TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE SANTA CATARINA

DIRETORIA DE CONTROLE DE LICITAÇÕES E CONTRATAÇÕES

Inspetoria 2

Divisão 6

PROCESSO Nº DEN 03/08075650
UNIDADE GESTORA PREFEITURA MUNICIPAL DE MAFRA
DENUNCIANTE

WILSON DE AQUINO

RESPONSÁVEL CARLOS ROBERTO SCHÖLZE (ex-Prefeito)
ASSUNTO Denúncia de Supostas Irregularidades na Prefeitura Municipal de Mafra
Relatório de REINSTRUÇÃO nº DLC/INSP2/ 544/2007

1 INTRODUÇÃO

Tratam os autos do Processo DEN 03/08075650, alusivo à Denúncia formulada pelo Sr. Wilson de Aquino, gerente do Jornal Independente de Mafra, com Relatório de Admissibilidade nº 53/54, (fls.40-43), emitido pela Diretoria de Controle dos Municípios - DMU, que apreciou a Denúncia, acolhida esta pelo Ministério Público - Parecer MPTC Nº 0193/2004 (fl. 45) e Voto do Conselheiro Relator (fls. 46-48), que conheceu da denúncia, somente quanto à irregularidade descrita na alínea "g" do Relatório Técnico, por apenas este item atender às prescrições contidas no art. 65, caput e § 1º, da Lei Complementar nº 202/2000.

Posteriormente, a Decisão nº 350/2004, em sessão ordinária de 17.03.04 (fl. 49) determinou a adoção de providências para a apuração dos fatos denunciados.

Atendendo à Decisão nº 350/2004, exarada pelo Egrégio Plenário deste Tribunal, a então Diretoria de Denúncias e Representações - DDR, realizou inspeção in loco, entre 12 e 23.07.04, em execução simultânea a outros Processos, para verificação de irregularidades cometidas no âmbito daquela Prefeitura Municipal.

O Responsável apresentou sua resposta às fls. 1203-1217, protocolada neste Tribunal sob o nº 016173 em 19/09/2007, através da qual foram apresentadas justificativas.

PRELIMINARMENTE:

Referente aos autos, salienta-se que foi procedida a Audiência do Sr. Carlos Roberto Scholze, conforme Ofício nº 7855 de 14.06.07 (fl. 1199), para que o mesmo, no prazo de 30 dias, apresentasse as justificativas que julgasse pertinentes ao saneamento das restrições mantidas na Conclusão do Relatório 175/2007.

Entretanto foi requerida a prorrogação de prazo, como se extrai do requerimento (fl.1200), protocoloado neste Tribunal de Contas em data de 11.07.2007.

Acolhida e concedida, pelo Sr. Relator, a prorrogação de prazo por mais 30 dias, para atendimento da Audiência, contados a partir de 16.07.2007.

Transcorrido o prazo concedido, o responsável deixou de apresentar a defesa, vindo, entretanto, a protocolá-la neste Tribunal de Contas, em data posterior, (19.09.2007) ou seja, com 34 dias de atraso em relação ao prazo concedido; portanto, intempestivamente, razão pela qual devem ser desconsideradas as alegações expendidas.

Entendendo V. Exa. por não acatar a preliminar antes suscitada, passa a Instrução à análise de mérito, de acordo com as justificativas apresentadas pelo Responsável

2 REANÁLISE

Como se depreende dos autos, (fl. 533-537) a Prefeitura Municipal de Mafra realizou despesas no montante de r$ 135.033,33 (cento e trinta e cinco mil, trinta e três reais e trinta e três centavos), com a empresa PLANEFAZ, Consultoria e Assessoria Fazendária Ltda., decorrentes de processos licitatórios, modalidade Convite, tendo por objeto a prestação de serviços contínuos especializados de planejamento, assessoria e consultoria na área tributária, aumento e arrecadação e promoção da justiça fiscal naquele Município.

Contudo, a referida contratação foi considerada irregular por ferir o disposto no Art. 37, XXII, da Constituição Federal, considerando-se que dentre os Servidores Públicos da Prefeitura, Secretarias de Fazenda e Planejamento, de Administração e Procuradoria Jurídica, há profissionais, cuja formação, os torna capazes de realizarem os serviços contratados, por se tratar de serviços inerentes à própria administração, quer seja através das suas Secretarias de Administração e Planejamento, quer seja pela própria Assessoria Jurídica do Poder Executivo.

Urgindo que se manifestasse, o Responsável refuta a irregularidade apontada nos autos, alegando que a Reinstrução n° 175/2007 limitou-se a corroborar a posição da Equipe de Inspeção cujo entendimento era baseado em dados e informações superficiais e insubsistentes.

Alega (fls. 1206) que a lista de serviços prestados no ano de 2003, (fls. 535) mencionada tanto na instrução como na reinstrução, elenca alguns itens que são partes isoladas de projetos específicos desenvolvidos e implantados pela empresa contratada no ano de 2003; no entanto, afirma que esses itens, listados pela Equipe de Inspeção, foram equivocadamente identificados como sendo os serviços para os quais a empresa foi contratada, o que não é verdadeiro. Todavia o Responsável informa os serviços executados (fls. 1212-1214), onde constam os tais serviços prestados e já mencionados nas fls. 1182 dos autos, os quais não ensejavam a necessidade de contratação de empresa especializada. São eles:

a. Contestação à Ação Popular n. 041.03.001393-4 (29.05.03);

b. Projeto de Lei de Substituição Tributária (21.05.03);

c. Projeto de Lei (alteração do Código Tributário) e respectivos Formulários (25.06.03);

d. Consolidação da Legislação Tributária local (30.07.03);

e. Projeto de Lei, Justificativa, Decreto e "kit" de Substituição Tributária (12.08.03);

f. Projeto de Lei com alterações no Código Tributário Municipal (27.08.03);

g. Projeto de Lei relativo ao ISS (10.08.03);

h. Projeto de Lei relativo ao IPTU e taxas (22.09.03);

i. Parecer sobre Contribuição de Melhoria (30.09.03);

j. Projeto de Lei que cria a UFM (Unidade Fiscal Monetária do Município) e que dispõe sobre a atualização de créditos fiscais com base no INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor) (16 e 20.10.03); e,

k. Projeto de Lei relativo ao ISS (10.10.03).

De se destacar, ainda, outros argumentos constantes às folhas 1204-1217 dos autos. Dentre eles:

... a Administração Pública possui limites, que não está livre para fazer ou deixar de fazer algo de acordo com a vontade do governante somente, mas que deverá obedecer à lei em toda a sua atuação. É a consagração da idéia de que a Administração Pública só pode ser exercida na conformidade da lei. (grifou-se).

Portanto, o julgamento dos atos do Gestor Público deve pautar-se antes,no princípio maior consubstanciado na supremacia do interesse público.

Prossegue na defesa alegando que:

A suposta irregularidade já mereceu a atenção do ex-Prefeito por ocasião do Relatório de Instrução n° 81/2004, em cuja oportunidade encaminhou as justificativas e documentos que considerou pertinentes para elucidar, de vez, as eventuais dúvidas quanto à regularidade e legalidade da contratação dos serviços (...)

Vale lembrar que os serviços prestados pela PLANEFAZ são enquadrados no art. 13, III e VI da Lei de Licitações, pois se trata de serviços técnicos profissionais especializados, passíveis, inclusive, da contratação por inexigibilidade de licitação, desde que inviabilizada a competição (art. 25, II).

Nessa condição, firmou os contratos ora questionados com o Município de Mafra, cujos objetos consistiam na "Prestação de serviços contínuos especializados de planejamento, assessoria e consultoria na área tributária."

De outro lado, os serviços contratados com a PLANEFAZ estavam detalhados no anexo 1 de cada um dos respectivos Convites, e foram devidamente executados conforme relatórios periódicos de execução dos serviços que acompanharam os respectivos faturamentos mensais e, em conformidade com o Relatório Final para os exercícios 2002 e 2003, e parcial para o exercício de 2004, encaminhado à Prefeitura através da Carta n. 059/04-PLANEFAZ, de 20107/2004.

(...)

Resumidamente, foram os seguintes os serviços executados: Ano de 2002

    Implantação da central de atendimento ao contribuinte, com infra-estrutura adequada para prestação de serviços de qualidade e eficiência no atendimento.

    Elaboração do projeto do novo Código Tributário Municipal.

    Implantação do Programa de Refinanciamento de Créditos Tributários inscritos ou não na Dívida Ativa do Município.

    Criação das condições legais e administrativas para dar legitimidade à ação fiscal (treinamento aos agentes fazendários, elaboração e instituição dos documentos necessários para os procedimentos de fiscalização).

    Revisão das isenções e imunidades tributárias

    Implantação do Conselho Municipal de Contribuintes.

    Prestação de Consultoria e Assessoramento na interpretação e aplicação da legislação tributária.

    Ano de 2003

    Adequação da Legislação Tributária concernente às taxas de fiscalização de localização, instalação e funcionamento e fiscalização de anúncio.

    Adequação da Legislação Tributária do ISS, às novas regras decorrentes da nova Lei Complementar n. 116/2003.

    Consolidação da Legislação Tributária do Município.

    Treinamento prático à fiscalização tributária.

    Ano de 2004

    Implantação do sistema de substituição tributária no âmbito do ISS.

    Elaboração do manual do contribuinte.

    Treinamento aos servidores do Departamento de Tributação.

    Elaboração do regulamento do ISS do Município.

    Assessoramento aos fiscais de tributos municipais na orientação, in loco, aos substitutos tributários quanto aos procedimentos para retenção na fonte e recolhimento do ISS.

    Outros serviços de consultoria.

    (...)

    Como acertadamente assevera o Responsável, "a Administração Pública possui limites, que não estão livre para fazer ou deixar de fazer algo de acordo com a vontade do governante somente, mas que deverá obedecer à lei em toda a sua atuação."

    Aduz o Responsável que a contratação dos serviços da referida empresa são enquadrados no art. 13, III e VI da Lei de Licitações por se tratar de serviços técnicos profissionais especializados, os quais são passíveis da contratação por inexigibilidade de licitação, fundamentada no art. 25, II da Lei 8666/93, que dispõe:

    Art. 25. É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial: (...)

    II - para a contratação de serviços técnicos enumerados no art. 13 desta Lei, de natureza singular, com profissionais ou empresas de notória especialização, vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e divulgação;

    No entanto, apesar de querer enquadrar tais serviços como de "natureza singular", contratou-os através de processos licitatórios, na modalidade Convite, o que já descaracteriza a alegada especialidade de natureza singular; logo em contradição aos argumentos expendidos.

    Saliente-se, a respeito, que o Estatuto de Licitações permite como ressalva à obrigação de licitar, a contratação através de inexigibilidade de licitação; porém, desde que preenchidos os requisitos previstos na lei.

    Contudo, para que a contratação se amoldasse ao fundamento legal citado, teria de atender simultaneamente a três requisitos legais, ou seja: deveria constar do artigo 13 da Lei 8.666/93; deveria possuir a natureza singular inerente a esses serviços (art. 25, II, da Lei 8.666/93) e a notória especialização do contratado, devidamente comprovada através de documentos idôneos, o que não é o caso, eis que foram contratados através de Convite; portanto afastada a alegada complexidade e especialidade.

    Assim sendo, tem-se que os serviços prestados pela contratada à municipalidade, durante 2002, 2003 e 2004, por terem dispensado a inexigibilidade de licitação, são de baixa complexidade, não ensejando a contratação de empresa especializada no ramo, podendo tais serviços, terem sido prestados por servidores da Municipalidade, dentre eles os advogados e procurador jurídico lotado naquela Prefeitura, conforme se depreende da lista de cargos/servidores das pastas correlatas, do Município (fls. 536-537).

    No entanto, atentando-se para as alegações apresentadas, o que delas se extrai e se percebe, é que para a realização dos respectivos trabalhos pelos próprios servidores lotados, entende o Responsável ser preciso ampla pesquisa, dedicação, tempo e remuneração apropriada, dada a complexidade da tarefa, a qual não podia ser satisfeita em razão do reduzido quadro e a ausência de profissional especializado na área. Veja-se:

    Fls. 1215-1216:

    Numa análise perfunctória, poder-se-ia afirmar que qualquer servidor, advogado ou até mesmo um auxiliar administrativo seria capaz de elaborar um projeto de lei para alteração do Código Tributário.

    (...)

    Um projeto dessa natureza e extensão não nasce de um dia para o outro. Ele é fruto de um estudo das normas constitucionais e infraconstitucionais pertinentes, acompanhado de pesquisas sobre o entendimento doutrinário e jurisprudencial acerca da matéria. Requer, ainda, o desenvolvimento de pesquisas a respeito dos critérios adotados em outros Municípios do País, além de avaliações e demonstrativos da repercussão que a mudança de critérios na cobrança das referidas taxas poderia trazer sobre a receita do Município. Portanto, além de altamente complexo e especializado, o serviço demanda tempo e dedicação exclusiva, o que certamente inviabilizaria a execução direta pelo Município de Mafra considerando o reduzido quadro funcional e a carência de profissional especializado no ramo do Direito Tributário em face dos minguados salários que a maioria dos Municípios paga aos servidores de carreira. (grifou-se).

    A propósito, convém transcrever os seguintes trechos dos Prejulgados nº 873 e 1121:

    Prej. nº 873

    b) É cabível a contratação de profissional do ramo do direito, desde que devidamente justificada para atender específicos serviços (administrativo ou judicial) que não possam ser realizados pela assessoria jurídica dada a sua complexidade e especificidade, configurando necessidade dos serviços de profissional (jurista) de notória especialização, hipótese em que a contratação, por inexigibilidade de licitação, se dará nos termos dos artigos 25, II, parágrafo 1o, combinado com o artigo 13, V e § 3º, e 26 da Lei Federal 8.666/93, observados os princípios constitucionais que regem a Administração Pública e observando-se, também, os arts. 54 e 55, da Lei Federal nº 8.666 de 21.06.93; ou por dispensa de licitação quando atendidos os requisitos do artigo 24, II, e 26 da Lei de Licitação.

    Prej. nº 1121

    A contratação de profissionais de advocacia sem vínculo empregatício com a entidade pública contratante somente ocorre quando houver contratação de serviço, mediante processo licitatório, nos termos da Lei Federal nº 8.666/93, que admite apenas a contratação de advogados ou escritório de advocacia para a defesa dos interesses da empresa em específica ação judicial que, por sua natureza, matéria ou complexidade (objeto singular), não possa ser realizada pela assessoria jurídica da entidade, justificando a contratação de profissional de notória especialização, caso em que a contratação se daria por inexigibilidade de licitação, nos termos dos arts. 25 e 26 do referido diploma legal.

    Portanto, permanece a restrição pela ilegalidade das despesas contraídas, infringindo os princípios constitucionais federais contidos no caput, do art. 37, especialmente o princípio da legalidade, bem como o disposto no inciso XXII do mesmo artigo.

    3 - CONCLUSÃO

    3.1 - Ante o exposto sugere-se CONHECER do Relatório realizada na Prefeitura Municipal de Mafra, com abrangência nos exercícios de 2002, 2003 e 2004, para JULGAR IRREGULAR os processos licitatórios, Convites, nº 27/2002, 20/2003, 14/2004, bem como os contratos deles decorrentes:

    3.1.2 - COM APLICAÇÃO DE MULTA, na forma do art. 29, § 2º c/c art. 36, § 2º, "a" da Lei Complementar nº 202/2000, prevista no artigo 70, II, da Lei Complementar nº 202/2000, ao Sr. Carlos Roberto Scholze, portador do CPF nº 310.806.349-91, residente e domiciliado na Rua Benemérito O. A. Scholze, 2430, Restinga, Mafra - SC, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias a contar da publicação do acórdão no Diário Oficial do Estado para comprovar ao Tribunal o recolhimento da multa ao Tesouro do Estado, sem o que fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos artigos 43, II, e 71 da Lei Complementar nº 202/2000:

    3.1.2.1 - A contratação de serviços contínuos de planejamento, assessoria e consultoria tributária, no valor de R$ 135.033,33, contrariando os princípios constitucionais federais contido no caput, do art. 37, especialmente o princípio da legalidade, e no inciso XXII do mesmo artigo, considerando-se a desnecessidade da contratação de tais serviços, por haver no quadro de servidores do Município, profissionais aptos a realizá-los, conforme lista de cargos/servidores lotados, ( item 2.1 desta reinstrução).

    3.2 - DAR CIÊNCIA da decisão deste Tribunal, do relatório e do voto do relator que a fundamentam, ao responsável, Sr. Carlos Roberto Scholze, Prefeito Municipal de Mafra, à época.

    TCE/DLC/DIV 6, em 9 /11/2007

    Maria Lucília Freitas de Melo

    Auditora Fiscal de Controle Externo

    Alexandre Pereira Bastos

    Auditora Fiscal de Controle Externo

    Chefe de Divisão

    Em ____/____/____

    De acordo:

    À elevada consideração do Exmo. Sr. Relator, ouvido, preliminarmente, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas.

    Em ___/___/2007

    Otto Cesar Ferreira Simões

    Coordenador de Inspetoria

    DE ACORDO,

    DLC, em ____/____/______

    EDISON STIEVEN

    Diretor