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TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO
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Processo n°: |
CON - 07/00020535 |
Origem: |
Prefeitura Municipal de Itapiranga |
Interessado: |
Vunibaldo Rech |
Assunto: |
Consulta |
Parecer n° |
660/07 |
Consulta. Direito Constitucional e Administrativo. Conselheiro Tutelar. Função Pública. Acumulação de proventos com vencimentos. Impossibilidade. Ações Diretas de Inconstitucionalidade nº 1721 e nº 1770.
1. Os Conselheiros Tutelares, embora sejam eleitos pela comunidade local, não são detentores de mandato eletivo, pois o processo de escolha é simplificado e o voto é facultativo. Este modo de eleição difere do sistema eleitoral realizado para a escolha de agentes políticos que são detentores de mandato eletivo. O mandato eletivo trata-se de um poder político outorgado pelo povo, por meio do voto obrigatório (facultativo em alguns casos estabelecidos na Constituição Federal), a um cidadão (condição de elegibilidade), para que governe a União, o Distrito Federal, um Estado ou um Município, ou represente os cidadãos nas respectivas casas legislativas, ou os Estados-Membros no Senado Federal.
2. Sendo eleito Conselheiro Tutelar o servidor inativo que perceba proventos de aposentadoria pagos pelo Regime Geral de Previdência Social (INSS), decorrente de cargo ou emprego público, deverá optar por um dos pagamentos, haja vista não ser possível acumular proventos do RGPS com o vencimento da função exercida no Conselho (art. 37, § 10, da CF).
3. Revogar o Prejulgado nº 612.
4. Reformar o 1º parágrafo do Prejulgado nº 940.
Senhor Consultor,
RELATÓRIO
O Prefeito Municipal de Itapiranga, Sr. Vunibaldo Rech, protocolizou Consulta nesta Corte de Contas em 08/02/2007.
Consta em fs. 02 e 03, a seguinte consulta:
[...]
Servidor municipal inativo, aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social, cujo cargo ocupado não era acumulável na forma do artigo 37, inciso XVI, da Constituição Federal, pode acumular os proventos de aposentadoria com o subsídio pago por conta do exercício do mandato eletivo de Conselheiro Tutelar?
Ressaltamos que a aposentadoria deu-se enquanto servidor; porém, é paga pelo Regime Geral de Previdência Social e não por regime próprio.
O questionamento leva em conta o contido no Prejulgado nº 1475, dessa egrégia Corte, onde se faz referência ao servidor aposentado pelo regime estatutário - artigo 40 da CF/88 - o que nos causa dúvida quanto ao servidor aposentado pelo Regime Geral da Previdência Social; além disso, o Prejulgado menciona que as atribuições de conselheiro tutelar são decorrentes de função pública; porém, o § 10 do artigo 37 da Constituição Federal diz que a regra proibitiva da acumulação não se aplica aos cargos eletivos, o que, em nosso entender, alcança o conselheiro tutelar que é eleito.
Por isso, consultamos também se o conselheiro tutelar pode ser conceituado, para fins de acumulação de proventos com remuneração, como ocupante de cargo eletivo e se por isso a proibição de acumular proventos com remuneração decorrente do exercício do mandato eletivo de conselheiro não o alcança.
[...]
Por meio do Parecer COG - 180/07 (fs. 17/36), esta Consultoria Geral respondeu a Consulta, cuja conclusão asseverou:
1. Conhecer da consulta por preencher os requisitos de admissibilidade previstos no Regimento Interno.
2. Responder a consulta nos seguintes termos:
2.1. Os Conselheiros Tutelares, embora sejam eleitos pela comunidade local, não são detentores de mandato eletivo, pois o processo de escolha é simplificado e o voto é facultativo. Este modo de eleição difere do sistema eleitoral realizado para a escolha de agentes políticos que são detentores de mandato eletivo. O mandato eletivo trata-se de um poder político outorgado pelo povo, por meio do voto obrigatório (facultativo em alguns casos estabelecidos na Constituição Federal), a um cidadão (condição de elegibilidade), para que governe a União, o Distrito Federal, um Estado ou um Município, ou represente os cidadãos nas respectivas casas legislativas, ou os Estados-Membros no Senado Federal.
2.2. Quando for eleito servidor inativo com proventos pagos pelo Regime Geral de Previdência Social (INSS), é necessário verificar se há complementação pelo ente no qual se deu a aposentadoria. Caso receba apenas os proventos do INSS, não estará sujeito às vedações do art. 37, §10, da Constituição Federal, do contrário, caso receba um "plus" da municipalidade (complementação), permanecem os impedimentos do referido dispositivo constitucional.
3. Revogar o Prejulgado nº 612.
Cabe ressaltar que a resposta proferida no item 2.2 acima transcrito foi efetuada com base na Informação nº COG - 009/07, formulada no processo PAD - 07/00024875, cujo objetivo seria o de reformar os prejulgados relativos à aposentadoria voluntária e seus efeitos no contrato de trabalho de emprego de empresa públicas e sociedades de economia mista, além daqueles relacionados à possibilidade ou não de cumulação de proventos com vencimentos.
Seguindo os trâmites regimentais, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas manifestou-se nos termos da Consultoria Geral (fs. 37/38).
Contudo, antes que o Relator se pronunciasse sobre o tema, a Coordenação de Consultas da Consultoria Geral entendeu por bem solicitar o retorno desses autos, bem como do processo PAD, para estudo e explicações complementares que se fazem necessárias, com o intuito de adequá-los com a posição do Supremo Tribunal Federal acerca da possibilidade ou não de cumulação de proventos com vencimentos.
Destarte esta Consultoria passa novamente a analisar as preliminares de admissibilidade, bem como a expor suas novas razões de mérito acerca dos questionamentos apresentados pelo Prefeito Municipal de Itapiranga com base no posicionamento do Supremo Tribunal Federal firmado em Ação Declaratória de Inconstitucionalidade.
É o relatório.
II. PRELIMINARES DE ADMISSIBILIDADE
De início, mister delinear que o Consulente, na condição de Prefeito Municipal de Itapiranga, possui plena legitimidade para encaminhar Consulta a este Tribunal consoante o que dispõe o art. 103, II, do Regimento Interno desta Corte (Resolução TC-06/2001).
Analisando a pertinência da matéria envolta no questionamento da Consulta, qual seja, dúvida de natureza interpretativa do direito em tese, essa merece prosperar haja vista que encontra guarida no inciso XII do art. 59 da Constituição do Estado de Santa Catarina, bem como no inciso XV do art. 1º da Lei Complementar nº 202/2000.
Observa-se ainda que a consulta não veio instruída com parecer da assessoria jurídica da entidade consulente, conforme preceitua o art. 104, V, da Resolução TC-06/2001 (Regimento Interno do TCE/SC). Contudo, o Tribunal Pleno poderá conhecer da consulta que não atenda a esta formalidade, conforme autoriza o parágrafo 2º do artigo 105 do referido Regimento, cabendo essa ponderação ser efetuada pelo Relator e pelos demais julgadores.
Destarte, sugerimos o conhecimento da peça indagatória pelo ínclito Plenário e o encaminhamento da resposta ao Consulente.
III. MÉRITO DA CONSULTA
A presente Consulta versa acerca da possibilidade de acumulação de proventos de aposentadoria de servidor inativo com remuneração decorrente do exercício da função de Conselheiro Tutelar, bem como se o Conselheiro Tutelar seria detentor de mandato eletivo ou não.
O Consulente entende que o Conselheiro Tutelar é detentor de cargo eletivo, com isso, consulta-nos, também, se a proibição de acumulação expressa no § 10 do art. 37 da CF alcançaria ou não o Conselheiro Tutelar.
Informa, em tese, que o servidor inativo estaria vinculado ao Regime Geral de Previdência Social (RGPS), questionando se caberia ou não a vedação do art. 37, § 10 da Constituição Federal, já que o Prejulgado nº 1475 refere-se a servidor aposentado pelo regime estatutário.
Primeiramente, necessita-se definir a natureza jurídica do Conselheiro Tutelar, que por sinal é assunto controvertido tanto na doutrina quanto na jurisprudência, não se definindo se estar-se-ia diante de um agente político (em razão de detenção de cargo eletivo), agente honorífico, cargo em comissão ou função pública sem cargo.
A jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina entende o que segue:
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - CONSELHEIROS TUTELARES ELEITOS NA FORMA DO ART. 132 DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE - REMUNERAÇÃO ESTABELECIDA POR LEI MUNICIPAL - DIREITO AO DÉCIMO TERCEIRO SALÁRIO - PREVISÃO LEGAL. Os conselheiros tutelares são eleitos pela comunidade para mandato de três anos. Embora sejam agentes públicos, não são, em tese, servidores, mas particulares em colaboração com a administração. A remuneração conquanto seja facultativa (art. 134, ECA), no caso em análise, é estabelecida por lei municipal, a qual dispõe que, além dos vencimentos mensais, os conselheiros tutelares terão direito, também, ao décimo terceiro salário e férias. (Acórdão: Apelação cível 2005.038931-0. Relator: Des. Volnei Carlin. Data da Decisão: 30/03/2006) (grifo nosso)
Extrai-se da supracitada jurisprudência, que os Conselheiros Tutelares, embora sejam eleitos pela comunidade local, não são detentores de mandato eletivo, mas sim particulares que atuam em colaboração com o Poder Público.
Pela doutrina do Professor Hely Lopes Meirelles estes agentes públicos são chamados de agentes honoríficos, ele nos ensina que:
Agentes honoríficos: são cidadãos convocados, designados ou nomeados para prestar, transitoriamente, determinados serviços ao Estado, em razão de sua condição cívica, de sua honorabilidade ou de sua notória capacidade profissional, mas sem qualquer vínculo empregatício ou estatutário e, normalmente, sem remuneração. Tais serviços constituem o chamado múnus público, ou serviços públicos relevantes, de que são exemplos a função de jurado, de mesário eleitoral, de comissário de menores, de presidente ou membro de comissão de estudo ou de julgamento e outros dessa natureza.
Os agentes honoríficos não são servidores públicos, mas momentaneamente exercem uma função pública e, enquanto a desempenham, sujeitam-se à hierarquia e disciplina do órgão a que estão servindo, podendo perceber um pro labore e contar o período de trabalho como de serviço público. Sobre estes agentes eventuais do Poder Público não incidem as proibições constitucionais de acumulação de cargos, funções ou empregos (art. 37, XVI e XVII), porque sua vinculação com o Estado é sempre transitória e a título de colaboração cívica, sem caráter empregatício. (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 27. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2002, p.79)
Ao ser realizada pesquisa acerca do assunto, encontramos outro posicionamento sobre a natureza jurídica de Conselheiro Tutelar no sítio do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul, em que a Procuradora Municipal de Porto Alegre, Vanêsca Buzelato Prestes, posiciona-se no seguinte sentido:
13. Com a implantação dos Conselhos Tutelares (em Porto Alegre temos oito), a realização da eleição e o início do trabalho, estas questões passaram a merecer maior atenção, pois na prática estavam demonstrando que deviam ser aperfeiçoadas. Forte nestes motivos é que iniciou-se a discussão quanto a natureza jurídica do vínculo dos conselheiros tutelares com a administração municipal. Negar simplesmente a existência de vínculo era desconhecer a realidade, bem como ignorar que o Conselho Tutelar enquanto órgão da administração municipal deve estar subsumido às normas gerais de Direito Administrativo, assim como aos preceitos constitucionais que regem a Administração Pública (Art. 37 C.F.). (11) Isto porque, não obstante haver independência funcional, autonomia quanto a aplicação das medidas e inexistência de subordinação hierárquica com a administração, a vinculação decorre do próprio serviço que é municipal, sendo que a população cobra do Município tanto a sua melhor estruturação quanto a sua ineficiência.
14. A par disso, outros elementos substanciais contribuíram para a análise quanto à necessidade da regulamentação do vínculo. O que fazer, p. ex., se algum membro de Conselho Tutelar sofresse algum acidente decorrente do trabalho? Haveria alguma responsabilidade do Município? O membro de Conselho ficaria desamparado e sem direito à percepção de auxílio algum? E se alguma Conselheira Tutelar ficasse grávida, como ficaria o direito constitucional à licença gestante se estes não eram considerados trabalhadores, mas sim agentes honoríficos? Todo este período exercendo a função de Conselheiro Tutelar não poderia ser computado para fins de averbação de tempo de serviço, com vista a aposentadoria? Enfim, estes entre tantos outros questionamentos levaram-nos a concluir quanto à necessidade de regulamentar o vínculo existente.
15. Concluímos que não se pode confundir o serviço público Conselho Tutelar, que é permanente e de natureza essencial, com os seus membros que são transitórios e figuram como agentes públicos durante o mandato. Todavia, neste lapso temporal de três anos, correspondente ao período do exercício da função, reconhecemos ser fundamental estabelecer os parâmetros aceitáveis para a configuração do vínculo, de forma a não interferir na autonomia prevista no Estatuto e, ao mesmo tempo, contemplar as questões anteriormente postas, admitindo, sobretudo que os membros de Conselho Tutelar, na forma estabelecida pela legislação municipal de Porto Alegre, durante o exercício do mandato, são trabalhadores públicos, devendo, portanto, perceber os direitos sociais correspondentes, assegurados pela Constituição Federal.
16. Esta linha de raciocínio encontrou guarida em comentários à novel Constituição Federal, no que diz respeito ao reconhecimento de direitos sociais aos trabalhadores de um modo geral. A respeito do tema assim se pronunciou o Professor Adilson Abreu Dallari (12), in verbis:
Com efeito, faz-se necessário afirmar em alto e bom som: o servidor público nada mais é que espécie do gênero "trabalhador". de fato, este gênero - "trabalhador"- na ordem jurídica brasileira, congrega duas grandes categorias: o trabalhador das empresas privadas e o servidor público. Por este motivo, reiterando o que acima já se afirmou, embora haja diversidade no tocante a determinados aspectos secundários, em cada uma das referidas categorias, impõe-se com referência aos elementos fundamentais da relação de trabalho, um tratamento igual ao empregado particular.
A conclusão disso tudo é a de que não poderia e não pode existir trabalhador algum desprovido das garantias que a Constituição confere a todos os trabalhadores. Não havia, como não há, possibilidade de existência de pessoal trabalhando apenas em troca de uma remuneração pecuniária, a título precário, como recebido, sem um regime jurídico (um conjunto equilibrado de direitos e deveres) perfeitamente definido."
17. O ilustre publicista segue discorrendo sobre a impropriedade de aplicar o regime celetista, aliás, segundo registra, tendência jurisprudencial de enquadrar aqueles que não fossem estatutários automaticamente como sujeitos às normas da CLT, pois esta prática criou uma forma de burla ao concurso público. Conforme já asseverado, este temor foi justamente o que ensejou o artigo da Lei estabelecendo que os Conselheiros Tutelares não entrariam para os quadros da administração municipal. Contudo, apesar da boa intenção, acabou-se por criar outro problema, conquanto a caracterização como agente honorífico mostrou-se insuficiente e inadequada, à luz das exigências da lei municipal e do efetivo trabalho desenvolvido pelos membros de Conselho Tutelar.
18. Na Lei 6.787 não havia previsão que elidisse as questões esposadas, até porque, os agentes honoríficos propriamente ditos, não sofrem este tipo de problema, pois, conforme já citado, são convocados para prestar determinados serviços, mas que não são permanentes e nem tão pouco cotidianos durante três anos, como é o caso dos membros de Conselho Tutelar. Gize-se, mais uma vez, que no período do mandato, os Conselheiros Tutelares ficam inteiramente subsumidos na função, inclusive com impossibilidade de exercerem outra atividade por força da exigência da dedicação exclusiva,(13) consubstanciada na Lei Municipal. Já os agentes honoríficos não têm este tipo de restrição, sendo que, comumente, são chamados ao exercício do múnus público em decorrência da própria atividade relevante que exercem.
19. Destarte, restou indubitável que o membro de Conselho Tutelar era mais do que um agente honorífico. E mais. Era necessário legislar criando a possibilidade de amparar o conselheiro que sofresse evento danoso (reportando ao exemplo do item 14), bem como sobre o pagamento aos membros de Conselho Tutelar dos mínimos constitucionais, nomeadamente, 13º salário, férias, férias proporcionais, licenças maternidade e paternidade, entre outros direitos previstos na Carta Magna. Esta conclusão decorreu da constatação fática que, face à peculiaridade da atividade desenvolvida, eles são mais do que agentes honoríficos, vez que prestam serviço público permanente, constituindo-se, em verdade, como trabalhadores públicos, dotados de características específicas, tais como, o modo de investidura (eleição) no serviço público e a natureza da função que desempenham cuja identidade máxima é a preservação da autonomia de ação, a fim de ver cumprida a finalidade para o qual foi criado o Conselho Tutelar. Para tanto, necessário se fez incursionar pela seara do direito administrativo, nomeadamente pelas categorias de agentes públicos, a fim de verificar a possibilidade que melhor se coadunasse a espécie híbrida com a qual nos deparávamos.
20. Desta reflexão, originou-se a Lei 7.207/93, a qual estabeleceu a criação das funções de confiança popular providas mediante cargos em comissão, o que temos até hoje. A aludida Lei teve vigência temporária, a fim de que o assunto fosse aprofundado, pois aos afeitos ao direito administrativo a criação de cargos em comissão com restrição à demissibilidade ad nutun constituía-se em solução arriscada, inadequada e inconstitucional. Todavia, ao menos no âmbito municipal, a matéria foi pacificada com o advento da Lei N.º 7394 de 28 de dezembro de 1993, a qual criou definitivamente os 40 (quarenta) cargos de confiança de conselheiros tutelares, por absoluta impossibilidade de legislar de outra maneira, conforme veremos no item seguinte. A lei ora vigente, assim estabelece:
Art. 1º - São criados na Administração Centralizada 40 (quarenta) cargos em comissão, a serem providos pelo exercício da função de confiança popular, denominados Conselheiros Tutelares, eleitos por voto universal e facultativo dos cidadãos porto-alegrenses, na forma da Lei 6787, de 11 de janeiro de 1991.
Art. 2º - Os Conselheiros Tutelares eleitos serão nomeados nos cargos em comissão por ato do Prefeito Municipal e exonerados ao final de seus mandatos, ou nos casos previstos na presente Lei.
III - FUNÇÕES DE CONFIANÇA POPULAR PROVIDAS MEDIANTE CARGOS EM COMISSÃO - A RAZÃO DESTA OPÇÃO
21. A Constituição Federal, em seu art. 37, inciso II, estabelece que a investidura no serviço público se dará por concurso público ou por cargos em comissão, nos casos previstos em lei. Sendo o Conselho Tutelar um serviço público, está adstrito ao postulado constitucional. O Estatuto, mesmo sendo legislação federal, por ser infraconstitucional, não pode contrariar a Constituição. Disto se conclui que no sistema legal vigente não há previsão de participação popular na execução do serviço público.
22. Todavia, era necessário criar uma forma de compatibilizar o sistema constitucional com a necessidade local de regulamentar o vínculo existente entre a Administração e o Conselho Tutelar, de modo que os membros do conselho pudessem ser reconhecidos como servidores públicos. Para tanto, na esfera de governabilidade e no âmbito de competência do Município criamos funções de confiança popular providas mediante cargos em comissão. Evidentemente trata-se de uma construção jurídica. Melhor seria se o sistema legal vigente passasse a contemplar a possibilidade de existência desta figura híbrida que mescla participação popular com serviço público permanente. Contudo, não podíamos esperar que o assunto se resolvesse na Federação. Dentre as possibilidades que existiam Porto Alegre optou por esta formulação, a qual nos pareceu a mais adequada, pois possibiltava o reconhecimento do membro de Conselho Tutelar como servidor público lato senso. A partir disso, criou-se a base legal para o pagamento dos mínimos constitucionais, uma vez que a Constituição Federal reconhece direitos sociais tanto para os trabalhadores públicos quanto aos privados, conforme salientado pelo prof. Adilson Dallari, conforme citação reproduzida no item 16.
23. Para efeito de explicitar a opção adotada, importante discorrer sobre alguns conceitos jurídicos que servem para compreender a espécie.
24. Os Agentes Públicos são todos aqueles que desempenham uma ação estatal.(14) Evidentemente há diversas formas de exercer a missão estatal, bem como níveis de responsabilidades e atribuições Esta diferenciação origina a classificação dos agentes públicos em três grandes grupos, admitindo-se posterior subdivisão,(15) a saber: a) agentes políticos, b) servidores públicos e c) particulares em atuação colaboradora com o Poder Público.
25. Conforme Celso Antônio Bandeira de Mello ,
"Agentes políticos são os titulares dos cargos estruturais à organização política do País, isto é, são os ocupantes dos cargos que compõem o arcabouço constitucional do Estado e, portanto, o esquema fundamental do poder. Sua função é a de formadores de vontade superior do Estado. São agentes políticos o Presidente da República, os Governadores, os Prefeitos e respectivos auxiliares imediatos (ministros e secretários das diversas pastas), os Senadores, os deputados e os Vereadores.. Todos estes se ligam ao Estado por um liame não profissional. A relação que os vincula aos órgãos do poder é de natureza política. Desempenham um múnus público. Para o exercício de tão elevadas funções não comparecem como profissionais. O que potencialmente os qualifica ao seu exercício é a qualidade de cidadãos, de membros da sociedade política; em conseqüência, titulares de direitos e de responsabilidades na condução da res publica. A função que lhes corresponde não é de caráter técnico, mas a de traçar a orientação superior a ser cumprida, por meios técnicos, pelos demais agentes".
26. O mesmo autor conceitua servidores públicos como sendo 'todos aqueles que mantém com o Poder Público relação de trabalho, de natureza profissional e caráter não eventual. A categoria servidores públicos é subdividida em espécies (funcionários públicos, servidores autárquicos, contratados pela legislação trabalhista e remanescentes dos antigos extranumerários). Para o objetivo do presente estudo desnecessário aprofundar a conceituação de cada espécie. Contudo, cabe lembrar que a imposição do regime jurídico único impõe ao Poder Público a definição da regra aplicável a todas espécies. Em Porto Alegre o regime jurídico único é o estatutário. Os servidores celetistas compõe um quadro em extinção, sendo vedado novas admissões sob este regime. Quanto aos extranumerários e os interinos, por força da própria Constituição não há mais possibilidade de sua criação, sendo de igual forma, pertencentes ao quadro em extinção.
27. Por último, a terceira classificação refere-se aos particulares em colaboração com a administração pública. São aqueles particulares que prestam um serviço ou uma missão pública (jurados, convocados pela justiça eleitoral, serviço militar, etc.) , os que assumem a gestão de coisa pública em momento de emergência ou, ainda, os que desempenham por conta própria, sem relação de dependência institucional, embora em nome do Estado, uma função ou serviço público (16) (contratados através de locação civil de serviços delegados de função, ofício ou serviço público, tabeliães e titulares de serventias públicas não oficializadas, diretores de faculdade, concessionários e permissionários de serviço ou obra pública e outras pessoas que praticam certos atos de força jurídica oficial). Englobados nesta classificação estavam caracterizados os Conselheiros Tutelares, na qualidade de agentes honoríficos.
28. À luz desta conceituação, bem como da situação vivenciada, não havia dúvida que os Conselheiros Tutelares são agentes públicos. Todavia, o problema exsurge no momento de classificá-los, pois, a partir desta definição conceitual é que as regras jurídicas as quais eles ficam submetidos são disciplinadas.
29. Conforme já dito, na primeira Lei Municipal os membros de Conselho Tutelar foram caracterizados como agentes honoríficos, cuja relação jurídica estabelecida foi de particulares em colaboração com o poder público. Por conseqüência, percebiam uma contraprestação pelo serviço prestado a título indenizatório, por força do que disciplinou a Lei. Em decorrência de não serem considerados trabalhadores públicos não podiam perceber os mínimos constitucionais. Todavia, conforme já amplamente explanado esta situação estava jurídica e faticamente inadequada. Isto porque, não obstante a permanência no serviço público dos membros de conselho tutelar ser adstrita a um mandato certo, durante este período desempenhavam atividade profissional cujas atribuições decorrem do ECA, bem como prestam serviço sem caráter de eventualidade, elementos característicos do conceito de servidor público. A par disso, desnecessário dizer que, de igual forma, não podiam ser caracterizados como agentes políticos, pois não são membros de Poder, nem tão pouco pertencem a cargos estruturais do Estado, exercendo uma parcela do poder inerente ao mesmo. O único elemento que identifica membro de Conselho Tutelar com agente político, naqueles Municípios que optaram pelo sufrágio universal como método de escolha do Conselho Tutelar e neste momento histórico democrático do país, é a eleição. Destarte nenhum destes conceitos se adequava à espécie.
30. Com base na reflexão desenvolvida no presente estudo chegou-se a conclusão de que os membros de Conselhos Tutelares eram servidores públicos . Para tanto, necessário disciplinar o tema, sem ferir os preceitos constitucionais.
31. A Constituição Federal aponta dois caminhos para investidura em cargo ou emprego público (art. 37, II), o concurso público de provas ou provas e títulos e as nomeações para cargo em comissão. Não obstante a eleição ter características que se assemelham a finalidade do concurso público - garantir a isonomia e a impessoalidade, (17) mesmo interpretando sistematicamente o texto constitucional não é possível equiparar a eleição como espécie de concurso, até porque esbarra em outros preceitos constitucionais, nomeadamente, o art. 41 que declara serem estáveis após dois anos de efetivo exercício, os servidores nomeados em virtude de concurso público. Nesta hipótese, haveria um problema intransponível na lei municipal que estaria contrariando o texto constitucional ao criar cargos a serem providos por uma "espécie de concurso", porém posteriormente estes servidores não seriam considerados estáveis, nos termos do art. 41 da Carta Magna, por força de lei infranconstitucional (lei municipal e ECA), que vincula ao mandato.
32. Outra alternativa pensada foi a criação de funções sem os respectivos cargos. Todavia, refutamos a hipótese com base nas colocações de ilustres administrativistas, alertando para o fato de que a novel Constituição terminou com a regra anteriormente existente de criar funções indiscriminadamente, bem como vedou a possibilidade, face a impossibilidade de burlar a congência do concurso público. Adilson Dallari, assim se manifesta sobre o assunto: (18)
"Claro está que, se o legislador puder criar livremente funções não correspondentes a cargos, esse fato, somado à interpretação literal do texto constitucional, com o costumeiro desprezo generalizado pelos princípios constitucionais, praticamente aniquilará a regra do concurso público.
Entendido isto, fica também perfeitamente claro que não mais é possível a criação de funções não correspondentes a cargos e empregos existentes. Ou seja, a função somente pode compreender dois significados: a) conjunto de atribuições inerentes a um determinado cargo ou emprego; b) conjunto de atribuições especiais, extraordinárias, cujo volume não justifica a criação de cargo ou emprego e que, por isso mesmo, pode ser conferido a quem seja funcionário ou empregado, mediante uma retribuição adicional.
33. Como se verifica não restava outra opção. Os cargos em comissão são de livre nomeação e exoneração do Chefe do Poder. Todavia, à medida que houver uma Lei Municipal dispondo sobre o assunto, restringindo a possibilidade e vinculando a um mandato certo, ou ela é cumprida ou é de ser argüida a sua inconstitucionalidade. Enquanto a lei subsistir gera todos os efeitos dela decorrentes. Ademais, não acarreta problema maior, porque regulamenta o vínculo existente com a administração, bem como possibilita o reconhecimento desta espécie de cargos em comissão, assim como o são os demais, como trabalhadores públicos que fazem jus a todos os mínimos constitucionais. Neste ínterim, quiçá o problema seja resolvido no âmbito da federação, como de direito deve ser.
34. A opção adotada tem os seus riscos. A doutrina tradicional não admite cargos comissionados que não possam ser destituídos pelo Chefe do respectivo Poder, justamente porque são de direção ou de assessoramento do agente político que os nomeou. Contudo, conforme demonstrado, as outras alternativas existentes eram mais frágeis e ao fim não contemplariam a resolução do problema em si. Ademais, era imprescindível reafirmar que, para Porto Alegre, os membros de Conselhos Tutelares não eram particulares que colaboravam com o Poder Público, assim como o são os agentes honoríficos, mas sim componentes de uma estrutura estatal criada para que os Conselheiros assumissem atribuições do Estado, da União e dos próprios Municípios, conforme já asseverado. Para tanto, a construção jurídica levada a efeito logrou êxito. Aliás passados quatro anos, entendemos que a opção adotada foi extremamente feliz, porque conseguiu contemporizar problema formal que parecia intransponível e que estava prejudicando o desempenho do serviço, face a insegurança que estava gerando. Ademais, para que o Prefeito não cumpra a indigitada Lei, conforme já dito, é necessário a argüição de sua inconstitucionalidade. Com a consolidação do órgão e a crescente legitimidade que vem conquistando, dificilmente uma ação desta natureza passaria incólume ao clamor popular. Assim, o Chefe do Executivo ou outro, legitimado para ação, inobstante a possibilidade de lograr êxito na declaração da inconstitucionalidade, certamente teria que enfrentar a mobilização da sociedade organizada que tem serviço público Conselho Tutelar uma referência.
35. Ainda, cabe registrar que no 1º Congresso Nacional sobre Conselhos Tutelares tivemos a oportunidade de falar sobre o tema, alertando para a necessidade de dispor sobre o assunto na Constituição Federal, inclusive sugerindo ao deputado que participava da mesa dos trabalhos, o debate do tema no Congresso Nacional. Por ora, na Conferência Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, foi aprovado o seguinte encaminhamento: "que o CONANDA possa desencadear uma campanha de emenda popular à Constituição Federal para a inclusão de previsão da figura do Conselheiro Tutelar no Serviço Público Brasileiro, inclusive com posterior regulamentação de suas funções". A preocupação quanto a regulamentação do vínculo, portanto, extrapola os limites municipais e encontra eco para resolução do problema formal enfocado. No limite da possibilidade de um município nos antecipamos ao clamor nacional. Porém reconhecemos que o problema somente restará elidido quando a Carta Magna contemplar a espécie.
IV - CARGOS COMISSIONADOS - NATUREZA JURÍDICA DA RELAÇÃO COM A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA - DIREITOS SOCIAIS DECORRENTES
36. Antigamente aos cargos comissionados não eram previstos direitos sociais, por serem considerados longa manus do agente político que os nomeou. Esta configuração acabou por causar uma distorção, contemplada na jurisprudência dominante. Isto porque estes agentes públicos socorriam-se da Justiça Laborista para pleitear os respectivos direitos sociais. E lá acabavam por encontrar amparo, na hipótese de não terem um regime jurídico próprio que os regesse. Com o reconhecimento dos direitos sociais a todos os trabalhadores públicos esta incongruência restou superada. Hoje os denominados CCs têm os mesmo direitos e obrigações decorrentes da Constituição dos servidores estáveis, excetuando-se, obviamente, àqueles próprios da categoria dos estáveis.
37. Destarte, aplica-se aos cargos comissionados, assim como aos demais servidores públicos, os direitos sociais previstos no art. 7º incisos IV, VI,VII, VIII, IX, XII, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXII, XXIII e XXX, por força do que dispõe o § 2º do art. 39 da Constituição Federal.
38. No Município de Porto Alegre, a Lei Complementar Nº 133 - Estatuto dos Funcionários Públicos Municipais - , considera funcionário público a pessoa legalmente investida em cargo público municipal.(19) Já os cargos públicos são aqueles criados por lei, sendo tanto os de provimento efetivo quanto os em comissão.(20) Por conseguinte, a Lei Complementar N.º 133 também contempla os cargos comissionados, estabelecendo o regime jurídico ao qual estão subsumidos.
[...]
40. Consoante já dito e repetido, o membro de Conselho Tutelar no Município de Porto Alegre exerce cargo em comissão. Assim sendo, têm direito às licenças anteriormente citadas, exceto as constantes dos incisos II, VII, VIII e IX do art. 141. Isto porque, a lei 7394 que regulamentou o vínculo com a Administração excetuou estas hipóteses, considerando justamente a natureza da função desempenhada pelo membro de conselho tutelar. Aos demais cargos em comissão do Município a regra incidente é a do parágrafo único, incisos I e II do mesmo art. 141, o qual também estabelece licenças a que os cargos comissionados não fazem jus. Esta regra não se aplica aos conselheiros tutelares face ao princípio da especialidade, segundo o qual norma especial afasta a incidência de norma geral. A norma especial é a Lei Municipal N.º 7394 e a norma geral o Estatuto dos Funcionários Municipais, o qual é aplicado subsidiariamente e no que couber, aos conselheiros tutelares, consoante se verifica da leitura do art. 7º da indigitada Lei.(21)
41. Por fim, resta elucidar o problema decorrente da contribuição previdenciária. Já foi muito debatida a questão concernente a contribuição previdenciária dos cargos comissionados. Porém, se dúvida havia, com o advento da Constituição de 1988 e da legislação infraconstitucional posterior (Lei dos Benefícios e Custeio da Previdência Social) a questão restou superada.
Atualmente é compulsória a vinculação do servidor público a um dos regimes previdenciários possíveis (geral ou particular do ente público). É entendido como regime previdenciário particular aquele que contemple, no mínimo, aposentadoria, pensão e os benefícios elencados no art. 40 da Constituição Federal. Consoante demonstra o Dr. Gustavo Nygaard, no Parecer da PGM de N.º 773/93,(22) o servidor apartado do regime próprio está automaticamente abrangido pelo regime geral. [...] (Disponível em <http://www.mp.rs.gov.br/infancia/doutrina/id165.htm> acesso em 09/04/07)
Como vimos, pelo Parecer da Procuradora do Município de Porto Alegre, o seu entendimento é de considerar a natureza jurídica do Conselheiro Tutelar como cargo em comissão. Contudo, discorda-se deste entendimento, pois os cargos comissionados são demissíveis ad nutum e de confiança do administrador público. E mais, ao utilizar a escolha por meio de eleição, estaríamos diante de uma inconstitucionalidade. A própria Procuradora reconhece a possibilidade dessa argüição.
Também afasta-se o entendimento de considerá-lo agente honorífico, haja vista que exercem uma função pública de forma momentânea, ou seja, por um período diminuto. O Conselheiro Tutelar tem mandato de 3 anos, permitida uma recondução, o que, no entender desta Consultoria, caracteriza continuidade e impossibilita seu reconhecimento como agente honorífico.
Os Conselheiros Tutelares, embora sejam eleitos pela comunidade local, não são detentores de mandato eletivo, pois o processo de escolha é simplificado e o voto é facultativo, conforme preceitua o art. 132 da Lei nº 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA), in verbis:
Art. 132. Em cada Município haverá, no mínimo, um Conselho Tutelar composto de cinco membros, escolhidos pela comunidade local para mandato de três anos, permitida uma recondução.
Este modo de eleição difere do sistema eleitoral realizado para a escolha de agentes políticos que são detentores de mandato eletivo. O mandato eletivo trata-se de um poder político outorgado pelo povo, por meio do voto obrigatório (facultativo em alguns casos estabelecidos na Constituição Federal), a um cidadão (condição de elegibilidade), para que governe a União, o Distrito Federal, um Estado ou um Município, ou represente os cidadãos nas respectivas casas legislativas, ou os Estados-Membros no Senado Federal.
Assim, a opção que traz menos problemas é o exercício de função pública sem cargo, que é aceita por parte da doutrina e não produz nenhuma ilegalidade ou inconstitucionalidade.
Por função pública, Hely Lopes Meirelles em sua doutrina conceitua que:
As funções são os encargos atribuídos aos órgãos, cargos e agentes. O órgão normalmente recebe a função in genere e a repassa aos seus cargos in specie, ou a transfere diretamente a agentes sem cargo, com a necessária parcela de poder público para o seu exercício. Toda função é atribuída e delimitada por norma legal. Essa atribuição e delimitação funcional configuram a competência do órgão, do cargo e do agente, ou seja, a natureza da função e o limite de poder para o seu desempenho. Daí por que, quando o agente ultrapassa esse limite, atua com abuso ou excesso de poder. (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 27. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2002, p.74)
Este é o atual entendimento desta Egrégia Corte de Contas, que já se posicionou acerca deste assunto, sendo matéria prejulgada. Propícia é a transcrição de parte do Prejulgado nº 940, bem como o Prejulgado nº 1475:
O membro de Conselho Tutelar previsto na Lei n° 8.069/90 (Estatuto da Criança e Adolescente) que perceba proventos de aposentadoria decorrente dos arts. 40, 42 ou 142 da Constituição da República não poderá perceber remuneração pela função exercida no Conselho, porquanto o § 10 do art. 37 da Constituição Federal veda a percepção simultânea de proventos decorrentes de aposentadoria no serviço público com remuneração de cargo, emprego ou função pública, independente da esfera de origem dos proventos e da remuneração, exceto se investido em cargo eletivo, em cargo em comissão declarados em lei de livre nomeação e exoneração ou se atendidos os requisitos de acumulatividade permitida pelo inciso XVI do art. 37 da Carta Magna.
[...]
Origem: Prefeitura Municipal de Guaraciaba
Relator: Auditor Evângelo Spyros Diamantaras
Data da Sessão: 18/12/2000
Prejulgado nº 1475
1. Para assumir as atribuições de conselheiro tutelar, o membro deve ser eleito, de acordo com as disposições constantes nos arts. 132 a 135 da Lei Federal nº 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente).
Caso o membro eleito seja servidor ativo ocupante de cargo público, em razão do que dispõe o art. 37, incisos XVI e XVII, da Constituição da República, deverá optar entre a remuneração de seu cargo e a de conselheiro, pois as atribuições do conselheiro tutelar são decorrentes de função pública.
Sendo eleito servidor inativo que tenha ocupado cargo (aposentadoria pelo regime estatutário - art. 40 da Constituição da República), também não poderá cumular os proventos decorrentes desta com a remuneração de conselheiro tutelar, devendo da mesma forma optar por uma das remunerações (art. 37, § 10, da Constituição da República), pois as atribuições do conselheiro tutelar são decorrentes de função pública.
Os servidores ativos e inativos deverão declarar formalmente sua opção de remuneração (remuneração do cargo, da aposentadoria, ou de conselheiro tutelar), cabendo ao município arquivar o pedido na pasta funcional do servidor. Caso o servidor não atenda a essa determinação, o prefeito municipal deverá nomear a pessoa com maior número de votos na ordem subseqüente.
2. O servidor ativo ou inativo que já tenha tomado posse como membro do conselho tutelar, e esteja acumulando as duas remunerações (remuneração do cargo, ou da aposentadoria, com de conselheiro tutelar), deverá ser exonerado do cargo de conselheiro tutelar ou ter a remuneração do cargo de servidor ativo ou proventos de aposentadoria suspensos, até adequar-se às determinações legais, devendo, ainda, devolver ao erário os valores que tiver recebido a maior de forma irregular, que devem ser apurados em competente procedimento de Tomada de Contas Especial a ser instaurado pelo município.
3. Tanto o servidor ativo ocupante de cargo, quanto o servidor inativo que tenha ocupado cargo (aposentadoria pelo regime estatutário - art. 40 da Constituição da República), e que esteja exercendo as funções de conselheiro tutelar, e opte pela remuneração da aposentadoria ou do cargo, não terá nenhuma suspensão dos benefícios concedidos aos servidores, tais como: revisão geral anual, aumentos, abonos, ou progressão funcional (servidor ativo).
Processo: CON-03/06649853
Parecer: COG-528/03
Decisão: 3928/2003
Origem: Prefeitura Municipal de Ilhota
Relator: Auditor Clóvis Mattos Balsini
Data da Sessão: 10/11/2003
Data do Diário Oficial: 19/12/2003
Sendo assim, superada a questão, no que tange a natureza jurídica do Conselheiro Tutelar, passa-se a analisar sobre a possibilidade ou não de cumulação de proventos e vencimentos.
Esta questão está sendo analisada pelo Processo PAD - 07/00024875, cujo objetivo é o de reformar os prejulgados relativos à aposentadoria voluntária e seus efeitos no contrato de trabalho de emprego de empresa públicas e sociedades de economia mista, além daqueles relacionados à possibilidade ou não de cumulação de proventos e vencimentos.
Transcreve-se abaixo o que a Coordenadoria de Sistematização, por meio da Informação nº COG - 009/07, sugeriu no Processo PAD - 07/00024875:
[...]
Diante de tais configurações e, precipuamente, a partir da manifestação do próprio Supremo, salienta-se que o atual posicionamento desta consultoria é no sentido de considerar a viabilidade de percepção simultânea de proventos (desde que não complementados por ente federativo, quer no âmbito da administração direta quer indireta), decorrentes da aposentadoria pelo regime geral de previdência social - INSS (não contemplada, portanto, nos artigos 40, 42 ou 142 da Constituição Federal, relativos a regime próprio de previdência social, afastando, por conseguinte, a vedação consubstanciada no artigo 37, §10, da Carta Magna), com vencimentos oriundos do exercício de cargo, emprego ou função pública.
[...]
Há que se observar, contudo, a questão da cumulação de vencimentos e proventos, admitindo-se, via de regra, sua percepção simultânea desde que os proventos decorram integralmente do INSS, sem complementação por parte de ente federativo, hipótese em que fica mantido o vínculo entre o servidor e o ente público, incidindo, portanto, as vedações de acumulação de proventos da inatividade com a remuneração, previstas no art. 37, §10, da Constituição Federal. Tal precaução faz-se mister, também, na hipótese em que o aposentado pelo regime geral de previdência social ingressar no serviço público, observando-se, nesse caso, a imprescindibilidade de realização e aprovação em concurso público, nos termos do artigo 37, II, da Constituição Federal.
Esta Egrégia Corte de Contas já consubstancia entendimento nesse sentido, admitindo a cumulação de remuneração de cargo, emprego ou função pública com proventos de aposentadoria, desde que esta não esteja fulcrada nos artigos 40, 42 e 142, da Constituição Federal (decorrente de regime próprio de previdência social). [...]
Porém, este não é o entedimento do Supremo Tribunal Federal acerca do assunto, o que fez com que a Coordenação de Consultas da Consultoria Geral solicitasse o retorno desses autos, bem como do processo PAD para estudo e explicações complementares que se fazem necessárias, com o intuito de adequá-los com a posição do STF que é pela impossibilidade de acumulação de proventos com vencimentos, independente de qual seja o regime previdenciário (Próprio ou Geral).
Essa posição ficou explicitamente esclarecida no julgamento do mérito da ADI nº 1770, conforme se extrai da seguinte parte do Voto do Relator, Ministro Joaquim Barbosa:
Ao menos desde o julgamento do RE 163.204 (rel. min. Carlos Velloso), a Corte tem decidido, já depois do advento da Constituição de 1988, que é vedada a acumulação de proventos de aposentadoria com vencimentos, a não ser nos casos excepcionalmente previstos no art. 37, XVI e XVII, da Carta. É preciso lembrar que a rationale em que se baseou o Pleno partiu do pressuposto de que a vedação de acumulação também se aplica aos empregados de empresas públicas e sociedade de economia mista- daí porque a explícita referência, na ementa do julgado, ao inciso XVII do art. 37. Vale lembrar que o entendimento do Tribunal foi confirmado com o advento da Emenda Constitucional nº 20, que taxativamente vedou o tipo de acumulação ora em questão ao acrescentar o § 10 ao art. 40 da Carta de 1988, sem contar os reiterados pronunciamentos da casa no mesmo sentido (cf., v.g., RE 463.028, rel. min. Ellen Gracie, Segunda Turma; AI 484.756-Agr, rel. min. Carlos Velloso, Segunda Turma; ADI 1.328, rel. min. Ellen Gracie, RE 141.376, rel. min. Nélson Néri da Silveira, Segunda Turma; RE 197.699, rel. min. Marco Aurélio. [...]
Ato contínuo, o Coordenador de Consultas manifestou-se no processo PAD, no qual exarou a Informação nº COG - 065/07, adequando tal processo com o pronunciamento acima transcrito do STF, in verbis:
[...]
O Supremo Tribunal Federal - STF ao interpretar os artigos 37, incisos XVI e XVII sempre entendeu que é vedado acumular proventos e vencimentos, salvo se os cargos, empregos ou funções fossem acumuláveis na atividade.
Exemplificando, podemos trazer os seguintes precedentes:
RE - 163.204/SP, de 09/11/1994;
RE - 141.376-0/RJ, de 02/10/2001;
AI - AgR - 495.967-4/SP, de 09/11/2004;
AI - AgR - 484.756-1/PR, de 15/02/2005.
Entretanto, uma segunda corrente, interpretando a redação original da Constituição da República, capitaneada por nomes como Celso Antônio Bandeira de Mello e José Afonso da Silva, entendia que a vedação dos incisos XVI e XVII do artigo 37 da Constituição da República era dirigida apenas à acumulação de vencimentos, mas não entre proventos e vencimentos.
Mesmo com a inclusão do §10 no artigo 37 da Constituição da República (acrescentado pela Emenda Constitucional nº 20), o Supremo Tribunal Federal - STF continuou a entender que tanto os proventos do Regime Geral (art. 201, C.R.), quanto os do Regime Próprio (arts. 40, 42 e 142, C.R.), decorrentes de cargo ou emprego na Administração Direta e Indireta, não são passíveis de acumulação com vencimentos provenientes de cargo, emprego ou função.
Esse contudo, não é o atual entendimento desta Consultoria Geral, que com a inclusão do §10 ao artigo 37 da Carta Magna, passou a se filiar à corrente que defende serem os proventos do Regime Geral acumuláveis com vencimentos. [...]
Contudo, no nosso entender, o STF encerrou a discussão quando do julgamento do mérito da ADI - 1770, pois em sede de Ação Direta de Inconstitucionalidade explicitamente afirmou não ser possível acumular proventos e vencimentos, independentemente de tratar-se de Regime Geral ou Próprio. [...]
Verifica-se que a informação nº COG-09/07 (fs. 29/75) deve ser desconsiderada, passando-se a atual informação a subsidiar o voto do Relator.[...]
A Consultoria Geral, num primeiro momento, manifestou-se nos mesmos moldes do entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal - STF, mas, como vimos, recentemente havia se filiado à corrente contrária ao STF.
Cabe-nos ressaltar que, pelo que pesquisamos no sítio do STF (www.stf.gov.br), o Pretório Excelso não havia se manifestado, em sede de Ação Direta de Inconstitucionalidade, sobre a proibição dos empregados, portanto, vinculados ao Regime Geral de Previdência Social (RGPS) acumularem proventos daquele regime com vencimentos de cargo, emprego ou função.
O Supremo Tribunal Federal - STF, nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade nº 1328-9 e 1541-9 analisou a impossibilidade de acumulação de proventos com vencimentos sob o prisma do inciso XVI do artigo 37 da Constituição da República, portanto Regime Próprio.
Agora, com a ADI - 1770, a Corte Suprema, fazendo o controle abstrato de norma, lança entendimento sobre a constitucionalidade da conjugação de proventos do Regime Geral, decorrentes de cargo ou emprego, e vencimentos.
Decorrência desse fato, iremos traçar abaixo os prejulgados correlatos ao tema em estudo e, fazer as devidas correções para compatibilizar os prejulgados desta Corte de Contas com as decisões emanadas pelo STF nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade nº 1721 e 1770.
Os prejulgados nº 650, 653, 745, 780, 903, 1010, 1154, 1165, 1216, 1363, 1475, 1575, 1778, 1787 e 1878, têm relação com a matéria estão compatíveis com o entendimento do Supremo Tribunal Federal.
Os prejulgados nº 502, 559, 606, 639, 658, 870, 918, 1150, 1206, 1326 e 1385, têm relação com a matéria mas não estão compatíveis com o entendimento do Supremo Tribunal Federal, merecendo, portanto, reforma ou revogação.
Ressaltamos que as alterações pertinentes aos prejulgados que tratam da acumulação entre proventos e remuneração decorrente do exercício da função de conselheiro tutelar serão revistas no processo CON - 07/00020535. [...]
Conforme visto, de acordo com o entendimento do STF firmado nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade nº 1721 e nº 1770, tanto o empregado (CLT) quanto o servidor inativo (estatutário), independentemente de estar vinculado ao Regime Geral de Previdência Social (RGPS) ou ao Regime Próprio de Previdência Social (RPPS), não podem perceber simultaneamente proventos com vencimentos oriundos do exercício de cargo, emprego ou função pública, salvo nos casos excepcionalmente previstos no art. 37, incisos XVI e XVII, da CF.
Sendo assim, o impedimento da acumulação de proventos e vencimentos, respaldado no § 10 do artigo 37 da Constituição Federal além de ser aplicado aos proventos de aposentadoria consubstanciados nos artigos 40, 42 e 142, da Constituição Federal também é aplicado aos proventos decorrentes do Regime Geral de Previdência Social (RGPS).
Portanto, sendo eleito Conselheiro Tutelar o servidor inativo que perceba proventos de aposentadoria pagos pelo Regime Geral de Previdência Social (INSS), decorrente de cargo ou emprego público, deverá optar por um dos pagamentos, haja vista não ser possível acumular proventos do RGPS com vencimentos da função exercida no Conselho (art. 37, § 10, da CF).
Sugere-se, ainda, a reforma do 1º parágrafo do Prejulgado nº 940, a fim de adequá-lo com o que foi acima exposto, passando a ter a seguinte redação:
O membro de Conselho Tutelar previsto na Lei n° 8.069/90 (Estatuto da Criança e Adolescente) que perceba proventos de aposentadoria decorrente de cargo ou emprego público pelo Regime Geral de Previdência Social (RGPS) não poderá perceber remuneração pela função exercida no Conselho, porquanto o § 10 do art. 37 da Constituição Federal veda a percepção simultânea de proventos decorrentes de aposentadoria no serviço público (cargo ou emprego público) com remuneração de cargo, emprego ou função pública, independente da esfera de origem dos proventos e da remuneração.
IV. CONCLUSÃO
Em consonância com o acima exposto e considerando:
- que o consulente está legitimado à subscrição de consultas para este Tribunal de Contas, nos termos dos incisos II do art. 103 e III do art. 104 do Regimento Interno desta Corte de Contas;
- que a consulta trata de situação em tese e de interpretação de lei, conforme determina o inciso XII do art. 59 da Constituição do Estado de Santa Catarina, bem como o inciso XV do art. 1º da Lei Complementar Estadual 202/2000;
- que apesar de não vir instruída com parecer da assessoria jurídica do órgão ou entidade consulente, conforme preceitua o art. 104, V, da Resolução n. TC-06/2001 (Regimento Interno do TCE/SC), o Tribunal Pleno poderá conhecer de consulta que não atenda a esta formalidade, conforme autoriza o parágrafo 2º do artigo 105 do referido Regimento, cabendo essa ponderação ser efetuada pelo Relator e pelos demais julgadores.
Sugere-se ao Exmo. Conselheiro César Filomeno Fontes que submeta voto ao Egrégio Plenário sobre consulta formulada pelo Exmo. Prefeito Municipal de Itapiranga, Sr. Vunibaldo Rech, nos termos deste parecer, que em síntese propõe:
1. Conhecer da consulta por preencher os requisitos de admissibilidade previstos no Regimento Interno.
2. Responder a consulta nos seguintes termos:
2.1. Os Conselheiros Tutelares, embora sejam eleitos pela comunidade local, não são detentores de mandato eletivo, pois o processo de escolha é simplificado e o voto é facultativo. Este modo de eleição difere do sistema eleitoral realizado para a escolha de agentes políticos que são detentores de mandato eletivo. O mandato eletivo trata-se de um poder político outorgado pelo povo, por meio do voto obrigatório (facultativo em alguns casos estabelecidos na Constituição Federal), a um cidadão (condição de elegibilidade), para que governe a União, o Distrito Federal, um Estado ou um Município, ou represente os cidadãos nas respectivas casas legislativas, ou os Estados-Membros no Senado Federal.
2.2. Sendo eleito Conselheiro Tutelar o servidor inativo que perceba proventos de aposentadoria pagos pelo Regime Geral de Previdência Social (INSS), decorrente de cargo ou emprego público, deverá optar por um dos pagamentos, haja vista não ser possível acumular proventos do RGPS com o vencimento da função exercida no Conselho (art. 37, § 10, da CF).
3. Revogar o Prejulgado nº 612.
4. Reformar o 1º parágrafo do Prejulgado nº 940, passando a ter a seguinte redação:
O membro de Conselho Tutelar previsto na Lei n° 8.069/90 (Estatuto da Criança e Adolescente) que perceba proventos de aposentadoria decorrente de cargo ou emprego público pelo Regime Geral de Previdência Social (RGPS) não poderá perceber remuneração pela função exercida no Conselho, porquanto o § 10 do art. 37 da Constituição Federal veda a percepção simultânea de proventos decorrentes de aposentadoria no serviço público (cargo ou emprego público) com remuneração de cargo, emprego ou função pública, independente da esfera de origem dos proventos e da remuneração.
5. Dar ciência desta decisão, do Parecer COG - 660/07 e Voto que a fundamenta ao Prefeito Municipal de Itapiranga, Sr. Vunibaldo Rech.
COG, em 29 de agosto de 2007.
JULIANA FRITZEN
Auditora Fiscal de Controle Externo
De Acordo. Em ____/____/____
GUILHERME DA COSTA SPERRY
Coordenador de Consultas
DE ACORDO.
À consideração do Exmo. Sr. Conselheiro César Filomeno Fontes, ouvido preliminarmente o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas.
COG, em de de 2007.
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MARCELO BROGNOLI DA COSTA Consultor Geral |