ESTADO DE SANTA CATARINA
    TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO
    CONSULTORIA GERAL

Processo n°: CON - 07/00126600
Origem: Prefeitura Municipal de Gaspar
Interessado: Adilson Luis Schmitt
Assunto: Consulta
Parecer n°

450917COG 223/07

Consulta. Tributário. Isenção. Concessão no curso da LDO. Impossibilidade.

Senhor Consultor,

1. RELATÓRIO

Trata-se de Consulta formulada pelo Prefeito do Município de Gaspar, Sr. Adílson Luis Schmitt, relativa a concessão de benefícios de natureza tributária às empresas que se estabeleçam ou iniciem suas atividades no Município.

O Consulente assevera não possuir dúvidas acerca da possibilidade das ditas empresas serem contempladas com benefícios de natureza tributária, já que a Lei Municipal nº 1.670/97, juntada às fls. 06/11, disciplina o assunto.

A questão apresentada diz respeito a concessão dos referidos benefícios às empresas que se instalem no Município após a aprovação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), hipótese em que não haveria como cumprir o disposto no item 5 do Prejulgado 1077 deste Tribunal de Contas, segundo o qual a concessão de benefícios de natureza tributária que resulte em renúncia de receita deverá, dentre outros requisitos, atender ao disposto na LDO.

Segundo o Consulente, o atendimento ao item 5 do Prejulgado 1077, "mostra-se um verdadeiro entrave às pretensões de pequenos municípios em sediar grandes empreendimentos, principalmente quando as negociações se fizerem no transcurso da LDO, do respectivo ano em que esta estiver em vigência."

Em face do exposto, formula o Senhor Prefeito Municipal de Gaspar a seguinte Consulta:

2. DA CONSULTA

3. PRELIMINARES DE ADMISSIBILIDADE

Considerando que a Consulta vem firmada pelo Prefeito do Município de Gaspar, Sr. Adilson Luis Schmitt, tem-se como preenchido o requisito de legitimidade, consoante o disposto nos artigos 103, II e 104, III, da Resolução nº TC-06/2001, desta Corte de Contas.

Observa-se ainda que a consulta não veio instruída com parecer da assessoria jurídica do órgão ou entidade consulente, conforme preceitua o art. 104, V, da Resolução nº TC-06/2001 (Regimento Interno do TCE/SC), contudo, o Tribunal Pleno poderá conhecer de consulta que não atenda a esta formalidade, conforme autoriza o parágrafo 2º, do artigo 105 do referido Regimento, cabendo essa ponderação ao Relator e aos demais julgadores.

Dessarte, sugere-se, a priori, o conhecimento da consulta.

4. ANÁLISE DA CONSULTA

A análise da Consulta será realizada na mesma ordem dos questionamentos apresentados pelo Consulente, que são os seguintes:

4.1. PRIMEIRO QUESTIONAMENTO

O primeiro questionamento apresentado pelo Consulente foi feito nos seguintes termos:

No que se refere ao prazo, a isenção pode ser por tempo indeterminado ou por período certo, ex vi o que dispõe o artigo 176 do Código Tributário Nacional (CTN), que possui a seguinte redação:

O mencionado artigo do CTN não fixou limites temporais para a isenção por período certo, cabendo ao legislador local estabelecer tais prazos de acordo com o interesse público.

Luciano Amaro1, ao discorrer sobre isenções temporárias, admite a concessão deste benefício por dez anos às empresas que se instalarem em certa região para fabricar determinado produto, in verbis:

Desse modo, desde que atendam ao interesse público, as isenções temporárias podem ser concedidas pelo período em que a lei previamente estabelecer.

Entretanto, é importante observar que a previsão de isenção por prazo certo, por período muito extenso, pode causar prejuízo ao Município caso eventualmente o benefício venha a ser revogado, principalmente se em virtude do incentivo, certas condições forem exigidas do contribuinte beneficiado.

Explica-se: o artigo 178 do CTN a seguir transcrito, excepciona da regra da plena revogabilidade isencional a isenção concedida por prazo certo e em função de determinadas condições:

Segundo Luciano Amaro 2 e Hugo de Brito de Machado3, a isenção concedida nesses casos não poderá ser cassada antes de findo o prazo de sua vigência, pois nesse caso a isenção se incorpora ao patrimônio do contribuinte.

Para Paulo de Barros Carvalho4 a revogação em tal situação seria possível, desde que o contribuinte fosse justamente indenizado.

O Supremo Tribunal Federal (STF) editou a Súmula 544, segundo a qual "isenções tributárias concedidas sob condição onerosa, não podem ser livremente suprimidas".

Em sintonia com a doutrina acima citada e com Súmula 544 do STF, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), sedimentou o entendimento segundo o qual a isenção concedida por prazo certo e sob determinadas condições não pode ser revogada a qualquer tempo.

Nesse sentido, o Acórdão proferido pela 1ª Turma do STJ, nos autos do AgRg no REsp 835466 / PE, Relator o Ministro José Delgado (DJ 16.10.2006 p. 315), que possui a seguinte ementa:

Ainda sobre o tema isenção, alerta-se que de acordo com o disposto no artigo 177 do CTN, salvo disposição de lei em contrário, a isenção não é extensiva às taxas, às contribuições de melhoria e aos tributos instituídos posteriormente à sua concessão.

Contudo, no caso do Município de Gaspar, como o artigo 2º, inciso V da Lei Municipal nº 1.670/97 juntada pelo Consulente às fls. 06/11 prevê a isenção de taxas e demais emolumentos incidentes sobre construção ou ampliação das instalações, aplica-se às isenções que vierem a ser concedidas sobre as referidas taxas bem sobre qualquer outra espécie de tributo, todas as regras previstas para a isenção dos impostos.

Portanto, a concessão de isenção temporária pelo período em que a lei previamente estabelecer é possível desde que observado o interesse público.

Todavia, em razão do que dispõe o artigo 178 do CTN e para se evitar a perda de recursos públicos em possíveis indenizações a serem pagas aos contribuintes, as conseqüências advindas de eventual cassação da isenção por prazo certo e em função de determinadas condições devem ser levadas em consideração pelo Município ao fixar o tempo do benefício que vier a ser concedido em caráter temporário.

Dessarte, diante de todo o exposto, respondendo objetivamente ao consulente, afirma-se que se houver autorização legislativa local, a isenção de impostos de competência do Município pode ser total, pelo período estabelecido na lei.

4.2. SEGUNDO QUESTIONAMENTO

A seguir, transcreve-se a segunda pergunta desta consulta:

Neste item o Consulente questiona como poderá cumprir a determinação constante no item 5 do Prejulgado 1077 caso o benefício da isenção seja concedido à empresa que vier a se instalar no Município após a elaboração da LDO, tendo em vista que os artigos 4º, § 2º, inciso V, 5º e 14 da Lei Complementar Federal nº 101/2000 - Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) não dizem respeito a instalação de novas empresas e sim das que já estão em atividade.

O item 5 do Prejulgado 1077 possui a seguinte redação:

Cumpre esclarecer que a determinação constante do item 5 do Prejulgado 1077 decorre da aplicação do artigo 14 da LRF, segundo o qual a concessão de benefícios de natureza tributária que resulte em renúncia de receita deverá, dentre outros requisitos, atender ao disposto na LDO.

Após a entrada em vigor no ordenamento jurídico da LRF, a concessão dos benefícios acima mencionados está condicionada ao cumprimento dos requisitos exigidos pelo artigo 14 da referida lei.

Nesse sentido, assim se pronunciou Kiyoshi Harada5 :

Ao emitir os Prejulgados 984, 1065, 1099, 1295, 1321, 1344, 1396 e 1235, este Tribunal de Contas pacificou o entendimento segundo o qual a concessão de benefício de natureza tributária que importe em renúncia de receita deve cumprir a LRF.

No que se refere a concessão ao benefício ora em análise após a elaboração da LDO, tem-se não ser possível tal hipótese no exercício financeiro em curso, não apenas em razão da LRF, conforme acima exposto, mas também for força do artigo 165, § 2º da Constituição Federal (CF).

Segundo o mencionado dispositivo constitucional, a LDO deve dispor sobre as alterações na legislação tributária, sendo evidente que a concessão de isenção provoca alteração na referida legislação, na medida em que dito benefício tributário deve estar previsto em lei.

Assim, por provocar alteração na legislação tributária, a isenção deve estar prevista na LDO.

Ao lecionar sobre a Lei de Diretrizes Orçamentárias, Kiyoshi Harada6 ensina que:

Por conseguinte, tanto em razão da LRF, quanto em razão do disposto no artigo 165, § 2º da CF, a concessão de benefícios fiscais que resultem em renúncia de receita não é possível após a LDO.

Com relação a afirmação do Consulente de que os artigos 4º, § 2º, inciso V, 5º e 14 da LRF não dizem respeito a instalação de novas empresas, mas sim daquelas que já estão em atividade, razão não lhe assiste, eis que a LRF não leva este fato em consideração, senão veja-se o que dizem os mencionados artigos:

        Art. 4o A lei de diretrizes orçamentárias atenderá o disposto no § 2o do art. 165 da Constituição e:
        [...]
        § 1o Integrará o projeto de lei de diretrizes orçamentárias Anexo de Metas Fiscais, em que serão estabelecidas metas anuais, em valores correntes e constantes, relativas a receitas, despesas, resultados nominal e primário e montante da dívida pública, para o exercício a que se referirem e para os dois seguintes
        §2º O anexo conterá ainda:
        V- demonstrativo da estimativa e compensação da renúncia de receita e da margem de expansão das despesas obrigatórias de caráter continuado.
        [...]
        Art. 5o O projeto de lei orçamentária anual, elaborado de forma compatível com o plano plurianual, com a lei de diretrizes orçamentárias e com as normas desta Lei Complementar:
        [...]

Desse modo, a simples leitura dos dispositivos legais acima transcritos deixa claro que para a LRF o fato juridicamente relevante é a concessão de incentivo ou benefício de natureza tributária que importe em renúncia de receita, pouco importando se tais benefícios sejam concedidos às empresas novas ou que já estejam em atividade.

Portanto, conforme acima exposto, a concessão de benefícios de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita não poderá ser realizada após a LDO, sendo juridicamente irrelevante o momento em que a empresa candidata aos mencionados benefícios se instale no Município.

4.3. TERCEIRO QUESTIONAMENTO

A última questão apresentada pelo Consulente foi a seguinte:

O conceito de renúncia de receita está definido no art. 14, § 1º da LRF, que possui a seguinte redação:

Na hipótese levantada pelo Consulente, o Município deixaria de auferir receitas tributárias em decorrência de uma isenção concedida em caráter não geral.

Logo, nos termos do que dispõe o dispositivo legal acima transcrito, dita situação deve ser interpretada como renúncia de receita.

5. CONCLUSÃO

Em consonância com o acima exposto e considerando:

2.1 Na instalação de empresas no Município, como forma de incentivo econômico e fiscal, desde que observado o interesse público, é possível concessão de isenção total dos impostos de competência municipal, por meio de lei, pelo período em que a norma previamente estabelecer.

2.2 Em razão do que dispõe o artigo 178 do Código Tributário Nacional (CTN) e para se evitar a perda de recursos públicos em possíveis indenizações a serem pagas aos contribuintes, as conseqüências advindas de eventual cassação da isenção por prazo certo e em função de determinadas condições devem ser levadas em consideração pelo Município ao fixar o tempo do benefício que vier a ser concedido em caráter temporário.

2.3 De acordo com o artigo 165, § 2º da Constituição Federal (CF) e no artigo 14 da Lei Complementar nº 101/2000 (LRF), a concessão de benefícios de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita não poderá ser realizada após a LDO, pois a referida norma deverá dispor sobre as alterações na legislação tributária, tais como a isenção de caráter não geral.

2.4 Nos termos do artigo 14, § 1º da LRF, a receita tributária que o Município deixar de arrecadar em razão de isenção concedida em caráter não geral deve ser considerada como renúncia de receita.

COG, em 20 de abril de 2007.

Valéria Rocha Lacerda Gruenfeld

Auditora Fiscal de Controle Externo

De Acordo. Em ____/____/____

GUILHERME DA COSTA SPERRY

Coordenador de Consultas

DE ACORDO.

À consideração do Exmo. Sr. Conselheiro Wilson Rogério Wan-Dall, ouvido preliminarmente o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas.

COG, em de de 2007

  MARCELO BROGNOLI DA COSTA

Consultor Geral


1 AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 281

2 AMARO, op. cit., p. 281

3 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 22. ed. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 203

4 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 495.

5 HARADA, Kiyoshi. Direito Financeiro e Tributário. 15. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 525

6 HARADA, op. cit., p. 103.