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Processo n°: | AOR - 05/04132369 |
Origem: | Fundo de Desenvolvimento Social - FUNDOSOCIAL |
Interessado: | Max Roberto Bornholdt |
Assunto: | Verificação dos registros contábeis e execução orçamentária, operacional e patrimonial referente ao período de FEVEREIRO A AGOSTO DE 2005 |
Parecer n° | COG-88/08 |
Senhor Consultor,
O processo em tela encontra sua gênese na auditoria "in loco", procedida no Fundo de Desenvolvimento Social - FUNDOSOCIAL, concernente ao período de fevereiro a agosto de 2005.
O procedimento encetado na referida unidade revestiu-se do escopo precípuo de avaliar os mecanismos de controle e execução do Fundo quanto à concessão de benefícios autorizados pela Lei Estadual 13.334/05, regulamentada pelo Decreto 2.977/05.
O Corpo Técnico desta Corte de Contas emitiu o Relatório nº 471/2005 (fls. 831-853), no qual, além de sugerir audiência do responsável, constatou um rol de irregularidades, passíveis de imputação de débito e aplicação de multa.
O Relator dos presentes autos, Exmo. Sr. Conselheiro Moacir Bertoli, mediante o Despacho nº GCMB/2007/059 (fls. 2040-2042), determinou a audiência do Sr. Max Roberto Bornholdt, ex-Secretário de Estado da Fazenda e ex-Gestor do FUNDOSOCIAL.
O responsável, por meio de documentação acostada aos autos (fls. 2047-2065), apresentou as justificativas que reputou hábeis a desconstituir as irregularidades quanto à operacionalização do FUNDOSOCIAL, apontadas pela Diretoria competente.
A partir das informações prestadas, a Área Técnica procedeu à reanálise dos termos processuais, consubstanciada no Relatório nº 309/2007 (fls. 2067-2104). Nessa oportunidade, a DCE reiterou (excepcionando-se a irregularidade estresida no item 2.2.2 - fl. 2077, que foi, indevidamente, reprisada na conclusão) os argumentos do segmento conclusivo do Relatório Preliminar nº 471/05, nos seguintes moldes:
3.2.2 Forma de constituição do Fundo Social constante dos arts. 1º e 2º da Lei Estadual nº 13.334/05, divergente de sua forma efetiva de atuação, caracterizando que o Fundo Social é de natureza especial e que seus recursos financeiros são vinculados à realização de ações de governo constantes do Plano Plurianual - PPA, Lei de Diretrizes Orçamentárias - LDO e Lei Orçamentária Anual - LOA, conforme apontamento constante do item 2.2, de fls. 2074 a 2077, do presente Relatório;
O Ministério Público junto a esta Corte manifestou-se no processo emitindo o parecer MPTC nº 7246/07 (fls. 2105-2121), no qual rechaça as conclusões da Área Técnica e considera as justificativas apresentadas pelo Sr. Max Roberto Bornholdt como aptas a elidir a responsabilidade do mesmo ante as irregularidades apontadas na instrução processual.
O Órgão Ministerial aludiu, na fundamentação de seu posicionamento, à Decisão deste Tribunal que firmou entendimento no sentido da aprovação das Contas do Governo do Estado de Santa Catarina, referentes ao ano de 2005.
Em face das divergências entre as informações conclusivas do Corpo Técnico desta Casa e as do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, o Eminente Relator, tal como consta no Despacho nº GCMB/2008/022 (fl. 2128), remeteu os autos à Consultoria Geral, a fim de que este Órgão manifeste-se acerca das questões em discussão.
II. MÉRITO
Com o escopo de tornar mais didática e objetiva a explanação subseqüente, os comentários deste Órgão Consultor serão tecidos na medida em que os itens apontados como irregularidades no Relatório Conclusivo nº 309/07 (fls. 2101-2104) forem sendo elencados.
- Imputação de débito no valor de R$ 84.158.412,33 (oitenta e quatro milhões, cento e cinqüenta e oito mil, quatrocentos e doze reais e trinta e três centavos) em face da renúncia de receitas promovidas no âmbito do FUNDOSOCIAL (fls. 2082-2090).
A Área Técnica desta Corte alude à existência do montante de R$ 84. 158.412,33 (oitenta e quatro milhões, cento e cinqüenta e oito mil, quatrocentos e doze reais e trinta e três centavos), equivalente à renúncia de receita, irregularmente operacionalizada no âmbito do FUNDOSOCIAL, razão pela qual aquele valor foi imputado ao responsável a título de débito.
A Área Técnica rechaça a captação de recursos pelo Fundo por intermédio da doação e transação previstas na Lei 13.334/05.
Quanto à doação, justifica seu posicionamento sustentando que aquele instituto pressupõe que, voluntariamente e, via de regra, sem contraprestação, transmita-se a outrem algo sobre o que se tem domínio. Aduz que o valor devido a título de ICMS (Imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicações) é do Estado e, assim sendo, o contribuinte estaria concorrendo com o fundo, utilizando-se, contudo, de recursos do Estado.
Tal procedimento caracterizaria, segundo a DCE, renúncia de receita, uma vez que o Estado estaria abdicando de percentual do ICMS em favor do Fundo, ou do próprio contribuinte, por conta de incentivos concedidos no intuito de estimular a doação.
No que concerne à transação, a Unidade Técnica assere que esse instituto, caracterizado, essencialmente, na esfera tributária, como mecanismo hábil a solucionar contendas, judicial ou administrativamente instaladas, não é verdadeiramente disciplinado na Lei 13.334/05, posto que a genuína transação pressupõe concessões recíprocas.
A Área Técnica rechaça e aponta como irregular o mencionado procedimento, alegando não ter restado claro o benefício que o Estado pode auferir com a transação tal como prevista no referido diploma legal, ou seja, o Estado estaria, na realidade, "perdoando" débitos, sem qualquer contrapartida, o que, segundo a Diretoria competente, configura irregular renúncia de receita.
Pode-se compreender que, para o Corpo Técnico, a transação operada nos moldes da Lei 13.334/2005 trata-se de mimetismo a ocultar os institutos da anistia e da remissão. Inferem, portanto, a existência de adulteração do procedimento da transação, fulcrando sua afirmativa na suposta ausência de contrapartida do devedor tributário naquele ajuste.
E é exatamente por essa razão que o Corpo Técnico afirmou e reafirmou (Relatórios nº 471/2005 e nº 309/2007) a irregularidade dos atos conformados sob a égide da transação, tendo em vista caracterizarem, efetivamente, a essência dos institutos da anistia e da remissão, ante a ausência, segundo a DCE, de contrapartida do sujeito passivo da obrigação tributária.
Nesse sentido, as transações celebradas pelo Fundo conformariam hipótese de renúncia de receita, tal como disposto no artigo 14 da Lei Complementar 101/2000:
Isso posto, para a Área Técnica, configurou-se renúncia de receita, sem observância das condições e medidas compensatórias previstas no dispositivo supra, o que implica a necessária imputação de débito ao responsável, no valor correspondente ao montante "renunciado"a título de doação ou transação, tal como previstas na Lei 13.334/05.
Quanto à restrição supramencionada, este Órgão Consultor manifesta-se no seguinte sentido:
- Quanto à suposta renúncia de receita decorrente de doação
A doação, em síntese, consiste na transmissão voluntária e, via de regra, sem ônus, de determinado bem a outrem.
Ocorre que a doação feita pelo contribuinte, correspondente a percentual do imposto devido, é passível de compensação até o limite fixado em lei (artigo 8º da Lei 13.334/05). Como previamente demonstrado, a Diretoria de Controle da Administração Estadual entende que o valor correspondente a essa compensação trata-se de renúncia de receita. O esperado caráter filantrópico da doação estaria maculado pela contrapartida em cancelamento de crédito tributário, mediante baixa junto aos registros contábeis e demais controles tributários estaduais.
A partir da análise dos argumentos estresidos nos autos, tanto os apontados pela Área Técnica e pelo Ministério Público quanto os aduzidos pelo responsável, por ocasião da defesa apresentada, este Órgão Consultor tece seu posicionamento mediante as seguintes assertivas :
1- A Lei 13.334/2005 prevê a doação de determinado percentual do ICMS ao FUNDOSOCIAL (arts. 2º e 8º);
2- O Estado, no intuito de incentivar tal procedimento, pode, sem prejudicar o fluxo de desembolso das atividades de custeio e investimento da Fazenda Estadual (§ 4º do art.8º), compensar o valor de contribuição até determinado limite;
3- Não obstante ser destinado a compor os recursos do Fundo, a parcela doada, referente ao ICMS, não deixa de ingressar nos cofres públicos, sendo, tão-somente, direcionada à finalidade específica;
4- Ao Estado é facultado estabelecer mecanismos de captação de recursos com o escopo de implementar ações governamentais na área da assistência social (art. 204 CF/88);
5- A possível impropriedade terminológica da Lei, ao instituir como doação o mecanismo de incentivo à participação do contribuinte com o Fundo, parece não ter o condão de justificar a imputação de débito ao ex-Gestor daquela unidade.
6- O próprio Corpo Técnico reconhece tratar-se de uso impróprio do termo "doação" e que, em tese (fl. 2082), a compensação em conta gráfica do ICMS teria causado prejuízo aos cofres públicos.
7- A doação não caracteriza renúncia de receita, ausente que está do rol estampado no artigo 14 da Lei Complementar 101/2000;
8- O Sr. Max Roberto Bornholdt, ora apontado como responsável, cingiu-se à aplicação de lei que, tendo seguido o devido processo legislativo quando de sua elaboração e estando em pleno vigor, não apresentava óbices quanto à aplicabilidade.
9- Há, portanto, que se questionar o posicionamento da Área Técnica quando esta sugere a imputação de débito ao responsável, alegando que o mesmo teria se pautado em dispositivos legais que a Diretoria de Controle da Administração Estadual entende equivocados, inconstitucionais e incompatíveis com a legislação tributária.
10- A análise da constitucionalidade, no que tange à Constituição deste Estado, é seara da Egrégia Corte de Justiça Catarinense, na qual a Lei 13.334/05 foi objeto de apreciação.
11- Por conta da Ação Direta de Inconstitucionalidade - ADI 2005.005316-1, aos dispositivos rechaçados pela Área Técnica, inclusive e precipuamente os que consubstanciam a doação e a transação, foi reconhecida interpretação conforme à Constituição. Ressalta-se, contudo, que referida Ação, inobstante decisão proferida (transcrita a seguir), não perfez, integralmente, sua trajetória processual, encontrando-se, em 06 de março de 2008, com vista à Procuradoria Geral de Justiça.
12- Constatada a plena vigência dos dispositivos que prevêem a doação e a transação nos moldes da Lei 13.334/05, resta incongruente imputar débito ao responsável com fulcro na aplicação daqueles preceitos.
13- Ponto crucial na presente argumentação, é o fato de que o FUNDOSOCIAL compôs as Contas do Governo do Estado, relativas ao exercício de 2005. Ocorre que no Parecer Prévio afeto àquelas Contas (processo PCG 06/00167445, sob a relatoria do Exmo. Sr. Conselheiro José Carlos Pacheco), esta Corte manifestou-se favoravelmente à aprovação das mesmas. Quanto ao FUNDOSOCIAL, esta Casa procedeu à seguinte ressalva:
14- Ante o exposto, seria contraditório que esta Corte, após ter se manifestado pela aprovação das Contas do FUNDOSOCIAL, por ocasião da análise das Contas do Governo, viesse, agora, quando do exame de dados semelhantes, ainda que em processo diverso, emitir deliberação antagônica, imputando débito em relação a contas outrora apreciadas e aprovadas, razão pela qual este Órgão Consultor posiciona-se no sentido de desconstituir a imputação de débito ao Sr. Max Bornholdt, no valor de R$ 7.627.143, 87, a título de doação em conta gráfica do ICMS.
- Quanto à suposta renúncia de receita decorrente de transação
A transação, em linhas gerais, no âmbito tributário, constitui forma de extinção do crédito tributário, a partir de concessões mútuas de credor e devedor, mediante a prévia existência de litígio, judicial ou administrativamente instalado.
O artigo 171 do Código Tributário Nacional disciplina:
Ocorre que a transação celebrada pelo Fundo, nos moldes da Lei 13.334/05, segundo o Corpo Técnico, efetivamente teria camuflado a concessão de remissão e anistia, diante da existência de concessões unilaterais, feitas pelo Estado, desvirtuando, portanto, o instituto da transação. Como previamente demonstrado, a Diretoria de Controle da Administração Estadual entende que os valores dos quais o Estado teria abdicado, equivalentes às concessões ensejadas com a transação, correspondem à renúncia de receita.
A Área Técnica considera efetivamente pragmatizados, ainda que sob a roupagem de transação, os mecanismos da remissão e da anistia.
Expõe-se, a seguir, informações sucintas quanto a esses institutos, de forma a elucidar a presente explanação.
A remissão consiste em modalidade extintiva do crédito tributário, calcada na benevolência do credor (Estado) que, com amparo legal, renuncia, total ou parcialmente, ao tributo.
Quanto à remissão, o CTN assere:
Trata-se, a anistia, de modalidade de exclusão do crédito tributário, mediante o perdão de penalidade referente a tributo, que deve ser concedido antes da constituição do crédito. Nas palavras de Hugo de Brito Machado:
O Código Tributário Nacional confere à anistia os seguintes contornos:
A partir da análise dos argumentos estresidos nos autos, tanto os apontados pela Área Técnica e pelo Ministério Público, quanto os aduzidos pelo responsável, por ocasião da defesa apresentada, e levando-se em conta, ainda, a abordagem preambular quanto à transação, este Órgão Consultor manifesta-se, quanto ao tópico sob análise, nos seguintes termos::
1- A Lei 13.334/2005 prevê a transação com devedores da Fazenda Pública como uma das fontes de recurso a constituir o FUNDOSOCIAL (arts. 2º, 9º, 10 e 11);
2- O Estado, no intuito de incrementar a captação de recursos para o Fundo, transaciona mediante a concessão dos descontos previstos no artigo 9º, destacando-se que, a interrupção de qualquer das contribuições mensais assumidas implica a perda daqueles e a execução do crédito pelo valor original, com os acréscimos legais (art. 10, § 3º);
3- Ao Estado é facultado estabelecer mecanismos de captação de recursos com o escopo de implementar ações governamentais na área da assistência social (art. 204 CF/88);
4- A celeuma em torno do instituto da transação, nos presentes autos, reside na afirmação da Área Técnica de que o mesmo apresenta, tal como preceituado na Lei 13.334/2005, contornos de anistia e remissão, caracterizando, portanto, renúncia de receita, nos termos do artigo 14 da Lei Complementar 101/2000, previamente transcrito.
5- É pacífico, doutrinária, legal e jurisprudencialmente, que a genuína transação pressupõe concessões mútuas. Resta saber se, tal como operacionalizado pelo Estado, aquele instituto implicou, efetivamente, concessões de ambas as partes. Certa aura de subjetividade paira sobre dita indagação, ou melhor, sobre as possíveis respostas à mesma.
6- É temerário refutar, de forma absoluta, os argumentos apresentados pela defesa do responsável. Isso porque
7- Não se pode olvidar que, mediante a remissão e a anistia, o Estado não impõe qualquer condição/contraprestação ao contribuinte. Trata-se de perdão de parte ou integralidade de um débito ou penalidade. No processo em comento, ainda que a contrapartida exigida do contribuinte não tenha sido considerada pela Área Técnica a mais apropriada, aquela não deixou de ser exigida, conferindo às situações apresentadas característica peculiar à transação.
8- Há que salientar, ainda, que, inobstante o fato de ser, o lançamento, atividade plenamente vinculada, o próprio Código Tributário admite que a lei poderá facultar aos sujeitos ativo e passivo da obrigação tributária celebrar transação.
9- A transação não caracteriza renúncia de receita, ausente que está do rol estampado no artigo 14 da Lei Complementar 101/2000;
10- O Sr. Max Roberto Bornholdt, ora apontado como responsável, cingiu-se à aplicação de lei que, tendo seguido o devido processo legislativo quando de sua elaboração e estando em pleno vigor, não apresentava óbices quanto à aplicabilidade.
11- Há, portanto, que se questionar o posicionamento da Área Técnica quando esta sugere a imputação de débito ao responsável, alegando que o mesmo teria se pautado em dispositivos legais que a Diretoria de Controle da Administração Estadual entende equivocados, inconstitucionais e incompatíveis com a legislação tributária.
12- A análise da constitucionalidade é seara da Egrégia Corte de Justiça Catarinense, na qual a Lei 13.334/05 foi objeto de apreciação.
13- Por conta da Ação Direta de Inconstitucionalidade - ADI 2005.005316-1, aos dispositivos rechaçados pela Área Técnica, inclusive e precipuamente os que consubstanciam a doação e a transação, foi reconhecida interpretação conforme à Constituição (decisão citada quando da exposição acerca da doação).
14- Constatada a plena vigência dos dispositivos que prevêem a transação nos moldes da Lei 13.334/05, resta incongruente imputar débito ao responsável com fulcro na aplicação daqueles preceitos.
15- O Ministério Público, também quanto à transação, manifestou-se favoravelmente à regularidade do procedimento, não reconhecendo qualquer débito a ser imputado ao responsável.
16- Salutar, ainda, é o fato de que o FUNDOSOCIAL compôs as Contas do Governo do Estado, relativas ao exercício de 2005. Ocorre que no processo PCG 06/00167445 esta Corte de Contas manifestou-se no sentido da aprovação das mesmas.
17- Ante o exposto, seria contraditório que este Tribunal, após ter se manifestado pela aprovação das Contas do FUNDOSOCIAL, por ocasião da análise das Contas do Governo, viesse, agora, quando do exame de dados semelhantes, ainda que em processo diverso, emitir deliberação antagônica, imputando débito em relação a contas outrora apreciadas e aprovadas, razão pela qual este Órgão Consultor posiciona-se no sentido de desconstituir a imputação de débito ao Sr. Max Bornholdt, no valor de R$ 76.531.268,46, a título de transações realizadas no período.
- Divergência entre o que foi efetivamente arrecadado e o que foi contabilizado no Fundo Social, gerando uma diferença a menor de R$ 414.599,84 (quatrocentos e quatorze mil, quinhentos e noventa e nove reais e oitenta e quatro centavos) - fls. 2071-2074.
A Unidade Técnica apontou, quando da auditoria no FUNDOSOCIAL, inconsistência tangente à Execução Orçamentária da Receita, indicando descompasso entre os valores registrados na contabilidade e os que foram efetivamente arrecadados, gerando a diferença de R$ 414.599,84. Dita constatação suscitou proposta da Área Técnica no sentido de aplicar multa ao responsável.
Cabe destacar, num primeiro momento, que não restou caracterizado prejuízo ao erário. Ademais, as justificativas apresentadas pelo responsável revelam-se bastante consistentes.
O sujeito passivo da presente relação processual aduz que a diferença verificada decorre de acordos ou transações do FUNDOSOCIAL que foram indeferidos por atrasos ou falta de pagamento das parcelas convencionadas. Logo, o valor correspondente às parcelas anteriores deixou de pertencer ao Fundo, passando a integrar a Receita Geral do Estado, mediante a alteração de código no Sistema de Arrecadação Tributária, procedimento este decorrente da aplicação da Lei 13.334/05. Por esa razão, a contabilidade do Fundo procedeu ao estorno dos valores registrados nas receitas do FUNDOSOCIAL naquelas circunstâncias.
Elucida, outrossim, que, com o escopo de evitar a reincidência dessa problemática, foi editada a Medida Provisória nº 128/2006, convalidada pelo Decreto Legislativo nº 18.274/2006, que, mediante alterações na Lei 13.334/05, tal como o acréscimo do § 4º ao artigo 10, procurou corrigir procedimentos que davam margem à certa confusão analítica quanto à matéria.
No mais, reprisa-se o argumento da aprovação das contas referentes ao Exercício de 2005, que atestam a regularidade dos registros contábeis.
Dessa feita, frágeis são os supedâneos a justificar a aplicação de multa ao Sr. Max Roberto Bornholdt, ora qualificado como responsável.
- Forma de constituição do Fundo Social, constante dos arts. 1º e 2º da Lei Estadual nº 13.334/05, divergente de sua forma efetiva de atuação, caracterizando que o Fundo Social é de natureza especial e que seus recursos financeiros são vinculados à realização de ações de governo constantes do Plano Plurianual - PPA, Lei de Diretrizes Orçamentárias - LDO e Lei Orçamentária Anual - LOA (fls. 2074-2077)
A Área Técnica aponta a situação acima como hábil a sustentar a aplicação de multa ao ex-Secretário da Fazenda. Por seu turno, o Ministério Público junto a esta Corte, em parecer subscrito pelo Exmo. Sr. Procurador-Geral, Márcio de Souza Rosa, infere a inexistência de qualquer irregularidade nesse sentido.
Esta Consultoria tece as seguintes considerações:
É notório que a própria lei instituidora do FUNDOSOCIAL, Lei 13.334/2005, já em seu artigo primeiro, revela a natureza do mesmo:
O que é corroborado pelo artigo 2º do mesmo Diploma Legal:
[...]
O escopo do legislador confirmou-se, inclusive, quando da alteração do instrumento normativo em epígrafe pela Lei 13.633/05 que, ao modificar os termos redacionais do artigo 1º, manteve as expressões que consagram o FUNDOSOCIAL como de natureza financeira.
O que poderia suscitar certo desconforto exegético, levando, inclusive, a DCE a apontá-lo como restrição, são as redações do caput do artigo 8º e do artigo 15 da Lei 13.334/05, que remetem a caracterísitcas de fundos com natureza especial.
O caput do artigo 8º e o artigo 15 da Lei 13.334/2005 dispõem:
A Constituição do Estado de Santa Catarina assim estabelece:
Ocorrre que, por conta de Decisão proferida no âmbito da Corte de Justiça Catarinense, nos autos da ADI 2005.005316-1, o caput do artigo 8º foi declarado inconstitucional.
Outrossim, o artigo 15 acha-se revogado pela Lei Estadual 13.356/05, que dispôs:
Logo, as supostas contradições apresentadas na lei instituidora do FUNDOSOCIAL, quanto à sua natureza, parecem dirimidas, assentando o caráter financeiro àquele organismo.
Ademais, independentemente de quaisquer equívocos e/ou retificações na referida lei, ou ainda que os dispositivos causadores de tal celeuma não tivessem cerceada sua vigência, descabido seria responsabilizar o ex-Secretário da Fazenda, ora sujeito passivo processual, por incongruências, de ordem material ou formal, daquele ou de qualquer outro diploma legal.
Ora, comungar com raciocínio diverso implicaria responsabilizar, também, os idealizadores e redatores do referido Diploma, assim como a Casa Legislativa deste Estado que, em observância às prerrogativas que lhe são atribuídas constitucionalmente, procederam à aprovação daquele projeto.
Ante o exposto, não há razões hábeis a justificar a aplicação de multa ao Sr. Max Roberto Bornholdt com fulcro na restrição ora em comento.
- Vinculação de receitas de impostos a despesas, conforme consta do art. 8º, §§ 1º e 2º, da Lei Estadual nº 13.334/05, caracterizando descumprimento do disposto no art. 123, V, da Constituição Estadual, que veda a vinculação de receitas de impostos a órgão, fundo ou despesa (fls. 2077-2081)
Nota-se que o Corpo Técnico desta Corte, nos presentes autos, originados a partir da auditoria no FUNDOSOCIAL, detiveram-se mormente a analisar os dispositivos da Lei 13.334/05 do que propriamente a adequação da gestão do Fundo à legislação que o instituiu e na qual, via de regra, deve se pautar.
Exemplo dessa constatação é a análise do item em tela, procedida no Relatório de Reinstrução nº 309/2007 (fl. 2079).
Percebe-se que o Corpo Técnico, ao examinar as justificativas apresentadas pelo responsável quanto ao presente tópico, considerou-as aptas ao saneamento da restrição apontada (fl. 2079). Seqüenciando sua explanação, refere que os §§ 2º e 3º apresentam inconsistências, mantendo, pois, quanto a esses dispositivos legais, a restrição.
É preciso enfatizar que as restrições apontadas por esta Corte devem cingir-se, via de regra, a ações e/ou omissões de administradores e gestores da coisa pública, e não às possíveis inconsistências do ordenamento jurídico.
Ora, a restrição analisada é una, logo, unívoco deve ser o posicionamento da Área Técnica quanto ao seu saneamento ou não. Deflui dos autos que a restrição consiste na "vinculação da receita de impostos a despesas", e, quanto a esse aspecto, a Diretoria competente, inobstante reprisá-la no segmento conclusivo de seu Relatório (fl. 2102), considerou sanada a suposta irregularidade (fl. 2079).
Ainda que a própria DCE não considerasse elidida aquela restrição, faz-se mister salientar que o suposto responsável não vinculou receita de impostos a despesas, uma vez que esta era determinação emanada de lei, de forma que o instrumento normativo instituidor do Fundo (Lei 13.334/05) foi o "agente" a impor aquele procedimento.
Atenta-se, por oportuno, que o caput do artigo 8º, que "vincula" determinado percentual da receita tributária líquida a programa desenvolvido pelo FUNDOSOCIAL, foi objeto de análise quanto à constitucionalidade, no Tribunal de Justiça deste Estado que, por sua vez, julgou-o (ADI 2005.005316-1) inconstitucional. Adverte-se, contudo, que os autos daquela Ação de Inconstitucionalidade ainda tramitam naquela Corte, encontrando-se, atualmente, com vista à Procuradoria Geral de Justiça.
É pacífico, todavia, que os dispositivos da Lei 13.334/05, ainda os que foram objeto de análise na ADI 2005.005316-1, revestiam-se de plena aplicabilidade enquanto escoraram a gestão do FUNDOSOCIAL sob a responsabilidade do então Secretário da Fazenda, Sr. Max Roberto Bornholdt.
Ante o exposto e o que mais dos autos consta, não subsitem argumentos suficientemente sólidos para justificar a aplicação de multa em face da restrição aqui analisada.
Às restrições consubstanciadas nos itens 3.2.4, 3.2.5, 3.2.6, 3.2.7 e 3.2.8 do Relatório nº 309/2007 (fls. 2103-2104) aproveitam os argumentos estresidos quando da explanação acerca da suposta irregularidade inicialmente examinada (Imputação de débito em face da renúncia de receita). Isso porque, tal como exposto naquela oportunidade, as operações protagonizadas pelo FUNDOSOCIAL, além de escudarem-se na legislação pertinente, foram chanceladas por esta Egrégia Corte quando a mesma posicionou-se favoravelmente à aprovação das contas daquela unidade, nos termos do Parecer Prévio sobre as contas prestadas pelo Governador do Estado, referentes ao exercício de 2005. Refutou-se, portanto, naquela ocasião, a ocorrência de renúncia de receita, o que implica a inoportunidade de imputação de débito ou aplicação de multa ao Sr. Max Roberto Bornholdt sob aqueles fundamentos.
Ante o exposto, constata-se que, nos autos do processo AOR 05/04132369, procedeu-se mais à análise e ao questionamento do diploma legal em si (Lei Estadual 13.334/05 - Instituidora do FUNDOSOCIAL) do que à verificação da adequação operacional do Fundo à lei.
Ora, causa estranheza responsabilizar o ex-Secretário da Fazenda por eventuais incompatibilidades daquele instrumento normativo ao ordenamento jurídico pátrio.
Se as ações do suposto responsável pautaram-se na legislação pertinente, não se há de responsabilizar o mesmo em virtude de eventuais incongruências legislativas, sobre as quais não incidiu a vontade do sujeito passivo da relação processual em tela.
Possível, outrossim, é alertar quanto à eventual necessidade de revisão do instrumento normativo instituidor do Fundo, o que, salienta-se, foi externado por esta Corte ao se manifestar favoravelmente à aprovação das contas prestadas pelo Governador do Estado, referentes ao exercício de 2005, no processo nº PCG 06/00167445, sob a relatoria do Exmo. Sr. Conselheiro José Carlos Pacheco.
Em síntese,
- Considerando o que dos autos consta;
- Considerando que a gestão do FUNDOSOCIAL operacionalizou-se sob os auspícios de diploma legal válido;
- Considerando que ao ex-Secretário da Fazenda não competia, de per si, alterar a lei instituidora do Fundo, ao passo que era imperativa a aplicação da mesma;
- Considerando a existência de decisão da Corte de Justiça deste Estado, chancelando a aplicabilidade de dispositivos legais sob a égide dos quais atos outrora rechaçados pela Área Técnica foram praticados;
- Considerando o parecer MPTC nº 7246/2007;
- Considerando, precipuamente, a manifestação plenária deste Tribunal de Contas no processo nº PCG 06/00167445 (Análise das Contas do Governo - Exercício 2005);
- Considerando a necessária coerência que deve pautar as decisões exaradas por esta Corte de Contas,
Não são constatados supedâneos legais e fáticos suficientemente hábeis a justificar imputação de débito ou aplicação de multa ao ex-Secretáio da Fazenda, Sr. Max Roberto Bornholdt, face às supostas restrições apontadas na instrução.
COG, em 14 de março de 2007.
MARCELO BROGNOLI DA COSTA Consultor Geral |