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Processo n°: | CON - 07/00020616 |
Origem: | Prefeitura Municipal de Caçador |
Interessado: | Saulo Sperotto |
Assunto: | Consulta |
Parecer n° | COG-166/07 |
Consulta. Administrativo. Dívida ativa de baixo valor. Não ajuizamento de execução fiscal. Possibilidade.
Senhor Consultor,
Trata-se de Consulta formulada pelo Prefeito do Município de Caçador, Sr. Saulo Sperotto, relativa à cobrança judicial de dívida ativa de valor inferior a um salário mínimo.
O Consulente informa que decisões judiciais de primeiro grau vêm entendendo que execuções fiscais de valores inferiores a mil reais devem ser extintas sem julgamento do mérito, por falta de interesse de agir.
Junta às fls. 04/07, sentença emitida pela 2ª Vara da Comarca de Caçador, que extinguiu execução fiscal ajuizada pelo Município de Caçador para cobrança de valor menor que o salário mínimo vigente.
Informa ainda o Consulente que nas mencionadas decisões judicias consta a notícia de que o Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina teria encaminhado expediente ao Tribunal de Contas do Estado com a sugestão de que fosse editado provimento desobrigando prefeitos a ajuizarem ações de execuções fiscais em valor inferior a mil reais.
Por fim, postula o Consulente a orientação deste Tribunal acerca da questão apresentada e da existência de provimento editado por esta Corte de Contas que dispense os Municípios de ajuizar ações de valores inferiores a um salário mínimo ou a mil reais.
II. DA CONSULTA
A Consulta de fls. 02/03, possui o seguinte teor:
III. PRELIMINARES DE ADMISSIBILIDADE
Considerando que a Consulta vem firmada pelo Prefeito do Município de Caçador, Sr. Saulo Sperotto, tem-se como preenchido o requisito de legitimidade, consoante o disposto nos artigos 103, II e 104, III, da Resolução nº TC-06/2001, desta Corte de Contas.
Observa-se ainda que a consulta não veio instruída com parecer da assessoria jurídica do órgão ou entidade consulente, conforme preceitua o art. 104, V, da Resolução nº TC-06/2001 (Regimento Interno do TCE/SC), contudo, o Tribunal Pleno poderá conhecer de consulta que não atenda a esta formalidade, conforme autoriza o parágrafo 2º, do artigo 105 do referido Regimento. Essa ponderação compete ao relator e aos demais julgadores.
IV. ANÁLISE DA CONSULTA
Conforme relatado pelo Consulente, o Município de Caçador vem enfrentando dificuldades ao ajuizar execuções fiscais de valor inferior a mil reais, isto porque alguns Juízes de primeiro grau têm extinguido os processos sem julgamento do mérito, com fundamento na falta de interesse de agir.
Como nas mencionadas sentenças os Juízes informam que, em razão de estudo elaborado pelo Tribunal de Justiça Catarinense sobre o custo das execuções fiscais para o Poder Judiciário, aquela Corte teria encaminhado expediente para o Tribunal de Contas do Estado sugerindo a edição de provimento desobrigando os prefeitos a ajuizarem execuções fiscais em valor inferior a mil reais, o Consulente questiona acerca da existência do referido instrumento normativo.
Ao final, o Consulente, ciente de que não pode renunciar às receitas, solicita orientação deste Tribunal de como proceder diante da questão apresentada.
Assim, para um melhor entendimento da matéria, a análise da Consulta será desdobrada nos seguintes tópicos: das sentenças de primeiro grau; do estudo realizado pelo Tribunal de Justiça e da previsão legal.
A) DAS SENTENÇAS DE PRIMEIRO GRAU
Os documentos de fls. 04/07 comprovam que o Juiz de Direito da 2ª Vara da Comarca de Caçador extinguiu sem julgamento do mérito, por falta de interesse de agir, Execução Fiscal ajuizada pelo Município de Caçador de valor menor que o salário mínimo vigente.
Entretanto, em pesquisa realizada no site do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, constatou-se que decisões monocráticas como a juntada pelo Consulente, vêm sendo reformadas em grau de recurso, senão veja-se:
No mesmo sentido, as Apelações Cíveis números 2006.006939-4; 2005.006165-6, 2005.006826-5, 2005.006654-6, 2005.004116-6; 2005.004166-1; 2005.004368-9; 2005.004345-2; 2005.004341-4; 2005.004256-0, 2005.004253-9, 2005.004251-5; 2005.004218-2; 2005.004202-7, dentre outras.
Assim, diante da farta jurisprudência existente no Tribunal de Justiça e tendo em vista o reexame necessário previsto no artigo 475 do Código de Processo Civil, as sentenças de primeiro grau extinguindo as execuções fiscais de valor inferior a mil reais ajuizadas pelo Município de Caçador podem ser reformadas em segundo grau, resolvendo-se desse modo, a dificuldade enfrentada pelo Consulente.
B) DO ESTUDO REALIZADO PELO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
A título de esclarecimento sobre a realidade dos fatos, o estudo sobre o custo dos processos de execução fiscal realizado pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina (Parecer processo 244.266-2006.3), sugeriu a remessa de cópia do mesmo para o Tribunal de Contas para conhecimento, eventual manifestação e solicitação para que se exija dos Municípios e do Estado a verificação de regularidade dos processos de constituição do crédito tributário e de inscrição em dívida ativa, com real e efetiva notificação do devedor, o que foi feito pelo Presidente daquele Tribunal, Desembargador Pedro Manoel de Abreu por intermédio do Ofício nº 479/06 - GP.
Em resposta, este Tribunal de Contas emitiu o Ofício TC/GAB-10.401/2006, onde informou que o tema "Receitas Próprias e Dívida Ativa", foi objeto da palestra e debate do IX Ciclo de Estudos de Controle Público da Administração Municipal, oportunidade em que se alertara não só para a necessidade da instituição, previsão e efetiva arrecadação dos tributos de competência dos municípios, como para a regularidade dos lançamentos e das notificações, evitando-se a frustração da cobrança pela via administrativa ou judicial.
Deste modo, esclarece-se que o Ofício nº 479/06 - GP encaminhado pelo Tribunal de Justiça, não sugeriu a este Tribunal de Contas editar provimento desobrigando os Prefeitos a ajuizarem ações de execuções fiscais em valor inferior a mil reais, até porque foge da competência desta Corte de Contas a edição de atos desta natureza, tarefa que cabe ao Poder Legislativo, como será visto no próximo tópico.
C) DA PREVISÃO LEGAL
O não ajuizamento de execuções fiscais de valores irrisórios somente poderia ser autorizado por lei, seja porque o administrador público, que está vinculado ao Princípio da Legalidade, só pode fazer aquilo que a lei previamente estabelece, seja pela previsão inserta no artigo 150, § 6º da Constituição Federal, que possui a seguinte redação:
A Lei de Responsabilidade Fiscal, em seu art. 14, § 3º, inciso II, ao dispor sobre renúncia de receita, prevê o cancelamento de débito cujo montante seja inferior ao dos respectivos custos de cobrança.
Desta maneira, para que o não ajuizamento de execuções fiscais de baixo valor seja possível, o Município deve levantar os custos que sua Procuradoria terá para a cobrança judicial da dívida ativa, tais como material de expediente, locomoção, risco de obtenção do crédito, eventual sucumbência, etc.
Apurado o total dos custos para a cobrança, projeto de lei prevendo o não ajuizamento da dívida ativa com valor inferior ou igual aos custos, deve ser encaminhado à Câmara Municipal.
Aprovado o projeto pela Câmara Municipal, o Prefeito estará legitimado a não ajuizar execuções fiscais de valores abaixo ou igual aos custos da cobrança.
É importante observar que, consoante determina o art. 30, inciso I da Constituição Federal, apenas o Poder Legislativo Municipal possui competência para legislar sobre o assunto em análise.
Somente o Município possui condições de apurar seus custos e definir o quantum que para ele seria antieconômico cobrar judicialmente e deste modo, agir de acordo com o estatuído pelo art. 14, § 3º, inciso II da Lei de Responsabilidade Fiscal.
Eventual lei estadual prevendo a extinção de processos de execuções fiscais de baixo valor não eximiria a responsabilidade dos Prefeitos, pois referida lei padeceria de vício de inconstitucionalidade por vedar o acesso à justiça (art. 5º, inciso XXXV, da CF), por invadir a esfera de competência da União para legislar sobre matéria processual (art. 22, inciso I, da CF) e por ferir a autonomia da organização político-administrativa dos Municípios (art. 18, da CF).
Cada ente da Federação deve legislar dentro de sua esfera de competência, como já ocorre nas esferas Federal e Estadual.
A Lei Federal nº 9.469/97 prevê a não propositura de ações para cobranças de créditos de valor igual ou inferior a mil reais e a Lei nº 10.522/02, art. 20, autoriza o Procurador da Fazenda Nacional requerer o arquivamento, sem baixa na distribuição, dos autos das execuções fiscais de valor igual ou inferior a dez mil reais.
As mencionadas leis possuem as seguintes redações:
Na esfera estadual, a Lei nº 11.309/99, autoriza os Procuradores do Estado a não propor ações de valor igual ou inferior a mil reais e a Lei nº 12.646/03, dispõe especificamente sobre a dívida ativa, nos seguintes termos:
Portanto, desde que haja previsão legal, o Município pode não ajuizar execuções fiscais de valores abaixo ou igual aos custos da cobrança.
1. Que o consulente está legitimado à subscrição de consultas para este Tribunal de Contas, nos termos do inciso II, do art. 103 do Regimento Interno desta Corte de Contas;
2. Que a consulta trata de situações em tese e de interpretação de lei, conforme determina o inciso XII, do art. 59, da Constituição do Estado de Santa Catarina, bem como o inciso XV, do art. 1º, da Lei Complementar Estadual 202/2000;
3. Que apesar de não vir instruída com parecer da assessoria jurídica do órgão ou entidade consulente, conforme preceitua o art. 104, inciso V, da Resolução n. TC-06/2001 (Regimento Interno do TCE/SC), o Tribunal Pleno poderá conhecer de consulta que não atenda a esta formalidade, conforme autoriza o parágrafo 2º, do artigo 105 do referido Regimento. Essa ponderação compete ao relator e aos demais julgadores.
Sugere-se ao Exmo. Relator Auditor Gerson dos Santos Sicca que submeta voto ao Egrégio Plenário sobre consulta formulada pelo Prefeito do Município de Caçador, Sr. Saulo Sperotto, nos termos deste parecer, que em síntese propõe:
1. Conhecer da consulta por preencher os requisitos de admissibilidade previstos no Regimento Interno.
2. Responder a consulta nos seguintes termos:
2.1. O artigo 150, § 6º da Constituição Federal estabelece que qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2.º, XII, g;
2.2 A Lei de Responsabilidade Fiscal em seu art. 14, § 3º, inciso II, ao dispor sobre renúncia de receita, prevê o cancelamento de débito cujo montante seja inferior ao dos respectivos custos de cobrança;
2.3. Para que o não ajuizamento de execuções fiscais de baixo valor seja possível, o Município deve levantar os custos que sua Procuradoria terá para a cobrança judicial da dívida ativa, tais como material de expediente, locomoção, risco de obtenção do crédito, eventual sucumbência, etc;
2.4 Apurado o total dos custos para a cobrança, projeto de lei prevendo o não ajuizamento da dívida ativa com valor inferior ou igual aos custos, deve ser encaminhado à Câmara Municipal;
2.5 Aprovado o projeto pela Câmara Municipal, o Prefeito estará legitimado a não ajuizar execuções fiscais de valores abaixo ou igual aos custos da cobrança, a exemplo do que ocorre na esfera federal (Lei nº 9.469/97 e Lei nº 10.522/02) e na esfera estadual (Lei nº 11.309/99 e Lei nº 12.646/03).
3. Remeter cópia desta Decisão, do Parecer e Voto que a fundamenta ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, tendo em vista a repercussão do assunto objeto da Consulta no âmbito do Poder Judiciário.
COG, em 30 de março de 2007.
Valéria Rocha Lacerda Gruenfeld
Auditora Fiscal de Controle Externo
De Acordo. Em ____/____/____
GUILHERME DA COSTA SPERRY
Coordenador de Consultas
DE ACORDO.
À consideração do Exmo. Sr. Relator Gerson dos Santos Sicca, ouvido preliminarmente o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas.
COG, em de de 2007.
MARCELO BROGNOLI DA COSTA Consultor Geral |