ESTADO DE SANTA CATARINA
    TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO
    CONSULTORIA GERAL

Processo n°: REC - 04/01378993
Origem: Câmara Municipal de Nova Erechim
Responsável: Flávio José Mohr
Assunto: Recurso (Recurso de Reconsideração - art. 77 da LC 202/2000) -PCA-02/00528718
Parecer n° COG-547/07

Despesa. Câmara Municipal. Art. 4º e §1º do art. 12 da Lei nº 4.320/64. Interesse público.

O pagamento de diária para participação em Olimpíada da respectiva Associação, bem como de faixa para Festa ocorrida no município, são consideradas despesas estranhas à competência da Câmara Municipal, do que se denota a ausência de caráter público, tornando ilegítima a despesa realizada.

Assessoria jurídica. Concurso público.

Exige-se a prévia seleção por concurso público, nos termos do inciso II do art. 37 da CF/88, para os serviços que possuem características de continuidade e imprescindibilidade - cargos típicos de carreira, situação em que se enquadram os serviços de assessoria jurídica.

Senhor Consultor,

RELATÓRIO

Inconformado, o Sr. Flávio José Mohr interpôs Recurso de Reconsideração, nº REC - 04/01378993 (fls. 02-05 e documentos de fls. 06-17), com o fito de reverter a decisão tomada por Acórdão.

É o relatório.

DOS PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE

No que se refere à legitimidade, o Sr. Flávio José Mohr (Presidente da Câmara Municipal de Vereadores de Nova Erechim-SC no exercício de 2001) é parte legítima, nos termos do artigo 133, § 1º alínea "a" da Resolução TC-06/01, na situação de Responsável para interpor recurso na modalidade de Reconsideração, nos moldes dos arts. 76, inciso I, da LC (estadual) nº 202/00. Vejamos:

Quanto ao requisito da tempestividade o art. 77, da LC (estadual) nº 202/00, assim estabelece o prazo para interposição do Recurso de Reconsideração:

Art. 77. Cabe Recurso de Reconsideração contra decisão em processo de prestação e tomada de contas, com efeito suspensivo, interposto uma só vez por escrito, pelo responsável, interessado ou pelo Ministério Público junto ao Tribunal, dentro do prazo de trinta dias contados da publicação da decisão no Diário Oficial do Estado.

(grifo nosso).

A Resolução TC-06/01, em seu art. 136, faz a mesma previsão:

Art. 136. De acórdão proferido em processos de prestação ou tomada de contas, inclusive tomada de contas especial, cabem Recurso de Reconsideração e Embargos de declaração.

Parágrafo único. O Recurso de Reconsideração, com efeito suspensivo, será interposto uma só vez, por escrito, pelo responsável ou pelo Procurador-geral do Ministério Público junto ao Tribunal, dentro do prazo de trinta dias contados da publicação do acórdão no Diário Oficial do Estado. (grifo nosso).

Ainda, necessário complementar com a regra disposta no art. 66, caput c/c §3º da Resolução TC-06/01:

Art. 66. Salvo disposição em contrário, os prazos previstos neste Regimento computar-se-ão excluindo o dia do começo e incluindo o do vencimento.

[...]

§3º Nos demais casos, salvo disposição expressa em contrário, os prazos somente começam a correr do primeiro dia útil após a publicação do acórdão ou da decisão no Diário Oficial do Estado.

O recurso sob exame foi protocolizado na data de 11/03/04, enquanto a publicação do Acórdão nº 2459 ocorreu no dia 11/02/04, portanto, atendeu ao prazo de trinta dias determinado no art. 77 da LC (estadual) nº 202/00 e no art. 136 da Resolução TC-06/01.

A singularidade também foi respeitada, em consonância com o art. 77 da LC (estadual) nº 202/00. Ademais, cuida-se de modalidade recursal apta a insurgir-se contra decisões proferidas em processo de prestação ou tomada de contas, o que espelha a situação em tela.

Em decorrência do acima exposto, sugere-se ao Exmo. Sr. Relator que conheça do Recurso de Reconsideração, na forma do art. 77, da LC (estadual) nº 202/00, por estarem preenchidos todos os pressupostos de admissibilidade.

III. DAS RAZÕES RECURSAIS

1 DO DÉBITO IMPUTADO

Foi imputado ao Recorrente débito no valor de R$ 105,00 (cento e cinco reais) em razão de despesas referentes à aquisição de 4 (quatro) metros de faixa para incentivo à Festa do Colono e Motorista e com diárias para participação na III Olimpíada da ACAMOSC, ambas consideradas estranhas à competência da Câmara Municipal, o que afronta os arts. 24 e 25 da Lei Orgânica Municipal. E, por não estarem abrangidas pelo conceito de gasto próprio, ferem o disposto no art. 4º c/c o §1º do art. 12 da Lei 4.320/64; in verbis:

Art. 4º A Lei de Orçamento compreenderá todas as despesas próprias dos órgãos do Governo e da administração centralizada, ou que, por intermédio deles se devam realizar, observado o disposto no artigo 2°.

Art. 12. omissis

§ 1º Classificam-se como Despesas de Custeio as dotações para manutenção de serviços anteriormente criados, inclusive as destinadas a atender a obras de conservação e adaptação de bens imóveis.

Defende-se o Insurgente colocando o pagamento da faixa como "uma singela homenagem" aos agricultores, e discordando ser a participação nas olimpíadas despesa estranha "sob pena dos vereadores e/ou funcionários não poderem participar dos eventos patrocinados, promovidos, pela sua entidade associativa" (fls. 03).

Primeiro, no que se refere ao pagamento da faixa para a Festa do Colono, transcreve-se trecho do Parecer elaborado pela Diretoria Técnica (fls. 72):

Com relação à faixa alusiva a Festa do Colono, ressalta-seque o Prejulgado n. 491 não acolhe a despesa realizada. Coroa de Flores para homenagear autoridades e pessoas ilustres que faleceram ou despesas com recepções a autoridade e sua comitiva não podem ser assemelhadas à despesa com faixa de divulgação da Festa do Colono, ainda que seja de interesse do Município, porque tal despesa não se enquadra nas competências institucionais da Câmara Municipal. Possível seria a realização da referida despesa pelo departamento de Cultura do Município (Poder Executivo), desde que o evento seja aberto a toda a comunidade.

Caracteriza-se, assim, como despesa imprópria, não se adequando às competências institucionais da Câmara Municipal, o que acarreta sua ilegitimidade - assunto que adiante será analisado.

O fornecimento de diária para participação em Olimpíada da Associação pela Câmara Municipal afasta por completo o princípio da impessoalidade, o qual deve permear os atos tomados pelos agentes administrativos.

Das palavras de Maria Sylvia Zanella Di Pietro, extraem-se os seguintes ensinamentos acerca do enunciado em questão - Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2000. 12. ed. p. 71:

Este princípio, que aparece, pela primeira vez, com essa denominação, no art. 37 da Constituição de 1988, está dando margem a diferentes interpretações, pois, ao contrário dos demais, não tem sido objeto de cogitação pelos doutrinadores brasileiros. Exigir impessoalidade da Administração tanto pode significar que esse atributo deve ser observado em relação aos administrados como à própria Administração. No primeiro sentido, o princípio estaria relacionado com a finalidade pública que deve nortear toda a atividade administrativa. Significa que a Administração não pode atuar com vistas a prejudicar ou beneficiar pessoas determinadas, uma vez que é sempre o interesse público que tem que nortear o seu comportamento; [...]

Destaca-se, ainda, a questão da supremacia do interesse público, nas palavras de Celso Antônio Bandeira de Mello - Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 90:

Interesse público ou primário, repita-se, é o pertinente à sociedade como um todo, e só ele pode ser validamente objetivado, pois este é o interesse que a lei consagra e entrega à compita do Estado como representante do corpo social. Interesse secundário é aquele que atina tão-só ao aparelho estatal enquanto entidade personalizada, e que por isso mesmo pode lhe ser referido e nele encarnar-se pelo simples fato de ser pessoa.

Com efeito, por exercerem função, os sujeitos de Administração Pública têm que buscar o entendimento do interesse alheio, o qual seja, o da coletividade, e não o interesse de seu próprio organismo, qua tale considerado, e muito menos dos agentes estatais.

Conforme se observa do estudo do caso concreto, não há como se extrair interesse público na conduta especificada, tampouco impessoalidade no ato de proporcionar pagamento de diária para participação em Olimpíada da Associação. É, portanto, despesa desprovida de caráter público, em desconformidade com os termos do art. 4º c/c o §1º do art. 12 da Lei nº 4.320/64 (supracitados).

São, portanto, atos ilegítimos - porquanto além de ilegais, vão de encontro à finalidade pública, o que garante a imputação do débito na forma da alínea 'c' do inciso III do art. 18 da LC (estadual) nº 202/00:

Art. 18. As contas serão julgadas:

[...]

III - irregulares, quando comprovada qualquer das seguintes ocorrências:

[...]

c) dano ao erário decorrente de ato de gestão ilegítimo ou antieconômico injustificado; e

[...] - (grifo nosso)

Dessa forma, como não se vislumbra regularidade nas despesas realizadas, conclui-se pela necessária aplicação do débito.

2 DAS IRREGULARIDADES APONTADAS