ESTADO DE SANTA CATARINA
    TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO
    CONSULTORIA GERAL

Processo n°: CON - 08/00317734
Origem: Prefeitura Municipal de Faxinal dos Guedes
Interessado: Edson Vizolli
Assunto: Consulta
Parecer n° COG - 300/08

Senhor Consultor,

RELATÓRIO

O Prefeito Municipal de Faxinal dos Guedes, Sr. Edson Vizolli, protocolizou Consulta nesta Corte de Contas em 09/05/2008.

Consta em fs. 03, a seguinte consulta:

1- Os servidores públicos municipais que se aposentaram pelo RGPS podem continuar ocupando cargo público, com a percepção simultânea de proventos, pagos pelo INSS e de vencimentos, pagos pelo Município, sem que venham a prestar novo concurso público?

2- Em que situação é possível exigir que os servidores aposentados pelo RGPS e que não pretendam se desligar do quadro pessoal efetivo, optem pela percepção dos proventos ou pela percepção dos vencimentos?

3- Os servidores aposentados pelo RGPS, antes da edição da EC 20/98, que somaram tempo de serviço prestado à iniciativa privada e ao serviço público (regime celetista transformado em 2006 para estatutário), mediante concurso público, depois da entrada em vigor da EC 20/98, em empregos não acumuláveis na forma da CF (art. 37, XVI), podem continuar acumulando os proventos e os vencimentos, com base no atual ordenamento jurídico? Se não podem, o que deve ser feito nestas situações?

4- A declaração de invalidade de admissão não escorada em concurso público, assim considerado aquele vínculo iniciado após a aposentadoria do servidor, não exonerado, pode ser decretada de ofício pela Administração Pública?

Esta Consultoria, após analisar as preliminares de admissibilidade, passa a expor suas razões de mérito acerca dos questionamentos ora apresentados pelo Prefeito Municipal de Faxinal dos Guedes.

É o relatório.

II. PRELIMINARES DE ADMISSIBILIDADE

De início, mister delinear que o Consulente, na condição de Prefeito Municipal de Faxinal dos Guedes, possui plena legitimidade para encaminhar Consulta a este Tribunal consoante o que dispõe o art. 103, II, do Regimento Interno desta Corte (Resolução TC-06/2001).

Analisando a pertinência da matéria envolta nos questionamentos da Consulta, quais sejam, dúvidas de natureza interpretativa do direito em tese, essa merece prosperar in totum haja vista que encontram guarida no inciso XII do art. 59 da Constituição do Estado de Santa Catarina, bem como no inciso XV do art. 1º da Lei Complementar nº 202/2000.

É importante registrar que como o processo de Consulta não envolve julgamento ou exame de legalidade para fins de registro por este Tribunal de Contas, a resposta ora oferecida não constitui prejulgamento do fato ou caso concreto, mas apenas a análise da tese apresentada pelo Consulente.1

Observa-se ainda que a consulta não veio instruída com parecer da assessoria jurídica da entidade consulente, conforme preceitua o art. 104, V, da Resolução TC-06/2001 (Regimento Interno do TCE/SC). Contudo, o Tribunal Pleno poderá conhecer da consulta que não atenda a esta formalidade, conforme autoriza o parágrafo 2º do artigo 105 do referido Regimento, cabendo essa ponderação ser efetuada pelo Relator e pelos demais julgadores.

Destarte, sugerimos o conhecimento da peça indagatória pelo ínclito Plenário e o encaminhamento da resposta ao Consulente.

III. MÉRITO DA CONSULTA

Os questionamentos apresentados pelo Consulente consistem basicamente em saber em quais hipóteses há a possibilidade da percepção simultânea de proventos e de vencimentos.

Este assunto já foi enfrentado por esta Corte de Contas, contudo, passa-se a analisar a cada uma das questões.

O primeiro questionamento versa o seguinte:

1- Os servidores públicos municipais que se aposentaram pelo RGPS podem continuar ocupando cargo público, com a percepção simultânea de proventos, pagos pelo INSS e de vencimentos, pagos pelo Município, sem que venham a prestar novo concurso público?

A resposta para esta questão encontra-se especificamente no item nº 4 do Prejulgado 1154, resultante do Parecer COG - 231/02, exarado no Processo CON - 01/00940323. Eis o teor:

[...]

4. A aposentadoria de servidor ocupante de cargo público vinculado ao Regime Geral da Previdência Social provoca os seguintes efeitos:

a) ocorre a vacância do cargo;

b) o servidor deixa de ocupar o cargo, passando a perceber proventos de aposentadoria (e não vencimentos de cargo);

c) fica vedada a continuidade do servidor no Serviço Público municipal, salvo em cargo em comissão ou em novo provimento decorrente de concurso, observadas as possibilidades de acumulação legal de cargos (art. 37, § 10, da CF);

d) se o cargo for de natureza efetivo, o provimento depende de prévia realização de concurso público;

e) se o cargo vago for integrante de cargos isolados, extingue-se com a vacância.

Sendo assim, os servidores públicos estatutários municipais, mesmo que vinculados ao RGPS, ao se aposentarem não podem permanecer no cargo público, haja vista que a aposentadoria é forma de vacância, admitindo-se a sua continuidade no serviço público quando do provimento em cargo em comissão ou quando exerça cargo efetivo acumulável, decorrente de aprovação em concurso público.

No que tange ao segundo questionamento,

2- Em que situação é possível exigir que os servidores aposentados pelo RGPS e que não pretendam se desligar do quadro pessoal efetivo, optem pela percepção dos proventos ou pela percepção dos vencimentos?

Este assunto também já foi objeto de consulta, sendo analisado por meio do Parecer COG - 584/07, exarado no Processo CON - 07/00408002, cuja decisão resultou o Prejulgado 1921, in verbis:

1. O servidor estatutário que se aposenta voluntária ou compulsoriamente pelo Regime Geral da Previdência Social deve ser desligado do serviço público, pois a aposentadoria é uma situação que gera a vacância do cargo, independentemente do regime previdenciário em que se encontra o servidor.

2. O servidor estatutário aposentado voluntariamente, mediante concurso (art. 37, inciso II), pode voltar a exercer cargo, emprego ou função remunerada acumuláveis, na forma do art. 37, incisos XVI e XVII, da Constituição Federal, ou, não sendo acumuláveis, optar entre vencimentos ou proventos, resguardados os direitos adquiridos reconhecidos pelo art. 11 da Emenda Constitucional n. 20/98.

3. O servidor estatutário aposentado voluntariamente poderá também exercer cargos eletivos e cargos em comissão.

4. Com relação ao servidor estatutário aposentado compulsoriamente, consoante dispõe o art. 40, § 1º, inciso II, da Constituição Federal, ele não poderá retornar ao exercício de cargo efetivo, mas poderá exercer cargos eletivos e cargos em comissão.

Processo: CON-07/00408002

Parecer: COG-584/07

Decisão: 3745/2007

Origem: Prefeitura Municipal de Irineópolis

Relator: Auditor Gerson dos Santos Sicca

Data da Sessão: 14/11/2007.

Conforme já visto, o servidor público estatutário aposentado deve ser desligado do cargo público, admitindo-se que o servidor aposentado possa continuar no serviço público no caso de provimento em cargo em comissão ou quando exerça outro cargo efetivo acumulável, decorrente de aprovação em concurso público.

Para melhor elucidar o questionamento, transcreve parte do Parecer COG - 584/07 (Processo CON - 07/00408002) que fundamenta o Prejulgado 1921, versando o que segue:

É importante ressaltar que o fato de os servidores do Município serem aposentados pelo RGPS e não pelo regime próprio de previdência, não legitima a percepção simultânea de proventos com vencimentos em cargos, empregos e funções não acumuláveis, pois o legislador constitucional, no citado § 10 do art. 37, ao vedar a percepção simultânea de vencimentos com proventos decorrentes do art. 40 da Carta, partiu do pressuposto que todas as aposentadorias advindas de cargos públicos estariam abrangidas pelo regime próprio de previdência, pois o mencionado art. 40 assegurou aos servidores titulares de cargos efetivos da União, Estados, Municípios e Distrito Federal o famigerado regime de previdência próprio.

De fato alguns Municípios, ao não assegurarem regime de previdência aos seus servidores titulares de cargos efetivos, vêm descumprindo este mandamento constitucional, que possui inclusive status de cláusula pétrea, ex vi o que dispõe o art. 60, § 4º do Texto Constitucional.

Por conseguinte, levando-se em consideração que o legislador constituinte não pode partir da premissa que a Constituição Federal está sendo violada, não foi feita referência no § 10 do art. 37 às aposentadorias decorrentes do RGPS, simplesmente porque servidores detentores de cargos públicos vinculados ao RGPS é uma figura não prevista na Carta.

Portanto, uma figura fática que caracteriza uma afronta ao art. 40 da CF, não pode ensejar burla ao que quis evitar o legislador constitucional no § 10 do art. 37: a percepção simultânea de proventos de aposentadoria de titulares de cargos efetivos (é o que diz o art. 40 mencionado no 37, §10) com a remuneração de cargo, emprego ou função pública.

Portanto, o direito de opção ocorrerá quando o servidor aposentado ingressar novamente no serviço público, mediante concurso público, em cargo não acumulável.

No terceiro questionamento tem-se que:

3- Os servidores aposentados pelo RGPS, antes da edição da EC 20/98, que somaram tempo de serviço prestado à iniciativa privada e ao serviço público (regime celetista transformado em 2006 para estatutário), mediante concurso público, depois da entrada em vigor da EC 20/98, em empregos não acumuláveis na forma da CF (art. 37, XVI), podem continuar acumulando os proventos e os vencimentos, com base no atual ordenamento jurídico? Se não podem, o que deve ser feito nestas situações?

Segundo o entendimento do STF, não há direito adquirido a regime previdenciário (Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3104/DF). Com isso, os servidores públicos municipais aposentados ao retornarem a exercício de cargo público devem obedecer, no que tange à acumulação de cargos, empregos ou funções, ao que estabelece a EC nº 20/98.

A EC nº 20, em seu art. 11, faz uma distinção aos servidores públicos aposentados que ingressaram novamente no serviço público, mediante concurso público, antes da sua publicação. Não lhes são aplicáveis a vedação do § 10 do art. 37 da CF, ou seja, neste caso é permitida a percepção simultânea de proventos com vencimentos. Ressalta-se que estes servidores não poderão acumular dois proventos, o próprio STF já decidiu sobre o assunto (RE 463028/RS). Já aqueles que ingressaram depois da sua publicação, devem obedecer a vedação disposta no § 10 do art. 37 da CF.

O quarto questionamento aborda o seguinte:

4- A declaração de invalidade de admissão não escorada em concurso público, assim considerado aquele vínculo iniciado após a aposentadoria do servidor, não exonerado, pode ser decretada de ofício pela Administração Pública?

Com relação a esta questão, a resposta encontra-se no item nº 5 do já referido Prejulgado 1154, a saber:

[...]

5. Ao titular do Poder cabe promover o desligamento de pessoal irregular, mediante ato motivado, recomendando-se a realização de processo administrativo, proporcionando aos atingidos a oportunidade do exercício do contraditório, em cumprimento à garantia constitucional da ampla defesa (art. 5º, LV, CF/88), como forma de precaução contra eventual argüição de nulidade de atos por cerceamento de defesa.

Diante do exposto, nos termos do § 3º do art. 105 do Regimento Interno desta Corte de Contas, sugere-se ao Consulente a remessa dos Prejulgados 1154 (originário Processo CON - 01/00940323) e 1921 (originário Processo CON - 07/00408002).

IV. CONCLUSÃO


1 MILESKI, Hélio Saul. O Controle da Gestão Pública. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 362