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Processo n°: | DIL - 04/03551528 |
Origem: | Secretaria de Estado da Administração |
Responsável: | Marcos Luiz Vieira |
Assunto: | Dispensa de Licitação n. 0093/2003 - AQUISIÇÃO DE IMÓVEL |
Parecer n° | COG-182/08 |
Operação de crédito. Compra parcelada. Obrigação.
Caracteriza-se a compra parcelada como operação de crédito, porquanto irá comprometer parte dos orçamentos seguintes do ente público (endividamento), o que gera uma obrigação financeira para o futuro.
Dispensa de licitação. Requisitos. LC n. 101/00. Autorização legislativa.
A autorização legislativa para contratação de operação de crédito deve ocorrer de maneira prévia e expressa no corpo da Lei Orçamentária Anual, créditos adicionais ou em lei específica, em consonância com o prescrito pelo inciso I do §1º do artigo 32 da LC n. 101/00.
Senhor Consultor,
Tratam os autos de Processo de Dispensa de Licitação, sob registro n. DL 0093/2003, em que se questionam os fundamentos da compra realizada pela Secretaria de Estado da Administração - SEA - de imóvel cuja propriedade pertencia à BESCREDI - BESC Financeira S/A.
II. DO MÉRITO
O tema em epígrafe culmina em altercar acerca da real ocorrência de Operação de Crédito para a aquisição de imóveis do BESC Financeira S/A - BESCREDI - pela Secretaria de Estado da Administração - SEA - e as possíveis implicações então decorrentes.
O questionamento em foco surge no Relatório de Reinstrução de n. 178/DCE/ECO/04 (fls. 71-76). Atentou-se, então, para o fato de que a Lei Complementar n. 101/00 (Lei de Responsabilidade Fiscal) estabelece normas de finanças públicas, sendo que destacou os seguintes dispositivos legais:
Complementou com o enunciado no art. 21 da Resolução do Senado Federal de n. 43/01; ipsis litteris:
Art. 21. Os Estados, o Distrito Federal, os Municípios encaminharão ao Ministério da Fazenda os pedidos de autorização para a realização das operações de crédito de que trata esta Resolução, acompanhados de proposta de instituição financeira, instruídos com:
I - pedido do chefe do Poder Executivo, acompanhado de pareceres técnicos e jurídicos, demonstrando a relação custo-benefício, o interesse econômico e social da operação e o cumprimento dos limites e condições estabelecidos por esta Resolução;
II - autorização legislativa para a realização da operação;
III - comprovação da inclusão no orçamento dos recursos provenientes da operação pleiteada, exceto no caso de operações por antecipação de receita orçamentária;
[...]
XIV - lei orçamentária do exercício em curso; e
XV - Lei de Diretrizes Orçamentárias do exercício em curso.
Concluiu o Corpo Técnico que "compulsando os autos não se vislumbra o atendimento ao preconizado no §1º, do art. 32, da Lei de Responsabilidade Fiscal, ou seja, a prévia e expressa autorização para a referida contratação, inserida no corpo da respectiva lei orçamentária ou, ainda, a edição de lei específica" (fls. 75).
Do exame dos autos, no entanto, extrai-se entendimento diverso do acima esposado por parte do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas do Estado - fls. 203:
Considerando todo o encaminhamento dado ao procedimento licitatório, em que os pareceres jurídicos nos órgãos competentes do Poder Executivo, anteriores a sua realização orientaram no sentido de não considerar a aquisição dos imóveis como operação de crédito, e por via de conseqüência o entendimento firmado a nível de Poder Executivo de que a autorização legislativa estava suprida pela edição da "Lei Estadual nº 12.563/2003 (lei do Orçamento Anual) aprovou o Projeto 7287, vinculado aos encargos gerais do Estado, cujo objeto seria "adquirir imóveis não de uso do BESC..." (fl. 23), e considerando ainda o encaminhamento de projeto de lei que resultou na Lei nº 14.049, de 17.07.07 (DOE nº 18.165, de 17.07.07 (ANEXO I), esta Procuradoria entende que a ratificação da aquisição dos imóveis do BESC e BESCREDI por autorização legislativa possa ser acolhida e ser convalidado o procedimento licitatório - Dispensa de Licitação nº 0093/2003 - realizado pela Secretaria de Estado da Administração.
Após os necessários apontamentos, passemos à análise da questão.
1 DA EXISTÊNCIA DE OPERAÇÃO DE CRÉDITO
O entrave jurídico debate se houve, ou não, operação de crédito no caso concreto. Nesse sentido, teríamos como implicações: se a resposta for afirmativa, a obrigação de cumprir os requisitos legais; se negativa, a dispensa de satisfazer as imposições estabelecidas na legislação específica.
Transcrevem-se os termos da restrição apontada pelo Corpo Técnico para desconsiderar a transação realizada como regular - fls. 193:
3.1.1 a ausência de prévia e expressa autorização legislativa para contratação de operação de crédito no texto da lei orçamentária, conforme disposto no artigo 32, §1º, I e artigo 33, §1º da Lei Complementar n.º 101/2000 c/c artigo 21 da Resolução do Senado Federal n.º 43, de 2001 (item 2.1, do Relatório, DCE/ECO n.º 216, fls. 188 a 203).
E a argumentação utilizada para confirmar a transação como uma operação de crédito foi a seguinte - fls. 138:
A "Promessa de Compra e Venda nº 2003/492" (fls. 44/50), em sua cláusula terceira, ao disciplinar o preço de compra e venda e a forma de pagamento a que se impõe o promitente comprador, normatiza o parcelamento (em 144 meses), a atualização monetária (correção pelo INCC) e os juros remuneratórios aplicados ao instrumento negocial formalizado entre os contratantes.
Nesse sentido, cabe ainda destacar tratar-se o promitente vendedor de instituição financeira, tendo como decorrência a incorporação neste contrato, além das características acima, algumas prerrogativas de caucionamento (parágrafo primeiro da cláusula terceira), como a retenção da Conta Única do Tesouro Estadual e todas as aplicações financeiras, empréstimos e demais serviços bancários dos órgãos e entidades do Governo do Estado de Santa Catarina, além de outras implicações elencadas nos parágrafos integrantes desta cláusula contratual, enquanto perdurar a vigência do presente instrumento negocial.
Com efeito, possui razão o Órgão Instrutivo, no que se refere à ocorrência de operação de crédito na situação disposta nos autos.
Dentre os dispositivos legais referentes ao tema, salientam-se:
Resolução n. 43, de 2002, do Senado Federal
Art. 3º Constitui operação de crédito, para os efeitos desta Resolução, os compromissos assumidos com credores situados no País ou no exterior, em razão de mútuo, abertura de crédito, emissão e aceite de título aquisição financiada de bens, recebimento antecipado de valores provenientes da venda a termo de bens e serviços, arrendamento mercantil e outras operações assemelhadas, inclusive com o uso de derivativos financeiros.
Parágrafo único. Equiparam-se a operações de crédito:
§ 1º Equiparam-se a operações de crédito: (Renumerado pela Resolução nº 19, de 2003, do Senado Federal)
I -recebimento antecipado de valores de empresa em que o Poder Público detenha, direta ou indiretamente, a maioria do capital social com direito a voto, salvo lucros e dividendos, na forma da legislação;
II - assunção direta de compromisso, confissão de dívida ou operação assemelhada, com fornecedor de bens, mercadorias ou serviços, mediante emissão, aceite ou aval de títulos de crédito;
III - assunção de obrigação, sem autorização orçamentária, com fornecedores para pagamento a posteriori de bens e serviços.
§ 2º Não se equiparam a operações de crédito: (Incluído pela Resolução nº 19, de 2003, do Senado Federal)
I - assunção de obrigação entre pessoas jurídicas integrantes do mesmo Estado, Distrito Federal ou Município, nos termos da definição constante do inciso I do art. 2º desta Resolução; (Incluído pela Resolução nº 19, de 2003, do Senado Federal)
II - parcelamento de débitos preexistentes junto a instituições não-financeiras, desde que não impliquem elevação do montante da dívida consolidada líquida. (NR) (Incluído pela Resolução nº 19, de 2003, do Senado Federal)
Da doutrina, como conceito de operação de crédito, destacam-se os seguintes excertos:
OPERAÇÃO DE CRÉDITO - Designação dada à tomada de empréstimo ou de financiamento por entidade da administração pública, com o objetivo de captar recursos (capital, bens ou serviços) para a realização de projetos e/ou empreendimentos. Tais operações são de Crédito Interno (quando realizadas com agentes nacionais) e de Crédito Externo (quando realizadas com instituições sediadas no exterior).
Para os efeitos das Resoluções nºs 96, de 1989, e 69, de 1995, do Senado Federal - que regulam o endividamento da União, Estados, Municípios e suas instituições -, ora substituídas pela Resolução nº 43, de 2001, entende-se por operação de crédito toda e qualquer obrigação decorrente de financiamentos ou empréstimos, inclusive de arrendamento mercantil, mediante a celebração de contratos, emissão ou aceite de títulos, ou a concessão de quaisquer garantias, que representem compromissos assumidos com credores situados no País ou no exterior.
- In: SANCHES, Osvaldo Maldonado. 2. ed. Dicionário de orçamento e áreas afins. OMS: Brasília, 2004. p. 233
A operação de crédito é uma figura contratual que pressupõe agente capaz, objeto lícito e forma prescrita ou não defesa em lei, nos exatos termos do art. 82 do Código Civil. Guarda a peculiaridade, no caso de contratos públicos, pelo fato de que um dos contratantes é ente federativo. Trata-se de compromisso em razão de um empréstimo, gerando crédito e débito. Como salienta Geraldo Ataliba, "tanto é operação de crédito o levantamento direto de um empréstimo em dinheiro quanto a aquisição de bens e serviços para pagamento a médio ou longo prazo" (Empréstimos..., p. 42). No mesmo sentido a opinião de Aliomar Baleeiro (Uma introdução à ciência das finanças, 15. ed., Forense, p. 488). - (grifo nosso)
- In: OLIVEIRA, Regis Fernandes. Responsabilidade Fiscal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 63
Considera-se operação de crédito, na própria definição da LRF, todo "compromisso financeiro assumido em razão de mútuo, abertura de crédito, emissão e aceite de título, aquisição financiada de bens, recebimento antecipado de valores provenientes da venda a termo de bens e serviços, arrendamento mercantil e outras operações assemelhadas, inclusive com o uso de derivativos financeiros", equiparam-se também às operações de crédito "a assunção, o reconhecimento ou a confissão de dívidas pelo ente da Federação". Ou, em uma definição mais concisa, as operações de crédito público "são aquelas realizadas pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios contemplando compromissos de pagamento a serem honrados no futuro". - (grifo nosso)
- In: CONTI, José Maurício. Comentários à Lei de Responsabilidade Fiscal. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 220.
Extrai-se das lições acima transcritas que a característica comum é o endividamento do ente público. In casu, a situação fica muito bem caracterizada, tendo em vista que a compra parcelada (dívida) irá comprometer parte dos orçamentos seguintes (futuros) do Estado.
Salienta-se, nesse ínterim, o intuito dos limites e vedações impostos pela Lei de Responsabilidade fiscal; nas palavras de Márcio Novaes Cavalcanti - In: Fundamentos da Lei de Responsabilidade Fiscal. São Paulo: Dialética, 2001. p. 114-116:
O mesmo cuidado adotado pelo legislador complementar ao definir de maneira ampla o conceito de operações de crédito, está evidente na Seção IV da Lei de Responsabilidade Fiscal que trata das operação de crédito. Não é só o estabelecimento de um verdadeiro ritual para a contratação que está presente. Há vedações, impedimentos e conseqüências severas para o não-atendimento dos requisitos impostos pela LRF.
[...]
O mesmo rigor existe para a contratação de operações de crédito. Assim, aquelas que não estão expressamente vedadas ou proibidas, devem atender ao rito e aos rigores do art. 32 da LRF. Haverá verificação por parte do Ministério da Fazenda no que diz respeito ao cumprimento dos limites e condições relacionados às operações de crédito, não só dos entes da federação, mas também das empresas por ele controladas, direta ou indiretamente. Este artigo estabelece diversos requisitos, dentre eles, existência de prévia e expressa autorização na lei do orçamento, ou em lei específica [...].
[...]
Tem-se a exata medida da importância do rigor e das proibições e vedações impostas pela LRF aos excessos, quando se avalia o quão nocivas eram, para o Brasil, as operações mágicas inventadas pelos gestores públicos no passado. Fica evidente, agora, que as práticas excessivas não mais serão contornadas por operações inventivas e destrutivas ao patrimônio público. Neste ponto específico, o rigor da LRF é altamente louvável, pois fica claro aos cidadãos, aos governantes e aos agentes do mercado, que a irresponsabilidade e o endividamento excessivo não serão bancado por operações maquiadas. Não serão possíveis, a partir de agora, manobras para se obter a antecipação de recursos, e recursos não mais virão aos cofres públicos sem a devida cautela na aprovação e o correspondente controle. - (grifo nosso)
Daí o cuidado exacerbado da legislação em se evitar o excesso de endividamento dos entes públicos, na busca pelo equilíbrio orçamentário das instituições públicas.
Cumpre lembrar, ainda, a existência da Resolução de n. 79, de 15 de dezembro de 1999, do Senado Federal, que autorizou o Estado de Santa Catarina a contratar operação de crédito para a compra do imóvel em questão, consubstanciada no Contrato de Abertura de Crédito e de Compra e Venda de Ações celebrado com a União; senão vejamos - fls. 160-163:
Vislumbra-se, assim, que a transação efetuada - inclusive, com a normatização no contrato de compra e venda (fls. 44-50) do parcelamento efetuado (144 meses), da atualização monetária (correção pelo INCC) e dos juros moratórios - possui todas as características de operação de crédito, tendo em vista o endividamento a que se submeteu o Estado para que se efetuasse a aquisição.
2 DA AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO LEGISLATIVA
Tendo em vista o embate acerca da ocorrência ou não de operação de crédito, tratar-se-á da questão da ausência de autorização legislativa, porquanto tal item encerraria o rol de exigências dispostas pelo art. 32 da LC n. 101/00; senão vejamos:
O tema foi motivo de dúvida desde a fase inicial do processo de dispensa de Licitação enviado para exame desta Corte de Contas, conforme se depreende às fls. 12, 16 (Parecer da Consultoria Jurídica da Secretaria de Estado da Fazenda), 18 (Parecer da Procuradoria Geral do Estado), entre outras. Da análise dessa documentação, observa-se que se considerou como suficiente a Lei n. 12.563, de 15 de janeiro de 2003 (ou seja, como a autorização legal exigida).
2.1 DOS REQUISITOS DA LC N. 101/00
O texto da LC n. 101/00 determina a "existência de prévia e expressa autorização para a contratação, no texto da lei orçamentária, em créditos adicionais ou lei específica" (inciso II do §1º do art. 32). Nesse sentido, interessante transcrever as palavras de Regis Fernandes de Oliveira - In: Responsabilidade Fiscal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 67:
Todas "as despesas tem que estar devidamente autorizadas pelo Congresso Nacional, quando da aprovação da lei orçamentária" (ob. cit., p. 66). É possível que a autorização esteja contida na lei anual de orçamento ou em lei específica. O importante é que não existe despesa que ocorra sem a devida autorização do Poder Legislativo. Ressalta Aliomar Baleeiro que "nenhuma autoridade, sem exceção sequer do Presidente da República, pode ordenar ou efetuar despesas sem autorização do Poder Legislativo, ou acima dos limites desta, nem também desviar para fins diversos ainda que úteis e indispensáveis, os créditos para aplicações específicas" (Uma introdução à ciência das finanças, 15. ed., Forense, 1998, atualizada por Dejalma de Camos, p. 81). - (grifo nosso)
Ressalta a defesa que o Projeto de n. 7287, aprovado pela Lei n. 12.563 (LOA), de 15 de janeiro de 2003, efetuou a exigida autorização legislativa: "Projetos Especiais. Objeto da ação: 'adquirir imóveis de uso do BESC e quitar dívidas oriundas de prestação de serviços no Estado por esta Instituição Financeira'".
Observa-se, no entanto, que como bem explanou o Corpo Técnico não foram obedecidos os parâmetros fixados pelo inciso II do §1º do art. 32. Nesse sentido, interessante transcrever os argumentos realizados - fls. 88:
O que se observa, ainda, da leitura da resposta encaminhada à esta Casa é a confusão conceitual do que preconiza a Lei de Responsabilidade Fiscal, pois o que a mesma busca é a autorização (prévia e expressa) para a contratação de operação de crédito, e não autorização legislativa para aquisição do imóvel (ou realização da despesa), através da disponibilização de recursos no orçamento estadual.
Com efeito o que exige a LC n. 101/00 é a previa e expressa autorização para contratar a operação de crédito, e não para realizar a compra.
Também, a simples indicação da dotação orçamentária não seria suficiente, conforme muito bem esclarece o Corpo Técnico - fls. 100:
Nesse sentido, cabe salientar que a dita Lei Orçamentária Anual somente se aterá aos créditos do corrente exercício, não contemplando todo o período contratado, ou seja, 144 meses, conforme reza a cláusula terceira do contrato em tela.
Ainda, há que se atentar para fato já anotado pelo Corpo Técnico, às fls. 88, que "compulsando os autos, e revendo a Lei 12.563, de 15 de janeiro de 2003, não se localizou a requisitada autorização, restando apenas comprovado o apontamento dos recursos orçamentários provenientes da referida contratação".
Nesse diapasão, não há como considerar implementado o requisito imposto pelo inciso II do §1º do art. 32, da LC n. 101/00.
2.1.1 DA LEI N. 14.049
O Poder Executivo Estadual publicou a Lei de n. 14.049, no Diário Oficial do Estado na data de 17/07/07 (fls. 205) em que busca convalidar a anuência que não se identificou na Lei n. 12.563 (LOA). Em relação ao fato, transcreve-se excerto do Parecer n. 156/DLC/Div. 4/07 - fls. 191: "entretanto, a restrição permanece, pois esta autorização legislativa deve ser prévia e expressa para contratação de operação de crédito [...]".
A Lei de n. 14.049 serve para preencher um dos requisitos para compra apontados pela doutrina, qual seja, lei que esclareça a aquisição - em consonância com a exigida transparência orçamentária. Nas palavras de Diogenes Gasparini - In: Direito administrativo. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 832:
A lei autorizadora é sempre necessária. Essa exigência é preconizada pela doutrina e jurisprudência, com base no Direito Positivo. De fato, a Administração Pública não é livre para adquirir ou alienar bens imóveis. Esses atos vão além dos de mera administração. [...] A lei deverá autorizar a aquisição mediante licitação, ou não, e caracterizar o bem a ser adquirido, indicando a finalidade, a área, o perímetro e suas respectivas confrontações, explicitando, ainda, quando existentes, as benfeitorias. Se o pagamento for a prazo, essa lei deverá prescrever o valor da entrada, o número, o valor e a data de vencimento das prestações, os juros, a correção monetária e as sanções pelo não-pagamento nas condições estipuladas, além de outros elementos que circunscrevem ou esclareçam o negócio. - (grifo nosso)
Não basta, portanto, uma autorização prévia para a contratação da operação de crédito. Exige-se, ainda, em nome do interesse público, lei autorizadora prévia para esclarecer a compra, em conformidade com o raciocínio do ilustre doutrinador, supratranscrito.
Passemos, ainda, à análise das disposições da Resolução n. 43/01 do Senado Federal.
2.2 DOS REQUISITOS DA RESOLUÇÃO N. 43/01 DO SENADO FEDERAL
A Resolução de n. 43/01, em seu art. 21, reclama tanto a lei orçamentária do exercício, como a autorização legislativa para que se proceda à operação de crédito.
Quanto ao primeiro requisito (lei orçamentária do exercício), o mesmo já foi analisado no tópico anterior. Em relação ao último (autorização legislativa para a operação), salienta-se que o dispositivo não é claro o suficiente para extrair se a autorização deverá ocorrer na forma do estipulado pela LC n. 101/00 (pode ser realizada no seu próprio texto) - ou exige mais, ou seja, outra lei para confirmar.
Observa-se que, ab initio, se a Resolução veio para Regulamentar o texto da LC n. 101/00, não poderá ampliar o que é definido pela mesma. Dessa forma, como a LC n. 101/00 dita que a autorização poderá vir no corpo da LOA, ilegal seria exigir mais - nesse caso, o requisito teria sido cumprido.
Salienta-se, ademais, que a autorização dada pela LC n. 101/00 para o Senado Federal expedir resoluções será com o fito de estabelecer os limites e as condições (inciso III do §1º da LC n. 101/00) para a realização das contratações - e não, expandir e/ou criar novas exigências.
Das lições de Celso Ribeiro Bastos, vejamos comentários acerca da Lei como fonte do Direito Administrativo - In: Noções de Direito Administrativo. São Paulo: Celso Bastos Editora, 2002. p. 23-24:
Embora a Constituição cuide de fixar princípios e, mesmo, regular matérias que nela encontram a sua disciplinação ampla, nada obstante isso, resta um papel enorme às leis. Estas é que vão dar conteúdo à competência distribuída pela Constituição às pessoas de Direito Público para legislarem sobre as diversas matérias administrativas.
A lei é a fonte por excelência do Direito Administrativo, até porque, quando se fala que este último obedecerá ao princípio da legalidade, entende-se que ele é todo regulado pela lei, que é a sua fonte normal, sua geradora por excelência, sua adaptadora às novas circunstâncias que vão surgindo no mundo em face da evolução econômica, tecnológica , social, cultural etc.
Não se pode subestimar a importância da lei como fonte do Direito Administrativo em nosso país. Há uma verdadeira reserva da lei, isto é, não se autoriza a produção pela Administração de normas de Direito Administrativo com a mesma hierarquia das leis e da Constituição. A lei se destaca, pois, por ser a fonte primária, logo depois da Constituição, sem nenhuma co-divisão de competência com uma eventual atividade legislativa do Poder Executivo, como ocorre em alguns países que seguem o modelo francês, onde há uma competência do Poder Executivo para legislar diretamente, dependendo apenas da Constituição.
[...]
Não existe campo no Direito Administrativo alheio às leis, em decorrência do princípio da legalidade. Portanto, não há uma reserva administrativa, ou seja, um campo de atuação administrativa desvinculado de qualquer previsão legal. [...]
Não há, como vimos, uma reserva administrativa no campo do atuar administrativo que fique isenta da regulamentação legislativa.
- (grifo nosso)
Celso Antônio Bandeira de Mello trata com excelência a célebre questão - In: Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 343-344:
Ainda, interessante anotar as palavras do ilustre doutrinador ao dissertar acerca dos regulamentos (o que, da mesma forma, aplicam-se às resoluções) - IBIDEM, p. 341-343:
Deveras, as leis provêm de um órgão colegial - o Parlamento - no qual se congregam várias tendências ideológicas múltiplas facções políticas, diversos segmentos representativos do espectro de interesses que concorrem na vida social, de tal sorte que o Congresso se constituem verdadeiro cadinho onde se mesclam distintas correntes.
Daí que o resultado de sua produção jurídica, as leis - que irão configurar os direitos e obrigações dos cidadãos - [...].
Com isto, as leis ganham, ainda que em medidas variáveis, um grau de proximidade em relação à média do pensamento social predominante muito maior do que ocorreria caso fossem a simples expressão unitária de uma vontade individual, embora representativa, também ela, de uma das facções sociais. É que, afinal, como bem observou o insuspeito Kelsen, o legislativo, formado segundo critério de eleições proporcionais, ensejadoras, justamente, da representação de uma pluralidade da representação de uma pluralidade de grupos [...].
Se fosse possível, mediante simples regulamentos expedidos por presidente, governador ou prefeitos, instituir deveres de fazer, ficariam os cidadãos à mercê , se não da vontade pessoal do ungido no cargo, pelo menos, da perspectiva unitária, monolítica, da corrente de pensamento de que estes se fizessem porta-vozes.
[...]
O próprio processo de elaboração das leis, em contraste com o dos regulamentos, confere às primeiras um grau de controlabilidade, confiabilidade, imparcialidade e qualidade normativa muitas vezes superior ao dos segundos, ensejando, pois, aos administrados um teor de garantia e proteção incomparavelmente maiores.
É que as leis se submetem a um trâmite graças ao qual é possível o conhecimento público das disposições que estejam em caminho de ser implantadas.
[...]
Já, os regulamentos carecem de todos estes atributos e, pelo contrário, propiciam as mazelas que resultariam da falta deles, motivo pelo qual, se são perfeitamente prestantes e úteis para a simples delimitação mais minudente das providências necessárias ao cumprimento dos dispositivos legais, seriam gravemente danosos - o que é sobremodo claro em país com as características políticas do Brasil - se pudessem, por si mesmos, instaurar direitos e deveres, impondo obrigações de fazer ou não fazer. - (grifo nosso)
Portanto, não sendo lei em sentido formal, não pode instituir obrigação nova, porquanto as resoluções são normas de grau inferior, em que estão ausentes as garantias encontradas nas leis quanto ao administrado, com o fito de proporcionar a estes segurança jurídica, conforme evidenciado pela doutrina acima destacada.
Esclarece-se, assim, a impossibilidade de Resolução ampliar rol de exigências já definidas em Lei.
De qualquer forma, reitera-se a já analisada ausência de prévia e expressa autorização para a contratação da operação de crédito em comento. Nesse sentido, impossível reconhecer que, tanto os requisitos da LC n. 101/00, quanto da Resolução 43/01, foram cumpridos.
A título de conclusão, exige-se, quando da aquisição de imóvel via compra parcelada: procedimento licitatório (que poderá se dar por meio de dispensa de licitação), lei autorizadora da contratação da operação de crédito (prévia e expressa, nos termos da LC n. 101/00), bem como lei autorizadora prévia para a compra do imóvel, em razão do interesse público a ser respeitado.
Nesse diapasão, impelente considerar o processo de Dispensa de Licitação em análise como irregular.
Destaca-se ainda, que, em consonância com o disposto no art. 1º da LC n. 101/00, fica a critério do Exmo. Sr. Conselheiro Relator averiguar se a transação ora analisada efetivamente contribuiu para alguma forma de desequilíbrio das contas públicas, ou se não gerou qualquer impacto no orçamento estadual, restringindo-se à irregularidade exclusivamente formal, cujo reflexo, considerando a implementação do contrato, bem como a ocupação do imóvel, torna excessiva a medida extrema de anulação do ato.
MARCELO BROGNOLI DA COSTA Consultor Geral |