TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE SANTA CATARINA

DIRETORIA DE CONTROLE DA ADMINISTRAÇÃO ESTADUAL

Inspetoria 2

Divisão 5

 

PROCESSO Nº AOR - 06/00283518
UNIDADE GESTORA FUNDO DE MELHORIA DA POLÍCIA CIVIL
INTERESSADO RONALDO JOSÉ BENEDET E MAURÍCIO JOSÉ ESKUDLARK
RESPONSÁVEIS ILSON DA SILVA

EDUARDO SIMON

JORGE APÓSTOLO DIAMANTARAS

ASSUNTO AUDITORIA ORDINÁRIA "IN LOCO" REFERENTE A AQUISIÇÃO DE DISTINTIVOS PARA O FUNDO DE MELHORIA DA POLÍCIA CIVIL
Relatório de instrução TCE/DCE/INSP 2/DIV 5 - nº 085 /2008

Sr. Coordenador,

1 INTRODUÇÃO

Em cumprimento ao que determinam O ARTIGO 59, IV, da Constituição Estadual, artigo 25, II, da Lei Complementar nº. 202/00 e o artigo 46 da Resolução nº TC - 06/2001, a Unidade Gestora acima identificada foi auditada por este Tribunal de Contas1, no período de 04/05 a 19/05/2006, fulcrada na aquisição de distintivos para a Polícia Civil de Santa Catarina.

Em sede de exame preliminar, consubstanciado no relatório de auditoria DCE/INSP.3 /nº 047/2006, fs. 38 a 43, registrou-se a conclusão que segue transcrita (fs. 41 a 43):

O senhor Relator, por meio do despacho de f. 44, acolheu os fundamentos da conclusão preliminar acima transcrita, para determinar a audiência dos senhores Ilson da Silva, Gestor do Fundo de Melhoria da Polícia Civil à época e do senhor Ronaldo Benedet, Gestor do Fundo para Melhoria da Segurança Pública à época.

O senhor Ronaldo Benedet, Gestor do Fundo para Melhoria da Segurança Pública à época, solicitou prorrogação de prazo, f. 47, que foi concedida pelo senhor Relator, conforme o despacho de f. 50.

De outro lado, o senhor Ilson da Silva, Gestor do Fundo de Melhoria da Polícia Civil, apresentou nos autos a sua defesa às fs. 51 a 60, trazendo a lume os argumentos a saber (fs. 52 a 56):

Reconduzidos os autos à instrução, foi expedido o relatório DCE/INSP.2/DIV.5/Nº. 39/2007, de 25 de julho de 2007, consubstanciado às fs. 98 a 114, tendo sido registrados, na análise das alegações de defesa apresentadas nos autos, acima reproduzidas, os apontamentos a saber:

2 ANÁLISE

2.1. O FRACIONAMENTO DAS DESPESAS

O reexame da matéria impõe que seja restabelecida a discussão de alguns pontos pertinentes ao mérito da matéria.

A par do que já foi exaustivamente discutido, a matéria sob análise se volta a dois aspectos precípuos: a fuga ao processo licitatório na aquisição de determinado bem, por meio de duas unidades orçamentárias distintas (Fundo de Melhoria da Polícia Civil e Fundo para Melhoria da Segurança Pública), e o interesse público ensejador desta aquisição.

Até aqui não há maiores dificuldades acerca da necessidade de licitação precedente para a aquisição da totalidade de medalhas.

Há que se deixar claro, também, que não se veda, juridicamente, o parcelamento nas aquisições da Administração Pública: aliás este figura na Lei Federal n. 8.666/93, artigo 15, na ordem de princípio de eficiência.

A condicionante legal, entretanto, é que quando se divide a obra, serviço ou compra em parcelas, a soma destas que definirá a exigibilidade da licitação precedente à aquisição, ou, ainda, a modalidade licitatória.

Em outras palavras, se a soma total da aquisição incorrer na necessidade de tomada de preços, cada uma das parcelas deverá ser adquirida por meio de tomada de preços (artigo 23, § 5º, da Lei Federal nº. 8.666/93) ou, ainda, em outro vértice se a soma das parcelas indicar a necessidade de licitação, licitadas deverão ser cada uma das parcelas integrantes do todo (artigo 24, II, da Lei nº 8.666/93).

Como se vê, a própria lei criou antídotos, por assim dizer, ou mecanismos de defesa contra subterfúgios ao descumprimento de seu valor fundamental que é a licitação, como regra geral e premissa de atendimento ao interesse público, só excetuada nos casos em que, na concepção do legislador, a sua realização não implica, necessariamente na vantajosidade que deve ser perseguida pela Administração Pública.

No caso em debate não são necessários grandes exercícios hermenêuticos para se perceber que à lei não importa o parcelamento das aquisições, e, tampouco, a repisada distinção de Unidades Orçamentárias, mas o objeto, o destino da aquisição em si, a sua substância; observe-se o que diz a última parte do inciso II do artigo 24, da Lei n. 8.666/93:

Não há dúvidas, portanto, que o foco nuclear da lei é o objeto da aquisição.

Todas as medalhas adquiridas foram destinadas a um mesmo fim, um mesmo propósito declinado, circunscrito no artigo 21, da Lei Estadual e Complementar nº 98/932, in verbis:

        As medalhas policiais civis, a que se refere o art. 268, da Lei nº 6.843, de 28 de julho de 1986, com a classificação prevista neste artigo, serão consideradas para efeito de promoção por merecimento [..]

As alegações de defesa e todo o corpo probando integrante dos autos não dissentem acerca do destino comum da mesma medalha, conforme se percebe, claramente, de excerto das alegações de defesa de f. 55, que novamente segue transcrito :

        Com os trabalhos da Comissão de Promoção verificou-se a insuficiência motivando a nova aquisição que, devido ao contingenciamento no fundo (sic) de Melhoria da Polícia Civil, foi realizada pelo Fundo de Melhoria da Segurança Pública somente no ano de 2006.

Trata-se, por conseguinte, de mesma aquisição, objeto e necessidade, parte atendida pelo Fundo de Melhoria da Polícia Civil e que, em razão de limites financeiros nominados pelo senhor Gestor de "contingenciamento", foi complementada a aquisição pelo Fundo para Melhoria de Segurança Pública.

Comprovada a incidência de desacato à parte final do artigo 24 da Lei Federal nº 8.666/93, também é de se alinhar ao entendimento da instrução, no sentido que o desatendimento ao disposto no referido artigo incorre, também, no malferimento à imperatividade consubstanciada no artigo 37, inciso XXI, da Constituição Federal, e ao caput do artigo 3º. da Lei Federal nº 8.666/93.

Remanesce a avaliar aos documentos acostados em sede de diligência.

Neste mister, o senhor Gestor, por meio da resposta à diligência empreendida, procurou restabelecer a discussão de mérito das restrições que integraram o procedimento de audiência anteriormente procedida, e, no que tange à questão que lhe foi formulada, limitou-se a evocar a existência de um projeto de lei que revogaria o artigo 21 da Lei Complementar nº 98/93, para fundamentar a " postergação" na entrega das referidas medalhas, que, conforme firma o documento de f.130, permanecem armazenadas no almoxarifado da Delegacia Geral de Polícia Civil.

Repise-se as palavras do senhor gestor a respeito (f.128):

        [..] deliberou-se postergar a entrega das referidas medalhas, uma vez que tramita projeto de lei revogando o art. 21 da Lei Complementar n. 98/93, o que poderá alterar conseqüências por ocasião das próximas deliberações da Comissão de Promoção da Polícia Civil.
        [..]

Nesta ordem, os argumentos trazidos a lume querem significar que ambos os Fundos promoveram aquisição fulcrada em lei que, brevemente, iria proclamar a sua desnecessidade, o que reforça, com mais rigor, a irregularidade de desvio de finalidade.

Contudo, nem a estes argumentos assiste verdade; é o que se explica a seguir.

Mas também impende ressaltar que, em pesquisa realizada no endereço eletrônico da Assembléia Legislativa do Estado de Santa Catarina3, revela-se que o projeto de lei em trâmite, com o ímpeto de alterar o mencionado artigo 21 da Lei Complementar e Estadual nº. 98/93, está arquivado desde 1999 (espelho de tramitação acostado ao presente processo às fs. 132 a 134); aproximados sete anos anteriores à aquisição aqui questionada.

Proposição desta ordem, só veio a ser submetida à Assembléia Legislativa em 14/11/20074, f. 135, dois meses posteriores às alegações de defesa acostadas pelo senhor Gestor (fs. 118 a 129), ora em exame, convertida, em 11 de janeiro de 2008, na Lei Complementar nº 402 (f. 138 dos autos).

Portanto, não é fato a evocada iminência da legislação aplicável à outorga das referidas medalhas.

Retome-se o exame da intercorrência de desvio de finalidade.

Com efeito, a suposta iminência de revogação da referida lei não pode se prestar à justificar a ociosidade dos bens adquiridos, face ao princípio da legalidade que, entre tantos significados, reza que uma lei permaneça em vigência até que outra expressamente a modifique, quer significar, por óbvio, o processo legislativo completo.

Nesta senda, do alegado fato de que as aludidas medalhas hoje integram o patrimônio público não se depreende, necessariamente, o interesse público na sua aquisição, porque da noção de interesse público são vetores a conveniência, a oportunidade e a utilidade do bem adquirido.

De fato, sob a égide do princípio da eficiência, inscrito no caput do artigo 37 da Constituição Federal, da obrigatoriedade da escolha da proposta mais vantajosa, registrado no caput do artigo 3º. da Lei Federal nº. 8.666/93 e, mesmo, com fundamento no disposto no artigo 7º., parágrafo 4º., também da Lei Federal nº. 8.666/93, não se concebe a aquisição de um bem que não atenda a uma efetiva e pontual necessidade pública.

É de se ponderar, outrossim, que toda a concepção da Lei Federal nº. 8.666/93 se volta, na ordem de premissa, ao planejamento e à definição exata das expectativas de consumo, precedentes às aquisições na Administração Pública, a exemplo do consubstanciado no inciso II do parágrafo 7º. do artigo 15, da Lei nº 8.666/93.

Por todo o exposto, este fato último, a não utilização dos bens, incorre em desvio de finalidade e afronta ao princípio da eficiência inscrito no caput do artigo 37 da Constituição Federal.

2.2 O ADIMPLEMENTO DAS DESPESAS

Um dos argumentos mais repisados pelas alegações de defesa acostadas aos autos é o que se reporta à independência das duas Unidades Orçamentárias: o Fundo para Melhoria da Segurança Pública e o Fundo de Melhoria da Polícia Civil.

A par do acima demonstrado, este argumento não é suficiente para elidir a imprescindibilidade do processo licitatório precedente às despesas realizadas.

Mas há outra questão a ser trazida a debate, expressa no artigo 70 da Lei Estadual e Complementar nº. 98/93, que segue reproduzido:

    Como se vê, também esta competência legal foi desrespeitada, não podendo ter sido a referida despesa ser suportada pelo Fundo de Melhoria da Polícia Civil, o que pode ensejar a aplicabilidade da multa prevista no inciso II do artigo 70 da Lei Estadual e Complementar nº. 202/2000.
    Contudo, este fato ainda não foi exposto ao devido contraditório, impondo-se novo procedimento de audiência em atenção ao artigo 5º., inciso LV, da Constituição Federal.

2.3 A responsabilidade do gestor do fundo PARA melhoria da segurança pública

O senhor Ronaldo Benedet, gestor do Fundo para Melhoria da Segurança Pública, evocou a sua RESPECTIVA EXCLUSÃO DO PÓLO PASSIVO, NO PRESENTE PROCEDIMENTO, COM FUNDAMENTO NA DELEGAÇÃO DE COMPETÊNCIA QUE ESTARIA MATERIALIZADA NA PORTARIA DE F. 73.

Também sobressai a considerar que o Prejulgado nº.15335, conforme o próprio senhor defendente alude, circunscreve critérios objetivos para a aferição da responsabilidade de quem se considera como Ordenador de Despesas, cujo assentado segue transcrito:

Neste diapasão, estes critérios deverão estar fulcrados nos Diplomas Legais de regência, bem como nas circunstâncias fáticas que envolvem os atos submetidos a exame.

No caso em epígrafe, a primeira questão a se considerar para exame é o ato de delegação de competência, acostado aos autos às fs. 73.

Veja-se que, no ato delegante (a portaria nº. 0334/GEREH/DIAD/SSPDC), figura como signatário o senhor João Henrique Blasi, predecessor, no cargo, do Gestor auditado, senhor Ronaldo José Benedet.

Em fato, ainda que se possa argumentar, em sentido contrário, que esta qualidade de delegação de competência se trate de ato personalíssimo - ninguém poderia prestá-lo em nome de outrem - esta delegação vigorou de fato, conforme se percebe no exame dos documentos de fs. 24 a 37.

    Trata-se aqui, portanto, de extrair, do conteúdo dos atos impugnados e da lei de regência, a exata participação dos agentes na consecução do ato ilícito.

Assim sendo, o Decreto Estadual nº. 30096, de 30 de novembro de 1992, assinala, por meio do artigo 10, que a administração contábil do Fundo de Melhoria competiria à Gerência de Administração Financeira, subordinada, à época da edição do referido regulamento, à Diretoria de Apoio Operacional, da Secretaria de Estado da Segurança Pública.

Na orbe da administração contábil concebida pelo artigo 10, do Decreto acima aludido, foram assinaladas as competências de emitir empenhos, subempenhos, guias de recolhimento, ordens de pagamento e cheques, em conjunto com o Coordenador Executivo do Fundo.

O Coordenador Executivo do Fundo, de acordo com o artigo 9º. do mesmo Diploma Legal, é o Diretor de Apoio Operacional da Secretaria de Estado da Segurança Pública.

Nesta ordem, o corpo probando integrante dos autos e a própria lei de regência, portanto, assentam as devidas responsabilidades.

As funções acima descritas foram exercidas7, à época dos fatos em vigor, pelo senhor Eduardo Simon, Diretor de Gestão Administrativa e pelo senhor Jorge Apóstolo Diamantaras, Gerente de Apoio Operacional, signatários de todos os atos integrantes do processo que definem as suas respectivas responsabilidades.

3 conclusão

Ante o exposto, sugere-se:

3.1 Seja procedida Audiência dos responsáveis abaixo descritos, nos termos do art. 29, § 1º, da Lei Complementar nº 202/00, para apresentação de justificativas, em observância ao princípio do contraditório e da ampla defesa:

3.1.1 Senhor Ilson da Silva, Gestor do Fundo de Melhoria da Polícia Civil à época dos fatos auditados, CPF nº. 145044999-91, com endereço na rua Álvaro de Carvalho, 220, Ed. Leatrice, 6º. andar, Centro, no município de Florianópolis, SC, CEP 88010-040, em razão da irregularidades a saber:

3.1.1.1 aquisição de bens sem a comprovação e justificativa da necessidade e o interesse público, o que incorre em desvio de finalidade e afronta ao princípio da eficiência, conforme dispõe o caput do artigo 37 da Constituição Federal, conforme item 2.1 do relatório;

3.1.1.2 Assunção, pelo Fundo de Melhoria da Polícia Civil de Santa Catarina, de despesas, aquisição de medalhas de mérito, atribuídas legalmente a outra Unidade Orçamentária, o Fundo para Melhoria da Segurança Pública de Santa Catarina, conforme o artigo 70, da Lei Estadual e Complementar nº. 98/93, o que também afronta o princípio da moralidade e da impessoalidade, bem como o da finalidade, inscritos todos no caput do artigo 37 da Constituição Federal, conforme item 2.1.2 do presente relatório, conforme item 2.2 do relatório;

3.1.2 Senhores EDUARDO SIMON, Diretor de Gestão Administrativa da Secretaria de Estado da Segurança Pública à época dos fatos auditados, inscrito no CPF sob o nº. 344615159-15, com endereço na rua Lauro Muller, nº. 448, ap. 42, Centro, em Criciúma, SC, CEP 88801-430, e JORGE APÓSTOLO DIAMANTARAS, inscrito no CPF sob o nº. 516359339 - 00, Gerente de Apoio Operacional da Secretaria de Estado da Segurança Pública à época dos fatos auditados, COM ENDEREÇO NA RUA fREI cANECA, Nº. 44, AP. 701, aGRONÔMICA, Florianópolis, sc, CEP, 88025-700, em razão da irregularidades a saber:

3.1.2.1 aquisição parcelada de medalhas de mérito policial previstas pelo artigo 21 da Lei Complementar e Estadual nº. 98/93, o que caracteriza a incidência de desacato ao artigo 3º e à parte final do artigo 24 da Lei Federal nº 8.666/93, e ao artigo 37, inciso XXI, da Constituição Federal, conforme item 2.1 do relatório.

3.1.2.2 aquisição de bens sem a comprovação e a justificativa da necessidade e o interesse público, o que incorre em desvio de finalidade e afronta ao princípio da eficiência, conforme dispõe o caput do artigo 37 da Constituição Federal, conforme item 2.1 do relatório.

3.2 Dar ciência do presente relatório à Secretaria de Estado da Segurança Pública e Defesa do Cidadão .

É o relatório.

DCE/ Insp.2/Div.5, em 20 de maio de 2008.

Patrycia Byanca Furtado

    Auditor Fiscal de Controle Externo

Odilon Inácio Teixeira

Auditor Fiscal de Controle Externo

Coordenador de Controle


1 Conforme o Ofício nº. TCE/DCE/AUD. 6096/2006, de 04/06/2006, fs. 11.

2 Lei que Dispõe sobre a promoção de Policiais Civis do Estado.

3 SANTA CATARINA.Assembléia Legislativa do Estado de Santa Catarina.Disponível em: <http://www.alesc.sc.gov.br/proclegis/tramitacao.php>Acesso em 13 de novembro de 2007.

4 SANTA CATARINA..Assembléia Legislativa do Estado de Santa Catarina.Disponível em: <http://www.alesc.sc.gov.br/proclegis/tramitacao.php>Acesso em 13 de novembro de 2007.

5 SANTA CATARINA. Tribunal de Contas. Consulta. Processo nº CON-TC CON-04/00311879. Relator:Luiz Roberto Herbst. Florianópolis, 12 de maio de 2004.Disponível em www.tce.sc.gov.br. Acesso em 07 de outubro de 2007.

6 Regulamenta o Fundo de Segurança Pública - FSP - transformado pela Lei º. 8.451, de 11 de dezembro de 1991.

7 Nomenclatura de cargos atribuída pela Lei Estadual e Complementar nº. 284/2005, de 28/02/2005, vigente à época.