ESTADO DE SANTA CATARINA
    TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO
    CONSULTORIA GERAL

Processo n°: CON - 07/00337652
Origem: Câmara Municipal de São José
Interessado: Edio Osvaldo Vieira
Assunto: Consulta
Parecer n° COG 454/07

Consulta. Constitucional. Revisão geral anual. Iniciativa de lei do Poder Legislativo. Extensão por Decreto. Impossibilidade.

1. A iniciativa de lei para a revisão geral anual dos subsídios dos vereadores é de competência exclusiva do chefe do Poder Executivo;

2. A extensão aos agentes políticos dos efeitos da lei de iniciativa do Poder Executivo que concedeu a revisão geral anual apenas para os servidores públicos não é possível mediante decreto.

Senhor Consultor,

1. RELATÓRIO

Trata-se de Consulta formulada pelo Presidente da Câmara Municipal de São José, Sr. Édio Osvaldo Vieira, relativa à revisão geral anual do subsídio dos vereadores.

O Consulente indaga se a iniciativa de lei para revisão geral anual seria da Câmara, tendo em vista sua competência originária para a iniciativa da lei fixadora do subsídio.

Questiona ainda o Consulente se os efeitos de revisão geral, caso concedida aos servidores públicos por lei de iniciativa do Poder Executivo, poderiam ser estendidos aos vereadores mediante Decreto.

2. DA CONSULTA

A Consulta de fls. 02/05, possui o seguinte teor:

3. PRELIMINARES DE ADMISSIBILIDADE

Considerando que a Consulta vem firmada pelo Presidente da Câmara Municipal de São José, Sr. Édio Osvaldo Vieira, tem-se como preenchido o requisito de legitimidade, consoante o disposto nos artigos 103, II e 104, III, da Resolução nº TC-06/2001, desta Corte de Contas.

Observa-se ainda que a consulta não veio instruída com parecer da assessoria jurídica do órgão ou entidade consulente, conforme preceitua o art. 104, inciso V, da Resolução nº TC-06/2001 (Regimento Interno do TCE/SC), contudo, o Tribunal Pleno poderá conhecer de consulta que não atenda a esta formalidade, conforme autoriza o parágrafo 2º do artigo 105 do referido Regimento, cabendo essa ponderação ao Relator e aos demais julgadores.

4. ANÁLISE DA CONSULTA

O primeiro questionamento feito pelo Consulente foi feito nos seguintes termos:

A lei para a revisão geral do subsídio dos vereadores não é de iniciativa da Câmara, mas sim do chefe do Poder Executivo, isto porque o artigo 37, inciso X, in fine da Constituição Federal1, determina que a revisão anual deve ser geral, sempre na mesma data e sem distinção de índices.

Isto significa que seria inviável cumprir as referidas determinações constitucionais caso cada Poder pudesse iniciar lei prevendo sua própria revisão anual, pois nesse caso a mesma não possuiria caráter geral, provavelmente não seria na mesma data e poderia haver distinção de índices, contrariando, desta forma, a norma constitucional em análise.

Assim, como a lei que disponha sobre o aumento da remuneração dos cargos, funções e empregos públicos na administração direta e autárquica é de iniciativa exclusiva do chefe do Poder Executivo, ex vi o que dispõe o art. 61, § 1º, II, a, da Constituição Federal, o Poder que tem mais condições de unificar a revisão geral anual é justamente o Executivo.

Ademais, nos termos do artigo 169 caput, § 1º, combinado com o art. 165 da Constituição Federal2, para que seja possível a concessão das vantagens decorrentes da revisão geral anual, devem as mesmas estar autorizadas na lei de diretrizes orçamentárias (LDO), que é de iniciativa do Poder Executivo.

Desse modo, cabe ao chefe do Poder Executivo incluir na LDO a revisão geral anual concedida inclusive aos agentes políticos.

Sobre este tema, ao comentar o artigo 37, inciso X, da Constituição Federal, assim se pronunciou o Auditor Fiscal de Controle Externo Enio Luiz Alpini, nos autos do Processo CON 02/00394339, Parecer COG 229/02, que originou o Prejulgado 1163:

O Prejulgado 1163 possui o seguinte teor:

No mesmo sentido, os Prejulgados 1775, 1691, 1686, 1565, 1544, 1531, 1462, 1428, 1334, 1264, 1263, 1203 e 1153 emitido por este Tribunal de Contas:

Sobre o tema, assim se manifestou o Supremo Tribunal Federal (STF) em recente decisão:

Portanto, com base nos artigos 37, inciso X, 61, § 1º, II, a, 169 caput, § 1º e 165 da Constituição Federal, bem como em decisões do STF e nos Prejulgados emitidos por esta Corte de Contas, a iniciativa de lei para a revisão geral anual do subsídio dos vereadores é competência exclusiva do Poder Executivo.

A seguir, o Consulente formula a seguinte pergunta:

Na hipótese levantada pelo Consulente, entende-se que não é legítima a extensão da revisão por Decreto, devido ao princípio da legalidade inserto no artigo 37, caput, da Constituição Federal.

O princípio da legalidade, em se tratando de Administração Pública, há de prevalecer e de se aplicar, razão pela qual a extensão dos efeitos da lei de iniciativa do Poder Executivo que conceder a revisão geral anual somente aos servidores públicos, não é possível por meio de Decreto.

A extensão pretendida pelo Consulente também não é viável devido ao disposto nos artigos 169 caput, § 1º e 165 da Constituição Federal, pois, como visto acima, a revisão geral anual, sendo uma vantagem concedida pela administração direta3, deve estar prevista na LDO, que é de iniciativa exclusiva do Poder Executivo4.

Logo, sendo a LDO de iniciativa privativa do Poder Executivo, a revisão geral anual concedida pelo próprio Poder Legislativo, via de regra, não estaria previamente prevista na LDO, o que inviabilizaria a pretendida extensão dos efeitos da lei, ainda que por intermédio de outra lei.

Com a palavra, Celso Antônio Bandeira de Mello5:

        (I) prévia dotação orçamentária suficiente para atender às projeções de despesa de pessoal; e
        (II) autorização específica na lei de diretrizes orçamentárias, ressalvadas, quanto a essa última exigência, as empresa públicas e sociedades de economia mista.

Sobre a necessidade de autorização específica na LDO para fins de revisão geral anual, este Tribunal de Contas assim se manifestou por intermédio do Prejulgado 1428:

        1428

Entretanto, caso haja autorização específica na lei de diretrizes orçamentárias e prévia dotação orçamentária suficiente para atender às projeções das despesas, admite-se, por lei de iniciativa do Poder Legislativo, a extensão dos efeitos da lei de iniciativa do Poder Executivo, desde que respeitados a data (período de reposição) e os índices nela previstos.

Dessa maneira estaria se respeitando o art. 37, inciso X da Constituição Federal que determina a unicidade da revisão geral anual, a iniciativa privativa do Poder Executivo para determinar, por meio de lei, a data e os índices aplicáveis na espécie, bem como os artigos 169 caput, § 1º e 165 da Constituição Federal e ainda o princípio da legalidade.

Por conseguinte, a extensão aos agentes políticos dos efeitos da lei de iniciativa do Poder Executivo que concedeu a revisão geral anual somente aos servidores públicos é possível, desde que seja feita por lei que observe a data e os índices previstos na lei de iniciativa do Poder Executivo e haja autorização específica na lei de diretrizes orçamentárias e prévia dotação orçamentária suficiente para atender às projeções das despesas.

Por fim, respondendo objetivamente ao questionamento apresentado pelo Consulente, a extensão aos agentes políticos dos efeitos da lei de iniciativa do Poder Executivo que concedeu a revisão geral anual apenas para os servidores públicos não é possível mediante decreto.

5. DA REFORMA E REVOGAÇÃO DE PREJULGADOS 1163 E 1696

O Prejulgado 1163 abaixo transcrito assevera em seu quarto parágrafo que não havendo previsão legal para a revisão geral anual dos subsídios dos vereadores, esta poderá se dar com base na lei de iniciativa do Poder Executivo que conceder a citada revisão aos servidores municipais. In verbis:

1163

Todavia, não consta no Prejulgado 1163 que deve ser respeitado os artigos 169 caput, § 1º e 165 da Constituição Federal, ou seja, para que seja possível a revisão geral anual dos subsídios dos vereadores com base na lei de iniciativa do Poder Executivo, é necessário autorização específica na lei de diretrizes orçamentárias e prévia dotação orçamentária suficiente para atender às projeções das despesas.

Também não consta no Prejulgado 1163 que a extensão em análise deve ser concretizada mediante lei, o que foi a intenção do Auditor Fiscal de Controle Externo Enio Luiz Alpini, ao emitir o Parecer COG 229/02, que instruiu o Processo CON-02/00394339 (Prejulgado 1163), senão veja-se:

Desse modo, com o fim de atender ao disposto nos artigos 169 caput, § 1º e 165 da Constituição Federal, bem como ao princípio da legalidade, sugere-se que o parágrafo ora em análise do Prejulgado 1163 seja reformado para constar a seguinte redação:

Com relação ao Prejulgado 1696, o mesmo estabelece, em sua segunda parte, que a revisão geral anual dos subsídios dos agentes políticos poderá ser admitida se prevista na lei que fixou os próprios subsídios.

Eis o teor do Prejulgado em comento:

        1696

Assim, a orientação contida no Prejulgado 1696 permite aos agentes políticos se auto concederem a revisão geral anual sem que haja lei de iniciativa do Poder Executivo, ou caso exista tal lei, que não sejam respeitados a data e os índices determinados pelo chefe do Poder Executivo, contrariando, desta forma, a unicidade prevista no art. 37, inciso X da Constituição Federal e os Prejulgados 1775, 1691, 1686, 1565, 1544, 1531, 1462, 1428, 1334, 1264, 1263, 1203, 1163 e 1153, emitidos por este Tribunal de Contas, que determinam, assim como faz o STF, a competência originária do chefe do Poder Executivo em matéria de revisão geral anual.

Também não consta no Prejulgado 1696, a necessidade de autorização específica na lei de diretrizes orçamentárias e prévia dotação orçamentária suficiente para atender às projeções das despesas, ex vi o que dispõem os artigos 169 caput, § 1º e 165 da Constituição Federal.

Portanto, tendo em vista a existência do 1163 que regula a matéria, sugere-se a revogação do Prejulgado 1696.

6. CONCLUSÃO

Em consonância com o acima exposto e considerando:


1 Art. 37 [...] X - a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices;

2 Art. 165. Leis de iniciativa do Poder Executivo estabelecerão:

I - o plano plurianual;

II - as diretrizes orçamentárias;

III - os orçamentos anuais.

Art. 169. A despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios não poderá exceder os limites estabelecidos em lei complementar.

§ 1º A concessão de qualquer vantagem ou aumento de remuneração, a criação de cargos, empregos e funções ou alteração de estrutura de carreiras, bem como a admissão ou contratação de pessoal, a qualquer título, pelos órgãos e entidades da administração direta ou indireta, inclusive fundações instituídas e mantidas pelo poder público, só poderão ser feitas:

I - se houver prévia dotação orçamentária suficiente para atender às projeções de despesa de pessoal e aos acréscimos dela decorrentes;

II - se houver autorização específica na lei de diretrizes orçamentárias, ressalvadas as empresas públicas e as sociedades de economia mista.

3 Art. 169, § 1º, da Constituição Federal.

4 Art. 165, da Constituição Federal.

5 Bandeira de Mello, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 20ª ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p.248