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TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO
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Processo n°: |
CON - 05/04260014 |
Origem: |
Prefeitura Municipal de Joinville |
Interessado: |
Marco Antonio Tebaldi |
Assunto: |
Consulta |
Parecer n° |
COG-757/07 |
Consulta. Administrativo. Trabalhista. Consórcio Público. Emprego em Comissão. Possibilidade.
A utilização do emprego em comissão, para atribuições de direção, chefia e assessoramento, por se tratar de uma forma de provimento regular, ainda que excepcional, pode ser efetivada de forma parcimoniosa nos Consórcios Públicos.
Senhor Consultor,
A consulta em exame apresenta 7 (sete) questionamentos acerca do instituto jurídico do Consórcio Público, figura agora regulamentada pela Lei Federal 11.107/05 e Decreto Federal 6.017/07.
A consulta foi inicialmente respondida pela Consultoria Geral (COG) através do parecer COG - 308/06 (fs. 11/26), da lavra do Dr. Hamilton Hobus Hoemke, no qual foram respondidos as 5 (cinco) primeiras indagações formuladas.
O Ministério Público de Contas, através do parecer nº 1141/07 (fs. 27/28), da lavra da procuradora Cibelly Farias, acompanhou o entendimento firmado pela Consultoria Geral.
Foram os autos conclusos ao Relator, Conselheiro Moacir Bertoli, que entendeu por devolver à COG para que o órgão de consultoria e controle verificasse os efeitos do Decreto Federal 6.017/07 sobre a resposta anteriormente formulada (firmada apenas com fulcro na lei 11.107/05) e perante o prejulgado nº 1776.
A Consultoria Geral exarou o parecer COG - 266/07 (fs. 30/39), da lavra da Dra. Valéria Rocha Lacerda Gruenfeld, que em síntese concluiu que o Decreto Federal nº 6.017/07 não produziu reflexos sobre as conclusões exaradas no parecer COG - 308/06 (fs. 11/26).
Contudo, a referida Auditora Fiscal de Controle Externo detectou que duas indagações (6 e 7) não haviam sido respondidas pelo parecer COG - 308/06 (fs. 11/26), o que a fez então produzir seu entendimento sobre a questão.
Tendo o processo retornado ao Ministério Público, novamente sob os auspícios da procuradora Cibelly Farias, o parquet acompanhou parcialmente o entendimento formulado pela Consultoria Geral, concordando no mérito, mas sugerindo a alteração do item 3 do prejulgado nº 1776 para adequação às disposições contidas na Lei Federal 11.107/05 e Decreto Federal nº 6.017/07.
De acordo com o parecer 3998/07 (fs. 40/45), da procuradora citada alhures, o item 3 do prejulgado nº 1776 não elenca todos os elementos que devem constar no protocolo de intenções e que estão dispostos nas normas que regulam o Consórcio Público.
Foram os autos conclusos ao relator que determinou a juntada aos autos de ofício da Federação Catarinense de Municípios (FECAM) - Of. Pres. Nº 333/07 - subscrito pelo seu presidente, Exmo. Sr. Prefeito de Sombrio, José Milton Scheffer (fs. 46/48).
Trata o documento de manifestação da FECAM em que assevera acerca da possibilidade dos Consórcios Públicos contarem com empregos em comissão para o exercício das atribuições de direção, chefia e assessoramento.
Através de despacho (fs. 46) o Relator, Conselheiro Moacir Bertoli, determinou que a Consultoria Geral considerasse as argumentações proferidas pela FECAM.
É o que passamos a fazer.
2 - PRELIMINARES DE ADMISSIBILIDADE
O Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina tem admitido que a Federação Catarinense de Municípios (FECAM) seja consulente em razão de seu presidente ser prefeito municipal, o que por conseguinte lhe confere legitimidade (art. 103, II, R.I.) para requerer deliberação desta Corte acerca de interpretação de lei sobre fato em tese.
Acontece que os presentes autos tratam de consulta originária da Prefeitura Municipal de Joinville, portanto formulada pelo chefe do executivo dessa municipalidade, única autoridade, portanto, que poderia subscrever nesse processo. Também poderia fazê-lo a assessoria jurídica do consulente, até porque seu parecer é requisito que deve ser observado, sendo elemento subsidiador da consulta (art. 104, V, R.I.). Dessarte, a FECAM está funcionando como um terceiro estranho à relação processual.
"A intervenção de terceiro é fato jurídico processual que implica na modificação de relação jurídica processual já existente. Trata-se de ato jurídico processual pelo qual um terceiro, autorizado por lei, ingressa em processo pendente, transformando-se em parte. São duas as premissas fundamentais da teoria geral da intervenção de terceiro:
a) terceiros são todos os sujeitos estranhos a dada relação processual, que se tornam partes a partir do momento em que intervenham;
b) o acréscimo de sujeitos à relação processual, em qualquer hipótese de intervenção, não importa criação de processo novo ou nova relação processual - a presença de um sujeito a mais torna a relação mais complexa, mas ela é sempre a mesma1."
A Lei Complementar Estadual nº 202, de 15 de dezembro de 2000, e o Regimento Interno (Resolução nº TC - 06/01) não prevêem acerca da possibilidade da intervenção de terceiros nos processos de consulta que tramitam perante esta Corte de Contas.
Nota-se, portanto, que o processo de consulta, por sua natureza, não admite a participação de mais de um consulente.
Portanto, em homenagem ao princípio da legalidade, não iremos considerar as informações prestadas pela FECAM, mas em respeito ao despacho de proferido pelo Relator, Conselheiro Moacir Bertoli, faremos explicações complementares acerca da possibilidade ou não da existência de emprego em comissão nos Consórcios Públicos.
O fato da possibilidade de existência do emprego em comissão ser controvertida, além do risco por qual passa a Administração Pública (altos dispêndios provenientes da rescisão contratual desses trabalhadores), fez com que a Consultoria Geral, através do parecer COG - 266/07, da lavra da Dra. Valéria Rocha Lacerda Gruenfeld, ao interpretar a Lei Federal nº 11.107/05 e o Decreto Federal nº 6.017/07 firmasse posicionamento restritivo no que concerne a possibilidade dos Consórcios Públicos possuírem empregos em comissão.
No referido parecer (COG - 266/07) expõe-se que os consórcios públicos devem constituir o quadro funcional tão somente com empregos públicos, cujo provimento se dá através de concurso, servidores cedidos pelos Entes Consorciados e por temporários, para atender necessidade de excepcional interesse público, porque, no entender da parecerista, a lei que regula o instituto jurídico dos Consórcios Públicos foi taxativa quanto às possibilidades de provimento, o que impossibilitaria o advento do emprego em comissão.
O posicionamento firmado pela Auditora Fiscal de Controle Externo foi bastante prudente, sobretudo quando sabemos que via de regra os cargos e os empregos em comissão (admitida sua possibilidade de existência) se destinam às pessoas de confiança daquele que o nomeou, que nem sempre possuem as aptidões necessárias ao bom desenvolvimento de suas atribuições e muitas vezes lá permanecem por indicações políticas sem ter qualquer domínio sobre a instituição e das suas respectivas incumbências, elementos norteadores do bom exercício do múnus público.
É importante aduzir que o direito não é estanque, mas sim dinâmico, portanto, em constante evolução. Além disso, a ciência jurídica percorre caminhos avessos às ciências exatas, não existindo muitas vezes uma única resposta ou interpretação correta na aplicação de uma norma. É o que nos apresenta a situação em estudo.
Assim, frente à possibilidade de existência ou não dos empregos em comissão os operadores do direito (conselheiros, pareceristas, advogados, magistrados, professores, acadêmicos, etc.) poderão ter dois caminhos a seguir, um restritivo (fechado), o outro liberal (aberto) admitindo tal figura em nosso ordenamento jurídico.
Ocorre que no inciso II do artigo 37 da Constituição da República, a Carta Magna do nosso país define a regra geral de investidura nos cargos e empregos públicos, que é o concurso público, mas ressalva os cargos em comissão não obedecerá essa regra. Também no inciso V do artigo 37 da Constituição da República não há nenhuma menção ao emprego em comissão, restringindo-se o dispositivo a tratar das funções de confiança para ocupantes de cargo efetivo e dos cargos em comissão, institutos destinados ao regime estatutário.
Os que asseveram pela impossibilidade da criação do emprego em comissão e que possuem posicionamento restritivo questionam o fato dessa figura jurídica não estar presente no Capítulo VII (Da Administração Pública) do Título III (Da organização do Estado), local onde deveriam estar presentes os dispositivos de onde emanariam às diretrizes que embasaria esse instituto jurídico. Os seguidores dessa linha de pensamento amparam-se no princípio da legalidade, ou seja, nós operadores do direito não poderíamos admitir e os legisladores infraconstitucionais criar um instituto jurídico não admitido pela Carta Magna, pois o Administrador Público só pode fazer o que a lei determina. Assim, como a Constituição da República não prevê essa regra de exceção ao concurso, o emprego público em comissão seria uma figura inadmissível.
É certo que ao se admitir a possibilidade dos empregos em comissão à luz da jurisprudência trabalhista sabe-se que tais empregados poderão receber inclusive, além do FGTS, a multa rescisória de 40% (quarenta por cento), ainda que sejam demissíveis ad nutum, por conta de serem vinculados ao regime da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT.
Esse é um risco inerente à adoção do regime celetista pela Administração Pública, sendo que tais dispêndios ocorrem também quando da demissão de empregado concursado, desde que não configurada a justa causa para a demissão, o que enseja, por conseguinte, a multa rescisória.
Importante transcrever parcialmente relatório e voto do então Conselheiro do Tribunal de Contas do Distrito Federal, Dr. Jorge Ulisses Jacoby Fernandes, que embasou a decisão nº 056/2006 do Pleno daquela Corte de Contas:
Em exame, nos autos, estudo quanto à possibilidade jurídica de serem criados cargos e empregos na administração indireta sem o requisito do concurso público.
Essa questão foi levantada quando, ao relatar o Processo nº 1.125/02, compreendi que o ponto estaria a merecer melhor análise. Aduzi, então, o seguinte:
Outra providência que entendo relevante é a formação de autos apartados para estudar a figura do emprego em comissão. Justifico: pela regra constitucional, conquanto as estatais devam seguir as normas aplicáveis às empresas privadas, contratando pela CLT, também devem subsumir-se ao dever de recrutar por concurso público. Desse modo, até mesmo pela liberalidade da regra constitucional, somente à lei, estrito senso, é permitido abrir exceção à regra do concurso público. Ao meu sentir, na Terracap, somente o cargo de Presidente e seus Diretores são passíveis de afastar a regra do concurso.
Aponta, o órgão técnico, posição favorável do Procurador Inácio Magalhães Filho à existência de tal instituto, desde que previsto em norma da entidade, com a aprovação dos órgãos competentes. Traz, em seguida, excerto de parecer daquele representante ministerial:
8. Não obstante as argumentações da Instrução, este Ministério Público entende necessário fazer algumas considerações a respeito da contratação de empregados comissionados não integrantes da Tabela de Empregos Permanentes por Empresa Pública e Sociedade de Economia Mista.
9. Pretende o inciso II do art. 37 da Constituição Federal estabelecer condições para a investidura em cargo ou emprego público. Dispõe a norma constitucional que a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração. De imediato, percebe-se que o constituinte previu a primeira exceção ao princípio quando expressa ressalva para os cargos de provimento em comissão. Tais cargos, de livre provimento e exoneração, permitem que pessoas estranhas, ou sem qualquer vínculo com a Administração Pública exerçam cargos de direção, chefia ou assessoramento.
10. Cumpre lembrar que a Administração Pública direta e indireta pode ou não adotar o regime trabalhista para a contratação de pessoal, podendo implantar o regime estatutário de caráter administrativo, empresas públicas e sociedades de economia mista e suas subsidiárias estão atreladas obrigatoriamente ao regime da iniciativa privada (art. 173, CF).
11. No regime celetista, a Administração equipara-se ao empregador particular, sem quaisquer prerrogativas especiais. Contudo, mesmo nessa hipótese, impõe-se à relação jurídica de trabalho preceitos de Direito Público, como: exigência de concurso público; vedação de acumulação de cargos e empregos; remuneração; não exigência de concurso público para empregos em comissão, etc...
12. Constitucionalmente, a competência legislativa para instituir normas sobre Direito do Trabalho é da União (competência privativa art. 22, I, CF), sendo que tais normas, via de regra, estendem-se a todos os empregados celetistas, de modo que normas instituídas pelos Entes de Direito Público, tratando de questões trabalhistas aplicáveis aos empregados, equivalem ao regulamento da empresa, obrigando apenas as partes ao seu cumprimento, desde que estejam em consonância com o sistema jurídico-nomativo trabalhista federal.
13. Nesse sentido a nomeação de empregado, sem concurso, em empresa pública é válida desde que os empregos em comissão estejam previstos no Plano de Carreira Cargos e Salários da Entidade, autorizado pelo Conselho de Política de Recursos Humanos CPRH da Secretaria de Gestão Administrativa do GDF e devidamente homologado pelo Governador do Distrito Federal, após aprovação da Diretoria Colegiada e referendum do Conselho de Administração.
14. Apesar do texto constitucional referir-se expressamente a cargo em comissão (art. 37, II), acolhendo a tese de que é possível a Administração Pública optar pelo regime trabalhista, necessariamente verificar-se-a empregos em confiança.
15. Não há óbice para a existência de emprego em confiança, já que a legislação trabalhista federal prevê sua existência (art. 450 e 62, II, CLT).
16. Ao comentar o art. 450, CLT, Sérgio Pinto Martins, afirma que:
A função de confiança estabelecida de acordo com o livre critério do empregador. Justamente por ser de confiança, o empregador nomeia quem quiser e tiver melhores condições de desempenhar essa função, segundo o seu livre arbítrio...
Os cargos em comissão são cargos de confiança do empregador, como de diretoria, de gerência, de chefia, de fiscalização etc...
17. Ao discorrer sobre cargo em comissão, o Jurista Manoel Gonçalves Ferreira Filho, assim manifestou:
Cargos em Comissão. Constituem cargos em comissão todos aqueles cujo preenchimento deve depender da confiança do nomeante para o bom andamento da administração. São, por isso, ditos também cargos de confiança. Tais cargos são aqueles pelos quais se transmitem diretrizes políticas, para a execução administrativa. Cumpre a seus titulares levar adiante essas linhas de ação, precisá-las em instruções se for o caso e fiscalizar a sua fiel execução. Conforme é de bom senso, essas funções não serão bem exercidas por quem não estiver convencido de seu acerto, não partilhar da mesma visão política. É, pois, essencial para a Democracia, na qual a linha política deve em última análise contar com o beneplácito do povo, que certos postos chaves na administração sejam ocupados por servidores devotados ao programa posto em prática pelas autoridades eleitas. Por isso, todo cargo em comissão é de livre nomeação e exoneração, prescindindo, obviamente, de concurso público para o seu preenchimento.
18. EGON GOTTSCHALK, citado por ARNALDO SÜSSEKIND, leciona que a admissão de um empregado em cargo de confiança dá-se, sempre e sem exceção, sob a condição, expressa ou tácita da demissibilidade ad nutum, que é inerente a este cargo (Grifou-se). O contrato, que tem por objeto serviço dessa natureza, é, por conseguinte, sempre um contrato condicional ; fica sujeito à condição resolutiva do enquanto bem servir, para usar um termo de direito administrativo, ou, melhor, enquanto gozar da confiança do empregador.
19. Como ensina José Afonso da Silva, justifica-se a exceção, porquanto tais cargos devem ser providos por pessoas de confiança da autoridade a que são imediatamente subordinadas. Demais, o titular assume-os em caráter passageiro. (grifou-se).
20. Hely Lopes Meirelles, ensina:
Cargo em Comissão - É o que só admite provimento em caráter provisório. Destina-se às funções de confiança dos superiores hierárquicos. A instituição de tais cargos é permanente, mas seu desempenho é sempre precário, pois quem os exerce não adquire direito à continuidade na função. (grifou-se)
21. Celso Bandeira de Mello, esclarece:
Os cargos de provimento em comissão (cujo provimento dispensa concurso público) são aqueles vocacionados para serem ocupados em caráter transitório por pessoa de confiança da autoridade competente para preenchê-los, a qual também pode exonerar ad nutum, isto é, livremente, quem os esteja titularizando. (grifou-se).
22. Pois bem. Deflui-se dos autos, que os contratos de emprego foram todos anotados em CTPS, sendo certo que o Plano de Cargos e Salário de 1995, no item 2 Empregos em Comissão e Funções Gratificadas permitiu a possibilidade de criação de empregos em comissão, de livre nomeação e exoneração pela Empresa (EC 1 a EC 8), respaldando-se em legislação infralegal (doc. Anexo); logo, os contratos de emprego mantidos pelos empregados comissionados com a Terracap são perfeitamente válidos, vez que não esbarram em óbice legal ou sequer constitucional, já que o inciso II, do art. 37, da CLT, dispensa da submissão a concurso público aqueles que foram nomeados para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração.
Em seu minudente trabalho, a 4ª ICE informa a juntada, pelo Ministério Público, de artigo de Rogério Neiva Pinheiro, atual Juiz do Trabalho substituto e ex-Advogado da União, acerca da figura do emprego em comissão. Comenta o seguinte:
7. Nesse documento, o mencionado Juiz do Trabalho apresenta diversas considerações acerca da questão em estudo, manifestando-se, em conclusão, pela incompatibilidade do emprego em comissão com a Constituição Federal. Algo que merece destaque na tese apresentada por esse magistrado diz respeito às reflexões oriundas de outros ramos do conhecimento que não só do Direito. Com efeito, há nesse escrito uma séria reflexão com embasamento na Ciência Política / Sociologia acerca do modelo de administração pública que deve preponderar na estrutura do atual Estado a teor da Constituição Federal. São as seguintes as considerações apresentadas no artigo em pauta, que conclui pela inconstitucionalidade do emprego em comissão:
* A relação jurídica de natureza profissional estabelecida entre os servidores públicos e o Estado pode dar-se de três modos: a) institucional-estatutária, b) contratual-empregatícia e c) prestação de serviços temporários. A primeira envolve a ocupação de cargo público em provimento efetivo ou em comissão; a segunda é a chamada relação celetista que depende de aprovação em concurso público, a teor do art. 37, II, da CF/88, com o que se compatibiliza o Enunciado 363 do TST, e a terceira, corresponde às contratações para atividades temporárias (art. 37, IX, CF/88 e OJ 263 do TST).
* Assim, salvo o empregado temporário, somente é possível a ocupação de cargo público ou de emprego público, podendo ser aquele em caráter efetivo ou em comissão. A ocupação de cargo em provimento efetivo e de emprego público depende de aprovação em concurso público.
* Disso decorre que somente está dispensada do concurso público a ocupação de cargo em comissão. Não há previsão constitucional para a ocupação de emprego público sem prévia aprovação em concurso público (emprego em comissão).
* O princípio da legalidade administrativa estabelece que o administrador, diversamente dos particulares, somente pode realizar aquilo que é permitido. Desse modo, uma vez que não há previsão constitucional para a criação de emprego em comissão, tem-se a incompatibilidade desse instituo com o ordenamento jurídico.
* A lógica constitucional e o modelo de Estado Moderno-Burocrático, baseado na idéia de impessoalidade administrativa, refutam a admissão do emprego em comissão. Tal modelo de Estado representa a ruptura com o paradigma do Estado Patrimonial, em que há confusão entre o interesse privado do administrador e o interesse público.
* O princípio da impessoalidade (art. 37 da CF/88) inspira o primado do livre acesso aos cargos públicos, o qual também se vincula ao princípio da isonomia e este impõe a realização de concursos públicos como condição para a formação de vínculos profissionais com o Estado.
* Tendo em vista que a noção de Estado Burocrático foi adotada no art. 37 da CF/88, a regra geral é que o ingresso nos quadros da Administração se faça mediante concurso público, sendo a ocupação de função pública de livre nomeação e exoneração a exceção.
* Considerando que o art. 61 da CF/88 exige lei apenas para a criação de empregos e cargos públicos no âmbito da Administração Direta, Autárquica e Fundacional, a admissão de emprego em comissão implicaria aceitar a abertura da porta para a promiscuidade administrativa (distribuição de emprego entre familiares, militantes-partidários, etc), sem o controle do Poder Legislativo, já que, em princípio, não se exige lei para a criação de emprego público.
* Quanto à questão da estabilidade, os empregados concursados e os ocupantes de emprego em comissão estariam equiparados quanto ao grau de manutenção do vínculo empregatício.
* As considerações acima não afastam a conclusão de que a ocupação dos quadros de direção das estatais é de livre escolha do Chefe do Poder Executivo e a relação jurídica entre os dirigentes e a Administração corresponde ao exercício de mandato, não ostentando natureza empregatícia (em. 269 do TST).
* Conclui o autor, então, pela incompatibilidade do emprego em comissão com a Constituição Federal.
Prossegue, o órgão técnico, aderindo à tese supra transcrita, a sua argumentação, posta nos seguintes termos:
8. Com efeito, a superação da fase do patrimonialismo tem sido uma constante nas últimas constituições brasileiras, com destaque para a Carta de 1988. Nesse ponto, cumpre destacar uma rápida lição do Professor MAURÍCIO GODINHO DELGADO, que trata desse tema sob a ótica do Direito e da Ciência Política/Sociologia. Na parte de seu livro em que trata da Terceirização na Administração Pública, o respeitado professor demonstra a impossibilidade de se reconhecer vínculo empregatício com entidades estatais, mesmo em se tratando de terceirização ilícita. E algo que merece atenção é a forma como o autor apresenta a importância que o concurso público exerce para a formação do requisito formal para o reconhecimento da relação de emprego entre o empregado e a Administração e seu significado como instrumento de ruptura da cultura patrimonialista. Assim esclarece o autor (in Curso de Direito do Trabalho, 3ª ed. LTR, São paulo, 2004, p. 446):
Para a Constituição, a forma passou a ser, portanto, da essência do ato de admissão de trabalhadores em entes estatais (arts. 82, 130 e 145, III, Código Civil de 1916).
O que pretendeu a Constituição foi estabelecer, em tais situações, uma garantia em favor de toda a sociedade, em face da tradição fortemente patrimonialista das práticas administrativas públicas imperantes no país. Tal garantia estaria fundada na suposição de que a administração e patrimônios públicos sintetizam valores e interesses de toda a coletividade, sobrepondo-se, assim, aos interesses de pessoas ou categorias particulares.
Sobre o conceito de patrimonialismo, o respeitado autor lembra que:
A Ciência Política tem compreendido como patrimonialismo a prática habitual das elites políticas de submeterem o interesse público e o cotidiano administrativo do Estado aos estritos interesses setoriais e particulares dessas mesmas elites.
9. Retomando ao Parecer n.º 60/2004-IMF e ao artigo de fls.4/6, percebe-se que a conclusão a que chegou o mencionado magistrado é diversa daquela eleita pelo Ministério Público de Contas do DF. Parece não haver incorreções nos raciocínios apresentados em ambas as teses. As considerações nelas expostas conduzem às respectivas conclusões. Dentro da lógica formal, ambas se apresentam perfeitas. A divergência observada entre uma e outra deve-se ao perfil ideológico que orientou um e outro especialista. No parecer ministerial visualiza-se uma postura mais liberal que permite retirar do texto da Constituição Federal a possibilidade de dar ao administrador público maior flexibilidade na alocação de empregados públicos. Admite-se, nesse raciocínio, a possibilidade de se criarem opções não expressamente previstas na Carta, como a do polêmico emprego em comissão. Para tanto, o representante do parquet admite o emprego em comissão como um instituto pararelo do cargo em comissão na relação celetista. Já o artigo oriundo do Magistrado trabalhista pauta-se por uma leitura da Constituição apoiada na premissa de que o Estado Burocrático representa o modelo eleito pela Carta de 1988 e inspira os princípios da impessoalidade e da isonomia e impõe a ruptura da prática patrimonialista na ocupação dos cargos e empregos públicos.
10. Pode-se observar que em ambas as teses há algo de positivo. Na primeira, visualiza-se uma interpretação da Constituição menos literal e, por conseguinte, mais voltada para o alargamento de possibilidades não expressamente previstas, como uma espécie de analogia ou interpretação extensiva. Na segunda, observa-se uma preocupação em assentar os princípios eleitos pela Constituição que devem orientar a Administração Pública e fazer uma leitura das regras constitucionais sem descuidar da abrangência normativa dos princípios.
11. Com relação à pratica patrimonialista na condução da coisa pública, é preciso não olvidar que a prática observada na administração direta reflete um total descompasso com o mandamento constitucional contido no art. 37, V, da Carta, que assim estabelece: As funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento.
12. Na verdade, não se tem observado tal mandamento. E o que deveria ser a exceção tornou-se regra. No âmbito do Distrito Federal tem-se o exemplo da CLDF que tem mantido imenso quantitativo de cargos em comissão ocupados por servidores alheios à administração e que exerciam atividades não referentes a atribuições de chefia, direção e assessoramento, fato que tem recebido a impugnação desta Corte de Contas e do Ministério Público local (Vide Processo n.º 1.531/2003).
13. Para se chegar a uma conclusão acerca da impossibilidade de se criarem empregos em comissão nas entidades da Administração indireta, cumpre indagar: o fato de não haver autorização expressa na CF/88 acerca do emprego em comissão de livre provimento e exoneração constitui um silêncio eloqüente? A resposta parece apontar para um sim. A propósito, veja-se a ementa da decisão exarada no Processo n.º 12331/2003-RO-0 e 00872-2001-122-15-00-0 pelo Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região São Paulo:
É claro o texto constitucional ao permitir as nomeações para cargo em comissão declarado por lei de livre nomeação e exoneração (artigo 37, II), utilizando-se do silêncio eloqüente para vedar a nomeação para emprego em comissão.
Aliás, por ser nomeado por agente político e deste depender sua permanência no cargo, também o nomeado se torna agente político. E agente político não tem e não pode ter os mesmos direitos dos trabalhadores concursados.
Mas mesmo que permitido fosse a nomeação para emprego em comissão, por certo que o aviso prévio e multa do FGTS seriam de todo incompatíveis com a fidúcia deste contrato que permite a imediata rescisão mediante a perda da confiança existente entre nomeado e nomeador.
14. No Parecer n.º 60/2004-IMF, são mencionados os artigos 450 e 62, inciso II, da CLT como sendo dispositivos da legislação trabalhista que prevêem o emprego em confiança. Nesse ponto pede-se vênia para apresentar um breve esclarecimento, no sentido de registrar que, realmente, há previsão nesses dispositivos de cargo em comissão, cargo de gestão, etc., mas não há previsão de autorização de dispensa de aprovação em concurso público nos casos em que o concurso público constitui pressuposto para a validade do contrato de trabalho. Veja-se o teor de ambos os dispositivos, destacando-se que a CLT utiliza freqüentemente as expressões cargo e emprego para se referir a emprego.
Art. 450. Ao empregado chamado a ocupar, em comissão, interinamente, ou em substituição eventual ou temporária, cargo diverso do que exercer na empresa, serão garantidas a contagem do tempo naquele serviço, bem como volta ao cargo anterior.
Art. 62.Não são abrangidos pelo regime previsto neste capítulo:
II os gerentes, assim considerados os exercentes de cargos de gestão, aos quais se equiparam, para efeito no disposto neste artigo, os diretores e chefes de departamento ou filial.
15. De se notar que o art. 450 rege a situação do empregado (pertencente aos quadros da entidade empregadora) que é chamado a exercer, interinamente ou em eventual substituição, cargo diverso daquele que exercia em caráter efetivo. Neste caso, o ordenamento garante o retorno ao cargo de origem e a contagem do tempo em que exerceu a função comissionada. Trata-se das chamadas chefias provisórias referidas por Valentin Carrion.
16. A ocupação de função de confiança, no regime celetista, implica alteração do contrato de trabalho e não um provimento de emprego, pois o empregado, deixando de exercer a função comissionada, retorna à ocupação anterior. Com efeito, o parágrafo único do art. 468 da CLT dispõe que não é considerada alteração unilateral a determinação do empregador para que o respectivo empregado reverta ao cargo (emprego) efetivo, anteriormente ocupado, deixando o exercício de função de confiança.
17. Quanto ao disposto no art. 62, inciso II, cabe considerar que a norma nele inserida visa a esclarecer que não fazem juz ao cálculo de horas extraordinárias os trabalhadores cuja prestação não se sujeita à fiscalização e controle por parte do empregador. É o caso dos gerentes que se equiparam aos chefes de departamento, de filial, etc. De se notar que os tipos mencionados no art. 62, II, da CLT não são empregados comuns, mas sujeitos especiais. Para Valentin Carrion, o conceito legal contido no art. 62, II, é o mais próximo que possuímos para o cargo de confiança, inobstante a previsão legal (art. 499) de outros cargos de confiança.
18. Em suma, os sujeitos a que se refere o art. 62, inciso II, mais se equiparam aos diretores/gerentes que, conjuntamente com o presidente da entidade estatal, não firmam contrato de trabalho, mas assumem mandato sob a confiança do chefe do Poder Executivo.
19. Essas considerações concorrem para mostrar que não há sentido para a existência de emprego em comissão nas entidades estatais de natureza privada. A uma, porque não há previsão na Carta da República, que erigiu o concurso público como requisito de validade do contrato de trabalho firmado por tais entidades; a duas, porque o próprio regime celetista já possui a solução para que o Executivo possa escolher os dirigentes das estatais entre pessoas de sua confiança e estes podem, dentro do quadro de empregados (já selecionados em concurso público), deliberar quem é possuidor de sua confiança para ocupar as funções comissionadas.
20. Assim, deve prevalecer a CLT, que, em nenhuma parte, é incompatível com a regra do concurso público como requisito de validade do contrato de trabalho firmado entre o empregado e a entidade estatal e oferece a possibilidade de se criarem funções comissionadas a serem ocupadas por integrantes do quadro de empregados efetivos e ainda prevê a figura do diretor, gerente e assemelhados, que não possuem vínculo empregatício. E estes, sim, podem ser admitidos sem concurso público, por que não ocupam emprego público, mas representam a entidade em decorrência de mandato, ou, como entendem os estudiosos do Direito Societário, constituem órgãos da companhia.
O Professor MARLON TOMAZETTE critica a concepção que identifica uma natureza contratual na relação entre administrador e a companhia. O referido professor acompanha o pensamento de Fábio Ulhoa Coelho, para afastar a tese de existência de relação empregatícia entre os administradores e a companhia e declara constituírem tais sujeitos órgãos da companhia (in Direito Societário, 2ª ed., atualizada. São Paulo, Juarez de Oliveira, 2004, págs. 382/384).
21. Em relação ao que os doutrinadores administrativistas comentam acerca do regime jurídico dos agentes públicos, não foi possível identificar, entre os mais renomados, uma alusão expressa à possibilidade jurídica de criarem empregos públicos nas estatais. O jurista CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, admite a possibilidade de as estatais que explorem atividade econômica contratarem, sem o processo do concurso público, profissionais de alta especialização. Tal exceção seria tolerável apenas nos casos em que o concurso público emprestasse óbice à captação desses profissionais especializados e o não recrutamento destes implicasse bloqueio ao desenvolvimento das atividades essenciais da estatal. O mesmo autor admite também que uma estatal possa fazer uso do contrato temporário na hipótese do art. 37, IX, da CF/88 (necessidade transitória e excepcional interesse público). Como essa hipótese não se insere no objeto do presente estudo, optou-se por não comentar tal posicionamento doutrinário.. Veja-se que o referido jurista não defende a criação de empregos em comissão de forma livre, mas somente em situação excepcionalíssima. Merecem destaque as seguintes considerações do referido jurista:
O que a Lei Magna visou com os princípios da acessibilidade e do concurso público foi, de uma lado, ensejar a todos iguais oportunidades de disputar cargos e empregos na Administração direta e indireta. De outro lado, propôs-se a impedir tanto o ingresso sem concurso, ressalvadas as exceções previstas na Constituição, (...).
Posto que as normas sobre acessibilidade e concurso público são impositivas para todo o universo da Administração, sociedades de economia mista e empresas públicas também estão sujeitas a elas.
Ressalve-se, todavia, que as pessoas estatais constituídas para exploração de atividade econômica disporão de liberdade para contratar diretamente seus empregados nas hipóteses em que (a) a adoção de concurso público tolheria a possibilidade de atraírem e captarem profissionais especializados que o mercado absorve com grande presteza e interesse ou (b) nos casos em que o recurso a tal procedimento bloquearia o desenvolvimento de suas normais atividades no setor.
22. Na linha de entendimento contrária à adoção de empregos em comissão, tem-se que a solução encontrada por CELSO ANTÔNIO poderia ser substituída por outros meios de contratação de profissionais de alta capacitação técnica. Há o processo de licitação disciplinado pela Lei n.º 8.666/93, norma essa que, inclusive, prevê hipótese de inexigibilidade para a contratação de serviços técnicos profissionais especializados (art. 25, II). Não se trata de estabelecimento de vínculo empregatício, mas de contratação (contrato de natureza civil/administrativa) de profissionais que possuem notória especialização. Outro meio é a criação, no quadro da entidade estatal que exerça atividade empresarial, de um emprego com remuneração compatível com aquela ofertada no mercado. Neste último caso, a exigência de um concurso público não deve ser vista como óbice ao recrutamento, pois o melhor profissional deve ser selecionado pelo critério do mérito. Se a CEB ou a CAESB necessitam em caráter permanente de um engenheiro com notória especialização, devem criar um emprego especial no seu quadro (uma espécie de engenheiro X) e prever remuneração adequada. No momento em que esse profissional não mais satisfizer o interesse dessas companhias, existe a via da demissão imotivada à disposição do administrador. De se recordar que o egrégio Tribunal Superior do Trabalho possui jurisprudência consolidada no sentido de reafirmar a aplicação ampla do regime celetista às relações empregatícias no âmbito das estatais, a teor do art. 173, II, da CF/88. De acordo com a OJ n.º 247 da SBDI I do TST, o empregado público celetista, contratado mediante aprovação em concurso público, pode sofrer despedida imotivada. Tal entendimento deriva de um outro, também já consolidado (Enunciado de Súmula n.º 390, II), segundo o qual o empregado celetista não goza da estabilidade prevista no art. 41 da CF/88.
23. A realidade brasileira, marcada por expressivo desemprego, parece mesmo estimular a exigência do concurso público, inclusive para empregos especializados. No penúltimo concurso para este Tribunal, por exemplo, foram selecionados quatro engenheiros oriundos do ITA Instituto Tecnológico da Aeronáutica, uma das mais respeitadas instituições de engenharia brasileira e cujos profissionais nele formados costumam ser prontamente recrutados pela iniciativa privada. Destes quatro, três continuam no serviço público e um preferiu enfrentar o promissor e arriscado mercado de capitais. Cabendo registrar que um deles continua no serviço público, mesmo após concluir doutoramento em renomada universidade americana.
24. Defende-se, portanto, ao contrário do que preconiza CELSO ANTÔNIO, que o fato de haver grande interesse na captação de profissionais altamente especializados pelo mercado não deve ser fator autorizativo de contratação sem concurso pelas estatais. Ademais, o recrutamento mediante livre arbítrio do administrador não traz nenhuma garantia da permanência desses profissionais na entidade.
25. A matéria objeto do presente estudo apresenta-se tormentosa. Não tem sido enfrentada pelos tribunais, salvo em um ou outro caso e, na maioria das vezes, a existência do emprego em comissão não constitui a matéria em controvérsia. Entre os doutrinadores mais renomados, CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO destaca-se por admitir uma exceção ao concurso público nas estatais em caso especialíssimo, conforme já anotado. No corpo destes autos constam dois respeitáveis textos com conclusões opostas um pela constitucionalidade e outro pela inconstitucionalidade da adoção de empregos em comissão sem concurso público.
26. Mas, na busca de oferecer uma conclusão acerca do tema posto, optou-se por uma resposta pautada pela valorização dos princípios que representam a expressão maior do arcabouço jurídico da República brasileira. Nesse ponto, deu-se prioridade à idéia de rompimento com práticas patrimonialistas na ocupação de empregos públicos, defendendo-se os métodos de recrutamento calcados nos primados constitucionais da impessoalidade e da isonomia. Defende-se que as pessoas jurídicas estatais de direito privado sigam o regime jurídico celetista nas relações com seus empregados, conforme ordenado pelo art. 173. II, da CF/88, sem olvidar do concurso público para a seleção baseada no mérito.
27. Nesse sentido opina-se por que o Tribunal acolha o entendimento, também exposto no artigo da lavra do Dr ROGÉRIO NEIVA PINHEIRO, que conclui pela incompatibilidade do emprego em comissão com a ordem constitucional. A tese ora defendida pode ser sistematizada da seguinte forma:
1 - A Administração Indireta compreende Autarquias, Fundações Públicas, Sociedades de Economia Mista e as Empresas Públicas;
2 - Empresa Pública e Sociedade de Economia Mista são entidades de direito privado e seus empregados possuem vínculo laboral de natureza celetista (art. 173, II, CF/88);
3 - A criação de emprego em comissão nessas entidades de direito privado é incompatível com a Constituição da República.
Feita a remessa dos autos ao Ministério Público, apresenta o ínclito Procurador Inácio Magalhães Filho alentado estudo em favor de sua posição favorável à existência do instituto. Considerando-se a pujança de seus argumentos, cumpre transcrevê-lo, na íntegra:
DA REDEFINIÇÃO DO PAPEL DO ESTADO
6. Antes de adentrar o mérito jurídico do problema ora enfrentado, mister se faz voltar os olhos à forma com que o Estado moderno vem tratando as questões atinentes à sua atuação no convívio social. Isso porque, em linhas gerais, a interpretação a que se procede de um preceito legal é sobejamente influenciada pela dinâmica estatal.
7. Desvencilhar-se do patrimonialismo foi, sem dúvida, um dos pilares da Constituição de 1988. Nota-se, em diversas passagens da Lex Mater , a intenção clara do legislador em liberar as amarras que prendiam o Estado à prática de políticas que submetiam o interesse público aos interesses particulares de poucos.
8. Nesse sentido, percebe-se que a Constituição dispensou, no artigo 37, série de preceitos que dão contornos rígidos à atuação da Administração Pública, legiferando, como exemplo, sobre a forma de criação de cargos, vencimentos de servidores e regras para compras de bens e serviços pelo Estado. Pontificaram-se, inclusive, cinco princípios basilares aos quais está submetida a Administração, donde ressai o da legalidade a funcionar como escudo às investidas vetustas do patrimonialismo.
9. Nesses termos, a Administração Pública burocrática surge, na metade do século XIX, como uma tentativa de combater a corrupção e o nepotismo inerentes ao patrimonialismo. Em realidade, esse modelo concebido por Max Weber representava um conjunto de princípios orientadores que impessoalizam a relação entre os administradores e os servidores, na exata medida em que estes passam a compor uma burocracia, ou seja, um corpo de funcionários profissionais, alheios às indicações políticas, voltados unicamente para o serviço público, tendo por base o exercício de um poder legitimamente definido em lei.
10. Dentro da perspectiva abalizada no modelo burocrático, a atuação do Estado passa a ser completamente vinculada a procedimentos rígidos, daí, talvez, exarcebando-se a interpretação muito restrita das normas constitucionais. De fato, a burocracia weberiana pregava a Administração como um corpo neutro e impessoal. Todavia, passava a ser extremamente autoreferida, ou seja, não preocupada com o resultado da atuação estatal.
11. É de se ver, contudo, que o modelo burocrático sofreu diversas críticas ao longo dos anos , culminando com a reforma do aparelho do Estado que conduziu a Administração a uma fase que pode ser denominada de gerencial, cujo foco passou a ser o controle dos resultados da ação estatal.
12. Nasce dessa nova concepção da Administração Pública o conceito de permitir ao legislador que torne mais flexível a condução da máquina pública. Deriva daí a idéia de adotar, no campo jurídico, interpretação sistemática, de forma a permitir mais agilidade aos entes públicos, notadamente aos pertencentes à órbita da Administração Indireta, que necessitam muito mais desses ingredientes do que aqueles da Administração Direta. Evidentemente, tal forma de agir não pode prescindir do liame indevassável da legalidade.
DA ANÁLISE JURÍDICA DO EMPREGO EM COMISSÃO
13. Não obstante a realização de concurso público seja regra para investidura em cargos e empregos públicos, a própria Constituição faz ressalvas quanto a essa imperatividade.
14. De fato, dispõe o inciso II, do Artigo 37, da CF que:
a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração (destacou-se)
15. É bem verdade que o texto legal não faz explícita menção ao emprego em comissão. Nem precisava. Veja-se que, se para o cargo em comissão (oriundo da administração direta) o próprio constituinte possibilitou exceção, qual seria o motivo para não estender esta aplicação aos entes da Administração Indireta, sabidamente mais flexíveis quanto ao controle que sobre eles exerce o poder público ?
16. Quer parecer que o conceito de cargo expresso na norma está em seu sentido lato, aí abrangendo também o emprego em comissão.
17. Discutindo sobre o tema, José Eduardo Martins Cardozo analisa:
embora o artigo 37, II, da Constituição Federal não inclua expressamente na exceção que estabelece ao princípio do concurso público os empregos de confiança em empresas públicas e sociedades de economia mista, estas hipóteses devem ser por analogia consideradas incluídas neste campo de excepcionalidade. A mesma "ratio' que justifica a exceção constitucional para os cargos públicos da Administração Direta e autárquica aponta para a necessidade desta ser estendida também para as atividades funcionais de confiança nas entidades de direito privado.
18. Questão importante para mapear o debate diz respeito à interpretação do preceito constitucional. Nesse aspecto, é cediço na doutrina que a interpretação literal de uma norma não é o caminho mais eficaz para subtrair-lhe a essência. De fato, há que ponderar princípios de interpretação constitucional para garantir maior correção.
19. Sob esse prisma, cabe obtemperar que a valoração desses princípios deve ser feita caso a caso, observando-se limites e condicionamentos recíprocos. Trata-se de harmonizar o texto constitucional, porquanto dele não pode advir antinomia.
20. A norma encontrada no artigo 37, da CF, portanto, não pode discrepar de outros normativos insculpidos no próprio texto constitucional. Tal assertiva decorre, primacialmente, do princípio da unidade da Constituição, que, como defendido por diversos doutrinadores, sempre sobrepõe-se às regras. De fato, o princípio mencionado resulta em que todas as normas constitucionais devem ser interpretadas de tal maneira que se evitem contradições com outras normas também de caráter constitucional.
21. O princípio da unidade da Constituição impõe ao intérprete, nas palavras de Canotilho , "buscar harmonizar os espaços de tensão existentes entre normas constitucionais a concretizar". O hermeneuta deve entender a Carta Magna como um sistema unitário de normas e princípios.
22. Convém trazer à discussão o tema da interpretação, porque em diferentes artigos da CF/88 tem-se claramente que o poder constituinte originário permitiu a existência do emprego em comissão.
23. No artigo 54, tem-se que:
Art. 54. Os Deputados e Senadores não poderão:
I - desde a expedição do diploma:
a) firmar ou manter contrato com pessoa jurídica de direito público, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista ou empresa concessionária de serviço público, salvo quando o contrato obedecer a cláusulas uniformes;
b) aceitar ou exercer cargo, função ou emprego remunerado, inclusive os de que sejam demissíveis "ad nutum", nas entidades constantes da alínea anterior.
24. Ora, vê-se na alínea "b" que a menção a emprego remunerado só pode referir-se a emprego em comissão na Administração Indireta: primeiro, porque o próprio inciso faz remissão a alínea anterior, a qual trata de empresa pública e sociedade de economia mista; segundo, porque só tem sentido falar-se em demissão "ad nutum" para emprego nessas entidades, eis que na iniciativa privada, salvo exceções como a estabilidade provisória, a regra é exatamente a da demissão a qualquer tempo, a juízo do empregador.
25. Se não bastasse o dispositivo citado, cabe também trazer à baila o enunciado do artigo 19, § 2º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, que, pela clareza, bem elucida o caso:
Art. 19. Os servidores públicos civis da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, da administração direta, autárquica e das fundações públicas, em exercício na data da promulgação da Constituição, há pelo menos cinco anos continuados, e que não tenham sido admitidos na forma regulada no art. 37, da Constituição, são considerados estáveis no serviço público.
§ 2º - O disposto neste artigo não se aplica aos ocupantes de cargos, funções e empregos de confiança ou em comissão, nem aos que a lei declare de livre exoneração, cujo tempo de serviço não será computado para os fins do "caput" deste artigo, exceto se se tratar de servidor
26. A tese ora defendida encontra amparo também na Corte de Contas Federal, segundo se pode observar neste excerto advindo do Processo nº 010.987/2004-8:
28. O raciocínio desenvolvido pelo Analista da Serur, citando trecho da manifestação do Analista da Secex/RJ que atuou inicialmente no processo, é de que os tais assessores externos não podem constituir funções de confiança porque estas são exclusivas dos servidores ocupantes de cargo efetivo. Também não são cargos em comissão, porque estes dependem de lei para serem criados. Assim, conclui que não há previsão normativa para a contratação desses assessores sem concurso público.
29. Entendo que tal interpretação não é a mais adequada. Inicialmente, cabe observar que a redação dos citados dispositivos constitucionais emprega uma terminologia que usualmente se utiliza para a administração direta. Fala-se em cargos e servidores (com relação à administração indireta, os termos utilizados seriam empregos e empregados ou funcionários).
30. A aplicação literal e isolada desses dispositivos com relação às entidades da administração indireta não se mostra pertinente. Ela conduziria a uma das duas hipóteses: a primeira seria que tais entidades não poderiam ter "cargos" em comissão de livre exoneração; a segunda, que tais "cargos" precisariam ser criados por lei. Nenhuma dessas hipóteses é razoável, nem guarda consonância com outros dispositivos constitucionais.
31. No caso da primeira, é pouco razoável concluir pela inviabilidade de que empresas, sujeitas ao regime privado, e assim, submetidas a menos amarras que os órgãos da administração direta, não possam ter esses "cargos" de livre nomeação e exoneração, ao passo que os órgãos mencionados tenham tal prerrogativa. Também há alguns dispositivos da própria Constituição que afastam essa interpretação:
- o art. 19, §2º do Ato das Disposições Constitucionais transitórias estabelece que o disposto no caput do artigo não se aplica aos ocupantes de "cargos, funções e empregos de confiança ou em comissão, ...". Vê-se que aqui se fala de emprego de confiança ou emprego em comissão, terminologia mais apropriada em relação à administração indireta, mas que não é utilizada no art. 37. O uso dessa expressão, todavia, denota que a Constituição reconhece a existência de 'emprego em comissão' (em contraposição a cargo em comissão).
- o art. 54, inciso I, alínea 'a' da Carta Magna estabelece que os deputados e senadores, desde a expedição do diploma, não podem "aceitar ou exercer cargo, função ou emprego remunerado, inclusive os que sejam demissíveis ad nutum, nas entidades constantes da alínea anterior". Entre as entidades referidas na alínea anterior, constam as empresas públicas e as sociedades de economia mista, denotando, mais uma vez, que o constituinte admitiu a existência de empregos, demissíveis ad nutum, nas entidades da administração indireta.
32. Ponto fundamental nessa análise empreendida diz respeito à clara e necessária utilização do instituto do emprego em comissão. Em realidade, ao defender a tese da possibilidade jurídica da existência do emprego em comissão, não está esse órgão ministerial, ao revés, difundindo sua livre utilização.
33. O Administrador Público deve ter sempre em mente que não se pode tratar uma exceção como regra, com o fim sombrio de burlar o princípio da impessoalidade, entranhado na exigência constitucional do concurso público. Não há liberdade irrestrita para a definição do emprego em comissão. Somente situações funcionais que exijam absoluta especialização podem assim serem tratadas. É o exemplo de exercício de funções de assessoria, direção ou chefia, consagradas no texto constitucional no artigo 37, V.
34. A esse respeito, inclusive, cabe salientar que o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios - MPDFT ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade contra os artigos 1º, 2º e 3º da Lei distrital nº 2.916/02 , pelo fato de que citados dispositivos previam a criação de cargos em comissão na Secretaria de Saúde do DF (DFA 14), a serem ocupados por médicos que, em realidade, deveriam ser ocupados por servidores efetivos.
35. Soam elucidativas as ponderações do MPDFT, constantes da citada ação:
14. Assim, vislumbra-se inconstitucionalidade no ato de criação artificiosa e indiscriminada de cargos em comissão, que, tal como pretende a lei impugnada, na verdade, prestar-se-ia a contornar a regra do concurso público. A respeito, veja-se o entendimento do Prof. MÁRCIO CAMMAROSANO (Direito Administrativo na Constituição de 1988, coord. por CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, São Paulo, RT, 1991, p. 173):
· Também a indiscriminada criação de cargos em comissão, por definição de livre provimento e exoneração, prestou-se a contornar a regra do concurso público. Como efeito, está implícito no sistema constitucional que não são quaisquer cargos que podem ser declarados de livre provimento e exoneração, mas apenas aqueles que a natureza das atribuições cometidas a seus titulares justifica sejam ocupados por pessoas de absoluta confiança das autoridades superiores, como os de assessoria e algumas chefias. Os demais, de cujos titulares nada se deva exigir senão o escorreito exercício de atividade estritamente profissional, regulamentada ou não, como são, v.g., os cargos de médico, procurador, desenhista, fiscal de obras, auxiliar administrativo, devem ser cargos de provimento em caráter efetivo, observado o necessário e prévio concurso público. (Grifos acrescentados.).
15. Igualmente, os atualizadores da monumental obra de HELY LOPES MEIRELLES (Direito Administrativo Brasileiro, 25. Ed., São Paulo, Malheiros, 2000, pág. 382), ao se referirem ao inciso V do artigo 37 da Constituição Federal, na redação que lhe foi dada pela Emenda Constitucional nº 19, promulgada em 4 de junho de 1998, não se olvidaram de que os cargos em comissão destinam-se "apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento (CF, art. 37, V)".
16. Portanto, Lei que cria cargos públicos de provimento em comissão, dispensando o concurso público, quando a natureza das atribuições a serem exercidas não se caracterizam como estritamente de "confiança", é inconstitucional, uma vez que consubstancia afronta aos princípios constitucionais do concurso público, da isonomia, da impessoalidade, da moralidade, da razoabilidade, da motivação e do interesse público, insculpidos no artigo 37, inciso II, da Constituição da República e reproduzidos no artigo 19 da Lei Orgânica do Distrito Federal. Nesse sentido podem ser colacionadas decisões várias do Supremo Tribunal Federal, proferidas, inclusive sob o regime da Constituição Federal de 1967, na qual não havia uma previsão clara como a do atual inciso V do artigo 37, acerca da destinação dos cargos em comissão" (destaques no original).
36. Exsurge, assim, por evidente analogia, a convicção de que somente podem ser criados empregos em comissão para funções de assessoria, direção e chefia.
37. De notar que o TCU também perfilhou esse entendimento, conforme se vê no seguinte excerto, ainda do Processo nº 010.987/2004-8, no qual o Ministro Ubiratan Aguiar assim esclarece:
34. Entendo relevante ressaltar que não estou a defender que as empresas públicas e as sociedades de economia mista criem, sem quaisquer parâmetros, empregos de livre nomeação. A criação desses empregos está sujeita aos princípios da moralidade, da impessoalidade e tem que ser aprovada pelas instâncias competentes. Além disso, eles devem estar restritos a funções de chefia, direção e assessoramento. No caso em tela, constata-se que foram criados dois cargos por diretor (são seis as diretorias). Considero que esse número se situa dentro de um patamar de razoabilidade, não se vislumbrando que tenha havido algum intuito de burla à regra geral do concurso público.
38. Há de recordar, ainda, que a usurpação do instituto do emprego em comissão também pode sofrer fiscalização do Ministério Público do Trabalho - MPT, como forma de garantir a aplicação restrita aos termos constitucionais. De fato, a má gerência de empregos públicos tem levado o MPT a atuar de forma imperativa. Vejam-se os casos recentes, no Distrito Federal, do Metrô-DF e da Caesb.
39. A propósito, o Metrô-DF e o MPT assinaram acordo de conciliação, em 18/04/2005, com o fito de exterminar as irregularidades verificadas na contratação de pessoal através de empresas terceirizadas. Note-se que esse procedimento deve ter o condão, também, de extinguir ação civil pública movida contra o órgão distrital.
40. O que se pretende com esse raciocínio é preservar o instituto em si, pois apresenta validade incontestável para o perfeito funcionamento das entidades da Administração Indireta. Não se pode negar, é verdade, que possam existir abusos. A resolução desse problema, todavia, não parece a esse órgão ministerial dar-se pelo caminho da inconstitucionalidade do emprego em comissão. Cabe salientar, ainda, que a própria atividade exercida por essa Casa é mecanismo de controle para evitar-se distorções.
41. Veja-se, a propósito, a matéria tratada no Processo nº 3410/04, tratando de Inspeção realizada na Companhia Imobiliária de Brasília - TERRACAP, objetivando averiguar a regularidade dos cargos em comissão existentes no quadro de pessoal daquela Jurisdicionada. Naquela oportunidade, o Tribunal exarou a decisão abaixo, comprovando que a utilização do emprego em comissão não prescinde de controle:
O Tribunal, por maioria, de acordo com o voto do 2º Revisor, Conselheiro JORGE CAETANO, com o qual concorda o Relator, Auditor PAIVA MARTINS, decidiu: I - determinar à Companhia Imobiliária de Brasília - TERRACAP que não utilize empregados comissionados em atividades permanentes da empresa, que não sejam de cunho gerencial ou de assessoramento, principalmente no que respeita à sua representação judicial, para evitar a caracterização de desvio de finalidade das contratações, sem prejuízo do que vier a ser adotado no Processo nº 6273/05; II - determinar à 3ª ICE que inclua em futuro Roteiro de Auditoria o cumprimento da determinação acima; III - autorizar o arquivamento dos autos. Vencido o 1º Revisor, Conselheiro JACOBY FERNANDES, que manteve o seu voto, no que foi seguido pelo Conselheiro ÁVILA E SILVA. O Conselheiro RONALDO COSTA COUTO deixou de votar, por haver nos autos voto proferido pelo Relator, Auditor PAIVA MARTINS, na ocasião em que se encontrava substituindo o insigne Conselheiro.
Presidiu a Sessão o Presidente, Conselheiro MANOEL DE ANDRADE. Votaram a Conselheira MARLI VINHADELI, os Conselheiros JORGE CAETANO, ÁVILA E SILVA, JACOBY FERNANDES e RENATO RAINHA. Participaram o Auditor PAIVA MARTINS e o representante do MPjTCDF Procurador INÁCIO MAGALHÃES FILHO.
42. Diante de todo o exposto, o Parquet alinhava as seguintes conclusões a respeito da matéria:
· a criação de empregos em comissão, na Administração Indireta, não fere a Constituição Federal, porquanto prevista sua existência no próprio texto constitucional, ex-vi dos artigos 37, II; 54, I, "b" ; e 19, § 2º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias;
· independe de lei, estrito senso, a criação de empregos em comissão, sendo válida tal prática desde que previstos no Plano de Carreira Cargos e Salários da Entidade, autorizado pelo Conselho de Política de Recursos Humanos CPRH , da Secretaria de Gestão Administrativa do GDF e devidamente homologado pelo Governador do Distrito Federal, após aprovação da Diretoria Colegiada e referendum do Conselho de Administração;
· é pressuposto de existência do emprego em comissão a necessária especialização em funções de assessoria, direção ou chefia, consagradas no texto constitucional no artigo 37, V.
A criação de empregos em comissão deve emanar de necessidades reais da entidade, devidamente justificadas, e ser destinada às atribuições de direção, chefia e assessoramento, para os quais se exija uma especial fidúcia na relação com os superiores hierárquicos. Jamais se deve admitir a sua criação apenas para atender interesses pessoais de dirigentes, desvinculados do interesse maior da entidade pública.
[...]
Com base no exposto, com as vênias devidas ao corpo técnico da Casa, VOTO por que o Eg. Plenário acolha as conclusões do douto Ministério Público, no sentido de:
I - adotar o seguinte entendimento:
a) a criação de empregos em comissão, na Administração Indireta, não fere a Constituição Federal, porquanto prevista sua existência no próprio texto constitucional, ex-vi dos artigos 37, II; 54, I, "b" ; e 19, § 2º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias;
Foram os argumentos apresentados acima que formaram a convicção da Consultoria Geral quando enfrentamos recentemente a questão que estamos ora novamente a abordar. Em consulta oriunda da Celesc Distribuição S.A., através do parecer nº COG - 138/07, da lavra da Dra. Eliane Guettky, este órgão de consultoria e controle manifestou-se pela desnecessidade de lei para criação de empregos em comissão nas empresas públicas e sociedades de economia mista (questionamento proposto pelo consulente naquele processo).
Nesse parecer, que deu embasamento ao prejulgado nº 1871 desta Corte de Contas, no que pertine especificamente à criação de empregos em comissão, importante aduzir que foi autorizada sua instituição em quantidade parcimoniosa, desde que destinadas às atribuições de direção, chefia e assessoramento.
Portanto, ainda que existam duas correntes, esta Consultoria Geral e o Tribunal Pleno do Tribunal de Contas manifestaram-se pela possibilidade do emprego em comissão, optando, portanto, pela linha mais aberta e que interpreta a Constituição da República de forma sistemática e não um ou outro dispositivo de forma isolada, dado que o ordenamento jurídico é composto de várias facetas que se interligam entre sí.
RUI BARBOSA, em seu tempo, já lecionava que:
"não há, numa Constituição, cláusulas a que se deva atribuir meramente o valor moral de conselhos, avisos ou lições. Todas têm a força imperativa de regras, ditadas pela soberania nacional ou popular de seus órgãos" (apud. PIOVESAN, Flávia. Proteção Judicial contra Omissões Legislativas. p. 52).
No mesmo sentido, cito ensinamento do professor LUÍS ROBERTO BARROSO:
"As normas constitucionais, como espécie do gênero normas jurídicas, conservam os atributos essenciais destas, dentre os quais a imperatividade. De regra, como qualquer outra norma, elas contêm um mandamento, uma prescrição, uma ordem, com força jurídica e não apenas moral. Logo, a sua inobservância há de deflagrar um mecanismo próprio de coação, de cumprimento forçado, apto a garantir-lhe a imperatividade, inclusive pelo estabelecimento das conseqüências de insubmissão a seu comando. As disposições constitucionais são não apenas normas jurídicas, como têm um caráter hierarquicamente superior, não obstante a paradoxal equivocidade que longamente campeou nessa matéria, ao considerá-las prescrições desprovidas de sanção, mero ideário não jurídico" (Interpretação e Aplicação da Constituição. 2a ed. Saraiva, São Paulo, 1998, p. 226).
Dessarte, ainda que o emprego em comissão não esteja previsto nos incisos II e V do artigo 37 da Constituição da República, como vimos alhures, existe previsão constitucional em outros dispositivos da Carta Magna que albergam sua instituição no âmbito da Administração Pública, desde que sejam analogicamente respeitadas as mesmas regras e condições aplicáveis aos cargos em comissão.
No que tange à taxatividade é preciso primeiro transcrever os dispositivos normativos que regulam as formas de provimento dos empregos nos Consórcios Públicos:
Art. 4º São cláusulas necessárias do protocolo de intenções as que estabeleçam:
IX - o número, as formas de provimento e a remuneração dos empregados públicos, bem como os casos de contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público.
Art. 4º A constituição de consórcio público dependerá da prévia celebração de protocolo de intenções subscrito pelos representantes legais dos entes da Federação interessados.
Art. 5º O protocolo de intenções, sob pena de nulidade, deverá conter, no mínimo, cláusulas que estabeleçam:
IX - número, as formas de provimento e a remuneração dos empregados do consórcio público.
Art. 22. A criação de empregos públicos depende de previsão no contrato de consórcio público que lhe fixe a forma e os requisitos de provimento e a sua respectiva remuneração, inclusive quanto aos adicionais, gratificações, e quaisquer outras parcelas remuneratórias ou de caráter indenizatório.
Art. 23. Os entes da Federação consorciados, ou os com eles conveniados, poderão ceder-lhe servidores, na forma e condições da legislação de cada um.
Das redações transcritas acima percebe-se que se pode inferir que os Consórcios Públicos podem constituir seu corpo funcional através de emprego público, podendo também utilizar o instituto da cessão de servidores e a contratação temporária para atender excepcional interesse público. Contudo, ao ser admitido o emprego em comissão como forma regular de provimento, não há impedimento de sua instituição para atribuições de direção, chefia e assessoramento.
Além disso, especificamente no que tange aos Consórcios Púbicos também poderia ser questionado o fato de qual pessoa teria a prerrogativa para nomear o empregado em comissão, uma vez que tendo personalidade jurídica de direito público, por expressa determinação legal (art. 6, §1º, da Lei Federal 11.107/05), o Consórcio Público pertence a todos os Entes Consorciados.
A resposta é extraída da própria lei. De acordo com o inciso VIII do artigo 4º da Lei Federal 11.107/05, o representante legal do Consórcio Público será um dos chefes do poder executivo dos Entes Consorciados, que será eleito para mandato, cujo prazo deverá estar definido no estatuto da entidade.
Dessarte, o emprego em comissão nos Consórcios Públicos é de confiança de seu dirigente máximo, ainda que a entidade seja de todos os Entes Consorciados.
Apenas para ilustrar, juntamos recente decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (Santa Catarina), que, ao analisar caso concreto, entendeu existir subordinação do empregado, pois o empregado estava ocupando uma chefia inferior, fato descaracterizaria o instituto do emprego em comissão, cuja utilização deve se dar apenas prover atribuições da alta administração.
EMPREGO EM COMISSÃO. AUSÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO. AUSÊNCIA DE ATRIBUIÇÃO DE DIREÇÃO, CHEFIA E ASSESSORAMENTO. NULIDADE. A figura do "emprego em comissão" há que guardar grande similitude com o cargo em comissão em face da identidade de seus requisitos. A ausência das atribuições inerentes de direção, chefia e assessoramento bem como a investidura sem prévio concurso público acarretam a nulidade do contrato realizado.
Ac. 2 T., 10.07.07. Proc. RO02242-2005-003-12-00-4. Unânime. Rel.: Juíza Sandra Márcia Wambier. Publ. TRT-SC/DOE em 28.08.07.
Diante de todo o exposto, em que pese ter inicialmente concordado com a manifestação exarada no parecer COG-266/07, modifico parcialmente meu despacho de fs. 39 no que toca o assunto chamado à baila pelo Conselheiro Moacir Bertoli, relator dos presentes autos, para admitir a utilização parcimoniosa do emprego em comissão nas atribuições de direção, chefia e assessoramento.
Em consonância com o acima exposto:
- Considerando que os pressupostos de admissibilidade da consulta foram analisados no parecer nº COG-308/06;
- Considerando que neste parecer especificamente apreciamos a possibilidade da utilização do emprego em comissão nos Consórcios Públicos por conta do despacho de fs. 46;
Sugere-se ao Exmo. Conselheiro Moacir Bertoli que ao submeter seu voto ao Egrégio Plenário sobre o item 6 da consulta formulada pelo Exmo. Prefeito Municipal de Joinville, responda conforme o parecer COG-266/07, com as modificações deste parecer, que em síntese propõe que:
1. A utilização do emprego em comissão, para atribuições de direção, chefia e assessoramento, por se tratar de uma forma de provimento regular, ainda que excepcional, pode ser efetivada de forma parcimoniosa nos Consórcios Públicos.
COG, em 2 de outubro de 2007.
GUILHERME DA COSTA SPERRY Coordenador de Consultas
DE ACORDO.
À consideração do Exmo. Sr. Conselheiro Moacir Bertoli, ouvido preliminarmente o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas.
COG, em de outubro de 2007.
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MARCELO BROGNOLI DA COSTA Consultor Geral |
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DINAMARCO, Intervenção de Terceiro, p. 39, nota 3, apud, JUNIOR, Fredie Didier. Processo Civil I. 1ª edição. Salvador: JusPODIVM, 2003. p. 118.