TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE SANTA CATARINA

DIRETORIA DE CONTROLE DOS MUNICÍPIOS - DMU

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PROCESSO

TCE - 03/02574093
   

UNIDADE

Prefeitura Municipal de São Francisco do Sul
   
INTERESSADO Sr. Odilon Ferreira de Oliveira - Prefeito Municipal (Gestão 2005 - 2008)
   

RESPONSÁVEL

Sr. Odilon Ferreira de Oliveira - Prefeito Municipal (Gestão 2001 - 2004)
   
ASSUNTO
    Restrições constantes do Relatório de Contas Anuais do exercício de 2001, apartadas em autos específicos por decisão do Tribunal Pleno - Reinstrução
 
     
RELATÓRIO N°
    231/2007

INTRODUÇÃO

A Prefeitura Municipal de São Francisco do Sul, sujeita ao regime de fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial deste Tribunal de Contas, nos termos do artigo 31 da Constituição Federal, artigo 113 da Constituição Estadual, artigos 50 a 59 da Lei Complementar n.º 202/2000, de 15/12/2000, e artigos 20 a 26 da Resolução N.º TC - 16/94, de 21/12/94, encaminhou para exame o Balanço Anual do exercício de 2001 - autuado como Prestação de Contas do Prefeito (Processo n.º PCP 02/03692632), por meio documental, e mensalmente, por meio magnético, os dados e informações constantes do art. 22 da Resolução antes citada.

Considerando o resultado da análise do processo em causa, consubstanciado em documentos e dados informatizados, e a decisão do Tribunal Pleno, em sessão de 18/12/2002, para que se proceda, em processo apartado, a análise no que diz respeito às restrições evidenciadas nos itens F.1.1, F.1.2, F.1.4, F.1.5, F.3.3, F.3.5 e F.4.1, da parte conclusiva do Relatório n.º 6001-A/2002, que integra o Processo n.º PCP 02/03692632, foi procedida a autuação em separado, sob o n.º PDI 03/02574393.

Desta forma, a Diretoria de Controle dos Municípios, atendendo a decisão do Tribunal Pleno, datada de 09/06/2003, convertendo o processo PDI 03/02574393 em Tomada de Contas Especial (TCE 03/02574093) com fulcro no artigo 32 da Lei Complementar n.º 202/2000 c/c o artigo 34, caput da Resolução TC 06/2001 - Regimento Interno do Tribunal de Contas, remeteu em data de 03/07/2003, ao Sr. Odilon Ferreira de Oliveira - Prefeito Municipal, o Ofício n.º 8488/2003, determinando a citação do mesmo, para, no prazo de 30 (trinta) dias, apresentar defesa por escrito, acerca do conteúdo do Relatório n.º 504/2003.

O Sr. Odilon Ferreira de Oliveira - Prefeito Municipal, através do Ofício s/n.º, datado de 28/08/2003, protocolado neste Tribunal sob n.º 015098, em 29/08/2003, apresentou justificativas sobre as restrições anotadas no Relatório supracitado.

II - PRELIMINARES

"A instrução do presente processo, não observou procedimentos essenciais preconizados pela a Lei Complementar/SC n° 202, de 15-12-2000 (Lei Orgânica do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina), necessários a revestir o ato examinado de condição apropriada para o seu julgamento.

A inobservância de tais requisitos prejudica a validade da Decisão, em tela. Razão por que, nesta oportunidade e no âmbito administrativo dessa Casa, levantam-se as PRELIMINARES1 a seguir enunciadas, para, antes de tudo, serem decididas pelo Egrégio Tribunal de Contas, na forma do direito e da lei.

PRIMEIRA PRELIMINAR: Impropriedade da identificação do responsável

Em razão de sugestão do Corpo Instrutivo (Relatório de Reinstrução DMU nº 504/2003, acatada pelo Relator, o Egrégio Plenário determinou a citação do Sr. Odilon Ferreira de Oliveira para responder a respeito do que a instrução entendera como irregular, inclusive sob pena de imputação de débito e cominação de multa. Para tanto, o processo PDI-03/02574093 foi convertido em "tomada de contas especial".

A DMU, entretanto, não indica nos autos os elementos informativos e comprobatórios em que se baseou inferir que o Prefeito Municipal foi quem realmente praticou ou ingeriu para que fossem cometidos os atos, integrantes, do procedimento administrativo em análise, inquinados de irregulares.

1. Denominar de "tomada de contas especial" um processo, como sugeriu a Diretoria, não deve ser considerada solução simplista destinada tão-somente a submeter o ato jurídico ao julgamento da Corte de Contas. Instaurar ou converter um processo (como o Relatório de Auditoria, p. ex.) em tomada de contas especial pressupõe, além de mudança da classificação burocrática dos autos, a adoção de específico procedimento administrativo, cuja natureza e objetivos há de se ter em vista, para o apropriado cometimento dos atos inerentes, na forma da lei.

A instauração de "tomada de contas especial" é, antes de tudo, medida assecuratória da justiça que deve embasar as deliberações do Tribunal, pois, dos procedimentos inerentes à sua execução, haverá de resultar criteriosa apuração dos fatos, identificação precisa (não presumida!) do(s) responsável(eis) e quantificação do dano, bem como garantia aos interessados de observância do direito ao contraditório e ampla defesa, preconizado na Constituição Federal (art. 5°, LV). O que não foi completado, no presente caso.

Em sua obra "Dicionário de Orçamento, Planejamento e Áreas Afins", Osvaldo Maldonado Sanches2, elucida sobre a matéria:

O novo Regimento Interno do TCE/SC, em seu art. 9°, inciso. II, considera tomada de contas especial a AÇÃO desempenhada pelo órgão competente ou pelo Tribunal:

"a) para a apuração de fatos, identificação dos responsáveis e quantificação do dano, quando não forem prestadas contas ou quando ocorrer desfalque, desvio de dinheiros, bens ou valores públicos;

b) quando, em processo de fiscalização a cargo do Tribunal, ficar caracterizada a prática de qualquer ato ilegal, ilegítimo ou antieconômico de que resulte prejuízo ao erário;

c) nos casos de falecimento do responsável ou de vacância do cargo, por qualquer causa, desde que não tenham sido apresentadas as contas ao Tribunal no prazo legal."

O § 4º, do art. 65, da L.C. n° 202/2000 é mais incisivo: determina que, se configurada outra irregularidade (e não apenas desfalque ou desvio de bens) de que resulte dano ao Erário, "o Tribunal ordenará, desde logo, a conversão do processo em tomada de conta especial, se o dano apurado for de valor igual ou superior àquele previsto no § 2º do art. 10" da mesma lei.

2. A tomada de contas especial, consoante os seus objetivos, obriga ao cometimento de atos intermediários ou preparatórios; esta determinação não pode deixar de ser observada, sob pena de ferir direitos e eivar de vício o ato final, que deverá especificar qual o ato ilegal havido, quem o praticou e o real dano ocasionado.

Portanto, do cometimento de tais atos preparatórios é que devem resultar os elementos precisos para que o ATO JURÍDICO, então integrante de uma tce, seja submetido ao julgamento do Tribunal. Sobre o assunto, o art. 14 do atual Regimento Interno do TC/SC é elucidativo:

(Observa-se, aliás, que a redação do inciso III, do art. 14. do RI/TC não segue a orientação do art. 11, inciso IV, da L.C. n° 202/2000.)

Tanto nas situações em que a tomada de contas especial resulte de instauração de processo pela autoridade competente (art. 10), como de quando o Tribunal ordene a conversão de processo em "tce" (arts. 32 e 65, § 4°), apenas se definidos seus elementos básicos (apuração dos fatos, identificação dos responsáveis e quantificação do dano) é que terá a Corte condições de, agindo como órgão julgador, dar seqüência ao procedimento, para então, e só aí, efetuar citações (art. 13, par. único) ou audiências (art. 29, § 1°), sob pena de resultar inócua a medida, seja por não haver ato ilegal adequadamente configurado contra que se insurgir; seja pela falta de certeza jurídica sobre quem deu causa ao ilícito; ou então por não se caracterizar a ocorrência de dano.

A observância do princípio da legalidade impõe ao Tribunal de Contas a obrigatoriedade do cometimento dos atos vinculados, previstos na própria Lei Orgânica. Nela estão definidos, inclusive, o momento e a condição processuais de se utilizar a figura da "audiência". Veja-se:

Prescreve a Lei que a citação serve para o Tribunal chamar o responsável, concedendo-lhe oportunidade de se defender.

Mas, quem considerar como o RESPONSÁVEL?

A LC 202, ao conceituar citação no parágrafo único do art. 13, definiu com precisão absoluta quem deve ser identificado como o responsável:

O conceito constante do art. 133, § 1°, "a" 3, do Regimento Interno do TC/SC (mais abrangente, por tratar de outras espécies de processos), guarda consonância com a definição legal acima.

O art. 10 da LO/TC indica a obrigatoriedade da identificação do responsável, como um dos objetivos procedimentais, quando da instauração de tomada de contas especial.

Como visto, é a norma legal que exige precisa evidência de que a pessoa praticou o ato irregular para que possa ser apontada como "responsável". Essa obrigação é forma prescrita na lei, é condição vinculante para a decisão do Tribunal, como ato jurídico administrativo, ser perfeita.

Portanto, de acordo a LO/TCE-SC, só deve haver citação se, da tomada de contas especial ou outro procedimento específico resultar cabal demonstração:

a) da existência indubitável de ato irregular;

b) de que a pessoa, indicada como responsável, efetivamente praticou os atos inquinados irregulares diretamente ou ingerindo para que fosse cometido com impropriedades; e

c) que tais atos são passíveis de imputação de débito ou cominação de multa.

Quando se der a instauração da tomada de contas especial pela AUTORIDADE COMPETENTE (Ordenador Primário, Secretário, Diretor Geral, etc.) do órgão fiscalizado (art. 10), o Tribunal de Contas efetuará a citação somente após aquela ter ultimado o procedimento e lhe encaminhar os autos. Nessa ocasião, é que a Corte concederá (agora, na sua esfera de competência, de órgão julgador) às pessoas identificadas como responsáveis o direito de exercer o contraditório e ampla defesa, em relação ao fato de que são acusadas, seja através da citação, seja da audiência, conforme o caso.

Conforme se disse, partindo do Tribunal de Contas a iniciativa de converter processo em tomada de contas especial, os autos só poderão ser levados a julgamento após efetivada a condição para a qual é prevista a "tce", ou seja, que esteja caracterizada a irregularidade de ato de gestão, identificado o responsável e quantificado dano causado ao Erário. Para atingir esse desiderato, o Órgão Julgador poderá se valer de duas alternativas, na forma da legislação atual:

Se o Corpo Instrutivo/TC realizar auditoria e não apurar todos os dados necessários ao julgamento de conta, a Corte - ao remeter cópia do Relatório de Auditoria à Unidade fiscalizada - determinar-lhe-á que instaure a tomada de contas especial, para a complementação dos trabalhos, haja vista a constatação de indícios de irregularidades. É o que se infere dos termos art. 10 da L.O. combinado com o art. 59, § 1°, inciso V, da Lei Complementar n° 101, de 2000.

Logicamente, seria recomendável que, antes da Corte determinar a instauração da "tce", primeiramente instasse o Órgão fiscalizado a lhe prestar esclarecimentos iniciais sobre as divergências apontadas pelo seu Corpo Instrutivos, no Relatório de Auditoria; com isto, poderá se dar o saneamento do processo de situações que, em realidade, não configuram irregularidade.

Portanto, o responsável nunca será designado, mas identificado; e isto não poderá decorrer de ilação não fundamentada. Será demonstrado, de maneira objetiva e insofismável, que a pessoa realmente PRATICOU o ato inquinado de irregular; só desta forma será legal que se lhe efetue citação ou audiência.

3. A Lei Complementar n° 202/00 não elege, como responsável, pessoa contra quem se construa uma dedução; não diz que o titular de órgão ou entidade pública é responsável pelo cometimento de ato de gestão irregular, pelo simples fato de ser o superior hierárquico de maior nível. O diploma legal estabelece que responsável é quem efetivamente praticou (fez, realizou, cometeu, executou) o ato irregular.

Veja-se, aliás, que a Lei Orgânica/TCSC só afirma a existência de responsabilidade solidária se a AUTORIDADE COMPETENTE (que até pode ser o Ordenador Primário) não instaurar a tce; fora dessa hipótese, não a declara responsável.

Conforme o estudo dos autos evidencia, o Corpo Instrutivo não agiu segundo a orientação sistêmica e objetiva, ditada pela própria Lei Orgânica do Tribunal de Contas. Deixou de sugerir, inclusive, que o Relator do processo determinasse à "autoridade competente" (o Titular da Unidade Gestora) a instauração de tomada de contas especial, já que a própria Instrução não atendera, de maneira cabal, o cumprimento dos requisitos preconizados pela Lei Orgânica.

4. Ao escolher o Recorrente como a pessoa contra quem deveria recair a citação, simplesmente pelo fato dele ser o Ordenador Primário, o Corpo Instrutivo agiu como dantes da vigência da Lei Complementar n° 202/2000. Àquela época, todo ato irregular era dito ser da responsabilidade do Titular do órgão sob fiscalização.

Então, não era atentado para a necessidade de se analisar a fundo o ato inquinado irregular, com o fito de determinar quem houvera causado o ilícito e, por conseguinte, sobre quem deveria recair a responsabilização pelo cometimento. À falta de identificação do agente praticante da irregularidade, tornou-se comum o Tribunal responsabilizar e até penalizar a autoridade maior, sob o argumento de que ele poderia exercer direito regressivo contra quem efetivamente houvesse praticado o ato ilegal, ilegítimo ou antieconômico.

A atual LO/TCSC corrigiu a distorção; estabeleceu regras mais precisas sobre a tomada de contas especial, como instrumento para apuração do ilícito, em todos os seus aspectos; além de evidenciar ser do Poder Público, e não da pessoa física (Agente Público ou não) o dever de identificar, em processo administrativo, sobre quem deva recair decisão da Corte de Contas.

As CONTAS PÚBLICAS, retratadas pela contabilidade, refletem o cometimento tanto de atos, quanto de procedimentos administrativos.

Em sua obra Direito Administrativo Brasileiro4, Hely Lopes Meirelles conceitua "ATO ADMINISTRATIVO" como sendo "toda manifestação unilateral de vontade da Administração Pública que, agindo nessa qualidade, tenha por fim imediato adquirir, resguardar, transferir, modificar, extinguir ou declarar direitos, ou impor obrigações aos administrados ou a si própria.

Ao discorrer sobre a formação do ato administrativo, ensina o autor que este pode ser classificado em:

6 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. Hely Lopes Meirelles. 22ª edição, atualizada por Eurico de Andrade Azevedo, Délcio Balestero Aleixo e José Emmanuel Burle Filho. São Paulo, Malheiros Editores Ltda., 1997, de fls. 141.

7 FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Tomada de Contas Especial: processo e procedimento nos tribunais de contas e na administrao pública. 2ª. ed. Brasília, DF: Editora Brasília Jurídica, 1998, p. 36.

8 Meirelles, Hely Lopes. Direito Municipal Brasileiro. São Paulo: Malheiros Editores Ltda, 15ª edição, atualizada por Márcio Schneider Reis e Edgard Neves da Silva, 2006, p. 711 e 712.

9 Meirelles, Hely Lopes. Direito Municipal Brasileiro. São Paulo: Malheiros Editores Ltda, 15ª edição, atualizada por Márcio Schneider Reis e Edgard Neves da Silva, 2006, p. 727.

10 Meirelles, Hely Lopes. Direito Municipal Brasileiro. São Paulo: Malheiros Editores Ltda, 15ª edição, atualizada por Márcio Schneider Reis e Edgard Neves da Silva, 2006, p. 711 e 712.