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TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO
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Processo n°: |
REC - 03/05831526 |
Origem: |
Prefeitura Municipal de Rio do Oeste |
RESPONSÁVEL: |
Valcir Leopoldo Nardelli |
Assunto: |
Recurso (Recurso de Reconsideração - art. 77 da LC 202/2000) -TCE-6329801/92 |
Parecer n° |
COG-676/07 |
Recurso de Reconsideração. Denúncia. Conversão em Tomada de Contas Especial. Imputação de débitos e multas. Conhecer e dar provimento parcial.
Despesa. Ausência de finalidade e interesse público. Dano ao erário. Responsabilização do Ordenador.
A realização de despesas estranhas às finalidades do Município enseja prejuízo ao erário e a conseqüente obrigação do Ordenador de ressarcir os cofres públicos.
Dispensa de licitação. Aquisição de imóvel. Amparo Legal. Art. 24, X, da Lei nº 8.666/93.
Uma vez preenchidos os requisitos legais pertinentes, pode o Município adquirir bem imóvel mediante dispensa de licitação.
Multa. Art. 70, II, da LC-202/00. Violação à norma da ABNT. Impossibilidade.
Norma técnica não pode ser elevada a categoria de norma legal para a imputação da multa prescrita no inciso II do art. 70 da Lei Complementar 202/00.
Senhor Consultor,
RELATÓRIO
Tratam os autos de Recurso, na modalidade de Reconsideração, interposto pelo Sr. Valcir Leopoldo Nardelli - ex-Prefeito do Município de Rio do Oeste, contra o Acórdão n. 0504/2003, proferido nos autos do Processo n. TCE-6329801/92.
O citado Processo n. TCE-6329801/92 é relativo à conversão em tomada de contas especial do Processo nº DEN-6329801/92 que, por sua vez, tratou de Auditoria Especial para averiguação de supostas irregularidades praticadas na Prefeitura de Rio do Oeste nos exercícios de 1997 a 1999, noticiada através do oferecimento de denúncia a esta Corte de Contas pelo Vereador Alcides Fiamoncini. A referida auditoria especial foi empreendida pela Diretoria de Denúncias e Representações - DDR, deste Tribunal.
Levada a efeito a mencionada análise, a DDR procedeu à elaboração do Relatório nº 040/99 (fls. 105 a 113), no qual sugeriu a diligência dos autos ao Prefeito de Rio do Oeste para esclarecimentos.
A diligência foi atendida pelo Sr. Valcir Leopoldo Nardelli, mediante alegações de defesa e juntada de documentos (fls. 171 a 260).
A DDR, então, elaborou o Relatório nº 58/99 (fls. 264 a 279), concluindo pelo julgamento irregular com imputação de débitos e multas ao ora Recorrente.
O Relator do feito, Conselheiro José Carlos Pacheco, entendeu corretamente que, em primeiro lugar, os autos ensejavam a conversão em tomada de contas especial com a conseqüente citação do Sr. Valcir Leopoldo Nardelli para que pudesse exercer seu direito ao contraditório (fls. 283 a 285).
A citação foi realizada (fls. 286/287) e o ex-Prefeito de Rio do Oeste compareceu novamente aos autos juntando suas alegações de defesa (fls. 289 a 309).
A DDR, logo em seguida, elaborou o Parecer nº 05/2003 (fls. 312 a 328), cujas conclusões foram encampadas apenas parcialmente pelo Ministério Público (fls. 330/331) e pelo Relator (fls. 332 a 337).
Na Sessão Ordinária de 14/04/2003, o Processo n. TCE-6329801/92 foi levado à apreciação do Tribunal Pleno, sendo prolatado o Acórdão n. 0504/2003 (fls. 338/339), portador da seguinte dicção:
"VISTOS, relatados e discutidos estes autos, relativos à Tomada de Contas Especial pertinente a irregularidades praticadas no âmbito da Prefeitura Municipal de Rio do Oeste, nos exercícios de 1997 a 1999.
Considerando que o Responsável foi devidamente citado, conforme consta na f. 286 dos presentes autos;
Considerando que as alegações de defesa e documentos apresentados são insuficientes para elidir irregularidades apontadas pelo Órgão Instrutivo, constantes do Parecer DDR n. 05/2003;
ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro no art. 59 c/c o art. 113 da Constituição do Estado e no art. 1° da Lei Complementar n. 202/2000,
6.1. Julgar irregular, com imputação de débito, com fundamento no art. 18, inc. III, alínea "c", da Lei Complementar n. 202/2000, as despesas tratadas na presente tomada de contas especial:
6.1.1. Condenar o Responsável Sr. Valcir Leopoldo Nardelli - Prefeito Municipal de Rio do Oeste, portador do CPF n. 494.772.509-53 ao pagamento da quantia de valor de R$ 507,80 (quinhentos e sete reais e oitenta centavos), referente a despesas com viagem, sendo parte, R$ 433,70, pelo seu desvio de finalidade, caracterizando dispêndio sem caráter público, não abrangido pelo conceito de gasto próprio do Governo e da Administração centralizada, previsto no art. 4º c/c 12 da Lei Federal n. 4.320/64, e parte, R$ 74,10, pela ausência da documentação comprobatória da despesa, em afronta aos arts. 62 da Lei Federal n. 4.320/64 e 57 a 61 da Resolução n. TC-16/94 (item II.2 do Parecer DDR), fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial do Estado, para comprovar, perante este Tribunal, o recolhimento do valor do débito aos cofres do Município, atualizado monetariamente e acrescido dos juros legais (arts. 40 e 44 da Lei Complementar n. 202/2000), calculados a partir da data da ocorrência do fato gerador do débito, ou interpor recurso na forma da lei, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial (art. 43, inc. II, da Lei Complementar n. 202/2000).
6.1.2. Aplicar ao Sr. Valcir Leopoldo Nardelli - Prefeito Municipal de Rio do Oeste, com fundamento nos arts. 70, II, da Lei Complementar n. 202/00 e 109, II, c/c o 307, V, do Regimento Interno instituído pela Resolução n. TC-06/2001, as multas abaixo discriminadas, com base nos limites previstos no art. 239, III, do Regimento Interno (Resolução n. TC-11/1991) vigente à época da ocorrência das irregularidades, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial do Estado, para comprovar ao Tribunal o recolhimento ao Tesouro do Estado das multas cominadas, ou interpor recurso na forma da lei, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts. 43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000:
6.1.2.1. R$ 400,00 (quatrocentos reais), em face da não-realização de processo licitatório quando da aquisição de terreno, em descumprimento aos art. 37, XXI, da Carta Magna e 2º da Lei Federal n. 8666/93 (item II.3 do Parecer DDR);
6.1.2.2. R$ 400,00 (quatrocentos reais), em face da avaliação de terreno elabora- da fora do estabelecido pela NB-502, registrado no INMETRO como NBR 5676 (item II.3 do Parecer DDR).
6.2. Dar ciência deste Acórdão, do Relatório e Voto do Relator que o fundamentam, bem como do Parecer DDR n. 05/2003, ao Denunciante e ao Denunciado - Sr. Valcir Leopoldo Nardelli - Prefeito Municipal de Rio do Oeste."
Visando à modificação do Acórdão supra, o Sr. Valcir Leopoldo Nardelli interpôs o presente Recurso de Reconsideração.
É o breve relatório.
II. PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE
Considerando que Processo n. TCE-6329801/92 é relativo à conversão em tomada de contas especial do Processo nº DEN-6329801/92 que, por sua vez, tratou de Auditoria Especial para averiguação de supostas irregularidades praticadas na Prefeitura de Rio do Oeste nos exercícios de 1997 a 1999, tem-se que o Sr. Valcir Leopoldo Nardelli utilizou-se da espécie recursal adequada, em consonância com o art. 77 da Lei Complementar nº 202/2000.
Procedendo-se ao exame do recurso, verifica-se que o Recorrente possui plena legitimidade para a interposição do mesmo, tendo em vista as responsabilizações e multas a ele impostas no Acórdão nº 0504/2003.
Tendo-se em conta que o Acórdão recorrido teve sua publicação no Diário Oficial do Estado na data de 17 de junho de 2003 e que a peça recursal em exame fora protocolizada neste Tribunal no dia 17 de julho do mesmo ano, constata-se a observância da tempestividade necessária ao conhecimento da presente Reconsideração.
Destarte, restaram devidamente preenchidas as condições legais de admissibilidade do Recurso em análise.
1) Débitos constantes do item 6.1.1 do Acórdão nº 0504/2003:
6.1.1. Condenar o Responsável Sr. Valcir Leopoldo Nardelli - Prefeito Municipal de Rio do Oeste, portador do CPF n. 494.772.509-53 ao pagamento da quantia de valor de R$ 507,80 (quinhentos e sete reais e oitenta centavos), referente a despesas com viagem, sendo parte, R$ 433,70, pelo seu desvio de finalidade, caracterizando dispêndio sem caráter público, não abrangido pelo conceito de gasto próprio do Governo e da Administração centralizada, previsto no art. 4º c/c 12 da Lei Federal n. 4.320/64, e parte, R$ 74,10, pela ausência da documentação comprobatória da despesa, em afronta aos arts. 62 da Lei Federal n. 4.320/64 e 57 a 61 da Resolução n. TC-16/94 (item II.2 do Parecer DDR), fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial do Estado, para comprovar, perante este Tribunal, o recolhimento do valor do débito aos cofres do Município, atualizado monetariamente e acrescido dos juros legais (arts. 40 e 44 da Lei Complementar n. 202/2000), calculados a partir da data da ocorrência do fato gerador do débito, ou interpor recurso na forma da lei, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial (art. 43, inc. II, da Lei Complementar n. 202/2000).
Com relação ao débito de R$ 74,10, o Recorrente alega:
"O valor de R$ 74,10 refere-se as despesas com 05 (cinco) almoços, oferecidas as autoridades comunitárias do município de Rio do Oeste, quando em audiência junto ao Presidente do Tribunal de Justiça do Estado, com a participação de membros da ALESC e das lideranças políticas e comunitárias, no sentido de viabilizar a instalação de uma Comarca Judicial no Município.
Foram beneficiados com os almoços o Secretário Municipal de Administração, que não recebeu diárias, somente o pagamento das refeições; e 04 (quatro) membros da comunidade de Rio do Oeste, que não exercem funções no serviço público municipal, onde participaram da reunião justamente para reforçar as autoridades envolvidas a reivindicação da população de Rio do Oeste.
O Corpo Técnico do tribunal alega que não foram apresentados os documentos pertinentes a despesa, entretanto, cabe pondenrar que referido documento estava anexo a citada Nota de Empenho, tendo havido todas as fases da despesa, conforme estabelece a Lei nº 4.320/64.
Com a apresentação da documentação fiscal, fica demonstrado que a Prefeitura não infringiu os arts. 62 da Lei Federal n. 4.320/64 e 57 a 61 da Resolução n. TC 16/94."
Em que pesem as alegações do Sr. Valcir Leopoldo Nardelli, não encontramos anexa nos autos principais e nem no presente recurso a nota fiscal, no valor de R$ 74,10, documento comprobatório da efetiva liquidação da despesa.
Ressalta-se que, in casu, a irregularidade está consubstanciada não na finalidade pública da despesa mas sim na sua não-liqüidação, ou seja, o fato gerador do débito não estava na legalidade ou não do pagamento das refeições e sim na ausência de apresentação dos comprovantes da despesa.
Diante disso, o posicionamento desta Consultoria não pode ser outro que não a manutenção da responsabilização imputada.
Para a despesa no valor de R$ 433,70, o Recorrente afirma o seguinte:
"As despesas no valor de R$ 433,70, refere-se a participação da primeira dama do Município no Seminário sobre MUNICIPALISMO, realizado nos dias 10 a 13 de dezembro de 1997, promovido pela Assembléia Legislativa do rio Grande do Sul e FAMURS, e coordenado na nossa região pela Associação dos Municípios do Alto Vale do Itajaí.
O Corpo Técnico no Parecer Conclusivo n. 05/03, para considerar irregulares as despesas no valor de R$ 433,70, que se refere a divisão por dois, do total das despesas realizadas quando da participação do Prefeito e da Primeira Dama no dito Seminário, alega que:
"..., como a primeira dama não exerce função pública, os gastos da despesa desta senhora são irregulares, pelo desvio de finalidade,..."
Ora, não resta dúvidas que a Primeira Dama, no caso do município de Rio do Oeste, não exerce funções administrativas no Poder Público, não percebendo remuneração do Erário, no entanto, como não poderia deixar de ser, participava e participa ativamente das atividades inerentes a área social, filantrópica e assistencial.
Conforme pode-se observar da programação do Seminário, a participação da primeira dama era de suma importância, pois além de constar da programação, prendeu-se as suas participações na troca de experiências naquelas ações que o municipalismo lhes impõem, principalmente, no campo da assistencial e filantrópica.
Portanto, não houve desvio de finalidade da despesa pública, quando da participação no Seminário.
Ainda, há necessidade de ponderar que o investimento de R$ 433,70 para a participação da primeira dama no citado seminário, trouxe a população de Rio do Oeste benefícios voltados as ações de ordem social, assistencial e filantrópica de grande valia, pois os ensinamentos do dito evento foram repassados as demais entidades do Município, através de reuniões nos grupos de mães; melhor idade; centro comunitário, dentre outros.
Pretende o Sr. Valcir Nardelli eximir-se da responsabilização a ele imposta, tentando comprovar a finalidade pública da despesa.
Entretanto, tendo em vista que a Primeira Dama do Município não exercia nenhum cargo ou função pública, a participação dela em seminários não poderia ter sido suportada com verbas do erário. Tal dispêndio, além de ferir os dispositivos citados na decisão ora guerreada, também afronta o princípio da impessoalidade.
Sobre esse postulado, confira-se a doutrina de Hely Lopes Meirelles:
"O princípio da impessoalidade, referido na Constituição de 1988 (art. 37, caput), nada mais é que o clássico princípio da finalidade, o qual impõe ao administrador público que só pratique o ato para o seu fim legal. E o fim legal é unicamente aquele que a norma de Direito indica expressa ou virtualmente como objetivo do ato, de forma impessoal.
E a finalidade terá sempre um objetivo certo e inafastável de qualquer ato administrativo: o interesse público. Todo ato que se apartar desse objetivo sujeitar-se-á a invalidação por desvio de finalidade (...).
Desde que o princípio da finalidade exige que o ato seja praticado sempre com finalidade pública, o administrador fica impedido de buscar outro objetivo ou de praticá-lo no interesse próprio ou de terceiros. (...)
O que o princípio da finalidade veda é a prática de ato administrativo sem interesse público ou conveniência para a Administração, visando unicamente a satisfazer interesses privados, por favoritismo ou perseguição dos agentes governamentais, sob a forma de desvio de finalidade. Esse desvio de conduta dos agentes públicos constitui uma das mais insidiosas modalidades de abuso de poder (...)."1 (grifamos)
No compasso das considerações acima, nosso posicionamento é pela manutenção da responsabilização.
2) Multa constante do item 6.1.2.1 do Acórdão nº 0504/2003:
6.1.2.1. R$ 400,00 (quatrocentos reais), em face da não-realização de processo licitatório quando da aquisição de terreno, em descumprimento aos art. 37, XXI, da Carta Magna e 2º da Lei Federal n. 8666/93 (item II.3 do Parecer DDR);
O Recorrente alega que o art. 24, X, da Lei Federal nº 8.666/93 autoriza a aquisição de imóvel via dispensa de licitação, com a seguinte argumentação:
"(...) Portanto, fica evidenciado que o Corpo Técnico admitiu o cumprimento da Lei das Licitações, quando foi procedida a Avaliação do Terreno, e ainda, foi editada a Lei nº 1043/97, que no seu artigo 5º, assim estabeleceu:
"Para aquisição do imóvel objeto da presente, fica o município devidamente dispensado da realização de processo licitatório, em função da localização do mesmo condicionar a sua escolha, conforme dispõe o art. 24, inciso X, da Lei Federal nº 8.666/93 e suas alterações posteriores."
Assim, reafirmamos que a própria Lei Municipal nº 1.043/97, ao autorizar a aquisição do imóvel, definiu qual o imóvel a ser adquirido, e também os motivos da sua escolha.
Desta forma, com a ampla publicidade da Lei Municipal nº 1.043/97, ficou demonstrado que todos os munícipes, por seus representantes, participaram na discussão, avaliação e autorização ao Poder Executivo para a aquisição do terreno, atendendo-se assim, todos os procedimentos constitucionais e legais.
Dentre tais características e pressupostos que levaram a administração municipal em condicionar a sua escolha e dispensar processo de licitação, podemos destacar:
a) A privilegiada localização do imóvel, em área central do município, totalmente livre do flagelo das cheias;
b) As suas condições topográficas e de relevo, que permitiu ao município minimizar sensivelmente os seus custos de investimentos em infraestrutura, atendendo, assim, aos termos do convênio firmado com a Cohab para construção de casas populares naquele local;
c) A pré-existência de acesso mediante a existência de ruas já abertas que facilitaram sobre maneira o tráfego às residências que ali foram posteriormente edificadas, o que gerou substancial economia aos cofres municipais, que apenas teve que fazer as adaptações necessárias;
d) A desnecessidade de reurbanização daquele local, bem como, a possibilidade de futura ampliação do conjunto habitacional, sem maiores gastos e desnecessários investimentos;
e) Essas variantes, conjuntamente, consagram a singularidade e as características únicas daquele imóvel, não existindo no município, qualquer outro em idênticas condições;
Com relação à dispensa de licitação para aquisição de imóvel, citamos o Prejulgado nº 0539 desta Corte:
Prejulgado nº 0539 - "O Município é vedado desapropriar área de terras de propriedade de empresa de economia mista estadual, consoante dispõe o § 2° do artigo 2° do Decreto-Lei n° 3.365, de 21.06.41, que trata da desapropriação por utilidade pública.
É viável a aquisição de imóvel pelo Município, com dispensa de licitação nos termos preconizados pelo inciso X do artigo 24 da Lei n° 8.666/93, quando caracterizada a inviabilidade de competição, ou seja, a impossibilidade de o interesse público ser satisfeito com outro imóvel que não o escolhido.
É facultado à empresa de sociedade de economia mista alienar imóvel com dispensa de licitação para outro órgão ou entidade da Administração Pública, de qualquer esfera de governo, consoante dispõe o artigo 17, inciso I, alínea "e", da Lei Federal n° 8.666/93." (Processo: CON-TC0269602/70; Parecer: COG-004/98; Origem: Prefeitura Municipal de São Pedro de Alcântara; Relator: Conselheiro Dib Cherem; Data da Sessão: 04/03/1998)
Marçal Justen Filho, em sua obra "Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos", trouxe as lições que ora transcrevemos:
"A ausência de licitação deriva da impossibilidade de o interesse sob tutela estatal ser satisfeito através de outro imóvel, que não aquele selecionado. As características do imóvel (tais como localização, dimensão, edificação, destinação etc.) são relevantes, de modo que a Administração não tem outra escolha. Quando a Administração necessita de imóvel para destinação peculiar ou com localização determinada, não se torna possível a competição entre particulares. (...)
Há hipóteses em que dois (ou mais) imóveis atendem aos reclamos da Administração. Ainda que os imóveis sejam infungíveis entre si, surgirão com intercambiáveis tendo em vista a necessidade e o interesse da Administração Pública. Qualquer dos imóveis satisfará a exigência que justifica a aquisição pela Administração. Nesses supostos, a questão muda de figura e a licitação se impõe. Estarão presentes os pressupostos da competição.
Antes de promover a contratação direta, a Administração deverá comprovar a impossibilidade de satisfação do interesse sob tutela estatal por outra via e apurar a inexistência de outro imóvel apto a atendê-lo.
Deverá verificar-se a compatibilidade do preço exigido com aquele de mercado. A Administração não poderá pagar preço ou aluguel superior ao praticado para imóveis similares.
A contratação depende, portanto, da evidenciação de três requisitos, a saber: a) necessidade de imóvel para desempenho das atividades administrativas; b) adequação de um determinado imóvel para satisfação das necessidades estatais; c) compatibilidade do preço (ou aluguel) com os parâmetros de mercado"2
O Recorrente colaciona em sua defesa a argumentação que é coerente com a interpretação doutrinária dada ao art. 24, X, da Lei 8.666/93 para a possibilidade de realizar a compra de imóvel mediante dispensa de licitação.
A DDR ao sugerir a penalização, por sua vez, não contrapõe as justificativas e motivação trazidas pelo Sr. Valcir Nardelli a ponto de deixar claro que a realização de licitação, in casu, seria imprescindível.
Diante de todo o acima exposto, nos posicionamos pelo cancelamento da multa.
3) Multa constante do item 6.1.2.2 do Acórdão nº 0504/2003:
6.1.2.2. R$ 400,00 (quatrocentos reais), em face da avaliação de terreno elaborada fora do estabelecido pela NB-502, registrado no INMETRO como NBR 5676 (item II.3 do Parecer DDR).
Independentemente das alegações expostas pelo Recorrente no presente processo, deve ser cancelada a penalidade supra.
Denota-se que a NB-502 (ou NBR 5676) nada mais é do que uma norma da ABNT, portanto, não é "norma legal ou regulamentar de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional ou patrimonial", com dispõe o art. 70, II, da LC-202/00, que fundamenta a aplicação da multa em análise.
Esta Consultoria Geral, analisando recursos em que penalidades foram aplicadas com fundamento no art. 70, II, da Lei Orgânica do TCE, por violação a normas técnicas, resoluções, portarias ou outros atos normativos hierarquicamente inferiores à lei, tem posicionado-se no mesmo sentido, ou seja, pelo cancelamento das multas. Vejamos alguns exemplos:
"PEDIDO DE RECONSIDERAÇÃO. ADMINISTRATIVO. MULTA. ARTIGO 70, II DA LC N. 202/00. CANCELAMENTO.
Ocorre que a norma técnica da Celesc não pode ser elevada a categoria de norma legal (aquela derivada do Poder Legislativo, que obedece o processo de elaboração de lei) ou regulamentar (que trata-se de Decreto para regulamentação de lei), para a imputação da multa prescrita no inciso II do art. 70 da Lei Complementar 202/00.
À vista disso, entende esta Consultoria Geral que quaisquer violações a Resoluções e Instruções expedidas tanto pelo Tribunal como por outros órgãos não devem ser enquadradas no inciso II, do art. 70, da LC nº 202/00, quando não encontrarem correspondência com a respectiva norma legal ou regulamentar que lhe garanta legitimidade jurídica, haja vista que esse inciso cuida somente da chamada multa-sanção.
Assim, a norma técnica da Celesc, não tem "força" para ensejar a imputação da multa capitulada no art. 70, II da Lei Orgânica deste Tribunal de Contas, não podendo ser equiparada à norma legal ou regulamentar.
Aliás, não somente as normas técnicas, mas as resoluções, instruções normativas e portarias, não são fundamentos adequados para a aplicação da multa prevista no artigo 70 e incisos da Lei Complementar 202/2000, o que torna insubsistente a multa aplicada, por errônea fundamentação."3
"Recurso de Reconsideração. Administrativo. Intempestividade. Superação. Processo de Prestação de Contas de Administrador. Julgamento irregular, sem débito, com aplicação de multas. Conhecer e dar provimento.
O erro na identificação do Responsável, é motivo para superar a intempestividade, conforme o art. 135, § 1º, inciso III da Lei Complementar nº 202/2000.
A multa cominada pelo Tribunal recairá sempre na pessoa física que deu causa à infração, conforme o art. 112 do Regimento Interno.
Não existe grave infração a norma legal ou regulamentar que autorize a aplicação da multa quando a restrição fora fundamentada exclusivamente em Resolução do Conselho Federal de Contabilidade.
A multa aplicada com base no art. 70, II da Lei Orgânica implica na multa-sanção, que está relacionada com ilegalidade da despesa ou julgamento irregular das contas."4
Nesse sentido, não deve ser mantida a multa.
IV. CONCLUSÃO
Em conformidade com o acima exposto sugere-se ao Exmo. Relator que em seu Voto propugne ao Plenário por:
1. Conhecer do Recurso de Reconsideração, com fulcro no art. 77 da Lei Complementar n. 202/2000, interposto contra o Acórdão n. 0504/2003, de 014/04/2003, exarado no Processo n. TCE-6329801/92, e, no mérito, dar-lhe provimento parcial para:
1.1. Cancelar as multas constantes do item 6.1.2, subitens 6.1.2.1 e 6.1.2.2, da decisão recorrida.
1.2. Manter os demais termos do Acórdão nº 0504/2003.
2. Dar ciência à Prefeitura Municipal de Rio do Oeste e ao Sr. Valcir Leopoldo Nardelli - ex-Prefeito daquele Município.
COG, em 31 de agosto de 2007.
ANNE CHRISTINE BRASIL COSTA
Auditora Fiscal de Controle Externo
De Acordo. Em ____/____/____
À consideração do Exmo. Sr. Conselheiro Luiz Roberto Herbst, ouvido preliminarmente o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas.
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MARCELO BROGNOLI DA COSTA Consultor Geral |
1
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 27. ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 902
Dialética. 11ª ed. São Paulo: 2005. p. 250
3
Processo nº REC-03/04726605, Parecer COG nº 0062/06
4
Processo nº REC-04/00315190, Parecer COG nº 313/06