ESTADO DE SANTA CATARINA
    TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO
    CONSULTORIA GERAL

Processo n°: CON - 08/00055276
Origem: Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina S.A (Epagri)
Interessado: Murilo Xavier Flores
Assunto: Consulta
Parecer n° COG-54/08

Organismos internacionais de cooperação. Cobrança.

A cobrança de taxa de administração pelos organismos internacionais de cooperação está amparada pelo parágrafo único do artigo 1º do Decreto Federal nº 5151/2004.

Senhor Consultor,

Gostaríamos de retomar um assunto que já foi objeto de análise deste Tribunal de Contas, através do Processo CON - 07/00469486 (em anexo), a respeito do pagamento da taxa de administração junto ao Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento - PNUD, já estamos anexando novos documentos que podem melhor embasar o posicionamento sobre o tema.

O Acordo Básico de Assistência Técnica, de 1964, firmado entre a ONU e o Brasil não apresenta de forma expressa disposição sobre a cobrança/pagamento da taxa de administração para a implementação de projetos de Cooperação Técnica Internacional, conforme foi afirmado pelo parecer deste Tribunal. Entretanto, de acordo com o artigo VI - Disposições Gerais em seu parágrafo 3 (em anexo), estabelece que qualquer assunto concernente ao presente Acordo e nele não previsto será resolvido entre o Governo e os Organismos interessados, dentro do espírito das resoluções e decisões pertinentes das assembléias, conferências, conselhos e outros órgãos dos Organismos e, particularmente nestes fóruns, a tal taxa de administração foi devidamente incluída na realidade operacional e legal dos projetos de Cooperação Técnica Internacional implementados pelas Nações Unidas.

[...]

Para corroborar com estas justificativas, o Dr. Fernando Cotrim Barbieri, Assessor Jurídico do PNUD, em seu parecer assim se expressa sobre este assunto: "A taxa de administração não é uma novidade no Brasil e está prevista em todos os acordos firmados pelo PNUD, os quais contam com as aprovações jurídicas dos órgãos públicos beneficiários e também da Agência Brasileira de Cooperação que é o órgão do Ministério das Relações Exteriores que regula a cooperação técnica internacional e passa tanto no âmbito estadual quanto federal. Ademais há um decreto presidencial o qual reconhece e permite a cobrança da "taxa de administração". Como se não bastasse, todos os projetos são auditados pela Controladoria Geral da União, com o controle externo do Tribunal de Contas da União e os órgãos de controle não têm questionamentos nesse sentido. O próprio TCU já reconheceu a natureza "sui generis" desses acordos e suas particularidades distintas a de um Convênio, sendo uma delas a própria "taxa de administração", que não é contestada por aquele Tribunal". (grifo do autor)

[...]

Assim, de acordo com esta análise dos documentos, complementada pelo parecer do Dr. Fernando Cotrin Barbieri, e com a postura do Tribunal de Contas da União, a taxa de administração que para a ONU é considerada "recuperação de custos" e está prevista em resoluções da Assembléia Geral e decisões do Conselho Executivo do PNUD do qual o Brasil é membro, estando tal taxa devidamente entronizada na realidade operacional e legal dos projetos de cooperação técnica internacional implementados pelas Nações Unidas, conforme o Acordo Básico de Assistência Técnica determina. ..."

Esta Consultoria passa a seguir a analisar as preliminares de admissibilidade.

O Regimento Interno deste Tribunal de Contas - Resolução nº TC-06/2001 - define as formalidades inerentes à consulta:

Deste modo, a seguir será visto se presentes os requisitos de admissibilidade acima mencionados.

3.1. DA COMPETÊNCIA

A matéria envolta na consulta, por tratar de direito internacional, não é de competência deste Tribunal de Contas, entretanto, o assunto já foi anteriormente conhecido por este Tribunal de Contas no processo de consulta nº 07/00469486, cujo consulente foi o Secretário de Estado do Planejamento.

Dessarte, para modificar o teor da decisão nº 3021, de 19 de setembro de 2007, que originou o Prejulgado nº 1918 deste Tribunal de Contas, admito que o pressuposto previsto no art. 104, inciso I, do Regimento Interno se encontra preenchido.

3.2. DO OBJETO

A consulta prevista no inciso XII do art. 59 da Constituição do Estado de Santa Catarina, bem como no inciso XV do art. 1º da Lei Estadual Complementar 202/2000, objetiva esclarecer incertezas acerca de interpretação de lei ou questão formulada em tese.

Dessa forma é importante registrar que o processo de consulta não envolve julgamento ou exame de legalidade para fins de registro por este Tribunal de Contas, assim, a resposta ora oferecida não constitui prejulgamento do fato ou caso concreto, mas apenas o prejulgamento da tese apresentada pelo Consulente.1

De acordo com os esclarecimentos exarados no item 2, a consulta em análise visa esclarecer dúvidas decorrentes de situação hipotética que enseja interpretação de lei lato sensu, motivo pelo qual está preenchido o requisito estabelecido no art. 104, inciso II, do Regimento Interno.

3.3. DA LEGITIMIDADE

O consulente, na condição de Diretor-Presidente da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina S.A. (Epagri), está legitimado a encaminhar consultas de acordo com o disposto no art. 103, I, do Regimento Interno desta Corte. Dessarte, encontra-se preenchido o requisito previsto no art. 104, inciso III, do Regimento Interno.

3.4. DA INDICAÇÃO PRECISA DA DÚVIDA/CONTROVÉSIA

Conforme relatado no item 2 supra, o consulente indicou de forma precisa sua dúvida, o que faz com que o requisito previsto no art. 104, inciso IV do Regimento Interno esteja preenchido.

3.5. DO PARECER DA ASSESSORIA JURÍDICA

Observa-se que a consulta não veio instruída com parecer da assessoria jurídica da entidade consulente, conforme preceitua o art. 104, V, da Resolução TC-06/2001 (Regimento Interno do TCE/SC).

Contudo, o Tribunal Pleno poderá conhecer da consulta que não atenda a esta formalidade, conforme autoriza o parágrafo 2º do artigo 105 do referido Regimento, cabendo essa ponderação ser efetuada pelo Relator e pelos demais julgadores.

3.6. CONSIDERÇÕES FINAIS ACERCA DA ADMISSIBILIDADE

Ex positis, em razão do preenchimento dos incisos I, II, III, IV, do artigo 104 da Resolução nº TC-06/2001, e desde que superada a falta do parecer jurídico, sugerimos ao Relator o conhecimento da consulta.

Como já foi mencionado, a Consulta retoma um assunto que já foi analisado por esta Corte de Contas, por meio do Processo CON - 07/00469486, cuja decisão exarou o Prejulgado nº 1918, in verbis:

Não concordando com a decisão supramencionada, o Consulente basicamente sustenta que o pagamento da taxa de administração é cobrada em todos os projetos de cooperação técnica internacional do PNUD, e que, inclusive, o Tribunal de Contas da União paga a taxa de administração referente a um acordo firmado com o órgão internacional.

Após a protocolização da presente Consulta, foi apresentado informalmente a esta Consultoria Geral alguns documentos, como o Projeto BRA/03/006 firmado entre o TCU e o PNUD, sob o título de Projeto de Apoio à Modernização do Tribunal de Contas da União, a fim de se comprovar o efetivo pagamento da taxa de administração pelo TCU.

Passo a trabalhar a temática da consulta.

Antes de se analisar o questionamento apresentado, é interessante tecer alguns comentários acerca de acordos internacionais que foram trazidos pelo parecer COG-714/2007, transcrevo in verbis:

"A Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados de 1969, em seu artigo 2º, inciso I, alínea "a", definiu tratado internacional como um "acordo internacional celebrado por escrito entre Estados e regido pelo direito internacional, quer conste de um instrumento único, quer dois ou mais instrumentos conexos, qualquer que seja sua denominação específica."

Na doutrina de Valério de Oliveira Mazzuoli, extrai-se o seguinte acerca do conceito de tratado internacional:

Com isso, percebe-se que pode haver uma variedade de denominações utilizadas que se referem a tratados, quais sejam: declaração, convenção, carta, protocolo, ato, acordo, pacto, ajuste, convênio e outros. Na realidade, não é considerada relevante a denominação utilizada, haja vista que estas diversas denominações conduzem aos mesmos efeitos jurídicos.

Para que um tratado entre em vigor, basicamente, quatro etapas devem ser realizadas: as negociações, a assinatura, a aprovação e a ratificação. Assim, somente após a ratificação é que o tratado passa a ter validade no ordenamento jurídico interno.

Contudo, outras etapas adicionais podem ser incorporadas ao processo de conclusão conforme a constitucionalidade de cada Estado.

No Brasil, o processo de celebração de tratados constitui-se em um ato jurídico complexo. Primeiramente, conforme art. 84, VIII, da Constituição Federal, o Presidente da República celebra tratados, convenções e atos internacionais. Em seguida, o Presidente remete os tratados para apreciação do Congresso Nacional, a quem cabe resolver definitivamente sobre a sua aprovação (art. 49, I, da Constituição Federal). Ato contínuo, os atos internacionais voltam ao Executivo, para a ratificação.

A aprovação do Congresso Nacional dar-se-á por meio do Decreto Legislativo, o qual não torna o tratado obrigatório, pois cabe ao Presidente da República proceder ao ato de ratificação ou adesão, promulgando e publicando, em seguida, o texto convencional via Decreto.3

Consoante o Acordo Básico de Assistência Técnica em que o Brasil firmou com a Organização das Nações Unidas - ONU, constata-se que todas as etapas para a vigência do mencionado acordo internacional foram cumpridas. Primeiramente, o Congresso Nacional aprovou o ato internacional por meio do Decreto Legislativo nº 11, de 1966, sendo que, a partir de tal aprovação parlamentar, o Presidente da República ratificou e promulgou o texto convencional por meio do Decreto nº 59.308, de 1966.

Assim, considera-se que o Acordo Básico de Assistência Técnica (tratado internacional) foi incorporado ao ordenamento jurídico brasileiro com status de lei ordinária nacional, aplicando-se em caso de resolução de conflitos o princípio da lei posterior revoga a anterior, entendimento esse sedimentado no Supremo Tribunal Federal, por meio do Recurso Extraordinário n° 80004/SE e que vige até os dias de hoje.

No mesmo sentido, Hildebrando Accioly esclarece que:

        Na prática, o resultado da dita incorporação é o seguinte: do fato de que o direito convencional (tratados ou convenções internacionais) se transforma em lei nacional, decorre a conseqüência de que ficam implicitamente revogadas as leis ou disposições de leis internas anteriores, contrárias ao referido direito. Se se trata de leis nacionais posteriores, que estejam em contradição com o referido direito convencional transformado em lei interna, este último ainda deve prevalecer, porque o Estado tinha o dever de respeitar as obrigações contratuais assumidas anteriormente e constantes de tal direito.

Cabe, ainda, esclarecer a diferença existente entre lei nacional e lei federal, pois cada uma destas leis terá um campo de abrangência. O Congresso Nacional ao desempenhar a função de legislador federal, atua no âmbito da competência legislativa da União como ente político, em contraposição aos demais entes políticos (DF, Estados e Municípios); ao desempenhar a função de legislador nacional, atua no âmbito da competência legislativa da União (República Federativa do Brasil) como ente central da federação. Por exemplo, a Lei nº 8.666/93 é lei nacional, de disciplina genérica e de aplicação por todos os entes da federação; já a Lei nº 8.112/90 é lei federal, de observância obrigatória pela Administração Federal direta e indireta."

Os doutrinadores pátrios asseveram acerca da diferença das competências da União no plano interno e externo, transcrevo in verbis:

"A União possui uma "dupla personalidade", pois assume um papel interno e outro internacionalmente.

Internamente, ela é uma pessoa jurídica de direito público interno, componente da Federação brasileira e autônoma na medida em que possui capacidade de auto-organização, autogovero, autolegislação e auto-administração, configurando, assim, autonomia financeira, administrativa e política (FAP).

Internacionalmente, a União representa a República Federativa do Brasil (vide art. 21, I a IV). Observe-se que a soberania é da República Federativa do Brasil, representada pela União Federal.

Exemplificando, de maneira interessante, David Araujo e Serrano Nunes observam: 'a União age em nome de toda a Federação quando, no plano internacional, representa o País, ou, no plano interno, intervém em um Estado-membro. Outras vezes, porém, a União age por si, como nas situações em que organiza a Justiça Federal, realiza uma obra pública ou organiza o serviço público federal'"4.

"A União é pessoa jurídica de direito público, tem capacidade política, manifesta-se em nome próprio no âmbito interno e representa a federação no plano internacional. No plano interno, a união é autônoma; no plano internacional, age com a soberania que, todavia, pertence à República que representa. A União é formada pela aglutinação dos entes que se congregam, sendo unidade federativa embora não seja uma das unidades federadas (cf. José Afonso da Silva, ob. Cit, p. 467)"5.

A organização da política externa da República Federativa do Brasil compete ao Ministério das Relações Exteriores, vejamos:

          Lei Federal 10.683/2003
          Art. 27. Os assuntos que constituem áreas de competência de cada Ministério são os seguintes:
          [...]
          XIX - Ministério das Relações Exteriores:
          a) política internacional;
          b) relações diplomáticas e serviços consulares;
          c) participação nas negociações comerciais, econômicas, técnicas e culturais com governos e entidades estrangeiras;
          d) programas de cooperação internacional;
          e) apoio a delegações, comitivas e representações brasileiras em agências e organismos internacionais e multilaterais;

Denota-se que compete ao Ministério das Relações Internacionais tratar dos programas de cooperação com os organismos internacionais. Para tanto, dentro deste órgão foi criada a Agência Brasileira de Cooperação, vejamos o que dispõe o anexo I do decreto regulamentar atualmente em vigor.

Decreto Federal nº 5979/2006

Art. 30. À Agência Brasileira de Cooperação compete coordenar, negociar, aprovar, acompanhar e avaliar, em âmbito nacional, a cooperação para o desenvolvimento em todas as áreas do conhecimento, recebida de outros países e organismos internacionais e aquela entre o Brasil e países em desenvolvimento.

A Agência Brasileira de Cooperação (ABC) "parte integrante do Ministério das Relações Exteriores, é o setor do Governo Federal responsável por toda cooperação técnica internacional (CTI) estabelecida entre o Governo brasileiro e outros países ou organismos internacionais. Sua principal função é negociar, coordenar, implementar e acompanhar os programas e projetos brasileiros de cooperação técnica, com base nos acordos firmados pelo Brasil com outros países e organismos internacionais"6.

Primeiro explicitamos como se dão os acordos internacionais, como eles passam a fazer parte do ordenamento jurídico brasileiro e os efeitos que produzem, depois trouxemos a quem compete, dentro da organização da União, dispor acerca dos programas e projetos brasileiros de cooperação técnica.

O parecer COG-714/2007 baseou-se na decisão nº 330/2002, exarada pelo Tribunal de Contas da União (TCU), para considerar irregular o pagamento de taxa de administração aos organismos internacionais na execução dos projetos de cooperação.

Naquela oportunidade estava vigente o Decreto Federal nº 3751, de 15 de fevereiro de 2001, que em seu artigo 18 permitia a cobrança de taxa administrativa até o limite de 5% (cinco por cento), cobrança considerada irregular pelo TCU.

Acontece, que atualmente é o Decreto nº 5151, de 22 de julho de 2004, que regulamenta a celebração de tais acordos, entretanto, o parágrafo único de seu artigo 1º traz comando semelhante ao revogado artigo 18, do Decreto nº 3751/2001.

Parece-nos que diante da repetição do mesmo comando permanecem as vedações impostas pela decisão nº 330/2002 do Tribunal de Contas da União (TCU), sendo inconstitucional a referida cobrança pelas razões elencadas na referida decisão.

Contudo, algumas elucubrações precisam ser realizadas:

1) O Decreto Federal nº 5151/2004 tem aplicação nacional?

2) Estando a norma produzindo seus efeitos no mundo jurídico e possuindo caráter nacional, compete ao Tribunal de Contas de Santa Catarina, em sede de consulta, analisar a inconstitucionalidade de um dispositivo ou negar a sua aplicação?

No que tange ao questionamento nº 1, temos que o Decreto Federal nº 5151/2004 regulamenta a execução dos projetos de cooperação técnica que tem por base os Acordos Básicos firmados entre o Governo brasileiro e os organismos internacionais cooperantes. Tais Acordos Básicos estão vigorando no Brasil como leis nacionais, assim, muito embora o caput do art. 1º limite seu campo de aplicação à esfera federal, creio que a referida norma é nacional.

A resposta à questão nº 2 também não necessita de grandes argumentações. A súmula nº 347 do Supremo Tribunal Federal (STF) permite que o Tribunal de Contas aprecie a constitucionalidade de leis e de atos do poder público, entretanto, essa verificação será em sede de casos concretos, pois o controle abstrato de constitucionalidade compete ao STF (art. 102, I, "a", da C.R.).

Sob a égide do Acordo Básico de Assistência Técnica promulgado pelo Decreto nº 59.308/66, o Estado de Santa Catarina, a Agência Brasileira de Cooperação do Ministério das Relações Exteriores e o PNUD firmaram entre si o PROJETO DE COOPERAÇÃO TÉCNICA BRA/03/008 - Descentralização Administrativa e Regionalização do Processo de Desenvolvimento Catarinense - PROJETO MEU LUGAR.

A decisão nº 3021, de 19 de setembro de 2007, que originou o Prejulgado nº 1918, originária do processo de consulta nº 07/00469486, não analisou esse projeto em si, mas genericamente a regularidade do pagamento de taxa de administração ao PNUD, entendendo que não seria possível que a Administração promovesse esse tipo de desembolso. Esse posicionamento deve ser reformado em razão dos argumentos que produzimos alhures, qual seja, ter se baseado na decisão nº 330/2002 do Tribunal de Contas da União, que se deu frente ao Decreto nº 3751/2001, hoje revogado.

Atualmente, apesar de o parágrafo único do artigo 1º do Decreto nº 5151/2004 apresentar redação semelhante ao revogado artigo 18, do Decreto nº 3751/2001, o Tribunal de Contas da União tem considerado regular a cobrança da taxa de administração pelos organismos internacionais.

Transcrevo excertos de três decisões do Tribunal de Contas da União (TCU) que se complementam entre si e comprovam que o TCU atualmente não está considerando a cobrança da taxa como uma irregularidade:

Acórdão 259/2004 - Plenário

TC 012.255/2003-7 (c/1 volume)

[...]

Trata-se de relatório de auditoria de natureza operacional realizada, no período de 22/09 a 31/10/2003, tendo como objetivo avaliar o desempenho da ação Apoio às Comunidades Extrativistas da Amazônia - Amazônia Solidária, que integra o Programa Amazônia Sustentável, considerando-se o relevante papel da ação auditada, a saber, "contribuir para o fortalecimento econômico e social das comunidades extrativistas da região amazônica, ao promover o uso sustentável e a conservação da biodiversidade, além de assegurar seu bem-estar e aumentar a eficácia da gestão de seus problemas".

Adoto, como parte deste, o Relatório definitivo da lavra da equipe de auditoria, já após as manifestações dos gestores (acostado às fls. 251/325), com cujas conclusões manifestaram-se de acordo o Diretor da Área e a Titular da Seprog (fls. 326), passando a dele transcrever suas partes essenciais:

[...]

Repasse de recursos às entidades beneficiárias por meio do PNUD

7.9. A maior parte dos recursos orçamentários do Programa são direcionados ao PNUD para serem posteriormente repassados aos beneficiários (ONGs e associações de beneficiários) mediante contratos de pequenos serviços. Assim, não há vínculo entre o poder público e o beneficiário dos recursos. Em outros programas governamentais, a exemplo do Reforsus e do Programa de DST/AIDS, os repasses são realizados por intermédio de instrumento apropriado entre o Ministério e a entidade beneficiária. Nesses casos o PNUD atua apenas como agente administrativo, recebendo a taxa de administração pelo serviço. (grifei)

7.10. Assim, cabe examinar se a forma que está sendo adotada para repassar os recursos para as entidades beneficiadas, via contratos com o PNUD, encontra-se em conformidade com a legislação vigente.

____________________________________________________

          Acórdão 547/2003 - Plenário
          TC 001.484/2003-1
          RELATÓRIO DO MINISTRO RELATOR
          [...]
          34.A situação, então, começa a ser delineada, de acordo com o exemplo seguinte. A União Federal, representada por um de seus órgãos, celebra com a ONU, representada pelo PNUD, um instrumento de cooperação técnica internacional (congênere de convênio), com vistas à execução do projeto BRA/97/033 - fortalecimento institucional do Departamento Comercial. O PNUD executará o acordo, em favor do órgão beneficiário, promovendo as contratações de serviços e de fornecimento de materiais, que se fizerem necessárias. Para tanto, ele perceberá uma taxa de administração. A ABC, por sua vez, coordenará e supervisionará todo o ajuste, bem assim administrará os recursos financeiros alocados ao projeto, mediante transferências. (grifei)
          35. Assim, fica evidente que as transferências não se dão por intermédio de contrato, elas se operam com amparo em instrumento de cooperação técnica internacional, que tem natureza similar a de convênio. Até porque, embora o PNUD perceba uma taxa de administração, ele não tem interesse contraposto ao da administração pública. Ambos têm interesses recíprocos e convergentes: no exemplo dado, tanto a administração quanto o PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) buscam, de modo direto, o fortalecimento do Departamento Comercial com vistas a promoverem, ainda que mediatamente, o desenvolvimento econômico do País. (grifei)
          [...]
          ____________________________________________________
          Acórdão 1018/2007 - Plenário
          TC 015.008/2005-6
          RELATÓRIO DO MINISTRO RELATOR
          [...]
          Assim, os projetos executados no âmbito do acordo com a OPAS, assim como os executados junto ao PNUD e demais organismos internacionais, devem submeter-se à legislação nacional pertinente, atualmente, às disposições do Decreto n.º 5.151/04. (grifei)
          Em relação à taxa de administração, observou-se que o Ministério da Saúde e a ABC tiveram iniciativas junto à OPAS para adequá-la ao comando do citado decreto, no entanto, restou claro que há uma certa resistência desse organismo internacional em alterar os seus procedimentos. (grifei)
          [...]

O próprio TCU, na execução do projeto BRA/03/006 - Projeto de Apoio à Modernização do Tribunal de Contas da União, firmado com o PNUD, pagou a taxa de administração ao referido organismo internacional.

      5. CONCLUSÃO

Em consonância com o acima exposto sugere-se ao Exmo. Sr. Conselheiro Wilson Rogério Wan-Dall que submeta voto ao Egrégio Plenário sobre consulta formulada pelo Diretor-Presidente da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina S.A. (Epagri), Sr. Murilo Xavier Flores, nos termos deste parecer, que em síntese propõe:

1. Conhecer da consulta por preencher os requisitos de admissibilidade previstos no Regimento Interno.

2. Responder a consulta nos seguintes termos:

2.1. O Decreto Federal nº 5151/2004 regulamenta a execução dos projetos de cooperação técnica que tem por base os Acordos Básicos firmados entre o Governo brasileiro e os organismos internacionais cooperantes;

2.2. Os Acordos Básicos vigoram no Brasil como leis nacionais, assim, muito embora o caput do art. 1º do Decreto Federal nº 5151/2004 limite seu campo de aplicação à esfera federal, a referida norma é nacional;

2.3. A cobrança de taxa de administração pelos organismos internacionais de cooperação está amparada pelo parágrafo único do artigo 1º do Decreto Federal nº 5151/2004;

3. Revogar o prejulgado nº 1918.

      COG, em 8 de abril de 2008.
      GUILHERME DA COSTA SPERRY Coordenador de Consultas
      DE ACORDO.
      À consideração da Exma. Sra. Auditora Sabrina Nunes Iocken, ouvido preliminarmente o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas.
        COG, em 8 de abril de 2008.
        MARCELO BROGNOLI DA COSTA

      Consultor Geral


        1 MILESKI, Hélio Saul. O Controle da Gestão Pública. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 362

        2 MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Tratados Internacionais. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2001. p. 27.

        3 DALLARI, Pedro B. A. Constituição e tratados internacionais. São Paulo: Saraiva, 2003, pp. 88/90.

        4 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 11ª edição. São Paulo: Método, 2007. p. 283.

        5 MOTTA FILHO, Sylvio & DOS SANTOS, William Douglas Resinente. Direito Constitucional: teoria, jurisprudência e 1000 questões. 11ª edição. Rio de Janeiro: Impetus, 2002. p.218.

        6 www.abc.gov.br