ESTADO DE SANTA CATARINA
    TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO
    CONSULTORIA GERAL

Processo n°: REC - 03/07180905
Origem: Agência de Fomento do Estado de Santa Catarina S.A. - BADESC
RESPONSÁVEL: Arno Garbe
Assunto: Recurso (Reexame - art. 80 da LC 202/2000) -ALC-02/09877731
Parecer n° COG-253/2007

RECURSO DE REEXAME. ADMINISTRATIVO. INEXIGIBILIDADE DE LICITAÇÃO. NÃO COMPROVAÇÃO DE SINGULARIDADE DO OBJETO E DE NOTÓRIA ESPECIALIZAÇÃO DO CONTRATADO. MANUTENÇÃO DA MULTA. CONHECER E NEGAR PROVIMENTO.

Senhor Consultor,

RELATÓRIO

ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro nos arts. 59 da Constituição Estadual e 1° da Lei Complementar n. 202/2000, em:

A decisão foi publicada no Diário Oficial do Estado nº 17.237, em 12/09/2003.

Em 24/09/2003, o BADESC e o Sr. Arno Gaber protocolaram o presente Recurso de Reexame nº 0307180905, por meio do qual requerem o cancelamento da multa relativa ao Processo nº 05/2001, que tratou da inexigibilidade de licitação para contratação de consultoria técnica, tributária e contábil (fls. 2-9). Afirmam que o contrato foi firmado ad exitum, ou seja, sob a condição de proporcionar economia ao BADESC; que a proximidade da data para entrega de declaração dos tributos inviabilizou a realização de procedimento licitatório; que a contratação direta resultou num benefício de quase R$ 5.000.000,00 (cinco milhões de reais) ao BADESC. Alegam, ademais, que a existência de vários profissionais no ramo não retira da contratada a característica da notória especialidade. Alegam que a singularidade do serviço não significa a exigência de inviabilidade de competição. Ressaltam, ademais, que a exigüidade de tempo foi uma das causas da inexigibilidade e que a medida foi tomada em consonância com o interesse público. Argumentam, por fim, que inexistiu grave infração à norma legal e, ainda, que não houve dano ao erário - mas sim um lucro de 5 milhões de reais.

Da mesma forma, quanto ao Processo nº 16/2001, os recorrentes requerem o cancelamento da multa aplicada em face da não-demonstração da singularidade do serviço de informações comerciais e da notória especialização da contratada, quando da inexigibilidade de licitação. Argúem que a exigência legal da singularidade do serviço e da notória especialização da contratada não significa a inexistência de concorrentes no mercado. Acrescentam que, no Brasil, existem duas únicas empresas habilitadas à prestação de serviço de informações comerciais, o que, por si só, já seria capaz de demonstrar a singularidade do serviço. Por fim, defendem que a inexigibilidade de licitação foi revestida de economicidade para a Administração.

PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE

O recurso de reexame é disciplinado pelo art. 80 da Lei Complementar Estadual nº 202/00, in verbis:

O Recurso de Reexame, com efeito suspensivo, poderá ser interposto uma só vez por escrito, pelo responsável, interessado ou pelo Ministério Público junto ao Tribunal, dentro do prazo de trinta dias contados a partir da publicação da decisão no Diário Oficial do Estado. (grifou-se)

O presente recurso é tempestivo, em 24/09/2003, tendo em vista que o Acórdão foi publicado no Diário Oficial do Estado em 12/09/2003.

Outrossim, cumpre - o recurso - o requisito da singularidade, porquanto interposto pela primeira vez.

O recorrente Arno Garbe, ex-Diretor-Presidente da Instituição, é parte legítima para o manejo do presente recurso, porquanto se enquadra no conceito de responsável enunciado pelo art. 133, § 1º, da Resolução nº TC 6/2001:

Ademais, a multa - objeto do recurso - foi contra ele imposta, nos termos do art. 112 da Resolução TC-6/2001:

O recorrente BADESC, por outro lado, carece de interesse processual, uma vez que a multa não foi imputada à Instituição, mas à pessoa física responsável. Da mesma forma, não se enquadra no conceito de responsável e de interessado, constante do art. 133, § 1º, da Resolução nº TC 6/2001.

Diante disso, é o presente parecer pelo recebimento do recurso exclusivamente quanto ao recorrente Arno Garbe.

MÉRITO

1) Da multa aplicada pela não comprovação da singularidade do serviço e da notória especialização da contratada na inexigibilidade de licitação para contratação de consultoria técnica, tributária e contábil - Processo nº 05/2001

Insurgem-se, inicialmente, os recorrentes contra a multa de R$ 400,00 (quatrocentos reais), aplicada em face da não comprovação da singularidade do serviço e da notória especialização da contratada, na inexigibilidade de licitação para contratação de consultoria técnica, tributária e contábil (processo nº 05/2001).

Alegam que o contrato foi firmado ad exitum, ou seja, sob a condição de proporcionar benefício ao BADESC. Argúem que a proximidade da data para entrega de declaração dos tributos inviabilizou a realização de procedimento licitatório. Ressaltam que a contratação direta resultou numa economia de quase R$ 5.000.000,00 (cinco milhões de reais) ao BADESC. Argumentam, ademais, que a existência de vários profissionais no ramo não retira da contratada a característica da notória especialidade. Acrescentam que a singularidade do serviço não significa a exigência de inviabilidade de competição. Ressaltam, ademais, que a exigüidade de tempo foi uma das causas da inexigibilidade e que a medida foi tomada em consonância com o interesse público. Alegam, por fim, a inexistência de grave infração à norma legal e, ainda, que não houve dano ao erário, mas sim um lucro de quase 5 milhões de reais.

Requerem o cancelamento da sanção.

a) Da ilegalidade do contrato ad exitum

Em primeiro lugar, cumpre destacar que o contrato ad exitum (contrato de risco) - caracterizado pelo condicionamento da remuneração da contratada a um efetivo benefício à Administração-contratante - não é prática na Administração Pública, tanto que o art. 55 da Lei 8.666/93 estabelece como cláusula obrigatória dos contratos o preço e as condições de pagamento (inciso II do art. 55).

Por outro lado, o contrato de risco somente é admissível quando o Poder Público não precisar despender qualquer valor, dependendo a remuneração do contratado exclusivamente do êxito da empreitada.

In casu, não se pode afirmar que o contrato firmado entre o BADESC e a B & C Consultoria e Serviços Ltda. configura um contrato de risco. Diz o item III do instrumento contratual (fls. 133-135):

PAGAMENTO/HONORÁRIOS:

III - O CONTRATANTE pagará ao CONTRATADO, a título de honorários pelos serviços previstos nos itens I e II, quantia correspondente a 5% (cinco) do benefício econômico efetivamente auferido após a consecução do objeto contratual, valor este líquido e livre da incidência de quaisquer tributos (...)

Da leitura dessa cláusula, pode-se concluir que o contrato estabeleceu tão-somente o percentual de pagamento pelos serviços prestados; todavia, não previu a hipótese de não remuneração, em caso de inexistência de efetivo benefício econômico. O alegado risco do contrato não se referiu, portanto, à possibilidade de não pagamento, mas apenas ao quantum a ser pago.

Note-se, ainda, que, considerando que a atividade administrativa está condicionada à observância do princípio constitucional da legalidade (art. 37, caput) e que toda a disciplina acerca dos contratos está traçada na Constituição (art. 37, XXI) e na Lei de Licitações (arts. 54 a 80), não há como ser aceita a celebração de contrato de risco pela Administração Pública, uma vez que, em nenhum momento, tais diplomas autorizam a celebração desse tipo de contrato. Nesse sentido, é a decisão do e. Tribunal Pleno, exarada na sessão de 24.05.99:

Esse é o entendimento já assentado, em caso semelhante, pelo Parecer COG nº 407/02, lavrado por ocasião da Consulta nº 02/03429850, in verbis:

O ordenamento jurídico, portanto, não admite a possibilidade de contrato ad exitum. Contudo, ainda que admitida a natureza de risco do contrato firmado, tal fato não teria, por si só, o condão de afastar a necessidade da realização de licitação. É o que preleciona o mesmo parecer:

Portanto, não procede o argumento de que a inexigibilidade foi motivada pela natureza de risco do contrato.

b) Da não configuração da singularidade do objeto e da notória especialização da contratada

A inexigibilidade de licitação decorre da inviabilidade de competição, nos termos do art. 25 da Lei 8.666/93. Exige-se, para tal, a concorrência de três requisitos: serviço técnico especializado constante do rol do art. 13 da Lei 8.666/93; singularidade do objeto e notória especialização do contratado.

O serviço de consultoria técnica e a auditoria financeira e tributária - objeto do contrato em análise - consta do rol do art. 13 da Lei de Licitações, que relaciona os serviços técnicos profissionais especializados, suscetíveis de inexigibilidade:

Art. 13. Para os fins desta Lei, consideram-se serviços técnicos profissionais especializados os trabalhos relativos a:

III - assessorias ou consultorias técnicas e auditorias financeiras ou tributárias;

Entretanto, a legalidade da presente inexigibilidade de licitação encontra óbice nos conceitos de "singularidade do objeto" e de "notória especialização do contratado", descaracterizando a inviabilidade de competição. Diz o art. 25, II, da Lei de Licitações:

Art. 25. É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial:

II - para a contratação de serviços técnicos enumerados no art. 13 desta Lei, de natureza singular, com profissionais ou empresas de notória especialização, vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e divulgação;

O conceito de singularidade do serviço é bem desenvolvido pela doutrina e está intimamente relacionado com a exclusividade no seu fornecimento:

Certamente não se considera de natureza singular aquilo que pode ser executado por numerosos profissionais ou empresas. Caso o legislador não pretendesse conjugar a notória especialização do profissional ou empresa com a natureza inédita ou incomum do serviço a ser prestado, teria simplesmente omitido a expressão natureza singular no dispositivo mencionado. Pois singular, inédito, incomum são, na verdade, sinônimos (...). É inexigível a licitação, quando houver inviabilidade de competição1.

Há singularidade, portanto, quando um único profissional é habilitado a realizar os serviços contratados. Havendo pluralidade de particulares capazes de satisfazer o objeto do contrato, não há que se falar em singularidade do objeto do contrato.

Esse é o entendimento desta Consultoria Geral, esboçado no Parecer nº 53/05, por ocasião da Consulta nº 05/00170126:

A existência de outros profissionais aptos a desempenhar a mesma espécie de serviço descaracteriza a singularidade do objeto e a inviabilidade de competição, repelindo a possibilidade de contratação direta.

No presente caso, conforme já assentado no Relatório nº 310/02 (fl. 18), havia muitos profissionais habilitados a desempenhar o serviço de auditoria financeira e tributária. O fato é reconhecido pelos próprios recorrentes, que, em suas razões, afirmaram: "o fato de existir (sic) muitos profissionais aptos a realizarem (sic) determinados serviços, como os em questão, por si só, não teria o condão de lhe retirar a exigência de notória especialização e, muito menos, a sua característica singular (...)" (fl. 3). Limitaram-se apenas a exaltar o melhor preparo da contratada em relação aos seus concorrentes.

O requisito da notória especialização, por sua vez, está presente quando o trabalho do profissional for essencial e indiscutivelmente o mais adequado à plena satisfação do objeto do contrato, nos termos do § 1 º do art. 25 da Lei 8.666/93. In verbis:

Art. 25. § 1o. Considera-se de notória especialização o profissional ou empresa cujo conceito no campo de sua especialidade, decorrente de desempenho anterior, estudos, experiências, publicações, organização, aparelhamento, equipe técnica, ou de outros requisitos relacionados com suas atividades, permita inferir que o seu trabalho é essencial e indiscutivelmente o mais adequado à plena satisfação do objeto do contrato.

O contratado deve, portanto, reunir requisitos que ostentam a adjetivação de notória especialização, como decorrência de desempenho anterior demonstrado e conhecido, experiências relacionadas aos serviços técnicos pretendidos pela Administração, estudos e publicações realizadas, organização, aparelhamento e equipe técnica, pertinentes ao objeto a ser contratado, permitindo inferir que, em tese, seu trabalho atenderá de modo eficiente à plena satisfação do objeto do contrato.

In casu, a notória especialização baseou-se exclusivamente no curriculum vitae de um dos profissionais da Empresa B & C - Consultoria e Serviços, conforme informado à fl. 136. Note-se que tal documento sequer foi juntado aos autos pelos recorrentes. No mais, consta do instrumento contratual apenas uma cláusula genérica que obriga a contratada a garantir a atuação de "profissionais notoriamente especializados, dentre eles o Sr. José Aluízio de Andrade" (item VI, fl. 134).

Não se vislumbra nos autos, pois, prova cabal da notória especialização da contratada, capaz de diferenciá-la do restante da concorrência.

Destaca-se, nesse sentido, o Parecer COG nº 407/02, lavrado na Consulta nº 02/03429850:

Não há como se reputar regular a inexigibilidade de licitação decorrente do Processo nº 05/2001, porquanto não caracterizada a singularidade do objeto e a notória especialização da contratante.

Cumpre salientar, ademais, que o contrato de prestação de serviços de auditoria e consultoria financeira e tributária decorreu de uma proposta enviada pela Empresa B & C ao BADESC, em 08/01/2001, dando conta de seus serviços e da forma de pagamento. Não consta do documento nenhuma outra informação quanto a desempenho anterior, experiências correlatas, estudos, publicações, organização, aparelhamento, ou qualquer outro elemento que demonstre a essencialidade do serviço à plena satisfação do objeto do contrato. Além disso, o contrato foi firmado em 25/01/2001 - apenas 13 dias após a remessa da carta-proposta ao BADESC - sem comparativo com qualquer outra proposta.

c) Da inexistência de procedimento de justificativa da inexigibilidade

Vale dizer que lei, para a eficácia dos atos, exige procedimento de justificativa da inexigibilidade, impondo a indicação da razão da escolha do fornecedor ou executante.

Art. 26. As dispensas previstas nos §§ 2o e 4o do art. 17 e no inciso III e seguintes do art. 24, as situações de inexigibilidade referidas no art. 25, necessariamente justificadas, e o retardamento previsto no final do parágrafo único do art. 8o desta Lei deverão ser comunicados, dentro de 3 (três) dias, à autoridade superior, para ratificação e publicação na imprensa oficial, no prazo de 5 (cinco) dias, como condição para a eficácia dos atos. (Redação dada pela Lei n 11.107, de 2005)

Parágrafo único. O processo de dispensa, de inexigibilidade ou de retardamento, previsto neste artigo, será instruído, no que couber, com os seguintes elementos:

I - caracterização da situação emergencial ou calamitosa que justifique a dispensa, quando for o caso;

II - razão da escolha do fornecedor ou executante;

III - justificativa do preço.

IV - documento de aprovação dos projetos de pesquisa aos quais os bens serão alocados. (Incluído pela Lei n 9.648, de 1998)

Não há, nos autos, cópia de procedimento de justificativa da inexigibilidade.

d) Da alegada economicidade e do interesse público

Por fim, note-se que a alegada economia de quase 5 milhões de reais - decorrente da consultoria contratada - não exime o contratante da responsabilidade pelas irregularidades na inexigibilidade de licitação. A Lei 8.666/93 prevê, como exceção à regra geral da licitação, a dispensa e a inexigibilidade, mas estabelece, em contrapartida, os requisitos indispensáveis para tal, que não podem ser afastados sob o pretexto do interesse público. A realização de licitação poderia ter dado ensejo à escolha de melhor proposta, mais vantajosa e mais econômica para a Administração.

e) Da invocação da exigüidade de tempo

O argumento da proximidade da data estabelecida para a entrega das declarações de tributos também não justifica a contratação direta. A exigüidade de tempo foi causada pela própria Administração, tendo em vista que a fixação da data da entrega da declaração de tributos é feita pelo Fisco, com antecedência, apresentando pouca variação entre um ano e outro. Dessa forma, pode-se dizer que não houve fator surpresa que tenha ensejado a contratação inesperada e urgente dos serviços de auditoria.

Note-se, ainda, que a alegada exigüidade de tempo não se coaduna com o extenso prazo de validade estabelecido para o cumprimento do contrato. O item II do instrumento contratual estabelece a validade de 180 dias, "a contar da emissão de parecer prévio sobre a viabilidade de redução de pagamento do imposto e de planilha discriminando o benefício econômico da aplicação do parecer contábil-tributário" (fl. 134).

f) Da grave lesão e do dano ao erário

Argumentam os recorrentes, por fim, que a inexigibilidade da licitação para contratação de serviço de consultoria financeira e tributária não importou em grave lesão ou prejuízo ao erário, conforme exige o art. 70, III, da Lei Complementar Estadual nº 202/2000. Preceitua o dispositivo:

Art. 70. O Tribunal poderá aplicar multa de até cinco mil reais aos responsáveis por:

II - ato praticado com grave infração à norma legal ou regulamentar de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial. (grifou-se)

Ocorre que - não se pode olvidar - a contratação direta, promovida por meio do Processo nº 05/2001, não observou os requisitos exigidos pelo art. 25, II, da Lei 8.666/93, vale dizer, a singularidade do objeto e a notória especilização do contratado.

Havendo infração à norma legal, justificável é a aplicação de multa, nos limites estabelecidos pelo art. 109, II, do Regimento Interno deste Tribunal de Contas (Resolução nº TC 06/2001).

2) Da multa aplicada em face da não comprovação da singularidade do serviço e da notória especialização da contratada na inexigibilidade de licitação para contratação de informações comerciais - Processo nº 16/2001

No tocante ao Processo nº 16/2001, referente à contratação direta de serviços de informações comerciais da Empresa SCI/Equifax, os recorrentes requerem o cancelamento da multa, aplicada em face da não comprovação da singularidade do serviço e da notória especialização da contratada, na inexigibilidade de licitação para contratação de informações comerciais (Processo nº 16/2001).

Argúem que a singularidade do serviço e da notória especialização da contratada não significa a exigência de inexistência de concorrentes no mercado. Acrescentam que, no Brasil, há duas únicas empresas habilitadas à prestação de serviço de informações comerciais, o que, por si só, já seria capaz de demonstrar a singularidade do serviço. Por fim, defendem que a inexigibilidade de licitação foi revestida de economicidade para a Administração.

Conforme já salientado no item 1, a inexigibilidade de licitação decorre da inviabilidade de competição, nos termos do art. 25 da Lei 8.666/93, e exige a concorrência de três requisitos: serviço técnico especializado constante do rol do art. 13 da Lei 8.666/93; singularidade do objeto e notória especialização do contratado.

Considerando que a singularidade do serviço se caracteriza pela habilitação de um único profissional apto à sua realização, a existência de uma pluralidade afasta a inviabilidade de competição, e, por conseguinte, a possibilidade de contrtação direta.

No presente caso, conforme já assentado no Relatório nº 310/02 (fl. 19), não houve comprovação da singularidade do serviço. Note-se que os próprios recorrentes mencionam a existência de, pelo menos, outra empresa fornecedora do serviço, a Serasa. Ademais, mediante simples pesquisa em sites de busca da internet, é possível identificar outras empresas capazes de satisfazer o objeto do contrato.

Quanto à notória especialização, também não se vislumbra, nos autos, prova cabal da essencialidade do trabalho da empresa contratada à plena satisfação do objeto, nos termos do § 1 º do art. 25 da Lei 8.666/93.

Os documentos acostados às fls. 146-187 não atestam diferencial que notabilize os serviços da contratada em relação aos oferecidos pela concorrência.

Ademais, sendo a contratação direta uma exceção à regra da licitação, cabe aos responsáveis o ônus da prova da regularidade do procedimento de inexigibilidade, vale dizer, da notória especialização da contratada e da singularidade do objeto.

A falta de comprovação dos requisitos exigidos para a inexigibilidade de licitação dá causa à aplicação de multa, em face da irregularidade da contratação direta. Esse é o entendimento desta Consultoria Geral, conforme Parecer nº 118/2007, lavrado no REC 03/0812880:

Por fim, cumpre destacar que a alegada economicidade não exime os contratantes da responsabilidade pelas irregularidades verificadas na contratação direta. No ordenamento jurídico pátrio, a realização de licitação é a regra, e tem por objetivo observância do princípio constitucional da isonomia e a escolha da melhor proposta para a Administração. Não podem os recorrentes descumprir preceito legal imperativo, sob o pretexto do atendimento ao interesse público.

3) Do impedimento do Exmo. Conselheiro Relator

Compulsando os autos, observa-se que o Exmo. Conselheiro Relator destes autos funcionou como órgão do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina (fls. 227-228/234).

Tal situação revela hipótese de impedimento, conforme art. 134, II, do Código de Processo Civil:

Tal comando é aplicável aos membros dos Tribunais de Contas, por força do art. 73, § 3º e do art. 75, ambos da Constituição da República:

Art. 73. O Tribunal de Contas da União, integrado por nove Ministros, tem sede no Distrito Federal, quadro próprio de pessoal e jurisdição em todo o território nacional, exercendo, no que couber, as atribuições previstas no art. 96.

§ 3° Os Ministros do Tribunal de Contas da União terão as mesmas garantias, prerrogativas, impedimentos, vencimentos e vantagens dos Ministros do Superior Tribunal de Justiça, aplicando-se-lhes, quanto à aposentadoria e pensão, as normas constantes do art. 40. (grifou-se)

...

Art. 75. As normas estabelecidas nesta seção aplicam-se, no que couber, à organização, composição e fiscalização dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, bem como dos Tribunais e Conselhos de Contas dos Municípios.

Parágrafo único. As Constituições estaduais disporão sobre os Tribunais de Contas respectivos, que serão integrados por sete Conselheiros. (grifo nosso)

A norma constitucional é repetida, com adaptações, no artigo 61, § 4º, da Constituição Estadual de 1989:

Art. 61 - O Tribunal de Contas do Estado, integrado por sete Conselheiros, tem sede na cidade de Florianópolis, quadro próprio de pessoal e jurisdição em todo o território estadual, exercendo, no que couber, a competência prevista no art. 83.

...

§4º - Os Conselheiros do Tribunal de Contas terão as mesmas garantias, prerrogativas, impedimentos, vencimentos e vantagens dos Desembargadores do Tribunal de Justiça.

Considerando a equiparação constitucional dos Conselheiros dos Tribunais de Contas aos Ministros do Superior Tribunal de Justiça e aos Desembargadores de Tribunal de Justiça, são extensivos a eles os impedimentos previstos no art. 134, II, do CPC.

A inobservância de tal regra importa na decretação de nulidade do processo, a partir do cometimento do vício.

Nesse sentido, o Acórdão abaixo transcrito é elucidativo:

Do voto da Relatora Ministra Denise Arruda, extrai-se o seguinte:

Todavia, o aresto recorrido violou o contido no artigo 134, II, do Código de Processo Civil, o qual dispõe:

"Art. 134: É defeso ao juiz exercer as suas funções no processo contencioso ou voluntário:

I - (...).

II - em que interveio como mandatário da parte, oficiou como perito, funcionou como órgão do Ministério Público, ou prestou depoimento como testemunha;"

O referido dispositivo legal exige para a configuração do impedimento do magistrado, entre outras vedações, apenas o fato dele ter funcionado como órgão do Ministério Público no mesmo processo.

Aliás, o termo "funcionar" , na simples consulta ao "Dicionário Aurélio Eletrônico" remete à idéia de "exercer as funções; estar em exercício; trabalhar."

No presente caso, apesar das respeitáveis considerações postas em sentido contrário, não pode ser admitida a cisão absoluta das funções do Ministério Público entre "meramente administrativa e a efetiva atuação processual do órgão do Ministério Público, no primeiro caso, com feição burocrática e instrumental, e no segundo, com caráter nitidamente valorativo".

A participação de membro do Ministério Público Federal em sessão de julgamento de suspensão de liminar, ainda que ausente manifestação expressa do representante do parquet, inegavelmente configura o exercício da função de agente ministerial. O próprio artigo 20 da LC nº 75/93 prevê que "Os órgãos do Ministério Público da União terão presença e palavra asseguradas em todas as sessões dos colegiados que oficiem.".

Inclusive, tal questão foi apontada no voto-vista proferido pelo ilustre Desembargador Federal Edgar Lippmann Junior (fl.66):

"....a atuação como órgão do Ministério Público não pode ser medida, como mais ou menos efetiva, pela manifestação nos autos por meio da interposição de recurso, aviamento de parecer, solicitação de diligência burocrática, ou pela dita presença "cerimonial ou honorífica". Antes, a atuação do MPF é garantia constitucional de defesa da ordem jurídica, do regime democrático, dos interesses sociais, dos interesses individuais

indisponíveis, do respeito aos Poderes Públicos, ...E, exatamente nos seus princípios institucionais - unidade, indivisibilidade e independência

funcional -, reside a importância de o Ministério Público ter se feito presente àquele julgamento, na pessoa do Dr. Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, quando qualquer dos Ilustres órgãos do MPF poderiam tê-lo feito.

Com relação, especificamente, ao Magistrado oriundo do Ministério Público Federal, pode-se dizer que o art. 134 do CPC, refere-se, em seu inciso I, à participação Ministerial como parte principal (autor, réu, opoente, assistente, ...) e em seu inciso II, como fiscal da lei. E a atuação do Magistrado é vedada em qualquer das duas hipóteses de participação anterior na lide ou em seus incidentes."

Nesse sentido a lição de CELSO AGRÍCOLA BARBI

("Comentários ao Código de Processo Civil", Ed. Forense, 2002, pág. 414):

"O item II impede o juiz quando ele, no mesmo processo, interveio como mandatário da parte, oficiou como perito, funcionou como órgão do Ministério Público, ou prestou depoimento como testemunha.

A exclusão não abrange qualquer tipo de participação anterior no processo, mas apenas as relacionadas. No seu exame, verifica-se que os casos de atuação como mandatário da parte e como órgão do Ministério Público encontram assento no fato de aquelas atividades são encaminhadas no sentido de propugnar pela vitória de uma das partes. Assim, quem, como mandatário, ou como órgão do Ministério Público, lutou por determinada solução do litígio não deve ser admitido a vir decidi-lo."

Esta também é a orientação de ANTONIO DALL'AGNOL

("Comentários ao Código de Processo Civil", Ed. Revista dos Tribunais,

2000, pág. 157):

" Igualmente impedido está o juiz que tenha atuado no processo como procurador da parte, como perito, como órgão do Ministério Público ou

mesmo tenha prestado depoimento como testemunha.

Nestas hipóteses todas, teve ciência o juiz de circunstância da causa que lhe retira a condição de terceiro imparcial, porquanto desse se espera que tome conhecimento dos fatos - alegações e prova - 'no processo', e não antes; e na condição de quem ignora, e não na de quem sabe."

Esta Corte Superior já proclamou:

"PROCESSO CIVIL. REEXAME NECESSÁRIO. IMPEDIMENTO (ART. 134, II, DO CPC). PRELIMINAR ACOLHIDA.

1. O art. 134, II, do CPC veda o exercício da função judicante em processo contencioso ou voluntário, do qual tenha participado como procurador da parte, oficiou como perito, funcionou como representante do Ministério Público ou prestou depoimento como testemunha.

2. Preliminar de nulidade acolhida, para determinar que o Tribunal "a quo" proceda a novo julgamento sem a participação do julgador impedido.

3. Recurso conhecido e provido."

(RESP 175740/RR, 2ª Turma, Rel. Min. Francisco Peçanha Martins, DJ de 18.10.99, p.222) (grifou-se)

O Ministro Luiz Fux, em seu voto, proferido nos mesmos autos, é ainda mais contundente:

A Sra. Ministra Denise Arruda levantou muito bem a questão no sentido de que, muito embora o eminente Desembargador represente um dos ornamentos da nossa ciência jurídica, um homem culto, probo, honesto, competente, a grande realidade é que o impedimento é objetivo, e não subjetivo. Subjetiva é a suspeição, tanto que tem de ser argüida, sob pena de preclusão. O impedimento torna a decisão passível, inclusive, de ação rescisória, e a nulidade é absoluta. A lei refere que é defeso ao juiz, e, a fortiori , ao Ministério Público, funcionar no processo; no outro não há essa expressão "defeso", por isso é incapaz de funcionar. (grifou-se)

Em face do exposto, toda e qualquer manifestação de membro do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas é causa de impedimento para atuação como relator, quando alçado a Conselheiro, nos termos do art. 73, § 2º, I, da Constituição da República, c/c art. 61, § 2º, I, da Constituição do Estadual.

Assim sendo, com fundamento nos arts. 73, § 3º e 75, da Constituição da República; 61, §§ 3º e 4º, da Constituição Estadual, c/c o art. 134, II, do Código de Processo Civil, é o presente parecer pela remessa dos autos ao Conselheiro Relator, para apreciação da situação de impedimento.

CONCLUSÃO

Em face do exposto, propõe o presente parecer:

4.1 O conhecimento do presente Recurso de Reexame, nos termos do art. 80 da Lei Complementar Estadual nº 202/00, interposto contra o Acórdão nº 1.297/2003 (fls. 233-234), proferido nos autos do Auditoria in loco de Licitações, Contratos, Convênios e Atos Jurídicos Análogos nº 02/09877731, exclusivamente quanto ao recorrente Arno Garbe, tendo em vista a ilegitimidade e a ausência de interesse processual do recorrente BADESC (arts. 112 e 133, § 1º, da Resolução TC-6/2001).

4.2 No mérito, a negativa de provimento, mantendo a decisão objurgada.

4.3 A remessa dos presentes autos ao Exmo. Sr. Relator Conselheiro, para apreciação da situação de impedimento, mediante despacho singular, em face de atuação anterior na qualidade de membro do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, nos termos dos arts. 73, § 3º e 75, da Constituição da República, do art. 61, §§ 3º e 4º, da Constituição Estadual, c/c o art. 134, II, do Código de Processo Civil.

4.4 A ciência do decisum, parecer e voto ao Sr. Arno Garbe, ex-Diretor-Presidente da Instituição, e ao BADESC, Agência Catarinense de Fomento S/A.

4.5 A remessa ao Ministério Público Estadual das cópias e dos documentos necessários ao oferecimento de eventual denúncia (art. 102 da Lei 8.666/93), em face da configuração, em tese, do crime previsto no art. 89 da Lei 8.666/93 (inexigência de licitação fora das hipóteses legais).

À consideração de Vossa Excelência.

  MARCELO BROGNOLI DA COSTA

Consultor Geral


1 SANT'ANNA, Reynaldo. Aspectos do Direito Público no Tribunal de Contas. Rio de Janeiro: Tribunal de Contas do Rio de Janeiro, 1992 apud PEREIRA JÚNIOR, Jessé Torres. Comentários à lei das licitações e contratações da administração pública. 5 ed. rev. atual. ampl. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. p. 300-301