ESTADO DE SANTA CATARINA
    TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO
    CONSULTORIA GERAL

Processo n°: REC - 07/00192409
Origem: Câmara Municipal de Bela Vista do Toldo
RESPONSÁVEL: Mario Alberti
Assunto: (Reexame - art. 80 da LC 202/2000) -LRF-04/04720943
Parecer n° COG-358/07

Senhor Consultor,

RELATÓRIO

Tratam os autos de Recurso de Reexame n° REC-0700192409, interposto pelo Sr. Mario Alberti, Presidente da Câmara de Vereadores de Bela Vista do Toldo, no exercício de 2003, em face do Acórdão n° 2592/2006 (fls. 44 a 45, autos principais), proferido nos autos do Processo n° LRF-04/04720943.

Com efeito, o citado Processo n° LRF-04/04720943 refere-se à verificação do cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal, do exercício de 2003, referentes a Gestão Fiscal - do 1° e do 2° semestres.

O Relatório DMU n° 724/2004 (fls. 03 a 07, autos principais), referente à Gestão Fiscal do 1° Quadrimestre de 2003, apontou como restrição o aumento da despesa total com pessoal em percentual superior ao limite fixado no art. 20, III, "a", da L. C. n° 101/2000 (item 2.2.5, fl. 16, autos principais).

Da mesma forma, no Relatório n° 2148/2004 (fls. 13 a 17, autos principais), referente à Gestão Fiscal do 3° Quadrimestre de 2003, a Diretoria de Controle dos Municípios - DMU, apontou como restrição (item 2.2.5, fl. 16, autos principais) o aumento de gastos com pessoal, do Poder Legislativo Municipal, no exercício de 2003, no percentual de 4,71% da Receita corrente Líquida apresentando uma variação relativa de 262,31% em relação ao exercício anterior (1,3%), sendo que a Lei Complementar 101/2000 limita essa diferença a 10%.

Ao final dos Relatórios n° 724/2004 e n°2148/2004, a Diretoria de Controle dos Municípios - DMU, sugeriu ao Exmo. Relator que fosse procedida à audiência do responsável Sr. Mário Alberti, Ex- Presidente da Câmara Municipal de Alto Bela Vista do Toldo.

O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas (fls. 40 a 41, autos principais) e o Relator do feito acompanharam (fls. 42 e 43, autos principais) o entendimento do Corpo Técnico deste Tribunal.

Na Sessão Ordinária de 18/12/2006, o Processo LRF N° 0404720943 foi examinado pelo Tribunal Pleno, que exarou o Acórdão n° 2592/2006 (fls. 44 e 45, autos principais), com a seguinte dicção:

6.1. Conhecer dos Relatórios de Instrução que tratam da análise dos dados dos Relatórios de Gestão Fiscal do 1º, 2º e 3º quadrimestres de 2003, encaminhados a esta Corte de Contas, por meio eletrônico, pelo do Poder Legislativo de Bela Vista do Toldo, em atendimento à Instrução Normativa n. 002/2001, deste Tribunal.

6.2. Aplicar ao Sr. Mário Alberti - Presidente da Câmara Municipal de Bela Vista do Toldo em 2003, CPF n. 558.175.809-34, com fundamento no art. 70, II, da Lei Complementar n. 202/2000 c/c o art. 109, II, do Regimento Interno, a multa no valor de R$ 400,00 (quatrocentos reais), em face do aumento com gastos em relação ao exercício anterior com folha de pagamento do Poder Legislativo em percentual superior ao fixado pelo art. 71 da Lei Complementar n. 101/2000, conforme apontado no item C.2.2.5. do Relatório DMU, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão do Diário Oficial do Estado, para comprovar ao Tribunal o recolhimento da multa ao Tesouro do Estado, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts. 43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000.

6.3. Dar ciência deste Acórdão, do Relatório e Voto do Relator que o fundamentam, bem como do Relatório DMU n. 1.699/2006, à Câmara Municipal de Bela Vista do Toldo e ao Sr. Mário Alberti - Presidente daquele Órgão em 2003.

Devidamente cientificado e inconformado com o Acórdão do Tribunal Pleno, o Responsável interpôs o presente Recurso de Reexame, alegando (fl. 03,dos autos) que:

2- Ocorre que tal "irregularidade" também foi objeto de análise nos autos do processo n. PCA-04/01341305, referentes à Prestação de Contas de Administrador referente ao ano de 2003, da Câmara Municipal de Alto Bela Vista do Toldo, Estado de Santa Catarina, ocasião em que houve aplicação da mesma multa, pela mesma "infração", conforme constata-se dos documentos anexos.

3- Tendo sido regularmente notificado nos autos do Processo n. PCA-04/01341305, o ora recorrente procedeu ao recolhimento da multa que lhe foi imposta, no valor de R$ 400,00 (quatrocentos reais), por infração do art. 71, da Lei Complementar n. 101/2000, em relação ao exercício de 2003, bem como, recolheu, ainda, o valor de R$ 600,00 (seiscentos reais), em face da aplicação de multa por infração ao art. 4°, da Resolução TC-07/99.

Argúi, ainda, que a multa referente ao PCA n° 04/01341305, já foi recolhida. Requer o cancelamento da multa ora aplicada, em face do bis in idem.

É o relatório.

II. PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE

Inicialmente cabe verificar a legitimidade do Sr. Mário Alberti, Ex. Presidente da Câmara Municipal de Alto Bela Vista do Toldo, para interpor o presente Recurso de Reexame, alegando que

Considerando que o Processo consiste em exame de verificação do cumprimento das disposições da Lei Complementar n° 101/2000, a peça recursal interposta foi recebida como Recurso de Reexame, nos termos do art. 79 da Lei Complementar n° 202/2000.

O recurso foi autuado pela Secretaria Geral desta Corte de Contas como sendo Recurso de Reexame, a teor do disposto no artigo 80 da Lei Complementar 202/2000, que determina:

Art. 80. O Recurso de Reexame, com efeito suspensivo, poderá ser interposto uma só vez por escrito, pelo responsável, interessado, ou pelo Ministério Público junto ao Tribunal, dentro do prazo de trinta dias contados a partir da publicação da decisão no Diário Oficial do Estado.

Outrossim, cumpre o recurso o requisito da singularidade, tendo em vista que foi interposto uma única vez.

Por fim, resta analisar a tempestividade do Recurso, conforme dispõe o art. 79 da Lei Complementar n. 202/2000, o qual oportuniza ao Responsável o prazo de 30 dias para interpor o Recurso de Reexame, contados a partir da publicação da decisão no Diário Oficial do Estado.

Observa-se que a publicação do Acórdão n° 2592/06 ocorreu em 08/03/07. O recurso foi ajuizado no dia 25/04/07, Assim, constata-se que o prazo expirou no dia 07/04/07, sendo intempestivo, portanto, o presente Recurso.

A norma regimental interna deste Tribunal de Contas (Resolução TC n° 06/01), admite, de forma excepcional, que se conheça do recurso intempestivo desde que preencha os requisitos do art. 135, § 1°:

Art. 135:

[...]

§ 1° Não se conhecerá dos recursos previstos neste Capítulo interpostos fora do prazo, salvo para corrigir inexatidões materiais e retificar erros de cálculo e, ainda, em razão de fatos novos supervenientes que comprovem:

I - que os atos praticados pelo recorrente não causaram, efetivamente, quaisquer prejuízos ao erário;

II - que o débito imputado ao Responsável era proveniente de vantagens pagas indevidamente a servidor, cuja devolução caberia originalmente ao beneficiário, em consonância com o disposto neste Regimento;

III - a ocorrência de erro na identificação do responsável.

Resta, todavia, verificar se da análise das razões recursais apresentadas vislumbram-se os pressupostos estabelecidos no art. 135 § 1° do Regimento Interno, que estabelece exceção no conhecimento de recurso interposto intempestivamente, desde que concernente à correção de inexatidão material, dà retificação de erro de cálculos, ou, a fatos novos supervenientes.

Considerando que consta do presente Recurso a informação de que a irregularidade apontada nos autos já foi objeto de análise nos autos do processo PCA-04/01341305, referente à Prestação de Contas de Administrador do ano de 2003, vislumbra-se a incidência da dupla punição pelo mesmo fato e, por conseguinte, a violação ao princípio do non bis in idem. Por esse motivo, o presente recurso deve ser conhecido, superando a sua intempestividade.

III. DAS RAZÕES RECURSAIS.

O Recorrente, em suas razões recursais, discorre:

1- Nos autos em epígrafe, o recorrente foi condenado ao pagamento de multa, no valor de R$ 400,00 (quatrocentos reais), por infringir o art. 71, da Lei Complementar n 101/2000 -Lei de Responsabilidade Fiscal, ao realizar despesas com pessoal, no exercício de 2003, em percentual superior ao permitido, em relação ao exercício anterior, tendo como parâmetro a receita corrente líquida de cada exercício.

2- Ocorre que tal "irregularidade" também foi objeto de análise nos autos do processo n. PCA-04/01341305, referentes à Prestação de Contas de Administrador referente ao ano de 2003, da Câmara Municipal de Alto Bela Vista do Toldo, Estado de Santa Catarina, ocasião em que houve aplicação da mesma multa, pela mesma "infração", conforme constata-se dos documentos anexos.

3- Tendo sido regularmente notificado nos autos do Processo n. PCA-04/01341305, o ora recorrente procedeu ao recolhimento da multa que lhe foi imposta, no valor de R$ 400,00 (quatrocentos reais), por infração do art. 71, da Lei Complementar n. 101/2000, em relação ao exercício de 2003, bem como, recolheu, ainda, o valor de R$ 600,00 (seiscentos reais), em face da aplicação de multa por infração ao art. 4°, da Resolução TC-07/99.

4- Como se vê, essa Egrégia Corte de Contas acabou por aplicar duas vezes a mesma penalidade ao ora recorrente, em relação a um único fato, qual seja: aumento da despesa com pessoal em desacordo com o art. 71, da Lei Complementar n. 101/2000, no tocante ao exercício de 2003, quando presidia a Câmara de Vereadores de Alto Bela Vista do Toldo-SC.

Alega o Recorrente, Sr. Mário Alberti, Ex-Presidente da Câmara Municipal de Alto Bela Vista do Toldo (fl. 03 dos autos), que, em processo anteriormente julgado por este Tribunal (PCA-04/01341305), já foi penalizado, com multa do mesmo valor - R$ 400,00 (quatrocentos reais)- em face de descumprimento do disposto no artigo 71 da Lei Complementar n° 101/2000. Em síntese, a penalidade decorreu do aumento de gastos com pessoal, no exercício de 2003, superior ao percentual de 10%, em relação ao exercício anterior (2002), fato novamente trazido aos presentes autos (LRF 04/04720943), ocasionando a incidência da dupla punição em razão do mesmo fato.

Após a análise de todos os dados, foi constatado que a manutenção da multa nos presentes autos ocasionaria dupla penalização.

É o que se percebe a partir do confronto entre ambos os Acórdãos:

PCA 04/01341305

Acórdão 2365/2006: 6.2. Aplicar ao Sr. Mário Alberti - Presidente da Câmara Municipal de Bela Vista do Toldo em 2003, CPF n. 558.175.809-34, as multas abaixo discriminadas, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial do Estado, para comprovar ao Tribunal o recolhimento das referidas multas ao Tesouro do Estado, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos artigos 43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000:

6.2.1. com base no art. 70, II, da Lei Complementar n. 202/2000 c/c o art. 109, II, do Regimento Interno, a multa no valor de R$ 400,00 (quatrocentos reais), em face do descumprimento ao disposto no art. 71 da Lei Complementar n. 101/2000, uma vez que se verifica um aumento de 14,83% entre o percentual de gastos com pessoal no exercício anterior (3,44%) e o percentual apurado no exercício atual (3,95%), quando o limite disposto no referido diploma legal é de 10% (item II.B.1.1 do Relatório DMU). (grifo nosso)

LRF 04/04720943

Acórdão 2592/2006:6.2. Aplicar ao Sr. Mário Alberti - Presidente da Câmara Municipal de Bela Vista do Toldo em 2003, CPF n. 558.175.809-34, com fundamento no art. 70, II, da Lei Complementar n. 202/2000 c/c o art. 109, II, do Regimento Interno, a multa no valor de R$ 400,00 (quatrocentos reais), em face do aumento com gastos em relação ao exercício anterior com folha de pagamento do Poder Legislativo em percentual superior ao fixado pelo art. 71 da Lei Complementar n. 101/2000, conforme apontado no item C.2.2.5. do Relatório DMU, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão do Diário Oficial do Estado, para comprovar ao Tribunal o recolhimento da multa ao Tesouro do Estado, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts. 43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000.(grifo nosso)

Assim, houve violação ao princípio do non bis in idem, preceito contemplado pelo Direito Administrativo Sancionador e aplicável aos processos administrativos instaurados por este Tribunal.

Diz a doutrina acerca do bis in idem:

A idéia básica do non bis idem é que ninguém pode ser condenado duas ou mais vezes por um mesmo fato. Já foi definida essa norma como "princípio geral do direito", que, com base nos princípios da proporcionalidade e coisa julgada, proíbe a aplicação de dois ou mais procedimentos, seja uma ou mais ordens sancionadoras, nas quais se dê uma identidade de sujeitos, fatos e fundamentos, e sempre que não exista uma relação de supremacia especial da administração Pública. in Osório, Fabio Medina. Direito Administrativo Sancionador - SP: Editora RT, 2000, fls. 279.

O bis in idem é intolerável. Assim, havendo em ambos os processos instaurados contra o Réu identidade de demanda, com as mesmas partes, o mesmo pedido e o mesmo fundamento, verifica-se a coisa julgada, se um dos feitos já houver sido decidido (TACRIM-SP-Rec.-Rel.Xavier Homrich - RT 529/536).1

[...]

E, ainda:

[...]

29.  Com relação ao argumento de que configuraria bis in idem a manutenção da multa imposta ao Recorrente, reproduzimos abaixo excerto do voto condutor do Acórdão n. 2.495/2005 – Primeira Câmara, por meio do qual este Tribunal julgou recursos de reconsideração dos responsáveis pelo Corcesp durante o exercício de 1993:'12. No que tange à alegação de ocorrência do bis in idem e desproporção da pena, tendo em vista que o Tribunal teria aplicado outras multas aos dirigentes do CORCESP em virtude dos mesmos fatos, a simples leitura do art. 7° da Lei n° 8.443/92 demonstra o equívoco da argumentação.

13. Realmente, o citado dispositivo legal prescreve que 'as contas dos administradores e responsáveis a que se refere o artigo anterior serão anualmente submetidas a julgamento do Tribunal, sob forma de tomada ou de prestação de contas, organizadas de acordo com normas estabelecidas em instrução normativa. Diante disso, é perfeitamente cabível a cominação de multas diversas a um ou vários responsáveis, desde que tenham praticado atos irregulares com desdobramentos em prestações de contas relativas a mais de um exercício, ainda que originários de uma mesma ilegalidade. No caso concreto em apreço, os fatos impugnados tiveram sua origem em 1992 [na verdade, 11.11.1991, conforme fls. 60/62, v.p. dos presentes autos], com a assinatura, entre o CORSESP e o SIRCESP, do contrato de prestação de serviços e comodato, sem licitação, por prazo indeterminado e com delegação de competências privativas. Não se trata, portanto, da ocorrência de dupla apenação aos responsáveis envolvidos'.2(grifo nosso)

[..]

Por fim, valendo-se da presente irresignação e amparado pelos princípios que norteiam o instituto da multa, há de ser reconsiderada a decisão exarada nos autos do Processo n. LRF-04/04720943, reconhecendo-se o pagamento da multa imposta nos termos do art. 71 da LRF, efetuado nos autos do PCA-0401341305.

III. CONCLUSÃO

Ante o exposto, sugere-se ao Relator que por Despacho propugne ao Egrégio Plenário o que segue:

1) Conhecer do Recurso de Reexame, nos termos do art. 80 da LC 202/2000, interposto contra Acórdão n° 2592/2006 proferido no processo LRF 04/04720943, na sessão do dia 18/12/2006, e, no mérito, dar-lhe provimento para:

      1.1) Anular o Acórdão nº 2592/2006, de 18/12/2006, em face da duplicidade processual.
      1.2) Determinar o arquivamento dos Autos.
      1.3) Dar ciência da Decisão, do Parecer e Voto que a fundamentam a Câmara Municipal de Vereadores de Alto Bela Vista do Toldo e ao Sr. Mário Alberti - Presidente deste órgão em 2003.
      COG, em de de 2007.
      LILIANE C.F. CABRAL
                  Técnica de Controle Externo
                  De Acordo. Em ____/____/____
                  HAMILTON HOBUS HOEMKE
                  Coordenador de Recursos
      DE ACORDO.
      À consideração do Exmo. sr. conselheiro luiz roberto herbst, ouvido preliminarmente o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas.
        COG, em de de 2007.
        MARCELO BROGNOLI DA COSTA

      Consultor Geral


      1 Do princípio da proibição do bis in idem no direito administrativo sancionador do mercado financeiro - essência e consectários, Glênio Sabbad Guedes, Procurador da Fazenda Nacional. Disponível em:http://www.bcb.gov.br/crsfn/doutrina/BIS_IN_IDEM.pdf. Acesso em: 13 jun. 2007.

      2 Tribunal de Contas da União GRUPO I -CLASSE I - 1ª Câmara.

      Natureza: Recurso de Reconsideração Disponível em:http://www.tcu.gov.br/Consultas/Juris/Docs/judoc/Acord/20061031/TC-005-055-1993-8.doc. Acesso em 14 jun. 2007.