ESTADO DE SANTA CATARINA
    TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO
    CONSULTORIA GERAL

Processo n°: REC - 03/07360210
Origem: Prefeitura Municipal de São Domingos
RESPONSÁVEL: Pedro Altair Neves
Assunto: Recurso (Recurso de Reconsideração - art. 77 da LC 202/2000) -TCE-02/07673829 + PDI-02/02795748
Parecer n° COG-666/07

Recurso de Reconsideração. Prestação de contas. Autos Apartados. Conversão em Tomada de Contas Especial. Acumulação remunerada de cargos. Imputação de débito. Conhecer e negar provimento.

O art. 37, XVI, da Constituição Federal determina que é vedada a acumulação remunerada de cargos públicos. Ao Vice-Prefeito convidado a ocupar cargo comissionado, deve ser dado o direito de optar entre uma das duas remunerações.

Senhor Consultor,

RELATÓRIO

Tratam os autos de Recurso de Reconsideração interposto pelo Sr. Pedro Altair Neves - ex-Prefeito Municipal de São Domingos, em face do Acórdão n. 1282/2003, proferido nos autos do Processo n. TCE-02/07673829.

O citado Processo nº TCE-02/07673829 concerne à conversão em tomada de contas especial do Processo nº PDI-02/02795748 que, por sua vez, tratou de autos apartados da prestação de contas do exercício de 2000 daquela Prefeitura, visando ao exame da acumulação de remunerações dos cargos de Vice-Prefeito e Assessor de Planejamento, realizado, por esta Corte, pela Diretoria de Controle dos Municípios - DMU.

A equipe de inspeção da DMU, ao proceder a referida análise, elaborou o Relatório n. 379/2002 (fls. 11 a 15 do Processo PDI), sugerindo a conversão dos autos apartados em tomada de contas especial.

O Exmo. Relator, concordando com a sugestão da DMU, propôs ao Tribunal Pleno a conversão dos autos em tomada de contas especial e a conseqüente citação do Sr. Pedro Altair Neves para que apresentasse suas alegações de defesa acerca da irregularidade evidenciada (Decisão nº 1087/2002, de fls. 21).

O ex-Prefeito de São Domingos, em atendimento à citação, apresentou defesa e juntou os documentos que entendeu pertinentes (fls. 05 a 15 dos autos TCE).

Em seqüência, a DMU examinou as alegações e documentação carreadas aos autos e elaborou o Relatório n. 198/2003 (fls. 17 a 26). As conclusões emanadas por aquela Diretoria foram acatadas na íntegra, tanto pelo Ministério Público (fls. 28/29), quanto pelo Relator do feito (fls. 30/31).

Na Sessão Ordinária, realizada em 23/07/2003, o Tribunal Pleno julgou o Processo nº TCE-02/07673829, proferindo o Acórdão nº 1282/2003 (fls. 32/33) portador da seguinte dicção:

Inconformado com o decisum supratranscrito, o Sr. Pedro Altair Neves interpôs o presente Recurso de Reconsideração.

É o breve Relatório.

II. ADMISSIBILIDADE

Considerando que o Processo n. TCE-02/07673829 consistiu em tomada de contas especial, culminando no julgamento irregular com imputação de débito ao ora Recorrente, tem-se que o Sr. Pedro Altair Neves utilizou-se da espécie recursal adequada, em consonância com o art. 77 da Lei Complementar nº 202/2000.

Tendo-se em conta que o Acórdão recorrido teve sua publicação no Diário Oficial do Estado na data de 04/09/2003 e que a peça recursal em exame fora protocolizada neste Tribunal no dia 02 de outubro do mesmo ano, constata-se a observância da tempestividade necessária ao conhecimento da presente Reconsideração.

Destarte, restaram devidamente preenchidas as condições legais de admissibilidade do Recurso em análise.

O Recorrente procura eximir-se da responsabilização a ele imputada alegando que este Tribunal de Contas possuía, à época da ocorrência da irregularidade, entendimentos conflitantes acerca do tema.

Entretanto, não lhe assiste razão.

Os Prejulgados nºs. 216 e 218, citados pelo Sr. Pedro Altair Neves em sua peça recursal, expressavam as seguintes informações:

Ressalta-se que o Prejulgado nº 0218 já previa, quando vigente, que a acumulação somente poderia ocorrer se não houvesse norma impeditiva. Ora, a nova redação dada ao art. 37, XVI, da Constituição Federal, em virtude da EC-19/98 é até, por assim dizer, mais do que uma simples norma legal, é norma constitucional, afetando, igualmente, o art. 25, II, § 1º, da Constituição Estadual..

De outro norte, os Prejulgados citados pelo Recorrente foram editados antes (em 1994) da Emenda Constitucional nº 19/98, é claro que, por essa razão, não contemplaram o seu teor.

Ademais, não se pode alegar desconhecimento da lei para manter situações por ela vedadas. Ainda que este Tribunal tenha expressamente revogado os Prejulgados citados apenas em 2002, não resta dúvidas que, com o advento da EC-19/98, tacitamente todo e qualquer entendimento contrário estaria revogado.

O Recorrente segue alegando que, como o Vice-Prefeito não recebia "subsídio" e sim "verba de representação", a acumulação não seria vedada, consoante o entendimento desta Corte. Alega, também, que como a fixação da remuneração do Prefeito e do Vice fora feita para a legislatura 1997/2000, não seria da competência do Prefeito realizar qualquer tipo de alteração.

Restou comprovado nos autos principais que a "remuneração" do Vice era feita por meio de "verba de representação" e não por "subsídio". Portanto, in casu, a verba de representação possuía caráter remuneratório e não indenizatório como é de praxe. Nesse caso, não poderia ser aplicada a regra dos prejulgados citados pelo Recorrente, pois aqueles tratavam da verba de representação de caráter indenizatório e não remuneratório.

O Parecer COG nº 199/02 elucidou bem a questão:

"(...) Primeiramente o consulente deseja saber se pode adequar aos ditames constitucionais trazidos pela Emenda nº 19/98, o diploma legal que fixou os subsídios dos vereadores para a legislatura 2001/2004, haja vista que não houve a observância do art. 37, inciso XIII, da Constituição Federal 1, bem como foi instituída terminologicamente a expressão verba de representação aos subsídios do Presidente da Câmara, em desacordo com o disposto no art. 39, § 4º da Carta Federal 2.

Com efeito, a Emenda Constitucional nº 19 tratou os agentes políticos das várias esferas de governo de forma semelhante na questão de suas remunerações, dispondo no § 4º do artigo 39 sobre o pagamento exclusivo por subsídio, fixado em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou qualquer outra espécie remuneratória, obedecido, em qualquer caso, o disposto no art. 37, X e XI.

Esse novo texto constitucional, limitador da remuneração dos agentes políticos fixados em parcela única, salienta o caráter retributivo que se concedeu ao exercício do cargo político, igualando-o a vencimento, em troca do trabalho executado; ou seja, conferiu-lhe a natureza de retribuição pecuniária pelo exercício dessa função pública, garantindo-lhe o caráter alimentar e de subsistência.

Contudo, ao estabelecer a parcela única, extinguiu a possibilidade de fracionamento dos subsídios em parte fixa e parte variável. A Emenda determinou um só montante de subsídios ao qual não se pode adicionar qualquer outra parcela de natureza remuneratória.

É indubitável que o texto constitucional veda o pagamento de verba de representação aos agentes políticos, outrossim, não é razoável defluir que o Chefe do Poder Legislativo Municipal deva receber idêntico subsídio ao dos demais edis, tendo em vista o caráter peculiar da função que exerce.

Consoante a doutrina e jurisprudência dos Tribunais, a natureza jurídica da verba de representação tem indiscutivelmente caráter indenizatório ou compensatório.

A Enciclopédia Saraiva do Direito 3, define que "a expressão verba de representação exprime, na tecnologia administrativa, quantia destinada a custear despesas no exercício de cargos ou funções públicas. Tal verba é acrescida à remuneração ou vencimentos dos respectivos funcionários."

Plácido e Silva 4, explica que a verba de representação é "quantia que se destina a certos funcionários ou empregados, para que a apliquem em despesas concernentes à ostentação ou ao decoro e dignidade do cargo."

Na mesma esteira, Hely Lopes Meirelles 5, ao comentar sobre a remuneração do Prefeito Municipal, ensina que "a remuneração do Prefeito compreendendo o subsídio do cargo e a verba de representação, deverá ser fixada pelo plenário da Câmara, ao final de cada legislatura, para vigorar na subseqüente."

Prosseguindo na análise do tema, o saudoso administrativista apresenta também definições de subsídio e verba de representação. Em seu posicionamento , "o subsídio corresponde ao vencimento do cargo, e é o principal na retribuição pecuniária do Prefeito." Conceitua verba de representação como "retribuição pecuniária que se atribui ao prefeito em razão do desempenho da chefia do Executivo, que naturalmente acarreta despesas extraordinárias para o seu titular. Tal verba tem natureza compensatória dos gastos pessoais de representação do Município, e, por isso, independe de comprovação de sua aplicação, pois a despesa está presumida nos encargos sociais de seu beneficiário. Esta verba deverá ser fixada juntamente com o subsídio e terá o mesmo regime de imutabilidade ou mobilidade da remuneração principal."

Acrescenta, também, que "quanto à verba de representação, em bases razoáveis, ao presidente da Câmara, sempre foi admitida e se justifica pela sua natureza indenizatória de gastos inerentes e específicos da função representativa da chefia da Edilidade."

O ilustre professor José Nilo de Castro6 afirma que "ao Presidente da Câmara assegura-se o direito à percepção de subsídio diferenciado, para a indenização dos gastos inerentes e específicos na representação da Câmara Municipal."

(...)

Mediante o explanado, infere-se que não existe impedimento à alteração terminológica do art. 2º da Lei Municipal nº 1.506, de 30 de junho de 2000, referente ao subsídio do Presidente da Câmara, mantendo idêntico valor ao estabelecido pelo referido dispositivo, no sentido de substituir a expressão verba de representação por verba indenizatória, conforme sugestão do próprio signatário da consulta. (...)"

Denota-se que, apesar da remuneração do Vice-prefeito ser denominada equivocadamente de "verba de representação", esta possuía as características de subsídio e, por tal razão, não pode ser acumulada com a remuneração de assessor. A vedação encontra-se inscrita no art. 37, XVI, da Constituição Federal. Vejamos:

Esta Consultoria Geral tratou da questão em seu Parecer nº 383/01, cuja ementa conteve o seguinte:

O Recorrente, na qualidade de ordenador da despesa do Munícípio de São Domingos à época, tinha o dever de determinar ao Vice-Prefeito que optasse pela remuneração de um dos dois cargo, entretanto, nada fez a respeito, mantendo a continuidade dos pagamentos irregulares.

Diante das considerações acima, nosso posicionamento é pela manuntenção da responsabilização.

IV. CONCLUSÃO

Ante o exposto, sugere-se ao Exmo. Relator do processo que em seu Voto proponha ao Egrégio Plenário o que segue:

1. Conhecer do Recurso de Reconsideração, nos termos do art. 77 da Lei Complementar n. 202/2000, interposto contra o Acórdão n. 1282/2003, exarado na Sessão Ordinária de 23/07/2003, nos autos do Processo n. TCE-02/07673829, e, no mérito, negar-lhe provimento, ratificando na íntegra os termos da decisão recorrida.

2. Dar ciência à Prefeitura Municipal de São Domingos e ao Sr. Pedro Altair Neves - ex-Prefeito daquele Município.

  MARCELO BROGNOLI DA COSTA

Consultor Geral


1 "Art. 37 - (...)

XIII - é vedada a vinculação ou equiparação de quaisquer espécies remuneratórias para o efeito de remuneração de pessoal do serviço público."

2 "Art. 39 - (...)

§ 4º - O membro de Poder, o detentor de mandato eletivo, os Ministros de Estado e os Secretários Estaduais e Municipais serão remunerados exclusivamente por subsídio fixado em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória, obedecido, em qualquer caso, o disposto no art. 37, X e XI."

3 São Paulo, 1977.

4 Vocabulário Jurídico, 1ª ed., Rio de Janeiro.

5 Direito Municipal Brasileiro, Malheiros Editores, 8ª ed., 1996, ps. 498/499.

6 Direito Municipal Positivo. Belo Horizonte. Editora Del Rey. 1998. P. 125.