ESTADO DE SANTA CATARINA
    TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO
    CONSULTORIA GERAL

Processo n°: REC - 04/01177904
Origem: Companhia de Desenvolvimento de Jaraguá do Sul
RESPONSÁVEL: Humberto José Travi
Assunto: Recurso (Reexame - art. 80 da LC 202/2000) -ALC-02/10882921
Parecer n° COG-896/07

Recurso de Reexame. Auditoria in loco. Licitações, contratos a atos análogos. Imputação de multas. Improcedência das preliminares argüidas pelo Recorrente. Conhecer e dar provimento parcial.

Contrato Administrativo. Prorrogação. Serviços.

A possibilidade de prorrogação de contratos, constante do art. 57, II, da Lei Federal nº 8.666/93, somente é aplicável para a prestação de serviços de natureza continuada, e desde que expressamente prevista no ato convocatório da licitação.

Nos termos do Prejulgado nº 923, não caracterizam serviços de natureza continuada a assessoria técnica e administrativa sendo, portanto, vedada a prorrogação de prazo dos contratos prevista no art. 57, II, da Lei de Licitações.

Contrato Administrativo. Ausência ou atraso na publicação. Irregularidade formal.

Marçal Justen Filho afirma que a "ausência de publicação do extrato do contrato não é causa de sua invalidade. O defeito não afeta a contratação. A publicação é condição para o contrato produzir efeitos. Na ausência ou no defeito da publicação, a situação se regulariza com nova publicação."

Senhor Consultor,

RELATÓRIO

Tratam os autos nº REC-04/01177904 de Recurso de Reexame, interposto pelo Sr. Humberto José Travi - ex-Diretor-Presidente da Companhia de Desenvolvimento de Jaraguá do Sul - CODEJAS, em face do Acórdão nº 2520/2003, proferido no Processo nº ALC-02/10882921.

O citado Processo n. ALC-02/10882921 é relativo à auditoria in loco sobre licitações, contratos, convênios e atos jurídicos análogos referentes ao exercício de 2000, empreendida por esta Corte de Contas, através de sua Diretoria de Controle da Administração Estadual - DCE.

Levada a efeito a mencionada análise, a DCE procedeu à elaboração do Relatório nº 355/02 (fls. 09 a 21), no qual sugeriu a audiência do Sr. Humberto José Travi para apresentar defesa acerca das irregularidades evidenciadas.

Exercendo o direito constitucional ao contraditório, o ora Recorrente compareceu aos autos e juntou suas justificativas e documentos (fls. 25 a 46).

A DCE, seqüencialmente, analisou os argumentos trazidos pelo Sr. Humberto José Travi e elaborou o Relatório nº 117/2003 (fls. 49 a 57), cujas conclusões foram acatadas na íntegra pelo Ministério Público (fls. 59/60) e pelo Exmo. Relator do feito (fls. 61 a 64).

Na Sessão Ordinária de 03/12/2003, o Processo n. ALC-02/10882921 foi levado à apreciação do Tribunal Pleno, sendo prolatado o Acórdão n. 2520/2003, portador da seguinte dicção (fls. 65/66):

Visando à modificação do Acórdão supratranscrito, o Sr. Humberto José Travi interpôs o presente Recurso.

É o breve Relatório.

II. ADMISSIBILIDADE

Com efeito, a modalidade escolhida pelo Recorrente foi o Recurso de Reexame, previsto no art. 80, da Lei Complementar nº 202/00, e que tem por fim atacar decisão proferida em processos de fiscalização de ato e contrato e de atos sujeitos a registro.

In casu, como o processo original tratou de auditoria in loco de licitações, contratos, convênios e atos jurídicos análogos da CODEJAS, tem-se que o Sr. Humberto José Travi utilizou-se da modalidade recursal adequada.

Quanto à legitimidade recursal, por ter sido o Recorrente apenado com as multas impostas nos itens 6.2.1 a 6.2.3 da decisão atacada, sua atuação se faz adequada.

No que concerne à tempestividade, estabelece o artigo supracitado o prazo de 30 (trinta) dias, contados a partir da publicação da decisão no Diário Oficial do Estado. Assim, considerando que o Acórdão nº 2520/2003 foi publicado no dia 18 de fevereiro de 2004 e a presente irresignação protocolada neste Tribunal no dia 26 do mesmo mês e ano, tem-se como tempestiva a peça.

Destarte, restaram devidamente preenchidas as condições legais de admissibilidade do Reexame em análise.

O Recorrente aduz, preliminarmente, que a regra constante do art. 70, II, da Lei Complementar n. 202/00 não seria auto-aplicável, necessitando de regulamentação para definir o conceito de "grave infração à norma legal".

Tal questão já foi inúmeras vezes debatida por esta Consultoria. Para elucidar o tema, transcrevemos abaixo trechos da Informação COG n. 0172/05, exarada nos autos do Processo n. REC-04/01498034 e que, com muita propriedade, tratou do assunto:

Acerca da mesma matéria, trazemos também a transcrição de parte do Parecer COG n. 86/04 (autos n. REC-01/01914458) que, no mesmo sentido, explicita:

Superada, portanto, a questão.

O Recorrente segue ainda alegando que a matéria de que trata os autos principais não tipificaria hipótese sobre a qual pudesse este Tribunal de Contas aplicar multa do art. 70, II, da LC-202/2000, pois não possuiria natureza contábil, financeira, ou orçamentária, bem como os atos questionados não teriam provocado dano ao erário. Afirma, também, que a Lei de Licitações não teria delegado aos Tribunais de Contas capacidade para aplicar multas.

Novamente não lhe assiste razão.

No que diz respeito à natureza da situação apurada, entende-se que a necessidade de licitar está fixada tanto na Constituição Federal como na lei que ordena as licitações e contratos na Administração Pública - Lei n. 8.666/93, a qual tem natureza operacional e financeira.

Afirmamos isso, porque da leitura do próprio art. 1º da Lei de Licitações1 percebe-se que o objetivo da norma é possibilitar que a Administração Pública adquira bens ou serviços dos particulares mediante a observância de certos procedimentos e dentro de limites específicos objetivando, assim, a contratação do particular melhor qualificado, o que portanto implica em norma operacional.

Ademais, o objetivo a ser alcançado através da licitação é a aquisição de bens ou serviços, o que acaba atingindo a despesa do ente público, implicando por sua vez norma financeira. Isso porque a disciplina financeira envolve um controle sobre a arrecadação da receita e a realização da despesa, tendo em conta a legalidade e a regularidade das suas operações.

Nas lições de Marçal Justen Filho:

Ademais, com relação à competência para a penalizar os gestores responsáveis pelas licitações, o art. 113 da Lei Federal nº 8.666/93 deslinda definitivamente a questão:

O Recorrente ainda questiona os valores das penalidades impostas, afirmando que contrariaram o disposto no art. 307, V, do Regimento Interno desta Corte de Contas.

Mais uma vez não lhe assiste razão.

O referido artigo tratou, justamente, das questões relativas à transição necessária entre o antigo Regimento Interno do Tribunal de Contas (Resolução nº TC-11/91) e o atual (Resolução nº TC-06/01), estabelecendo as regras processuais aplicáveis. Vejamos:

O valor das penalidades fora aplicado, conforme se denota pela leitura do decisum guerreado, respeitando os limites previstos e estabelecidos pelo art. 239, III, da Resolução nº TC-11/91 (Regimento Interno deste Tribunal de Contas, vigente à época da ocorrência das irregularidades), abaixo transcrito:

Vejamos, também, os comentários de Marçal Justen Filho acerca do dispositivo supra, extraídos da obra "Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos"2:

Portanto, para a contratação em comento (CECOP), não prosperam as alegações do Recorrente.

Com relação à multa imposta no item 6.2.2, melhor sorte não alcançou o Recorrente.

A possibilidade de prorrogação deveria estar prescrita no instrumento convocatório, conforme já dispuseram os Prejulgado nºs. 0885 e 1151, a saber:

          (...)"
        Portanto, ainda que o objeto do contrato da CODEJAS com a empresa PROSERV pudesse ser caracterizado como de prestação de serviços de natureza continuada, a possibilidade de prorrogação de prazo teria que ser, obrigatoriamente, prevista no instrumento convocatório, conforme determina a Lei de Licitações.
          Nesse sentido, nos posicionamos pela manutenção das penalidade impostas ao Sr. Humberto José Travi nos itens 6.2.1 e 6.2.2 do Acórdão nº 2520/2003.
            2) Multa imposta no item 6.2.3 do Acórdão nº 2520/2003:
                6.2.3. R$ 400,00 (quatrocentos reais), em face da não-publicação do resumo dos Contratos de Prestação de Serviços celebrados com Campos Matos e Staff Recursos Humanos, em descumprimento do art. 61, parágrafo único, da Lei Federal n. 8.666/93 (item 2.2 do Relatório DCE);
              O Recorrente alega:
                    "A CODEJAS publicou os contratos celebrados em seu quadro mural, de amplo acesso ao público, entendendo assim estar cumprido o princípio da publicidade.
                    Como já afirmado anteriormente, a falta de publicação no Órgão Oficial de Divulgação do Município não é motivo de invalidade do contrato. Pode ser até argüida a ineficácia do contrato, que seria relevante caso a avença tivesse de ser discutida judicialmente. Mas isto não ocorreu. E os Contratantes respeitaram mutuamente as obrigações assumidas; os serviços foram prestados, fazendo jus ao pagamento; e a Companhia remunerou-os, conforme licitado, após tê-los recebido.
                    Com a devida vênia e reportando ao tópico 1 acima, reafirma-se não ser cabível a multa, aplicada através do item 6.2.3 do Acórdão; o apontado não constitui 'grave infração a norma legal ou regulamentar de natureza contábil, financeira, orçamentária ou patrimonial."

              Com relação à publicação dos contratos na Imprensa Oficial, esta Consultoria Geral manifestou-se, reiteradamente, expressando o posicionamento abaixo descrito, extraído do Parecer COG nº 105/05:

                      "Recurso de Reexame. Licitação. Fundo Penitenciário do Estado de Santa Catarina. Ausência de aprovação prévia pela Assessoria Jurídica. Ausência de publicação do instrumento do contrato. Provimento Parcial.
                      (...)
                      De igual modo, a ausência de publicação do instrumento do contrato na Imprensa Oficial pode não ensejar multa, com base no art. 70, II, da Lei Orgânica deste Tribunal, se a publicação, mesmo que a destempo, for realizada ou, em não sendo realizada, o Corpo Técnico não demonstrar que a falta da publicação serviu para escamotear possíveis irregularidades na contratação.
                      Em ambos os casos é perfeitamente cabível uma determinação, por parte do Tribunal Pleno, para que a entidade passe a observar os preceptivos legais violados."

              Do corpo do referido Parecer, transcrevemos os seguintes ensinamentos:

                      "(...) Concernente aos demais processos licitatórios em que foi encontrado o mesmo vício, o Recorrente não trouxe aos autos a prova da devida publicação. Contudo, pode-se considerar que a publicação, mesmo que a destempo, sanaria o vício apontado pela Instrução.
                      Parece seguir essa linha de raciocínio, o magistério de Marçal Justen Filho:
                      A ausência de publicação do extrato do contrato não é causa de sua invalidade. O defeito não afeta a contratação. A publicação é condição para o contrato produzir efeitos. Na ausência ou no defeito da publicação, a situação se regulariza com nova publicação.
                      Na mesma esteira, a lição de Carlos Ari Sundfeld:
                          Desta feita, conclui-se que a ausência da publicação da minuta do contrato, por si só, não macula a essência do contrato, tampouco acarreta a resolução da obrigação contratual, contaminando apenas a eficácia do contrato, ou seja, os prazos ficam suspensos até que a publicação seja efetivada.
                            Logo, ao verificar a ausência de publicação, seria conveniente que no próprio Relatório de Reinstrução de Auditoria, o Corpo Técnico sugerisse ao Relator do feito que efetuasse determinação ao gestor responsável para que tomasse as providências, no sentido de realizar a publicação, bem como tomasse providências administrativas em relação ao servidor responsável por tal encargo.
                              O Tribunal de Contas da União, ao enfrentar o tema, assim decidiu:
                              Tomada de Contas. Ministério dos Transportes. Delegacia no Estado do Rio de Janeiro. Ausência de inventário de bens móveis e imóveis. Quantitativo de veículos irrecuperáveis. Divergência nos controles de consumo de combustíveis. Falta de publicação de contratos. Não devolução do bilhete de passagem pelo servidor. Falhas consideradas de caráter formal, com Recomendações já efetuadas pela CISET. Contas regulares com ressalva. Determinação. Bens móveis. Desaparecimento. Necessidade de observar o art. 84 do DL 200/67.(TCU - Processo nº TC-594.050/93-6, Acórdão 2/1994 - Segunda Câmara - Número Interno do Documento AC-0002-01/94-2- Relator: Ministro Paulo Affonso Martins de Oliveira).
                                Igualmente, em outro acórdão, essa questão assim examinada:
                                  Cuidam os autos de Representação da Secex/SC, originada a partir de expediente enviado por particular, tratando de possíveis irregulares na gestão do Crea/SC.
                                  2. A Secex/SC realizou inspeção na entidade para averiguar as questões tratadas na representação. Foram as seguintes as falhas/irregularidades detectadas (fls. 247/269, v.p.):
                                  a) descumprimento de decisão Confea, a respeito da composição do Plenário do Crea/SC, por modalidade profissional, nos conselhos regionais;
                                  b) homologação de convites, sem que existissem três propostas válidas;
                                  c) publicação de contrato quase seis meses após sua assinatura;
                                  [...]
                                  Em relação às ocorrências mencionadas nas letras a, b, c, d, e, h acima, a Secex/SC entende tratarem-se de falhas formais, que devem ensejar a formulação de determinações corretivas. No que tange àquelas registradas nas letras i, m, p, r, constatou-se que a entidade já tinha tomado as medidas cabíveis no sentido de corrigir as falhas detectadas. No que tange às demais constatações, a Unidade Técnica entendeu-as de maior gravidade, razão pela qual realizou a audiência dos responsáveis para que apresentassem razões de justificativa. (TCU-Acórdão nº 1.642/2004- Plenário - Número Interno do Documento AC-1642-39/04-P - Sessão 20/10/2004 - Relator: Ministro Ubiratan Aguiar).
                                    Ressalte-se que a ausência de publicação ou a sua efetivação tardia somente poderá ser considerada falha de caráter formal quando não restar qualquer outra evidência de vício fatal no contrato e, neste caso, será suficiente uma determinação à entidade para que observe o preceptivo legal violado.
                                      In casu, apesar da inexistência de publicação, em relação aos contratos nº 173/99, 174/99, 175/99, 177/99, 178/99 e 179/99, o Corpo Técnico não apontou outra irregularidade, cuja gravidade tivesse o condão de tornar os mencionados atos contratuais nulos e embora se reconheça uma irregularidade de caráter formal esta Consultoria se posiciona pelo desconsideração da sanção pecuniária irrogada ao Recorrente, bastando uma determinação ao FUPESC para que observe o preceituado no art. 61, parágrafo único, da Lei 8.666/93 e demais legislação correlata.(...)"

                              O mencionado Parecer COG nº 105/05 (exarado nos autos do Processo nº REC-01/02041059) teve suas conclusões acolhidas, na íntegra, pelo Plenário desta Corte de Contas, nos termos do Acórdão nº 452/2005.

                              Nesse diapasão, nosso posicionamento é pelo cancelamento da penalidade.

                                  IV. CONCLUSÃO

                                  Ante o exposto, sugere-se ao Exmo. Relator do processo que em seu Voto proponha ao Egrégio Plenário o que segue:

                                  1. Conhecer do Recurso de Reexame, nos termos do art. 80 da Lei Complementar n. 202/2000, interposto contra o Acórdão n. 2520/2003, exarado na Sessão Ordinária de 03/12/2003 nos autos do Processo n. ALC-02/10882921, e, no mérito, dar-lhe provimento parcial para:

                                  1.1. cancelar a multa constante do item 6.2.3 da decisão recorrida e, por conseqüência, considerar regulares os Contratos de Prestação de Serviços firmados com Campos Matos e Staff Recursos Humanos.

                                  1.2. ratificar os demais termos da decisão recorrida.

                                  2. Dar ciência deste Acórdão à CODEJAS e ao Sr. Humberto José Travi - ex-Diretor-Presidente daquela Companhia.

                                      COG, em 28 de novembro de 2007.
                                      ANNE CHRISTINE BRASIL COSTA
                                                  Auditora Fiscal de Controle Externo
                                                  De Acordo. Em ____/____/____
                                                  HAMILTON HOBUS HOEMKE
                                                  Coordenador de Recursos
                                      DE ACORDO.
                                      À consideração do Exmo. Sr. Conselheiro César Filomeno Fontes, ouvido preliminarmente o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas.
                                      COG, em de de 2007.
                                      MARCELO BROGNOLI DA COSTA

                                    Consultor Geral


                                    1 Lei n. 8.666/93: Art. 1º- Esta Lei estabelece normas gerais sobre licitações e contratos administrativos pertinentes a obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações e locações no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

                                    2 Dialética, 6ª ed., São Paulo. 1999. p. 499

                                    3 A autora se referia à Medida Provisória 1500, posteriormente convertida em lei.

                                    4 FILHO, Marçal Justen. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 6.ed. São Paulo: Dialética, 1999, p. 518.

                                    5 SUNDFELD, Carlos Ari. Licitação e contrato administrativo. São Paulo: Malheiros, 1994, p. 217.