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Processo n°: | CON - 07/00112812 |
Origem: | Assembléia Legislativa do Estado de Santa Catarina |
Interessado: | Herneus De Nadal |
Assunto: | Consulta |
Parecer n° | COG-259/07 |
EMENTA. Consulta. Assembléia Legislativa do Estado de Santa Catarina. Doação de recursos por uma empresa privada para obras de infra-estrutura de escola da rede pública estadual através do Fundo da Infância e da Adolescência.
O artigo 260 da Lei Federal nº 8069/90, designa os Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente como órgãos deliberativos e controladores das ações para a atenção à infância e juventude, cabendo aos mesmos a captação e a aplicação dos recursos do Fundo - FIA, que devem ser destinados à execução da política de proteção especial à criança e ao adolescente.
É impraticável a doação de recursos financeiros para obras de melhoria da infra-estrutura de uma entidade de ensino da rede pública estadual através do Fundo da Infância e Adolescência do município-sede, podendo, outrossim, ser concretizada a obra, pelo particular, diretamente no educandário necessitado.
Senhor Consultor,
Por meio do presente expediente, o Exmo. Sr. Deputado Estadual, Herneus de Nadal, remete consulta a este Tribunal de Contas, requerendo opinativo acerca da possibilidade do Fundo da Infância e Adolescência de um município gerenciar recursos que, hipoteticamente, seriam originários de uma empresa privada para obras de melhoria da infra-estrutura de uma escola da rede pública estadual.
Este, o breve relatório.
A matéria consultada encontra guarida no inciso XII, do art. 59, da Constituição do Estado de Santa Catarina, bem como no inciso XV, do art. 1º da Lei Complementar nº 202/2000, posto que se trata de situação em tese e de interpretação de lei, sobre matéria de competência desta Casa.
Considerando que o expediente vem subscrito pelo Sr. Deputado Estadual, Herneus de Nadal, tem-se como preenchido o requisito de legitimidade, conforme o disposto nos artigos 103, I e 104, III, da Resolução nº TC-06/2001, desta Corte de Contas.
Observa-se ainda, que a consulta não veio instruída com parecer da assessoria jurídica da Assembléia Legislativa do Estado de Santa Catarina, conforme preceitua o art. 104, V, da Resolução nº TC-06/2001 (Regimento Interno do TCE/SC), contudo, o Tribunal Pleno poderá conhecer de consulta que não atenda a esta formalidade, conforme autoriza o parágrafo 2º, do artigo 105, Regimental, cabendo esse discernimento ao relator e aos demais julgadores.
A questão trazida pelo ilustre Deputado Herneus de Natal diz respeito à possibilidade de uma empresa privada efetuar doação de recursos financeiros objetivando a melhoria da infra-estrutura de uma entidade de ensino da rede pública estadual, sendo que tal numerário seria primeiramente repassado ao Fundo da Infância e Adolescência de uma municipalidade, que, então, faria a destinação ao educandário.
Importante ressaltar que numa visão ampla, o Estado subsiste a partir do momento em que o povo, consciente de sua nacionalidade, se organiza politicamente, firmando, a partir disso, princípios de conduta e boa convivência mediante um sistema jurídico estatal, consubstanciado por um agrupamento de normas e condições existenciais da coletividade. Tal conjunto de direitos e obrigações que almeja organizar a sociedade de forma harmônica está inserido no texto constitucional. Na Carta Federal estão também estabelecidos os objetivos essenciais do Estado para satisfazer as necessidades básicas da população, delegadas a uma administração através de um sistema político onde seus agentes são eleitos pela coletividade.
A existência do Estado é explicada pelas finalidades que tem de preencher para atingir seus objetivos superiores, ou seja, organizar e tornar possível a convivência da sociedade civil como um todo, dando proteção à vida e seus complementos inerentes, tais como a liberdade, a propriedade, a saúde, a educação, a moradia e a segurança.
O jurista e professor Carlos Vasconcelos Domingues, em estudo denominado "Políticas Públicas e Convênios Administrativos", didaticamente expõe:
"Contemporaneamente para o Estado cumprir suas finalidades fundamentais, desempenha as seguintes funções:
a. de instituir uma ordem jurídica (função normativa, ordenadora ou legislativa);
b. de cumprir e fazer cumprir as normas próprias dessa ordem, resolvendo os conflitos de interesse (função disciplinadora ou jurisdicional);
c. de cumprir essa ordem, administrando os interesses coletivos, gerindo os bens públicos e atendendo às necessidades gerais (função executiva ou administrativa).
Essa ótica tridimensional do Estado representa uma visão limitada à necessidade de organização harmônica dos Poderes, todavia, as funções estatais devem se ampliar para além de sua estrutura administrativa, atingindo e estimulando a participação da sociedade organizada, representada por grupos institucionalizados que se colocam ao lado da máquina estatal, constituindo ramificações de sua estrutura operacional.
A ampliação da estrutura do Estado para a consecução de sua função encontra guarida na parceria com entes sociais e particulares, representando, assim, um novo conceito das relações entre o aparelho estatal e a sociedade, repercutindo, por via de conseqüência numa nova forma de atuação do Estado moderno.
Nesta linha de raciocínio infere-se que o Estado organizado necessita obter meios finalísticos junto à própria sociedade para tornar realidade as aspirações sociais.
Para suprir tal desiderato, precisa executar uma série de funções e implementar atividades básicas de natureza econômica, política, administrativa e financeira. É a partir desse contexto que o Estado estabelece suas políticas públicas, buscando gerir de forma eficiente e eficaz os interesses da comunidade.
Através da instituição de políticas públicas é que o Estado visa acelerar o crescimento econômico e melhor distribuir seus benefícios a todos os segmentos da coletividade.
Feitas tais considerações acerca dos objetivos do Estado, bem como da participação da sociedade como um todo, há que se referir que a hipótese aventada pelo nobre Consulente reside numa situação em que uma empresa privada deseja efetuar uma doação de recursos financeiros destinados à melhoria da infra-estrutura de uma entidade da rede de ensino pública da esfera estadual. A dúvida reside se a referida doação pode ser feita ao Fundo da Infância e Adolescência do município sede do estabelecimento de ensino para posterior repasse ao educandário.
Louvável a iniciativa empresarial, contudo, na legislação que rege a matéria extrai-se que os Fundos para a Infância e Adolescência são recursos públicos oriundos de receitas do Estado, de doações voluntárias e de parte do Imposto de Renda da pessoas físicas (6% do imposto devido) e jurídicas (1% do imposto devido).
A destinação é deduzida do imposto de renda devido apurado na declaração de ajuste anual, respeitados os limites legais. O valor destinado é considerado como um adiantamento do imposto. O contribuinte apenas direciona parte do imposto devido à criança e ao adolescente, pois o pagamento é feito pelo governo.
O Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA, Lei Federal nº 8069/90, trouxe uma série de inovações, entre elas a criação dos Conselhos Municipais, Estaduais e do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente. Em seu art. 88, II, o diploma legal designa os Conselhos de Direitos como órgãos deliberativos e controladores das ações para a atenção à infância e juventude, cabendo aos mesmos a captação e a aplicação dos recursos do Fundo - FIA, que se destinados à execução da política de proteção especial à criança e ao adolescente, através de financiamentos de projetos que poderão ser implementados mediante programas de entidades governamentais e não governamentais, desde que previamente aprovado pela plenária do Conselho, conforme dispõe o art. 260.
Isto posto e respondendo objetivamente à consulta proposta, não vislumbramos a possibilidade de uma empresa privada efetuar uma doação de recursos financeiros para obras de melhoria da infra-estrutura de uma entidade de ensino da rede pública estadual através do Fundo da Infância e Adolescência do município sede, podendo, outrossim, ser concretizada obra, pelo particular, diretamente no educandário necessitado.
Em consonância com o acima exposto e considerando:
1. Que o consulente está legitimado à subscrição de consultas para este Tribunal de Contas, nos termos do inciso I, do artigo 103 do Regimento Interno desta Corte de Contas;
2. Que a consulta trata de situação em tese e de interpretação de lei, conforme determina o inciso XII, do art. 59, da Constituição do Estado de Santa Catarina, bem como o inciso XV, do art. 1º, da Lei Complementar Estadual nº 202/2000.
3. Que apesar de não vir instruída com parecer da assessoria jurídica da edilidade consulente, conforme preceitua o art. 104, inciso V, da Resolução nº TC-06/2001 (Regimento Interno do TCE/SC), o Tribunal Pleno poderá conhecer de consulta que não atenda a esta formalidade, conforme autoriza o § 2º, do artigo 105 do referido Regimento, desde que assim entendam o Relator e os demais julgadores.
Sugere-se ao Exmo. Sr. Conselheiro Relator Wilson Rogério Wan-Dall que submeta voto ao e. Pretório sobre consulta formulada pelo Deputado Estadual, Sr. Herneus de Nadal, nos termos deste opinativo que, em síntese propõe:
1. Conhecer da consulta por preencher os requisitos de admissibilidade previstos regimentalmente.
2. Responder a consulta nos termos deste arrazoado, que, em síntese, propõe:
2.1. O artigo 260 da Lei Federal nº 8069/90, designa os Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente como órgãos deliberativos e controladores das ações para a atenção à infância e juventude, cabendo aos mesmos a captação e a aplicação dos recursos do Fundo - FIA, que devem ser destinados à execução da política de proteção especial à criança e ao adolescente.
2.2. É impraticável a doação de recursos financeiros para obras de melhoria da infra-estrutura de uma entidade de ensino da rede pública estadual através do Fundo da Infância e Adolescência do município-sede, podendo, outrossim, ser concretizada a obra, pelo particular, diretamente no educandário necessitado.
MARCELO BROGNOLI DA COSTA Consultor Geral |