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Processo n°: | REC - 03/00724179 |
Origem: | Secretaria de Estado da Educação e do Desporto |
Responsável: | Miriam Schlickmann |
Assunto: | Recurso (Recurso de Reconsideração - art. 77 da LC 202/2000) -ALC-01/01597037 |
Parecer n° | COG-285/07 |
Recurso de Reconsideração. Modalidade inadequada. Aplicação do princípio da fungibilidade recursal. Conhecer como Reexame. Auditoria in loco sobre licitações, contratos, convênios e atos jurídicos análogos. Imputações de multas. Argüição de Preliminar de Ilegitimidade Passiva rejeitada. Ausência de defesa quanto ao mérito. Negar Provimento.
Competência Administrativa. Delegação. Formalização documental.
A alegação de ilegitimidade passiva em virtude de delegação de competência depende de prova documental para ser acolhida. O ato de delegação tem forma escrita, na qual ficará consignado em que limites os atos e/ou medidas serão repassados e por quanto tempo perdurará o seu exercício. Além disso deverá ser publicado no diário oficial, a fim de que todos saibam por quem será exercida a prerrogativa.
Senhor Consultor,
Tratam os autos de Recurso de Reconsideração, interposto pela Sra. Miriam Schlickmann - ex-Secretária de Estado da Educação e do Desporto - SED, em face do Acórdão nº 0853/2002, proferido no Processo nº ALC-01/01597037.
O citado Processo nº ALC-01/01597037 é relativo à auditoria in loco sobre licitações, contratos, convênios e atos jurídicos análogos da SED, referentes ao período de julho a dezembro de 2000, empreendida por esta Corte de Contas através de sua Diretoria de Controle da Administração Estadual - DCE.
Levada a efeito a mencionada análise, a DCE procedeu à elaboração do Relatório nº 224/2001 (fls. 20 a 53), no qual sugeriu a audiência da Sra. Miriam Schlickmann para apresentar defesa acerca das irregularidades evidenciadas.
A ex-Secretária de Estado compareceu aos autos, apresentando as justificativas e documentos que entendeu necessários (fls. 139 a 490).
Em seqüência, seguiram os autos para reanálise da DCE que, em seu Relatório nº 072/2002 (fls. 492 a 542), concluiu por aplicar multas à Recorrente. Tal posicionamento foi acatado, na íntegra pelo Ministério Público (fls. 576/577) e parcialmente pela Relatora do feito (fls. 578 a 605).
Na Sessão Ordinária de 14/10/2002, o Processo n. ALC-01/01597037 foi levado à apreciação do Tribunal Pleno, sendo prolatado o Acórdão n. 0853/2002, portador da seguinte dicção (fls. 606 a 609):
"(...) ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro nos arts. 59 da Constituição Estadual e 1° e 25 da Lei Complementar n. 202/2000, em:
6.1. Conhecer do Relatório da Auditoria realizada na Secretaria de Estado da Educação e do Desporto, com abrangência sobre licitações, contratos, convênios e atos jurídicos análogos, referente ao período de julho a dezembro de 2000, para considerar, com fundamento no art. 36, §2º, alínea "a", da Lei Complementar n. 202/2000:
6.1.1. regulares os seguintes atos:
(...)
6.1.2. irregulares a Tomada de Preços n. 066/00 e conseqüente Contrato 002/01, firmado com Transportadora Supersul Ltda.
6.2. Aplicar à Sra. Miriam Schlickmann - Secretária de Estado da Educação e do Desporto, com fundamento nos arts. 70, inc. II, da Lei Complementar n. 202/00 e 109, inc. II, c/c o 307, inc. V, do Regimento Interno instituído pela Resolução n. TC-06/2001, as multas abaixo discriminadas, com base nos limites previstos no art. 239, inc. III, do Regimento Interno (Resolução n. TC-11/1991) vigente à época da ocorrência das irregularidades, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial do Estado, para comprovar ao Tribunal o recolhimento ao Tesouro do Estado das multas cominadas, ou interpor recurso na forma da lei, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts. 43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000:
6.2.1. R$ 100,00 (cem reais), por não ter estimado a quantidade do objeto da licitação, proporcionando à empresa que já prestava o serviço vantagem sobre as demais, infringindo os arts. 40, inc. I e §2º, inc. IV e 3º, §1º, inc. I, da Lei Federal n. 8.666/93;
6.2.2. R$ 100,00 (cem reais), em face da cobrança, das empresas interessadas na licitação, de importância a título de indenização do edital que, de forma alguma, limita-se ao custo efetivo da reprodução gráfica do mesmo, contrariando o disposto no art. 32, §5º, da Lei Federal n. 8.666/93;
6.2.3. R$ 100,00 (cem reais), pela exigência de certificados de propriedade de equipamentos para a execução do objeto da licitação, contrariando o disposto no art. 30, §6º, da Lei Federal n. 8.666/93.
6.3. Recomendar à Secretaria de Estado da Educação e do Desporto que, doravante:
(...)
6.4. Dar ciência deste Acórdão, bem como do Relatório e Voto que o fundamentam, à Sra. Miriam Schlickmann - Secretária de Estado da Educação e do Desporto."
Visando à modificação do Acórdão supratranscrito, a Sra. Miriam Schlickmann interpôs o presente Recurso de Reconsideração.
É o breve Relatório.
II. ADMISSIBILIDADE
Com efeito, apesar da peça recursal ser nomeada "Recurso de Reconsideração" e da autuação dada por este Tribunal manter os mesmos termos, a modalidade adequada é o Recurso de Reexame, previsto no art. 80, da Lei Complementar nº 202/00, e que tem por fim atacar decisão proferida em processos de fiscalização de ato e contrato e de atos sujeitos a registro.
In casu, como o processo original tratou de auditoria in loco de licitações, contratos, convênios e atos jurídicos análogos da SED e, ainda, pela aplicação do princípio da fungibilidade, receberemos a peça recursal como Recurso de Reexame e, nestes termos, passaremos a analisá-la.
Quanto à legitimidade recursal, por ter sido a Recorrente apenada com as multas impostas nos itens 6.2.1 a 6.2.3 da decisão atacada, sua atuação faz-se adequada.
No que concerne à tempestividade, estabelece o artigo supracitado o prazo de 30 (trinta) dias, contados a partir da publicação da decisão no Diário Oficial do Estado. Assim, considerando que o Acórdão guerreado foi publicado no dia 07 de fevereiro de 2003 e a presente irresignação protocolada neste Tribunal no dia 10 de março do mesmo ano, tem-se como tempestiva a peça.
Destarte, restaram devidamente preenchidas as condições legais de admissibilidade do Reexame em análise.
III. DISCUSSÃO
A Recorrente alega, em síntese, o seguinte:
"(...) É importante ressaltar que todas as fases referentes às licitações e contratos bem como os demais procedimentos análogos, os mesmos eram elaborados, acompanhados e aferidos por servidores da Secretaria de Estado da Educação e do Desporto, legalmente investidos em funções específicas para desmpenharem os procedimentos inerentes às licitações, no caso específico, a Tomada de Preços nº 066/00 (PL-284/00), de 13/11/00 e o respectivo Contrato nº 002/01.
Para corroborar a acertiva, a Recorrente junta fotocópia do Formulário Avaliativo do Edital e Contrato de Licitação (doc. 01), em que os setores Requisitante e Jurídico atestam a regularidade do procedimento.
Ressalte-se, também, que dada a magnitude dos problemas afetos a SED, impossibilitavam a titular da Pasta ater-se aos mínimos detalhes exigidos pela legislação, haja vista que os assuntos administrativos pedagógicos tomavam-lhe, praticamente, todo tempo disponível para dar suporte ao oferecimento obrigatório das condições educacionais mínimas exigidas na Carta Magna Federal, Constituição Estadual e as diretrizes básicas da educação, prescritas na Lei nº 9.394/96.
A Recorrente aceitou o procedimento, que está sendo considerado irregular, porque louvou-se em informações de funcionários instruídos, que se acreditavam hábeis para conduzir com crédito e competência as suas funções, gozando, assim, os seus atos, de presunção de legitimidade.
(...)
Registre-se, também, que não foram evidenciados, em momento algum, no Relatório de Reinstrução em comento, dano aos cofres públicos ou má fé da Recorrente, em todo o procedimento realizado pela SED concernente a Tomada de Preços nº 066/00.
Como não há menção nos autos, que a Recorrente, com o procedimento adotado, tivesse o ânimo de agir, omitir-se ou lesar o erário, nem induzir alguém ao erro, mediante a utilização do engodo ou da esperteza com finalidade de tirar proveito em causa própria, conclui-se que os atos contestados foram praticados de boa fé, estando convicta que não cometeu nenhum ato ilícito. (...)"
Note-se que a Recorrente limita-se somente a afirmar que não seria a real responsável pelas irregularidades, tendo em vista a distribuição de funções/competências dentro da Secretaria de Estado da Educação.
Entretanto, a alegação de "ilegitimidade passiva" necessita de prova documental, qual seja, o ato formal de delegação de competência pois, caso contrário, figura como responsável, perante esta Corte de Contas, a Secretária de Estado à época que, in casu, era a ora Recorrente. É o que dispõe o art. 6º da Lei Complementar Estadual nº 202/00 (Lei Orgânica do TCE/SC):
Art. 6º - A jurisdição do Tribunal abrange:
I - qualquer pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que utilize, arrecade, guarde, gerencie, ou administre dinheiros, bens e valores públicos, ou pelos quais o Estado ou o Município respondam, ou que em nome destes, assuma obrigações de natureza pecuniária;
Oportuno, então, tecermos alguns comentários acerca do instituto da delegação e, para tanto, utilizaremo-nos do estudo realizado no Parecer COG-361/05 (exarado nos autos do Processo nº REC-03/03200626), abaixo transcrito:
"(...) A delegação é o instituto por meio do qual o titular de uma competência legal ou constitucionalmente atribuída - delegante - transfere a outrem - delegado - o seu exercício. Tal deslocação, na lição de Regis Fernandes de Oliveira, pode-se dar de duas formas:
a) por previsão legal - caso em que estar-se-á diante de uma transferência, em caráter permanente, da competência para a prática reiterada de atos, dotada de generalidade e abstração.
b) por ato individual ou concreto - em que a delegação alcança apenas uma ação, esgotando-se na simples deliberação dirigida a alguém.
Há que se identificar, também, a delegação com ou sem reserva de poderes, a depender se o delegante, concorrentemente com o delegado, pode ou não praticar o ato/medida objeto da delegação.
É importante frisar que a delegação somente pode ocorrer caso haja permissivo legal ou constitucional, ou seja, há necessidade de autorização normativa, pois existem determinadas atribuições cujo exercício não pode ser repassado; são prerrogativas privativas/inerentes ao órgão ou agente consideradas indelegáveis.
Regra geral, a delegação ocorre de escalões superiores para inferiores da estrutura da Administração Pública, almejando conferir maior agilidade e rapidez na tomada de decisões, assim como liberar a autoridade ou órgão superior da execução de tarefas rotineiras e repetitivas. Mas isso não exclui sua existência entre órgãos/agentes distintos ou pessoas estranhas à Administração. Oportuna é a lição de Odete Medauar sobre este aspecto:
"[...] O termo delegação nem sempre é utilizado, no ordenamento pátrio, com o sentido acima exposto, em que a transferência de atribuições ocorre de superior hierárquico para escalões inferiores, na mesma estrutura. Menciona-se o termo para a transferência de competências a entidades da Administração Indireta, efetuada mediante a lei que as instituiu. Também para a transferência da execução de serviços públicos objeto de concessão, permissão e autorização. E, ainda, quando se criam ordens profissionais (OAB, CREA, CRM etc.) e se atribuem a estas as atividades relativas à fiscalização do exercício profissional em suas respectivas áreas. O Dec-lei 200/67 refere-se a execução de programas federais delegada, mediante convênio, a órgãos estaduais e municipais (art. 10, §5º)."1
Anteriormente, ao responder Consulta formulada pela CASAN (autos nº CON-04/00311879) sobre o tema da delegação de funções, a COG exarou o seguinte entendimento (Parecer COG nº 052/04):
Diante dos comentários supratranscritos, não merece prosperar a alegação de ilegitimidade passiva.
Por fim, tendo em vista que a Recorrente deixa de se manifestar acerca do mérito de cada uma das penalidades, sugerimos a manutenção integral do decisum recorrido.
2. Dar ciência à Secretaria de Estado da Educação, Ciência e Tecnologia e à Sra. Miriam Schlickmann - ex-Secretária de Estado.
Consultor Geral
O ato de delegação tem forma escrita, na qual ficará consignado em que limites os atos e/ou medidas serão repassados e por quanto tempo perdurará o seu exercício. Além disso deverá ser publicado no diário oficial, a fim de que todos saibam por quem será exercida a prerrogativa, que por elas ficará responsável. Quanto a este aspecto, é importante frisar que a regra é excluir de responsabilidades o delegante, posto que não será ele, pessoalmente, quem irá dar efetividade aos atos. Excepcionalmente, quando ficar caracterizada a sua participação ou tendo conhecimento de ilegalidades provenientes da delegação, não adotar providências no sentido de sanar as incongruências ou representar contra o delegante, é que se cogitará de sua culpabilidade.
Cumpre destacar, novamente, lições de Regis Fernandes de Oliveira acerca da responsabilidade das duas figuras centrais do instituto, delegante X delegado:
"A responsabilidade implica na imputação jurídica a quem deva suportar a conseqüência de uma ação antijurídica. Imputável é quem pratica o ato. Responsável, quem pode suportar suas conseqüências.
Como ensina Caio Tácito, 'a responsabilidade administrativa, civil ou penal pelos atos praticados em regime de delegação de competência, pertence ao autor, ou seja, à autoridade delegada. O delegante somente dela participará se, por qualquer forma, concorrer diretamente, para a realização ou a confirmação do ato".
No mesmo sentido é a posição de Gordilho, ao afirmar que 'o delegado é inteiramente responsável pelo modo com que exerce a faculdade delegada' (tradução nossa).
É este, também, o entendimento de Clenício da Silva Duarte. Odete Medauar afirma que, transferida a competência para a prática do ato, nenhuma reserva cabe mais à autoridade delegante, ficando o delegado responsável pelo exercício ou prática das atividades delegadas, pois seria absurdo que o delegante transferisse atribuições e continuasse responsável por atos que não praticou.
A matéria foi excelentemente analisada em acórdão do Supremo Tribunal Federal, no qual se decidiu que 'é da responsabilidade do Ministro de Estado o ato por ele praticado por delegação do Presidente da República, na forma da lei'. Como razões de decidir, o Ministro Themístocles Cavalcanti afirmou que, 'transferida a competência, nenhuma reserva é feita à autoridade delegante, ficando o delegado responsável pela solução administrativa, e aplicação da lei'.
Em seguida, afirma o Ministro que 'na delegação de funções é diferente, porque os fundamentos do ato, as razões de decidir pertencem à autoridade delegada'.
A irresponsabilidade do delegante decorre do fato de que, ao delegar, nos estritos termos do previsto na lei permissiva, por pressuposto fê-lo em agente ou órgão que estava credenciado pela própria lei. A fidúcia é pressuposta. O agente titular de um cargo ou função pública está devidamente qualificado para o exercício das funções próprias e as que lhe forem delegadas. No caso do Presidente da República, maior razão a se afirmar sua irresponsabilidade. É que o parágrafo único do art. 84, de forma expressa, indicou a quais autoridades se pode delegar. Ainda que o Presidente tenha confiança em outro ocupante de cargo público, não poderia a ele delegar, se não figura no rol dos taxativamente indicados. Ora, se não há relação de confiança, provindo da lei o número das autoridades aquém se pode delegar, nenhum sentido tem que, ainda assim, fique responsável por atos de terceiros. Diga-se o mesmo, das demais autoridades. Imaginemos o ordenador de despesa a quem se delegou a prática de algum ato. Se ultrapassou os limites das atribuições transferidas, responde, pessoalmente, pelo excesso que cometeu ou pelo dolo ou culpa com que praticou o ato.
Caberia, agora, indagar se é possível a aplicação de responsabilidade solidária do delegante por culpa in elegendo ou in vigilando. Augustin Gordillo admite-a.
Não se pode concordar com a posição do ilustre jurista argentino. Todos os agentes públicos, em princípio, estão aptos a exercer as funções a ele cometidas. Inclusive, a própria Administração Pública, por força da desconcentração, fixa as competências próprias de cada órgão. Nela investe, segundo se supõe, os agentes mais aptos. Se existe a previsão legal da possibilidade da delegação e é ela transferida a um órgão que é ocupado por determinado agente irresponsável, a este será imputado eventual excesso ou responsabilidade e pelo descumprimento, alteração ou indevido cumprimento da matéria delegada. É que, na medida em que a Constituição estabeleceu as autoridades a quem se pode delegar, pressuposto é que estejam aptas ao exercício de atribuições transferidas. Quem ocupa alto posto da República é responsável pelos atos que pratica, delegados ou não.
Caso o delegante não tenha a competência ou tendo-a, não está por lei, autorizado a delegá-la, e ainda assim o faz, evidente que o cometeu ele uma infração administrativa e por ela responde. Eventualmente poder-se-á admitir a responsabilidade solidária, caso o delegado tenha ciência do comportamento da autoridade e não represente contra ela, praticando os atos que sabe indevidos, por lhe falecer competência, em face da incompetência do delegante
O comportamento é contrário ao direito e pode ensejar aplicação de sanção."
A Consultoria Geral deste Tribunal de Contas, no Processo nº CON-04/00311879, da Companhia Catarinense de Águas e Saneamento, por meio do Parecer nº COG-052/04, também entendeu aplicável a culpa in elegendo para caracterização da responsabilidade do delegante perante o Tribunal de Contas:
"EMENTA. Consulta. Constitucional. Administrativo. Ordenador Primário. Delegação de Responsabilidades. Responsabilidade Solidária.
Na fixação de responsabilidade de quem seja ordenador de despesa nas diversas entidades do Poder Público Estadual e Municipal, deverá esta Corte, diante do ato de delegação de competência, proceder ao exame minucioso do referido ato, conforme disposições da Lei Complementar nº 202/00 (Lei Orgânica do Tribunal de Contas).
Do mencionado exame deverá constar a apreciação preliminar da competência para delegar, a qual se restringe, no âmbito da administração indireta estadual, pelas leis que autorizaram sua constituição e pelos respectivos estatutos ou contratos sociais, nos termos do inciso III, do §3º do art. 58 da Lei Complementar nº 243, de 30 de janeiro de 2003, que estabeleceu a nova estrutura administrativa do Estado de Santa Catarina.
[...]
A função administrativa é, por si, matéria de natureza delegável pelo que, em princípio, não se vislumbra impossibilidade jurídica a que o ordenador de despesa originário delegue atribuições inerentes à administração financeira, contábil, operacional e patrimonial da entidade pela qual responda ou órgão a ela subordinado.
[...]
No que concerne à responsabilidade administrativa, o ordenador de despesa original, assim definido em lei, responde pelos atos e fatos praticados na sua gestão.
Em caso de existência de ato de delegação regular, serão partes nos processos de prestação e de tomada de contas, de auditoria e outros de competência desta Corte, somente os ordenadores de despesa delegados.
Serão solidariamente responsáveis, e com isso também partes jurisdicionadas nos mesmos expedientes, os agentes delegantes, nos casos de delegação com reserva de poderes ou de comprovada participação na realização de atos dos quais provenham conseqüências antijurídicas ou mesmo em razão de culpa pela má escolha da autoridade delegada."
O Tribunal de Contas da União, no Processo n. TC-005.147/95-6, assim posicionou-se:
"Auditoria. IBAMA. Licitação. Contrato. Pedido de reexame de decisão que aplicou multa aos responsáveis em decorrência da prática de atos de gestão antieconômicos, consistentes no superdimensionamento da capacidade contratada de equipamentos reprográficos. Comprovação de inexistência de responsabilidade por parte de alguns dos responsáveis. Não comprovação pelos demais. Conhecimento. Provimento. Juntada às contas.
[...]
4.3.2.4.5. A respeito da distribuição da responsabilidade entre delegante e delegado, cabe ter presente excertos do Voto do Exmo. Ministro aposentado do STF - Dr. Themístocles Cavalcante Relator do Mandado de Segurança nº 18.555-DF, do qual resultou a Súmula nº 510 daquele Tribunal (2) ("In: Referências da Súmula do STF; Noronha, Jardel e Martins, Odaléia; Vol. 27, pp. 166/171), a seguir transcritos:
No exercício da função da delegada, quem exerce o faz em nome próprio ou em nome da autoridade que delega.
No ato da delegação, o poder delegante transfere também para o seu delegado a jurisdição própria para conhecer do seu ato ou a conserva.
Em outras palavras: o ato é de quem pratica ou continua vinculado à autoridade que delega.
(omissis)
Transferida a competência, nenhuma reserva é feita à autoridade delegante, ficando o delegado responsável pela solução administrativa e aplicação da lei.
Nem teria sentido transferir a função e reserva-se a responsabilidade pelo ato.
(omissis)
Na delegação de funções [...]os fundamentos do ato, as razões de decidir pertencem à autoridade delegada.
4.3.2.6. Na linha do acima mencionado Voto, tem-se as seguintes posições doutrinárias:
A delegação de competência para a prática de atos administrativos de qualquer natureza exclui, da autoridade delegante, a autoria da prática de tais atos. ("In: Delegação de Competência; Ferreira, Firmino; Revista de Direito Administrativo nº 91, pp. 420/423; parecer do SubProcurador-Geral da República emitido no Mandado de Segurança nº 54.504 impetrado ao Tribunal Federal).
Na relação entre um e outro, o ato do delegado é da responsabilidade pessoal deste, e não do delegante, salvo na delegação de assinatura, como adiante se verá ("In: Da Delegação Administrativa; Podné, Lafayette; revista de Direito Administrativo nº 140, pp. 1/15 - grifo no original)
4.3.2.7. Finalmente, faz-se referência ao Parecer do Ilustre ex-Procurador Geral desta Casa - Dr. Franscisco de Salles Mourão Branco exarado no TC nº 015.989/87-9 (consulta sobre procedimentos adotados ante delegação de competência) cujo segmento abaixo reproduz-se ("in verbis"):
15. Por oportuno ressaltar o princípio consagrado na Sessão de 15.12.81 (cf. TC 20.511/79, Anexo VI da Ata nº 95/81), pelo qual não padece dúvida de que por força da delegação e seu ato formal, o ordenador de despesa, no exercício é a autoridade delegada, responsável perante este Tribunal, nos termos do art. 80 do Decreto-lei nº 200/67. É este agente quem se sujeita à tomada de contas, consoante o que estatui a mesma Lei da Reforma Administrativa, em seu art. 81. Uma vez inscrito, pelos órgãos de contabilidade, como responsável, porque ordenador das despesas feitas, só poderá ser exonerado de sua responsabilidade após julgadas regulares por suas contas pelo Tribunal de Contas, nos precisos termos do citado art. 80 e do art. 34, inciso I, do Decreto-lei nº 199/67. Daí decorre que o delegante somente será responsabilizado quando houver avocado o caso, na forma permitida desde o Decreto nº 86.377, editado ulteriormente ao entendimento firmado neste Tribunal sobre o assunto (cf. v. decisão de 03. 07/80), ou, como salientado na assentada de 15.12.81, quando ocorrer responsabilidade solidária com o delegado na hipótese, ali acentada, de parcela cuja concessão não podia ignorar.
[...]
4.3.2.8.1. Assim, o que se tem de avaliar é quais atos dos subordinados devem obrigatoriamente ser supervisionados e controlados pelo superior hierárquico, visto que se tal supervisão fosse irrestrita, a delegação de competência perderia, por completo, seu sentido. Essa avaliação somente pode ser realizada caso a caso, levando-se em conta aspectos de materialidade, amplitude e diversidade das funções do órgão, grau de proximidade do ato com suas atividades-fim, dentre outros inerentes à especificidade de cada caso.
[...]
4.3.2.9. Quanto à questão em tela, crê-se que a obrigação quanto à estimativa do consumo de cópias, à análise financeira do contrato de locação de máquinas reprográficas e ao acompanhamento de sua execução deve ficar restrita aos cargos diretamente relacionados com a aludida contratação, principalmente devido ao cunho eminentemente administrativo dos atos questionados.
4.3.2.9.1. Certamente, se fosse exigido que a supervisão do Presidente do IBAMA abrangesse tais atos ( e outros análogos), sua gestão seria dispersa, afetando a eficácia da Entidade quanto às suas finalidades regimentais, esta, sem dúvida, responsabilidade de seu Dirigente máximo.(...)"
"(...) No que concerne ao aspecto da legalidade, devem se fazer presentes certos requisitos necessários à admissibilidade da delegação de competência, quais sejam, a autorização legal, a definição pela autoridade delegante da competência a ser transferida e ser matéria delegável permitida.
(...)
Igualmente, dentre os requisitos de admissibilidade à delegação, necessário se faz que a autoridade delegada esteja investida legitimamente na competência que pretende transferir.
No que concerne aos elementos formais condicionantes à validade, o ato de delegação administrativa deve, primeiramente, se constituir por escrito. Tal posicionamento é endossado por vários causídicos administrativistas, dentre os quais Marcelo Caetano, que ensina:
"Não são admissíveis delegações tácitas de competência, daí inferindo-se a necessidade do ato de delegação ter forma escrita." (Manual de Direito Administrativo. Ed. Forense, Rio de Janeiro, 1965, vol. I).
É necessário também que a autoridade delegante indique, com precisão, a autoridade delegada e as atribuições da delegação. Tal exigência encontra-se expressa na disposição do art. 12 do Decreto-lei nº 200/67.
O ato de delegação de competência também pode conter explicitação de que os servidores que receberem delegação de competência para uma finalidade específica, deverão comunicar, de ofício, à autoridade delegante, em determinado prazo, as irregularidades e os ilícitos administrativos de que tenham conhecimento, ou indícios de sua prática, anexando os documentos pertinentes, sempre que tais fatos puderem configurar qualquer infração à legislação e às normas da companhia ou possam resultar em prejuízo econômico-financeiro, sob pena de infração administrativo-disciplinar. Assim, a autoridade delegante poderia ter maior controle sobre a administração da entidade.
Quanto ao requisito para que o ato de delegação possa produzir regularmente seus efeitos, urge que ao mesmo seja dado publicidade. Tal formalidade, cuja imperiosidade decorre de princípio constitucional, é condicionante à eficácia da delegação, a medida que essa traduz alteração de competência, daí devendo ser obrigatoriamente levada ao conhecimento do público em geral. Por outro lado, a publicação tornará legítima a atuação da autoridade delegada.
Partindo de autoridade competente e revestindo todos os requisitos, entre os quais os supramencionados, o ato de delegação de competência se apresentará válido e eficaz, com isto, ocasionando modificações no campo das responsabilidades atinentes aos administradores públicos.
Segundo jurisprudência sumulada pelo Supremo Tribunal Federal, a responsabilidade conseqüente de ações antijurídicas perpetradas através de ato administrativo recai sobre a autoridade delegada, conforme o enunciado da Súmula 510:
"Praticado o ato por autoridade, no exercício de competência delegada, contra ela cabe o mandado de segurança ou a medida judicial."
Acerca da admissão de responsabilidade solidária de autoridade delegante, entende-se que a mesma limita-se a casos especiais, constituindo exceção. Responderá, por exemplo, o agente delegante, quando não estiver autorizado a delegar atribuições; quando a matéria for indelegável; ou na hipótese da delegação deixar de revestir requisito indispensável à sua validade e eficácia.
Observa-se, também, que incorrerá em responsabilidade conjunta o agente delegante que tenha ciência de irregularidades praticadas pelo agente delegado, omitindo-se quanto as providências administrativas ou legais que lhe couberem, ou aquele que, comprovadamente sabedor da inaptidão de determinado agente, o eleja para exercer atribuições delegadas. (...)" (grifamos)
IV. CONCLUSÃO
Ante o exposto, sugere-se ao Exmo. Relator do processo que em seu Voto proponha ao Egrégio Plenário o que segue:
1. Conhecer do Recurso de Reexame, nos termos do art. 80 da Lei Complementar n. 202/2000, interposto contra o Acórdão n. 0853/2003, exarado na Sessão Ordinária de 14/10/2003, nos autos do Processo n. ALC-01/01597037, e, no mérito, negar-lhe provimento, ratificando na íntegra os termos da decisão recorrida.
COG, em 10 de maio de 2007.
ANNE CHRISTINE BRASIL COSTA
De Acordo. Em ____/____/____
DE ACORDO.
À consideração do Exmo. Sr. Relator Gerson dos Santos Sicca, ouvido preliminarmente o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas.
COG, em de de 2007.
MARCELO BROGNOLI DA COSTA
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