ESTADO DE SANTA CATARINA
    TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO
    CONSULTORIA GERAL

Processo n°: REC - 05/00881065
Origem: Assembléia Legislativa do Estado de Santa Catarina
RESPONSÁVEL: Juarez Soares
Assunto: (Recurso de Reconsideração - art. 77 da LC 202/2000) -TCE-04/01820530
Parecer n° COG-462/08

Recurso de reconsideração. Intempestividade. Superação da deficiência. Ofensa ao contraditório e à ampla defesa. Nulidade. Conhecer e dar provimento.

1. O recurso de reconsideração é intempestivo quando protocolizado após transcorridos trinta dias da publicação da decisão no Diário Oficial do Estado, conforme o art. 77 da Lei Complementar nº 202/00.

2. Quando a matéria argüida é estranha às hipóteses de admissibilidade de recurso extemporâneo previstas no art. 135, § 1º, do Regimento Interno (correção de inexatidões materiais, retificação de erros de cálculo e superveniência de fatos novos), não é possível superar a intempestividade.

3. Porém, quando o recorrente levanta, com razão, ofensa ao contraditório e à ampla defesa, excepcionalmente o recurso intempestivo pode ser conhecido, a fim de conferir legalidade aos procedimentos fiscalizatórios instaurados pelo Tribunal e também assegurar ao jurisidicionado aquelas garantias.

4. A citação por edital somente tem cabimento após o esgotamento dos meios processuais disponíveis para localização do responsável.

5. É necessária a nomeação de curador especial para o responsável citado por edital, cabendo àquele diligenciar como substituto processual.

Senhor Consultor,

RELATÓRIO

Tratam os autos de recurso de reconsideração interposto por Juarez Soares, ex-Presidente da Associação de Moradores das Ruas Antônio Apolônio Vargas e Coronel Conceição, de Tijucas, nos termos do art. 77 da Lei Complementar nº 202/00, em face do acórdão nº 2088/2004 proferido nos autos da tomada de contas especial nº 04/01820530, que, na forma do art. 18, III, "a", c/c art. 21, caput, daquela lei, julgou irregulares, com imputação de débito, as contas de recursos antecipados repassados pela Assembléia Legislativa do Estado de Santa Catarina (ALESC), condenando-o ao pagamento de R$ 1.600,00 referente à nota de empenho nº 3623/000, de 09/07/2001, por não ter apresentado a prestação de contas dos valores recebidos, em afronta aos artigos 8º da Lei Estadual nº 5.867/81 e 43 da Resolução nº TC-16/94.

O processo originário consiste na tomada de contas especial instaurada pela ALESC (fl. 16) em cumprimento à Decisão nº 3009/2002 deste Tribunal (fl. 03), devido à ausência de prestação de recursos antecipados referente a 149 notas de empenho do exercício de 2001, dentre as quais a de nº 3623/000, repassada à Associação de Moradores das Ruas Antônio Apolônio Vargas e Coronel Conceição.

Finalizada a apuração, a ALESC remeteu o processo a esta Corte.

A Diretoria de Controle da Administração Estadual (DCE), manifestando-se sobre os documentos, sugeriu a citação da responsável (relatório de instrução DCE/INSP.1 - nº 164/2004 às fls. 36-38), que foi determinada à fl. 38.

Não foi possível citar o responsável mediante ofício com aviso de recebimento (fl. 40), razão pela qual se procedeu à citação por edital (fls. 43-44), conforme autoriza o art. 57, IV do Regimento Interno.

Os autos retornaram à DCE, que, no relatório de reinstrução DCE/INSP.1 n º 361/2004, recomendou julgar as contas irregulares, com imputação de débito; declarar o impedimento para receber novos recursos do erário até que fosse regularizada a situação; e aplicar multa pelo não cumprimento do prazo para apresentar a prestação de contas (fls. 46-49).

O Ministério Público junto a esta Corte pronunciou-se no sentido de acolher o entendimento consignado pelo órgão técnico (parecer MPTC nº 2.653/04, às fls. 52-53).

A Relatora, ao proferir seu voto, adotou o mesmo posicionamento (fls. 54-57), e o Tribunal Pleno, na sessão ordinária de 17/11/2004, exarou o Acórdão nº 2088/2004, nos termos que seguem (fls. 58-59):

ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro nos arts. 59 da Constituição Estadual e 1° da Lei Complementar n. 202/2000, em:

6.1. Julgar irregulares, com imputação de débito, com fundamento no art. 18, III, alínea "a", c/c o art. 21, caput, da Lei Complementar n. 202/2000, as contas de recursos antecipados repassados pela Assembléia Legislativa do Estado de Santa Catarina à Associação de Moradores das Ruas Antônio Apolônio Vargas e Coronel Conceição, de Tijucas, no valor de R$ 1.600,00 (um mil seiscentos reais), referentes à Nota de Empenho n. 3623/000, de 09/07/2001, em face da não-apresentação da prestação de contas dos valores recebidos, em afronta ao disposto nos arts. 8º da Lei Estadual n. 5.867/81 e 43 da Resolução n. TC-16/94, e condenar o Responsável – Sr. Juarez Soares - ex-Presidente daquela Associação, CPF n. 027.010.349-06, ao pagamento da citada quantia, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial do Estado, para comprovar perante este Tribunal, o recolhimento do valor do débito aos cofres do Estado, atualizado monetariamente e acrescido de juros legais, calculados a partir da data da ocorrência do fato gerador do débito (arts. 40 e 44 da Lei Complementar n. 202/2000, ou interpor recurso na forma da lei, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial (art. 43, II, do mesmo diploma legal).

6.2. Aplicar ao Sr. Juarez Soares - ex-Presidente da Associação de Moradores das Ruas Antônio Apolônio Vargas e Coronel Conceição, de Tijucas, com fundamento nos arts. 70, II, da Lei Complementar n. 202/00 e 109, II, c/c o 307, V, do Regimento Interno instituído pela Resolução n. TC-06/2001, a multa no valor de R$ 200,00 (duzentos reais), com base nos limites previstos no art. 239, III, do Regimento Interno (Resolução n. TC-11/1991) vigente à época da ocorrência da irregularidade, em face do descumprimento de norma estatuída no art. 8º da Lei n. 5.867/81 (prazo legal para apresentação da prestação de contas), fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial do Estado, para comprovar ao Tribunal o recolhimento ao Tesouro do Estado da multa cominada, ou interpor recurso na forma da lei, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts. 43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000.

6.3. Declarar a Associação de Moradores das Ruas Antônio Apolônio Vargas, e Coronel Conceição, de Tijucas, e o Sr. Juarez Soares impedidos de receberem novos recursos do Erário até a regularização do presente processo, consoante dispõe o art. 5°, alínea "c", da Lei Estadual n. 5.867/81.

6.4. Dar ciência deste Acórdão, do Relatório e Voto do Relator que o fundamentam, bem como do Relatório de Reinstrução DCE/Insp.1/Div.3 n. 361/2004, à Associação de Moradores das Ruas Antônio Apolônio Vargas e Coronel Conceição, de Tijucas, ao Sr. Juarez Soares - ex-Presidente daquela entidade, e à Assembléia Legislativa do Estado de Santa Catarina.

A decisão foi publicada no Diário Oficial do Estado nº 17.583, de 22/02/2005.

Inconformado, Juarez Soares interpôs recurso. Também remeteu documentos relativos à prestação de contas.

Diante disso, esta Consultoria sugeriu encaminhar os autos à DCE (Informação COG-96/2006, às fls. 08-09 do recurso), que se manifestou às fls. 10-13 pela manutenção da irregularidade (relatório de instrução DCE/INSP.1 - nº 476/2006).

É o relatório.

PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE

Inicialmente, vale destacar que as razões apresentadas não apontam qual a modalidade recursal elegida, e, considerando a omissão do recorrente neste ponto, considerar-se-á que a insurgência corresponde, então, a recurso de reconsideração, que é o instrumento cabível de decisão proferida em processo de tomada de contas especial (art. 77 da Lei Complementar nº 202/00), como é o caso dos autos.

São pressupostos de admissibilidade deste: a legitimidade, a singularidade e a tempestividade.

No que se refere à legitimidade, verifica-se que o recorrente a possui, já que tem interesse recursal em razão do débito e da multa imputados em seu desfavor. Enquadrou-se, ademais, na definição de responsável prevista no art. 133, § 1º, "a", do Regimento Interno.

A singularidade também foi observada, pois interposto o recurso uma única vez.

Porém, não foi atendido o requisito da tempestividade. O acórdão recorrido foi publicado no Diário Oficial do Estado nº 17.583, de 22/02/2005; o prazo de trinta dias para a interposição do recurso começou, portanto, em 23/02/2005, e expirou em 28/03/2005. A insurgência foi protocolizada somente dia 11/04/2005, razão pela qual é intempestivo o inconformismo.

Nos termos do art. 135, § 1º, do Regimento Interno deste Tribunal de Contas, é possível superar essa deficiência quando o recurso busca corrigir inexatidões materiais ou retificar erros de cálculo, indicar erro na identificação do responsável, ou apontar a ocorrência algum acontecimento superveniente ao acórdão.

Compulsando as razões recursais, verifica-se que nenhuma dessas hipóteses foi suscitada. A par disso, o recorrente alegou que não lhe foi oportunizado o contraditório e a ampla defesa, tendo em vista a realização de citação por edital, apesar de não ter mudado de endereço (fl. 02). Nessa situação, mesmo que não se encaixe nas hipóteses do art. 135, entende-se que o recurso excepcionalmente possa ser conhecido, considerando que a insurgência levanta, com razão, ofensa às garantias constitucionais invocadas.

De fato, depois de remetido o ofício para citação do responsável, a correspondência retornou com o aviso de recebimento constando a indicação de "endereço insuficiente". Logo em seguida, sem qualquer diligência para obter a complementação do endereço, ou mesmo um alternativo, procedeu-se à citação por edital. Foi dado seguimento ao processo ainda que sem a manifestação do responsável, culminando no acórdão nº 2088/2004, que lhe imputou débito e multa. Diversamente do que ocorreu na fase instrutória, a correspondência contendo a notificação da decisão foi entregue no mesmo endereço com sucesso (fl. 76) após diversas tentativas.

Analisando esse contexto, há que se admitir que houve, sim, ofensa ao contraditório e à ampla defesa.

Primeiro, porque conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça, "a citação por edital somente tem cabimento após o esgotamento dos meios processuais disponíveis para localização do devedor"1. Como se viu, não foi o que se verificou, in casu.

Segundo, porque não foi nomeado curador especial para o responsável nos termos do art. 9º, II, do Código de Processo Civil, a quem caberia diligenciar como substituto processual, de modo a assegurar a legalidade do procedimento. Cabe ressaltar que diante de omissão na Lei Orgânica e no Regimento Interno deste Tribunal de Contas para resolver o procedimento da citação ficta, invoca-se a parte inicial do art. 308 do Regimento Interno: "Os casos omissos serão resolvidos mediante aplicação subsidiária da legislação processual ou, quando for o caso, por deliberação do Tribunal Pleno".

Pelo exposto, opina-se pelo provimento do recurso, anulando-se os atos processuais praticados a partir da citação por edital, inclusive o acórdão recorrido.

Considerando que o recorrente já teve ciência da imputação que lhe foi feita no processo originário, sugere-se que seja prontamente notificado para apresentar as suas alegações de defesa, a fim de que seja dada regular continuidade ao procedimento.

CONCLUSÃO

Ante o exposto, o parecer é no sentido de:

A) Conhecer do presente recurso de reconsideração interposto contra o acórdão nº 2088/2004 proferido na sessão ordinária de 17/11/2004, nos autos da tomada de contas especial nº 04/01820530, e, no mérito, dar-lhe provimento, a fim de anular os atos processuais praticados a partir da citação por edital, inclusive o acórdão recorrido;

B) Dar ciência deste parecer, bem como do voto do Relator e do acórdão, à Assembléia Legislativa do Estado de Santa Catarina e ao responsável Juarez Soares, Presidente da Associação de Moradores das Ruas Antônio Apolônio Vargas e Coronel Conceição, de Tijucas, em 2001.

  MARCELO BROGNOLI DA COSTA

Consultor Geral