ESTADO DE SANTA CATARINA
    TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO
    CONSULTORIA GERAL

Processo n°: REC - 03/06209888
Origem: Secretaria de Estado da Educação e do Desporto
RESPONSÁVEL: Onelio Francisco Menta
Assunto: Recurso (Reexame - art. 80 da LC 202/2000) -SPE-02/04838304
Parecer n° COG-104/07

Recurso de Reexame. Decadência. Art. 54 da Lei nº 9.784/99. Atos de aposentadoria. Inaplicabilidade. Convalidação dos pagamentos pretéritos. Princípio da isonomia. Precedentes. Registro do ato aposentatório.

Com o advento de lei que afasta a restrição a título de concessão de Gratificação, inclusive em relação aos pagamentos pretéritos, necessária a determinação do registro do ato aposentatório, pois cessada está a irregularidade que o maculava.

Senhor Consultor,

RELATÓRIO

Tratam os autos de Recurso de Reexame interposto pelo Sr. Onélio Francisco Menta, conforme prescrito no art. 80, da LCE nº 202/00, em face da Decisão nº 1006/03, proferida nos autos do Processo nº SPE 02/04838304, a qual decidiu por ordenar o registro do ato aposentatório, entretanto, com a suspensão do pagamento das parcelas concedidas ilegalmente ao aposentado.

O presente processo decorre da análise de Ato de Concessão de Aposentadoria (Relatório de Instrução nº 488/02 - fls. 35-39) em que se apurou irregularidades no ato aposentatório do Sr. José Dirceu Cordeiro (59 anos de idade - data de nascimento: 07/09/47 - valor histórico total dos proventos: R$ 330,24, de acordo com a Apostila de Proventos, data de 31/01/02 - fls. 10) acerca da incorporação indevida de gratificação (valor de R$ 26,19), em desacordo com o estabelecido no art. 3º, da Lei Municipal nº 708, de 27/10/93. A partir disso, com fulcro no art. 35 da LCE nº 202/00, o Corpo Técnico sugeriu assinar prazo para que a Prefeitura Municipal de Caçador adotasse as providências com vistas ao exato cumprimento da Lei.

Às fls. 41-42, o Ministério Público Especial junto ao Tribunal de Contas emitiu Parecer em que se posicionou no sentido de acompanhar o entendimento emitido pelo Corpo Técnico, assim como o Exmo. Sr. Auditor Relator Altair Debona Castelan - fls. 43-44. E, através da Decisão nº 2536/02, na Sessão Ordinária de 30/09/02, o Tribunal Pleno confirmou o voto do Relator - fls. 45, cita-se:

O TRIBUNAL PLENO, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro no art. 59 c/c o art. 113 da Constituição do Estado e no art. 1º da Lei Complementar n. 202/2000, decide:

6.1. Assinar o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação desta Decisão no Diário Oficial do Estado, nos termos do art. 36, §1º, alínea "b", da Lei Complementar n. 202/2000, para que a Prefeitura Municipal de Caçador comprove a este Tribunal a adoção de providências com vistas ao exato cumprimento da lei, relativamente à incorporação indevida de gratificação, no valor de R$ 26,19 (vinte e seis reais e dezenove centavos), aos proventos de aposentadoria de José Dirceu Cordeiro, servidor do Quadro de Pessoal da Secretaria Municipal de Obras e Serviços, no cargo de Motorista de Caminhão, nível II, referência: 12, consubstanciada no Decreto n. 1.300/1996, em desacordo ao que estabelece o art. 3º da Lei Municipal n. 708/1993, conforme exposto no item 3.3.4 do Relatório DMU n. 488/2002.

6.2. Dar ciência desta Decisão, bem como do Relatório e Voto que a fundamentam, ao Sr. Onélio Francisco Menta - Prefeito Municipal de Caçador.

O Ofício nº 13.131/TCE/SEG/02 - fls. 46, comunicou o Responsável acerca da Decisão exarada por esta Corte de Contas.

Em resposta (fls. 48-49), via Ofício nº 1211/02, o Sr. Onélio Francisco Menta, apresentou a seguinte justificativa:

QUANTO À CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA DOS SERVIDORES-

Juntou os docs. de fls. 50-62.

No Relatório de Reinstrução de nº 0054/03, fls. 65-71, ratificaram-se os apontamentos do Relatório de Instrução nº 488/02, com a ordenação do registro e a determinação de suspensão da parcela concedida de forma ilegal.

O Ministério Público Especial, fls. 72, bem como o Relator do feito - fls. 73-74, acompanharam o posicionamento do Corpo Técnico. E, através da Decisão nº 1006/03, na Sessão Ordinária de 14/04/03, o Tribunal Pleno confirmou o voto do Relator - fls. 75, cita-se:

O TRIBUNAL PLENO, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro no art. 59 c/c o art. 113 da Constituição do Estado e no art. 1º da Lei Complementar n. 202/2000, decide:

6.1. Ordenar o registro, nos termos do art. 34, II, c/c o art. 36, §2º, "b", da Lei Complementar n. 202/2000, do ato aposentatório de José Dirceu Cordeiro, matrícula n. 351, no cargo de Motorista de Caminhão, nível II, referência 12, CPF n. 194797279-00, PIS/PASEP n. 1008444974-5, do Quadro de Pessoal da Prefeitura Municipal de Caçador, consubstanciado no Decreto n. 1300/1996, considerado legal conforme pareceres emitidos nos autos.

6.2. Determinar à Prefeitura Municipal de Caçador que, no prazo de 30 dias, a contar da publicação desta decisão no Diário Oficial do Estado, adote providências visando à suspensão do pagamento das parcelas concedidas ilegalmente ao aposentando acima citado, conforme apontado no item 3.3. do Relatório da Instrução, nos termos do que dispõe o art. 41, §1º, da Resolução n. TC-06/2001 (RI do TCE/SC).

6.3. Determinar à Diretoria de Controle dos Municípios – DMU, deste Tribunal, que, após transitada em julgado a decisão, inclua na programação de Auditoria in loco na Prefeitura Municipal de Caçador a averiguação do cumprimento do determinado no item 6.2 supra-exposto.

6.4. Dar ciência desta Decisão, do Relatório e Voto do Relator que a fundamentam, bem como do Relatório de Reinstrução DMU n. 054/2003, à Prefeitura Municipal de Caçador.

O Ofício nº 5838/TCE/SEG/03 (fls. 76, na data de 28/05/03) comunica a Decisão ao Responsável e o notifica para que adote as providências necessárias.

Em seguida, o Ofício nº 0815/03, solicitou "prorrogação de prazo para interposição de recurso de reexame" - fls. 77, a qual foi autorizada por mais 30 (trinta) dias (Ofício nº 10.400/TCE/SEG/03) - fls. 79.

Inconformado, o Responsável interpôs Recurso de Reexame (nº REC - 03/06209888). Insurgiu-se acerca da ocorrência da decadência e, no mérito, tratou do tema da autorização para o pagamento da famigerada gratificação.

É o Relatório.

II. DOS PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE

No que se refere à legitimidade, o Prefeito Municipal de Caçador é parte legítima, nos termos do artigo 133, § 1º alínea "a" da Resolução TC-06/01, na situação de Responsável, para interpor recurso na modalidade de Reexame.

Quanto ao requisito da tempestividade o art. 80, da LCE nº 202/00, assim estabelece o prazo para interposição do Recurso de Reexame:

Ainda, necessário complementar com a regra disposta no art. 66, caput c/c §3º da Resolução TC-06/01:

Art. 66. Salvo disposição em contrário, os prazos previstos neste Regimento computar-se-ão excluindo o dia do começo e incluindo o do vencimento.

(...)

§3º Nos demais casos, salvo disposição expressa em contrário, os prazos somente começam a correr do primeiro dia útil após a publicação do acórdão ou da decisão no Diário Oficial do Estado.

O recurso em análise foi protocolizado na data de 04/08/03, enquanto a publicação da Decisão nº 1006/03 ocorreu no dia 17/06/03. Entretanto, foi concedida prorrogação do prazo por 30 (trinta) dias (fls. 79), o que possibilitou considerar tempestiva a insurgência.

A singularidade também foi respeitada, em consonância com o art. 80 da LCE nº 202/00.

Em decorrência do acima exposto, sugere-se ao Exmo. Sr. Conselheiro Relator Otávio Gilson dos Santos que conheça do Recurso de Reexame, na forma do art. 80, da LCE nº 202/00, por estarem preenchidos todos os pressupostos de admissibilidade.

III. DAS RAZÕES RECURSAIS

Como preliminar de mérito, o Recorrente suscitou a questão da decadência nos seguintes termos (fls. 04-05):

Neste âmbito é razoável antes de se deflagrar o processo administrativo, avaliar a discussão acerca do decurso de prazo, entre a data da concessão da aposentadoria, (leia-se: do pagamento da primeira parcela considerada como ilegal), e o momento da rejeição desta parcela na homologação do ato aposentatório.

[...]

A lei nº 9.784/99, na parte aqui enfocada, buscou preencher uma lacuna, qual seja o prazo para a invalidação por iniciativa própria dos atos administrativos.

Em resumo, quanto ao prazo de decadência do direito da Administração Federal de impugnar os seus atos, pode-se afirmar que, à luz da lei vigora a seguinte sistemática: é de 5 anos para invalidar atos administrativos concretos inconvalidáveis, pela Administração, que importem em benefício para terceiros, excetuando-se apenas a hipótese de má-fé do interessado.

Assim, salvo melhor juízo, a parcela considerada como irregular, já não pode mais ser suspensa dos proventos do servidor, em face a ocorrência da decadência, (ou prescrição, como melhor for o entendimento do E. Tribunal), que pode ser alegada em qualquer tempo ou grau de jurisdição.

Ao contrário do alegado pelo Recorrente, o prazo decadencial estabelecido no art. 54 da Lei nº 9.784/99 não se aplica aos atos de aposentadoria, caso em que passa a correr apenas após o seu respectivo registro (condição resolutiva), por se tratar de ato complexo. Segue teor do art. 54 da Lei nº 9.784/99:

Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.

§1º No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência contar-se-á da percepção do primeiro pagamento.

§2º Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administrativa que importe impugnação à validade do ato.

Tal prazo decadencial deve ser observado nos casos de ato administrativo de eficácia definitiva, e não nos de eficácia provisória, situação dos atos de aposentadoria, que apenas adquirem aquela quando do seu registro.

Dessa forma, é de se observar que a decadência alegada (art. 54 da Lei nº 9.784/99) não se aplica quando do exercício do controle externo pelo Tribunal de Contas. A respeito, vejamos o que dispõe o art. 71, III, da CF/88:

Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete:

[...]
III - apreciar, para fins de registro, a legalidade dos atos de admissão de pessoal, a qualquer título, na administração direta e indireta, incluídas as fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, excetuadas as nomeações para cargo de provimento em comissão, bem como a das concessões de aposentadorias, reformas e pensões, ressalvadas as melhorias posteriores que não alterem o fundamento legal do ato concessório;

No que concerne ao tema, da jurisprudência do Egrégio Supremo Tribunal Federal, colaciona-se:

O Tribunal de Contas, no julgamento da legalidade de concessão de aposentadoria ou pensão, exercita o controle externo que lhe atribui a Constituição Federal, art. 71, III, no qual não está jungindo a um processo contraditório ou contestatório. (MS24.859, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ 27/08/04)

E mais:

O ato de aposentadoria configura ato administrativo complexo, aperfeiçoando-se somente com o registro perante o Tribunal de Contas. Submetido à condição resolutiva, não se operam os efeitos da decadência antes da vontade final da Administração. (MS 24.997, Rel. Min. Eros Grau, DJ 01/04/05)

Acerca da matéria, esta Coordenadoria já se manifestou sobre o assunto através do Parecer COG nº 456/04 da Consultora Geral à época Elóia Rosa da Silva - Processo nº PDI 01/00135803, Conselheiro Relator José Carlos Pacheco, Decisão nº 2700/03, data da Sessão Ordinária Preliminar: 13/08/03, data da Sessão Ordinária Definitiva: 18/04/05:

Atos de pessoal. Aposentadoria. Administrativo. Decadência. Registro. Aplicação do art. 54 da Lei 9784/99 aos atos de aposentadoria sujeitos à apreciação da legalidade pelo Tribunal de Contas para fins de registro. Impossibilidade.

1. Consoante o entendimento do STJ, fica a Administração impedida de rever atos ilegais geradores de efeitos favoráveis no campo de interesses individuais expedidos a mais de cinco anos, em face da decadência preconizada pelo art. 54 da Lei nº 9.784/99.

2. O entendimento do STJ acerca da decadência tem aplicabilidade restrita aos atos administrativos que adquirem eficácia definitiva na esfera administrativa, o que não ocorre com os atos de aposentadoria que possuem eficácia provisória e, por isso mesmo, devem ser, pelo sistema constitucional vigente, submetidos ao controle da legalidade pelo TC, cujo registro confere o caráter de definitividade e permanência destes atos no mundo jurídico.

3. A norma do art. 54 da Lei Federal nº 9784/1999 não impede o exercício do controle externo da legalidade dos atos de aposentadoria conferido ao Tribunal de Contas pelo sistema constitucional vigente, a quem compete, a qualquer tempo, declarar a sua ilegalidade porque não há influência do prazo decadencial enquanto o ato de aposentadoria pende de registro pelo Tribunal de Contas.

4. A autoridade administrativa fica obrigada a corrigir os defeitos jurídicos do ato, ou promover a sua anulação, se for o caso, em face do caráter impositivo das decisões do Tribunal de Conta que negam o registro do ato de aposentadoria, observado o devido processo legal no qual sejam assegurados o contraditório e a ampla defesa. (grifo nosso)

Diante do exposto, necessário se faz proceder a análise de mérito do ato aposentatório em comento, que se restringe a convalidação do ato com a conseqüente supressão da irregularidade - pagamento de gratificação de que trata a Lei Municipal nº 708/93 - pela Lei Municipal nº 1.945/03, que em seu art. 1º, estabelece:

Art. 1º. Ficam convalidados os atos de aposentadoria que incorporaram a gratificação de que trata a lei nº 708, de 27 de outubro de 1993, que dispõe sobre o pagamento de gratificação aos motoristas de caminhões e operadores de máquinas, do Grupo Ocupacional Operacional da Prefeitura Municipal de Caçador que foram para a inatividade até a publicação da Lei Complementar nº 10, de 15 de dezembro de 2000, que institui o Regime Próprio de Previdência Social dos servidores efetivos e cria o IPASC, conforme Anexo I que integra a presente Lei. (grifo nosso)

Tal legislação acabou por remediar a irregularidade então existente no cálculo dos proventos do servidor, que seria a inclusão da Gratificação de que trata a Lei Municipal nº 708/93. Ademais, ao se manifestar acerca da matéria em caso análogo, esta Consultoria Geral exarou Parecer COG nº 1054/05, elaborado pela Dra. Walkíria M. R. Maciel. Cita-se:

Do corpo do Parecer, extrai-se:

Importante salientar que tal opinião foi referendada por este Tribunal através do Acórdão de nº 0298/06, sessão de 06/03/2006, processo nº REC-03/07480976, Exmo. Sr. Conselheiro Relator Luiz Roberto Herbst:

Conforme se denota, de acordo com o Parecer e o Acórdão supra mencionados, o princípio da isonomia deve ser respeitado. E, por se cuidar de situações semelhantes, exigem tratamento idêntico.

Nas palavras de Alexandre de Moraes - Direito Constitucional. São Paulo: Atlas, 2003. 13.ed. p. 65:

O princípio da igualdade consagrado pela constituição opera em dois planos distintos. De uma parte, frente ao legislador ou ao próprio executivo, na edição, respectivamente, de leis, atos normativos e medidas provisórias, impedindo que possam criar tratamentos abusivamente diferenciados a pessoas que encontram-se em situações idênticas. Em outro plano, na obrigatoriedade ao intérprete, basicamente, a autoridade pública, de aplicar a lei e atos normativos de maneira igualitária(...). (grifo nosso)

Importante indicar, ainda, a Decisão nº 1915/06, do REC nº 01/02085005, contra a Decisão do processo nº SPE - 00/00898694, data da Sessão Ordinária: 09/08/06, em que atuou como Relator o Exmo. Sr. Conselheiro César Filomeno Fontes:

Interessante concluir que em seu voto, o Exmo. Sr. Conselheiro Relator faz referência ao Parecer COG nº 756/05:

Por sua vez, do corpo do Parecer COG nº 756/05, extrai-se:

Apesar de eventuais divergências que possam ser levantadas, é certo que este Tribunal de Contas, em processo análogo - REC-03/00693788 - por meio da Decisão nº 3530, proferida na Sessão Ordinária de 08/11/2005, decidiu por legal a concessão da Gratificação de Responsabilidade Técnica à servidora que exercia o cargo de advogada na FATMA, não sendo adequado, decidir-se no presente caso de modo diverso, correndo-se o risco de violar o princípio da isonomia.

Por fim, cumpre acrescentar que é o servidor de boa-fé, tendo em vista que não contribuiu para que ocorresse a irregularidade, sendo ato de responsabilidade exclusiva da Administração.

IV. CONCLUSÃO

Ante o exposto, sugere-se ao Exmo. Relator dos autos que em seu voto proponha ao Egrégio Plenário o que segue:

  MARCELO BROGNOLI DA COSTA

Consultor Geral