TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE SANTA CATARINA

DIRETORIA DE CONTROLE DOS MUNICÍPIOS - DMU

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PROCESSO :

RPA 03/02681680
   

UNIDADE :

Prefeitura Municipal de Otacílio Costa
   

RESPONSÁVEL :

Sr. Altamir José Paes - Prefeito no exercício de 2002
   
INTERESSADO : Sr. Antônio Geraldo Martins - Vice Presidente da Câmara a época
   
ASSUNTO : Representação de agente público acerca de irregularidades no processo de desapropriação de imóvel
   
RELATÓRIO N° : 2377/2007

INTRODUÇÃO

Tratam os autos de inspeção decorrente da manifestação do Egrégio Plenário deste Tribunal, em sessão de 02/06/2003 (fl. 60), Decisão nº 1693/2003, que determinou a adoção de providências para apuração dos fatos denunciados.

A Decisão foi proferida em razão das irregularidades representadas, quando o Processo mereceu apreciação da Diretoria de Controle dos Municípios, através do Relatório de Admissibilidade nº 518/2003, de 22/04/2003 (fls. 54 a 56 dos autos).

Assim sendo realizou-se Inspeção in loco, entre os dias 28/02 a 04/03 de 2005, conforme Of. TCE/DDR nº 1297/2005 (fl. 64), para verificação de irregularidades cometidas no âmbito da Prefeitura Municipal de Otacílio Costa.

Os trabalhos foram confiados aos auditores fiscais Celso Guerini (Coordenador), Sandro Luiz Nunes e Najla Saida Fain.

Das ações de inspeção procedidas, originou-se o Relatório de Inspeção nº 22/2005, constante às fls. 162 a 198 dos autos, propugnando recomendação no sentido de proceder-se a Audiência do Responsável em razão do cometimento de irregularidades conforme conclusão do referido relatório.

O Sr. Altamir José Paes, através do Ofício s/nº, datado de 01/07/2005, protocolado neste Tribunal sob n.º 11901, em 04/07/2005, apresentou justificativas sobre as restrições anotadas no Relatório supracitado.

II - DA TRAMITAÇÃO DO PROCESSO

Por força dos artigos 1º e 2º, da Resolução TC nº 10/2007, de 26 de fevereiro de 2007, que altera a estrutura e as competências dos órgãos auxiliares do Tribunal de Contas de Santa Catarina e artigo 1º, Inciso I, alínea "b" e III da Portaria nº TC 136/2007, de 27/02/2007 o presente processo foi encaminhado à Diretoria de Controle dos Municípios.

III - DA REINSTRUÇÃO

Visando proceder a Reinstrução do presente processo, traz-se as restrições relacionadas na conclusão do Relatório de Inspeção nº 22/2005, colocando a manifestação do Responsável abaixo de cada uma delas, conforme a seguir:

1.1 - Avaliação de imóvel desapropriado pelo Município, através de laudo incompleto, sem observância dos critérios estabelecidos nas normas da ABNT, estando ausentes elementos essenciais de convencimento de que houve justa indenização, conforme artigo 5º, XXIV da C.F.

(Relatório n.º 022/2005, de inspeção "in loco" - Audiência, item 1)

O Responsável apresentou as seguintes justificativas:

No presente caso, foi o que ocorreu. O Município de Otacílio Costa vinha se ressentindo dos efeitos de uma economia estagnada, geradora de desemprego. Este efeito - o desemprego - também vinha sendo aumentado pela tecnologia industrial. Para se ter uma idéia, a empresa Klabin sucessora da Olinkraft, Igaras e Manville e base da economia local, já operou, nos anos 60 e 70, com quase três mil empregos diretos. Atualmente, vem operando com pouco mais de 600 funcionários - situação que, convenhamos, é significativa para uma população de pouco mais de 15 mil habitantes. Imagine-se a situação que geraria se fosse, em termos exatamente proporcionais, registrada em centros como Joinville, Florianópolis ou Blumenau...

Buscando a instalação de empresas geradoras de emprego e que aproveitassem os recursos econômicos da região, a Administração Municipal efetuou diagnóstico florestal do Município para divulgação no país e no exterior. Com isso, atraiu a atenção das grandes indústrias.

Houve grande repercussão das potencialidades de Otacílio Costa no setor madeireiro. E diversas industrias, inclusive do exterior, estiveram visitando o Município que, por sua vez, buscava um local apropriado para a instalação de novas empresas.

A empresa Klabin não se opôs à desapropriação de um terreno, SITUADO NO PERÍMETRO URBANO, às margens da rodovia SC-425, para ampliação do Núcleo Industrial do Município, apesar de o referido terreno estar totalmente coberto de pinus.

Havia necessidade de que as empresas contassem, de imediato, com área disponível para sua instalação em Otacílio Costa. E a administração, de um dia para o outro, viu-se na contingência de perder grande parte, ou até a totalidade, dessas empresas para outros Municípios próximos que, na carona do levantamento florestal realizado por Otacílio Costa, ofereciam vantagens para acolher aquelas indústrias. Não havia como perder tempo.

Realizou-se, então, a avaliação do dito terreno. Não foram observados, é verdade, todos os contornos indicados pela ABNT para a providência. No entanto, QUALQUER AVALIAÇÃO QUE SE FAÇA, EM QUAISQUER CONDIÇÕES E COM QUAISQUER TÉCNICAS, chegará à conclusão de que o imóvel desapropriado vale, no mínimo, SEIS VEZES MAIS do que a avaliação realizada.

A empresa Klabin não se opôs ao irrisório preço oferecido pela desapropriação por ter herdado a tradição de suas antecessoras de contribuir para o progresso municipal, sendo parceira em inúmeras iniciativas do gênero ao longo de sua existência na região (desde 1948). De pronto, afasta-se, portanto, a idéia de que teria havido uma superavaliação do imóvel para beneficiar a empresa expropriada, mesmo porque seu nível patrimonial e financeiro não carece de tais expedientes para se manter ou para seu incremento.

De outra banda, se tivesse havido alguma ilegalidade com lesividade ao patrimônio público municipal, por certo que haveria denúncias neste sentido. Ao que se sabe, houve apenas um isolado denunciador, com objetivos visivelmente eleitoreiros, já que o referido cidadão foi candidato em chapa majoritária contrária à reeleição dos atuais administradores municipais. Sistematicamente, o denunciante (Antônio Geraldo Martins, então ocupante do cargo de vereador) sempre se posicionou, por mais absurdo que possa parecer, abertamente, empresários que buscavam a parceria e aqui pretendiam se instalar. Chegou a criar situações constrangedoras em reuniões com os empresários que aqui buscavam instalar suas indústrias.

Apesar dessa isolada voz contrária ao progresso e à geração de empregos, o Núcleo Industrial e Comercial se tornou uma realidade exatamente a partir daquela expropriação e sempre contando com o apoio da comunidade, que hoje se beneficia com centenas de novos empregos diretos e muito mais indiretos.

Veja-se que na avaliação, de R$ 131.000,00, se incluíam as árvores de pinus, cuja venda, por leilão, gerou aos cofres municipais a importância de R$ 33.000,00, com o que o terreno já custou para o Município menos de R$ 100.000,00.

Ora, trata-se de uma área com praticamente 'meio milhão' de metros quadrados, situada de frente para a principal rodovia que travessa o perímetro urbano de Otacílio Costa. Ainda que fosse um terreno situado a 10 ou 20 Km do perímetro urbano, valeria muito mais que R$ 100.000,00. No entanto, o terreno está no perímetro urbano, a menos de 500m (isso mesmo, QUINHENTOS METROS) do Prédio da Prefeitura Municipal.

Por derradeiro, o aponte do DD Relator, neste tópico, diz respeito à possibilidade de que estariam 'ausentes elementos essenciais de convencimento de que houve justa indenização'. Obviamente, que o 'justo' que a lei exige para situações como a presente, é o preço indenizatório não prejudicial a qualquer das partes, ou seja, que seja efetivamente justo para todas as partes - expropriante e expropriado.

Quanto à empresa expropriada, se julgasse o preço ofertado injusto, por certo que se insurgiria. Ainda que bem inferior ao preço de mercado, o valor ofertado foi aceito pela empresa, e unicamente pelas circunstâncias acima referidas, no sentido de que a Klabin sempre, desde o nascedouro de sua área fabril, em 1948, participou de todas as iniciativas que visassem o benefício coletivo. Um exemplo disso é a construção do Hospital Santa Clara, cujos recursos necessários foram adiantados pela então empresa OlinKraft/Igaras, antecessora da Klabin.

Para o Município, obviamente que o preço foi altamente compensador. Se colocado à venda a particulares, o mesmo imóvel, por ocasião da desapropriação, receberia preço no mínimo cinco vezes superior.

No entanto, caso esse Eg. Tribunal entenda necessária a realização de uma avaliação nos moldes delineados pela ABNT, não haverá qualquer problema, e não querendo, de forma alguma, parecer piegas, nem lançar desafio demagógico, este administrador adianta que indenizará a diferença, com recursos próprios, caso haja avaliação apontado um valor do imóvel inferior àquele indicado pela Comissão Especial de Avaliação."

Considerações da Instrução:

Quanto ao fato da avaliação de imóvel desapropriado pelo Município ter sido efetuada através de laudo incompleto, sem observância dos critérios estabelecidos nas normas da ABNT, o responsável afirma que "Não foram observados, é verdade, todos os contornos indicados pela ABNT para a providência".

A NBR 5676, em vigência na data da desapropriação do imóvel, utilizada para avaliar imóveis urbanos, estabelece padrões para elaboração de laudos avaliatórios que, em casos particulares, poderão ser alterados, desde que devidamente justificados. Eis os requisitos mínimos ditados pela referida Norma para realização de Laudos de Avaliação:

1. IDENTIFICAÇÃO DO SOLICITANTE

2. IDENTIFICAÇÃO DO PROPRIETÁRIO (se diferente do solicitante);

3. OBJETIVO DA AVALIAÇÃO

4. IDENTIFICAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO DO BEM AVALIADO

Bens imóveis em geral

Endereço completo do imóvel

Caracterização da região

- Usos predominantes e potenciais no entorno (residencial familiar, residencial multifamiliar, comercial, industrial, rural);

- Infra-estrutura (água, esgoto pluvial e sanitário, energia elétrica, iluminação, telefonia, informação, gás canalizado);

- Serviços públicos e comunitários (pavimentação, transportes coletivos, comércio, rede bancária, educação, saúde, segurança, lazer);

- Caracterização física (relevo, solo e condições ambientais);

Caracterização ao terreno

- Área e dimensões dos lados (frente, fundos, laterais) do terreno;

- Forma geométrica;

- Situação do terreno em relação à quadra (meio de quadra, esquina, quadra inteira, outros);

- Posição em relação ao nível do logradouro (no nível, acima, abaixo);

- Inclinação/relevo (plano, semi-plano, aclive, declive, acidentado, etc.);

Superfície (seco, brejoso, alagável, outros);

- Uso atual e vocação;

- Servidões existentes ou previstas (informar tipo e dimensões);

- Áreas de preservação permanente;

- Outras restrições físicas e legais ao aproveitamento;

Caracterização da edificação ou unidade

- Tipo (casa, apartamento, loja, prédio, galpão, outros);

- Número de pavimentos;

- Posição no terreno ou na edificação (unidade, apartamento, escritório, etc.);

- Fração ideal do terreno atribuída à unidade avaliada, quando for o caso;

- Idade efetiva e aparente;

- Padrão de acabamento;

- Estado de conservação;

- Detalhes construtivos relevantes (cobertura da edificação, material das alvenarias, etc.);

- Número de vagas de estacionamento cobertas ou descobertas (para residenciais e imóveis comerciais);

- Áreas averbadas;

- Áreas não averbadas;

- Uso (residencial, comercial, industrial, misto, outros);

- Condições de ocupação.

5. INDICAÇÃO DOS MÉTODOS E PROCEDIMENTOS UTILIZADOS

Fazendo constar a justificativa da escolha

6. PESQUISAS DE VALORES

Informando inclusive:

- fontes de consulta;

- no caso de bens imóveis, os endereços e a descrição dos imóveis que compuseram a amostra;

- data em que os dados foram obtidos.

7. ESPECIFICAÇÃO A AVALIAÇÃO

Quanto à Fundamentação e à Precisão, os laudos deverão apresentar:

Imóveis urbanos e rurais:

- Grau de Fundamentação III;

- Grau de Precisão III;

Máquinas, equipamentos, instalações e complexos industriais: Nível de Precisão rigoroso.

A adoção de graus ou níveis inferiores àqueles ora estabelecidos deverá ser devidamente justificada.

8. MEMÓRIA DE CÁLCULO COM TRATAMENTO DOS DADOS

9. IDENTIFICAÇÃO DO RESULTADO

Deverão ser apresentados o valor de mercado e o valor de liquidação

10. LOCAL E DATA DA AVALIAÇÃO

11. QUALIFICAÇÃO LEGAL COMPLETA E ASSINATURA DOS PROFISSIONAIS RESPONSÁVEIS PELA AVALIAÇÃO

12. DOCUMENTAÇÃO MÍNIMA A SER ANEXADA AO LAUDO

Cópia da ART quitada dos profissionais responsáveis pela avaliação;

Para todos os imóveis: cópia do título de propriedade e certidão de ônus reais atualizada;

Para imóveis residenciais, comerciais e industriais: cópia do espelho do último IPTU;

Máquinas e equipamentos: cópia das notas fiscais de aquisição dos bens;

Relatório fotográfico dos bens avaliados e, sempre que possível, dos elementos da amostra.

É recomendável a apresentação de planta de localização/situação dos imóveis avaliados.

Com intuito de redimir possíveis dúvidas no tocante a avaliação do imóvel, efetuada pela comissão de avaliação, nomeada pelo Prefeito Municipal de Otacílio Costa, por meio do Decreto nº 162/02 (fl. 65 dos autos), requisitou-se à época, à Diretoria de Controle de Obras, um parecer técnico à respeito da forma em que foi efetuada a avaliação, a qual, manifestou-se no seguinte sentido (fls. 223 e 224 dos autos):

"Constata-se que o laudo presente nos autos, não deve ser considerado como Laudo de Avaliação por não atender os dispositivos contidos nas Normas Brasileiras.

Simplesmente, foi arbitrado um valor a ser pago pela municipalidade, com evidências de entendimento antecipado com a expropriada.

Ressalta-se que, em outubro de 2000, a extinta Diretoria de Controle de Obras - DCO, efetuou auditoria no Município de Palmeira, atendendo denúncia formulada a esta Corte de Contas (Processo DEN 62348/01-90), referente a desapropriação efetuada pelo Município de Palmeira, sendo o Engº Agrimensor Orlando Armênio era um dos membros da equipe de avaliadores constituída pela municipalidade.

Naquele processo, no Acórdão 750/2002, houve imputações de multas em função da ausência de ART e elaboração de Laudo de Avaliação, em desacordo com as normas vigentes.

Logo, o referido avaliador já tinha conhecimento da confecção de laudo de acordo com o prescrito nas Normas Brasileiras.

Portanto, não deveria ser estranha para o mesmo a aplicação das normas técnicas vigentes. Além de que, cabe ao profissional legalmente habilitado o conhecimento da aplicação das Normas Brasileiras e suas conseqüências.

Dentre as Normas Brasileiras para avaliação de imóveis em vigor à época, destaca-se as que poderiam ser aplicadas ao imóvel em tela:

- NB-502/NBR 5.676 - Norma para Avaliação de Imóveis Urbanos

- NBR-900/NBR 8.951 - Norma para Avaliação de Glebas Urbanizáveis

- NBR-613/8.799/85 - Avaliação de Imóveis Rurais

Constatou-se que na apresentação do laudo de avaliação efetuada pela equipe de inspeção da extinta Diretoria de Denúncias e Representações - DDR deve ser desconsiderado, pois, os mesmos não são legalmente habilitados para efetuar avaliação de imóveis (fls. 170 a 174), de acordo com a legislação pertinente no item 2.1. deste relatório."

É de se concluir, portanto, que o laudo de avaliação, apresentado quando da Inspeção in loco, não possui os requisitos mínimos contidos nas Normas Brasileiras de Avaliação.

O Responsável, em sua manifestação, admite que, na elaboração do laudo de avaliação não foram observados todos os requisitos indicados pela ABNT, contudo, assevera que o valor pago à expropriada é inferior ao valor de mercado.

Nada obsta que a empresa concorde em receber, à título de indenização, um valor inferior ao valor de mercado do imóvel, podendo até mesmo, caso haja autorização legislativa, doar o imóvel ao Município.

Contudo, quando há pagamento de indenização, como no caso em tela, somente um laudo de avaliação elaborado dentro das normas ditadas pela ABNT, pode assegurar que o valor pago não extrapolou o valor de mercado do imóvel.

Ausentes e não comprovados os requisitos mínimos utilizados para avaliação do imóvel desapropriado, previstos nas Normas Brasileiras de Avaliação de Imóveis, mantém-se a restrição.

1.2 - Imissão prévia, pelo Município, na posse de imóvel expropriado, realizando extração e venda de pinus lá existentes, mediante leilão, antes da efetivação da indenização devida, contrariando o § 1º do artigo 15 do Decreto Federal nº 3.365/41

(Relatório n.º 22/2005, de inspeção "in loco" - Audiência, item 2)

O Responsável apresentou as seguintes justificativas:

"Valem, aqui, os mesmos argumentos acima expedidos quanto à necessidade premente, para o Município de Otacílio Costa, de contar com uma área industrial para abrigar empresas que aqui pretendiam se instalar, sob pena de afastar tais empresas para outras regiões.

É verdade que houve a imissão na posse antes da efetivação da indenização, o que constitui irregularidade, conforme se deduz inclusive pelo disposto no Prejulgado 497 do TCE/SC. No entanto, a imissão se operou com a aquiescência da empresa expropriada, sabedora da urgência com que o Município precisava dispor do terreno.

Espera-se, portanto, que seja dado como superada a irregularidade, face aos relevantes motivos aqui expostos."

Considerações da Instrução:

Primeiramente, mostra-se oportuna a transcrição do relato dos fatos constatados a respeito da imissão prévia, quando da inspeção in loco, fls. 175 a 177 dos autos:

Evidenciado, ficou, que o Município ainda não detinha a posse do imóvel quando alienou os pinheiros existentes no imóvel desapropriado.

Para melhor esclarecer a questão, faz-se um breve estudo sobre a imissão prévia:

Segundo ALEXANDRINO, M.; PAULO, Vicente P. Direito Administrativo. 11 ed. Rio de Janeiro: Ímpetus, 2006, p. 584:

"Em regra, a posse do expropriante sobre o bem expropriado somente ocorre quando tiver sido ultimado todo o processo de desapropriação, com a transferência jurídica, após o pagamento de devida indenização.

Porém, desde que haja declaração de urgência e depósito prévio, é possível a imissão provisória na posse, isto é, que o expropriante passe a ter a posse provisória do bem antes da finalização da ação de desapropriação."

O art. 15 do Decreto Lei nº 3.365/41, que trata das desapropriações por utilidade pública, corrobora o exposto, prevendo o seguinte:

"Se o expropriante alegar urgência e depositar quantia arbitrada de conformidade com o art. 685 do Código de Processo Civil, o juiz mandará imiti-lo provisoriamente na posse dos bens.

Verifica-se, portanto, dois pressupostos para a imissão provisória na posse:

- declaração de urgência pelo Poder Público, expedida no próprio decreto expropriatório ou posteriormente, no curso da ação de desapropriação;

- depósito prévio, cujo valor será arbitrado pelo juiz segundo critérios da lei expropriatória.

O expropriante tem o prazo de 120 dias, a partir da decretação de urgência, para requerer ao juiz a imissão provisória.

O Responsável afirma que "É verdade que houve a imissão na posse antes da efetivação da indenização (...). No entanto, a imissão se operou com aquiêscencia da empresa expropriada, sabedora da urgência com que o Município precisava dispor do terreno". O fato da empresa expropriada concordar com a imissão prévia não garante ao Ente expropriante tal direito.

Ou seja, a Prefeitura Municipal de Otacílio Costa não tinha posse sobre o bem expropriado, visto que a lavratura da Escritura Pública em seu nome deu-se em 09/12/2004, quando a alienação dos pinheiros existentes no terreno ocorreu em 26/05/2003 (fl. 175 dos autos), mesmo não tendo ultimado todo o processo de desapropriação, com a transferência jurídica do bem, ainda assim, o Município poderia imitir-se da posse provisória, declarando urgência, via Decreto expedido pelo Poder Executivo, ou mediante depósito prévio, conforme visto anteriormente.

Assim, não comprovada a posse por parte do expropriante (Prefeitura Municipal de Otacílio Costa) em data anterior à alienação dos pinheiros existentes no terreno desapropriado, nem tampouco, havendo declaração de urgência, nem depósito prévio, pressupostos para realização de imissão provisória na posse, mantém-se a restrição.

1.3 - Indenização referente à expropriação realizada pelo Município, cumprida através de compensação tributária, sem autorização legislativa, em desconsonância com o artigo 170 do Código Tributário Nacional

(Relatório n.º 22/2005, de inspeção "in loco" - Audiência, item 3)

O Responsável apresentou as seguintes justificativas:

"Acreditamos que os órgãos técnicos desse Tribunal de Contas tenham incorrido em equívoco, ao afirmarem que a Administração Municipal de Otacílio Costa promoveu compensação tributária sem autorização legislativa, em desacordo com o artigo 170 do Código Tributário Nacional.

A Lei Complementar Municipal nº 40, de 18 de dezembro de 2002, que "institui o Código Tributário do Município de Otacílio Costa", em seu art. 120 determina que " Fica o Executivo Municipal autorizado, a seu critério, a compensar débitos tributários com créditos líquidos e certos, vencidos ou vincendos do sujeito passivo contra a Fazenda Pública, nas condições e sob as garantias que estipular."

Considerações da Instrução:

Ao Município é permitido legislar concorrentemente sobre matéria tributária, conforme previsão disposta no art. 24, inciso I da C.F., em outras palavras, a Constituição Federal concede autonomia ao Município para edição de normas tributárias acerca dos tributos de sua competência.

Mais adiante, a Constituição Federal, no art. 24, §1º, prevê:

"§ 1º - No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais."

Em matéria de compensação tributária o art. 170 do Código Tributário Nacional estabelece que:

Importante destacar que a Constituição Federal de 1988 recepcionou com status de Lei Complementar o Código Tributário Nacional, promulgado pela Lei 5.172/66, estando, portanto, o art. 170 do CTN em consonância com as disposições constitucionais. Pode-se, então, concluir que o direito à compensação é autorizado mediante disposições legais infraconstitucionais.

O Responsável, em suas justificativas, menciona o artigo 120 da Lei Complementar Municipal nº 40, de 18/12/2002, que institui o Código Tributário Municipal, estabelecendo que: "Fica o Executivo Municipal autorizado, a seu critério, a compensar débitos tributários com créditos líquidos e certos, vencidos ou vincendos do sujeito passivo contra a Fazenda Pública, nas condições e sob as garantias que estipular."

Nota-se, portanto, que o Município de Otacílio Costa possui previsão legal para compensação de créditos, podendo sim, compensar créditos tributários com o crédito resultante da indenização por desapropriação, contudo, embora possua autorização legal, em respeito ao princípio da formalidade deveria, via Decreto, regulamentar referidas compensações, visto que o art. 120 da Lei Complementar Municipal nº 40/2002, Código Tributário Municipal, autoriza a compensação tributária pelo Chefe do Poder Executivo, porém, não estipula as condições e garantias.

Desta forma, possuindo o Município previsão legal para compensação de créditos, resta por sanada a restrição apontada quando da Instrução, visto que esta referia-se à ausência de autorização legal para compensação tributária, todavia, ressalta-se que além de referida autorização, o Chefe do Poder Executivo deve, a cada caso, editar Decreto regulamentando tal compensação.

1.4 - Concessão de isenção tributária às Empresas instaladas no Núcleo Industrial e Comercial de Otacílio Costa, sem atendimento dos requisitos previstos no art. 4º, § 2º V, art. 5º, II e art. 14 da LC 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal), ainda que haja lei autorizativa local, ou seja, a LC 25/2001 de 18/09/2001, alterada pelas LC nº 031/2001 de 28/12/2001, LC nº 37/2002 de 26/04/2002, LC nº 38/2002 de 03/12/2002

(Relatório n.º 22/2005, de inspeção "in loco" - Audiência, item 4)

O Responsável apresentou as seguintes justificativas:

"Os artigos 3º e 4º, da Lei Complementar nº 25, de 18.09.01 apenas autorizam a concessão de incentivos de natureza fiscal.

Reza o art. 4º:

'Art. 4º. Os incentivos a que se refere o artigo 3º poderão constituir-se, isolada ou cumulativamente:

I - da isenção de tributos municipais concedida por ato do Chefe do Poder Executivo, obedecidas as..." (grifamos e destacamos).

Não podem os técnicos desse E. Tribunal de Contas inferir que houve o descumprimento a dispositivos da Lei de Responsabilidade Fiscal em relação à renúncia de receita, apenas pelo fato de que uma lei municipal autoriza a concessão de tais benefícios, sem demonstrar quais foram as empresas beneficiadas, quais os tributos não recolhidos e respectivos valores e, principalmente, quais os atos que concederam as isenções.

Especificamente em relação à empresa Serraria Campos de Palma S/A que motivou o processo objeto da presente Audiência, não consta dos autos qualquer referência sobre os impostos não recolhidos e, tampouco, é mencionado o ato que concedeu o benefício fiscal na forma da Lei.

Assim, esperamos seja a restrição considerada insubsistente, apreciando-se como regulares os atos praticados."

Considerações da Instrução:

Com intuito de ampliar o Núcleo Industrial e Comercial do Município de Otacílio Costa, este desapropriou uma área de terras, 467.902 m2, de posse e domínio da Klabin S/A, através de Decreto nº 196 de 03/12/2002, fls. 79 e 80 dos autos.

Através da Lei Municipal nº 1.397 de 21/04/2003, fls. 140 e 141 dos autos, procedeu a doação de parte desta área desapropriada, 57.220 m2, à Empresa Serrarias Campos de Palmas S/A, para instalação de unidade industrial.

Todavia a doação não é o instituto mais adequado, e sim, a concessão de direito real de uso, conforme dispõe o Prejulgado 1852 desta Corte de Contas:

Salienta-se que ao conceder isenções o Município deve respeitar os requisitos estabelecidos na Lei Complementar Municipal nº 25, de 18.09.01, inclusive as normas estabelecidas pela Lei Complementar nº 101/2000 - LRF, no tocante à renúncia de receita.

Considerando que não ficou demonstrado, quando do relatório Instrutivo de Inspeção in loco nº 22/2005, a efetiva concessão de incentivos fiscais previstos na Lei Complementar nº 25, de 18.09.01, alegadas, inclusive pelo Responsável: "não consta dos autos qualquer referência sobre os impostos não recolhidos e, tampouco, é mencionado o ato que concede o benefício fiscal na forma da Lei.", considera-se sem efeito a restrição apontada inicialmente.

CONCLUSÃO

À vista do exposto e considerando a inspeção in loco realizada na Prefeitura de Otacílio Costa, entende a Diretoria de Controle dos Municípios - DMU, com fulcro nos artigos 59 e 113 da Constituição do Estado c/c o artigo 1º, inciso III da Lei Complementar n.º 202/2000, que possa o Tribunal Pleno, decidir por:

1 - CONHECER do presente Relatório de Reinstrução, decorrente do Relatório de Inspeção nº 22/2005, resultante da inspeção in loco realizada na Prefeitura Municipal de Otacílio Costa, para, no mérito:

2 - CONSIDERAR IRREGULARES, na forma do artigo 36, § 2º, "a" da Lei Complementar n.º 202/2000, os atos a seguir relacionados, aplicando ao Sr. Altamir José Paes - Prefeito Municipal, CPF 521.814.489-49, residente Condomínio Vila Brasília, 22, Pinheiros, CEP 88540-000, multa(s) prevista(s) no artigo 70, inciso II da Lei Complementar n.º 202/2000, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias a contar da publicação do acórdão no Diário Oficial do Estado para comprovar ao Tribunal o recolhimento da multa ao Tesouro do Estado, sem o que fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos artigos 43, II, e 71 da Lei Complementar n.º 202/2000:

2.1 - Avaliação de imóvel desapropriado pelo Município, através de laudo incompleto, sem observância dos critérios estabelecidos nas normas da ABNT, estando ausentes elementos essenciais de convencimento de que houve justa indenização, conforme artigo 5º, XXIV da C.F. (item 1.1 deste Relatório);

2.2 - Imissão prévia, pelo Município, na posse de imóvel expropriado, realizando extração e venda de pinus lá existentes, mediante leilão, antes da efetivação da indenização devida, contrariando o § 1º do artigo 15 do Decreto Federal nº 3.365/41 (item 1.2).

3 - RECOMENDAR a revogação do ato que formalizou a doação do terreno à empresa Serrarias Campos de Palmas S/A, conforme apontado no item 'c' do Relatório de Inspeção nº 022/2005, concedendo apenas o direito real de uso, mediante Lei autorizativa que disponha sobre as condições e preveja o atrelamento às atividades para as quais houve concessão, bem como a reversão do bem para o Município após o transcurso do prazo ou quando não mais sejam atendidas as condições da concessão, evitando-se a doação de bens imóveis públicos à particulares.

4 - RECOMENDAR a regulamentação, via Decreto, de futuras compensações tributárias, estipulando as condições e garantias do procedimento realizado, conforme o disposto no artigo 120 do Código Tributário Municipal de Otacílio Costa.

5 - DAR CIÊNCIA da decisão ao Denunciado, Sr. Altamir José Paes e ao Denunciante, Sr. Antônio Geraldo Martins

É o Relatório.

TCE/DMU/DCM 2, em 10/10/2007

Thaisy Maria Assing

Auditora Fiscal de Controle Externo

Visto em ........./........./..........

Clóvis Coelho Machado Auditor Fiscal de Controle Externo Chefe de Divisão

De Acordo

EM......../...../2007.

Cristiane de Souza Reginatto

Coordenadora de Controle

Inspetoria 1

 

TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE SANTA CATARINA

DIRETORIA DE CONTROLE DOS MUNICÍPIOS - DMU

Rua Bulcão Viana, 90, Centro – Florianópolis – Santa Catarina

Fone: (048) 3221 - 3764 Fax: (048) 3221-3730

Home-page: www.tce.sc.gov.br

PROCESSO  
   

UNIDADE

Prefeitura Municipal de ....................
   
ASSUNTO
    Reinstrução xxxxxxxxxxxxxxxxxxx

ÓRGÃO INSTRUTIVO

Parecer - Remessa

Ao Senhor (Conselheiro ou Auditor) Relator, ouvida a Douta Procuradoria, submetemos à consideração o Processo em epígrafe.

TC/DMU, em ...../....../.......

GERALDO JOSÉ GOMES

Diretor de Controle dos Municípios