. 23 da Lei nº 8.666/93 quando formado por até 3 (três) entes da Federação, e triplicar, quando formado por maior número;

h) celebrar contrato de programa com entes da Federação ou entidades da administração indireta por dispensa de licitação;

i) contratar por dispensa de licitação quando o valor for de até 20%, ao invés do percentual informado no art. 24, I e II da Lei nº 8.666/93 (10%);

j) realizar licitação da qual decorram contratos para os órgãos e entidades dos entes da Federação consorciados;

A formação de relação jurídica, entre entes da Federação, que não respeite os requisitos impostos pela Lei nº 11.107/05, não se constitui em consórcio público (stricto sensu).

Portanto, os atuais consórcios públicos (lato sensu), que estão em desacordo com os requisitos de constituição e operacionalização ditados pela Lei nº 11.107/05, podem continuar operando, porém, sem se beneficiar das normas da citada lei.

3) Reportando-se ao artigo 9º - parágrafo único, ao artigo 15 e artigo 20 da Lei Federal 11.107 de 06 de abril de 2005, o Consórcio Público de pessoa jurídica de direito privado estará sujeito a aplicação de seus recursos e ao registro de suas operações contábeis segundo o disposto na Lei 4.320 de 17/03/64, ou seja Contabilidade Pública, ainda que concomitante com a Contabilidade Privada? Como se deve proceder operacionalmente?

Novamente, parece nítido o disposto na Lei nº 11.107/05, quanto a imposição, aos consórcios públicos, das normas de direito financeiro aplicáveis às entidades públicas.

A Lei nº 4.320/64 é norma geral de Direito Financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal, portanto aplicável aos consórcios públicos.

A Lei nº 11.107/05, nesse ponto, não traçou distinção, razão pela qual tanto a pessoa jurídica de direito público quanto a de direito privado estão inseridas nessa obrigação. Por outro lado, se houver a necessidade de tratamento diferenciado em razão da natureza jurídica dessas duas formas, será o Poder Executivo da União o responsável pela regulamentação da Lei nº 11.107/05, inclusive quanto as normas gerais de contabilidade pública (art. 20).

4) Os Consórcios Públicos de pessoa jurídica de direito privado poderão instituir o Pregão Eletrônico ou Presencial amparado na Lei Federal 10.520 de 17 de julho de 2002? Como se deve proceder operacionalmente?

A aplicação aos consórcios públicos da lei geral de licitações, bem como, de outras que gravitam em torno dela, é determinação da Lei nº 11.107/05, conforme arts. , § 1º, III; e , § 2º. A Lei nº 8.666/93 também menciona o consórcio público nos arts. 23, § 8º; e 24, XXVI, parágrafo único; e 112, § 1º.

No mesmo sentido da aplicação da contabilidade pública ao consórcio público, também, em relação à licitação, a Lei nº 11.107/05 não traçou distinção, razão pela qual tanto a pessoa jurídica de direito público quanto a de direito privado estão obrigadas a licitar.

5) Devem obedecer integralmente a Lei 8.666/93 ou deverá observar suas regras (art. 6º, § 2º, Lei 11.107/05)?

Conforme analisado no item anterior, a Lei 8.666/93 deve ser integralmente obedecida pelo consórcio público, seja pessoa jurídica de direito público, seja de direito privado.

IV. CONCLUSÃO


1 SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das Normas Constitucionais. 3ª ed. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 82.

2 Disponível em: <http://www.miguelreale.com.br/parecer.htm. Acesso em: 30 junho 2006.

3 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. O Consórcio Público na Lei nº 11.107, de 6.4.05. BDA -Boletim de Direito Administrativo - Novembro/2005, p. 1220.

4 Ibid., p. 1222.