ESTADO DE SANTA CATARINA
    TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO
    CONSULTORIA GERAL

Processo n°: CON - 08/00467620
Origem: Câmara Municipal de Joinville
Interessado: Fabio Alexandre Dalonso
Assunto: Consulta
Parecer n° COG-601/08

Exoneração. Servidora detentora de cargo comissionado. Estado de gravidez. Estabilidade provisória. Indenização.

O estado de gravidez de servidora detentora de cargo em comissão não configura impedimento à sua exoneração, a qualquer tempo, pela autoridade que a nomeou, pois é justamente esta faculdade que caracteriza a precariedade de tal tipo de provimento.

Na oficialização do ato de dispensa, a servidora deverá receber indenização substitutiva correspondente à remuneração desde a exoneração até cinco meses após o parto.

Senhor Consultor,

RELATÓRIO

O Presidente da Câmara de Vereadores de Joinville, Sr. Fábio Alexandre Dalonso, através do ofício nº 1750/08, formula consulta a este Tribunal de Contas sobre indenização à servidora gestante, que ocupa cargo comissionado e sofre exoneração.

Este, o brevíssimo relatório.

PRELIMINARES

O consulente, na condição de Presidente do Legislativo do Município de Joinville, possui plena legitimidade para encaminhar Consulta a este Tribunal consoante o que dispõe o art. 103, II, do Regimento Interno desta Corte (Resolução TC-06/2001).

Analisando a pertinência da matéria envolta no questionamento suscitado, qual seja, dúvida de natureza interpretativa do direito em tese, essa merece um pronunciamento do Pretório Excelso desta Casa, haja vista encontrar guarida no inciso XII do art. 59 da Constituição do Estado de Santa Catarina, bem como no inciso XV do art. 1º da Lei Complementar nº 202/2000.

É importante registrar que como o processo de Consulta não envolve julgamento ou exame de legalidade para fins de registro por este Tribunal de Contas, a resposta ora oferecida não constitui prejulgamento do fato ou caso concreto, mas apenas o prejulgamento da tese apresentada pela Consulente.1

Ressalte-se, por oportuno, que a inicial não veio instruída com parecer da assessoria jurídica da Câmara em foco, conforme preceitua o art. 104, V, da Resolução nº TC-06/2001 (Regimento Interno do TCE/SC), contudo, neste aspecto, o Tribunal Pleno poderá conhecer de consulta que não atenda a esta formalidade, conforme autoriza o parágrafo 2º do artigo 105, Regimental, ficando esse juízo ao discernimento do Relator e demais julgadores.

Nesta linha de raciocínio, sugerimos ao Exmo. Sr. Conselheiro Relator que dê conhecimento ao presente feito.

MÉRITO

O cerne do presente processo reside em verificar se é possível a Câmara Municipal realizar o pagamento da indenização da estabilidade provisória à servidora gestante, ocupante de cargo em comissão, antes ou após a sua exoneração.

Segundo a Constituição Federal:

"Art. 37 - [...]

II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração;" (grifou-se).

Os ocupantes de cargos de provimento em comissão são demissíveis a qualquer tempo pela autoridade que os nomeou. Vejamos, pois, a doutrina:

"Os cargos de provimento em comissão (cujo provimento dispensa concurso público) são aqueles vocacionados para serem ocupados em caráter transitório por pessoa de confiança da autoridade competente para preenchê-los, a qual também pode exonerar ad nutum, isto é, livremente, quem os esteja titularizando." (MELLO, Celso Antônio Bandeira de, Curso de Direito Administrativo. 14. Ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 269).

Nesta orientação, ainda, o estatuto dos servidores do município, Lei Complementar nº 266, de 05 de abril de 2008:

"Art. 7º - A investidura em cargo público de provimento efetivo dependerá de prévia aprovação em concurso público, enquanto os cargos de provimento em comissão serão de livre nomeação e exoneração." (grifou-se).

Assim, o regime previdenciário adotado aos ocupantes exclusivamente de cargo em comissão é o Regime geral da Previdência Social - RGPS, conseqüentemente, a servidora é segurada do INSS e, em razão da incapacidade temporária para o trabalho, deverá receber da autarquia federal o benefício chamado "salário-maternidade".

Convém examinar o teor da Lei Federal nº 8.213, de 24 de julho de 1991, que dispõe sobre os planos de benefícios do RGPS:

"Art. 71. O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade". (Redação dada pela Lei Federal nº 10.710 de 05/08/2003).

A redação do artigo supra sugere que a servidora afastada por motivo de gestação está acobertada por estabilidade provisória, o que é confirmado pelo Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, verbis:

"Art. 10 - [...]

II - fica vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa:

[...]

b) da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto."

Para o caso vertente, citamos a interpretação dada por nossos Tribunais superiores:

"EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. LICENÇA-GESTANTE. EXONERAÇÃO. C.F., art. 7º, XVIII; ADCT, art. 10, II, b.
I. - Servidora pública exonerada quando no gozo de licença-gestante: a exoneração constitui ato arbitrário, porque contrário à norma constitucional: C.F., art. 7º, XVIII; ADCT, art. 10, II, b.
II. - Remuneração devida no prazo da licença-gestante, vale dizer, até cinco meses após o parto. Inaplicabilidade, no caso, das Súmulas 269 e 271-STF.
III. - Recurso provido." (SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. RMS N. 24.263-DF. REL. MIN. CARLOS VELLOSO. 09/05/2003).

"ADMINISTRATIVO. SERVIDORA FEDERAL DEMITIDA ENQUANTO EM GOZO DE LICENÇA-MATERNIDADE. INDENIZAÇÃO. DESCABIMENTO. MANDADO DE SEGURANÇA.

[...]

Conquanto ilegal a demissão de servidora pública gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto (ADCT, art. 37, II, 'b'), não há como atribuir, ao Mandado de Segurança, efeitos patrimoniais pretéritos, nem considerá-lo sucedâneo de ação de cobrança (Súmulas 269 e 271/STF).

[...]". (SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. MS 7.393/DF. REL. MIN. EDSON VIDIGAL. 12/12/2001).

"ADMINISTRATIVO. SERVIDORA PÚBLICA. CARGO EM COMISSÃO. LIVRE NOMEAÇÃO E EXONERAÇÃO. GESTANTE. DIREITO À INDENIZAÇÃO SUBSTITUTIVA. RECURSO ORDINÁRIO PROVIDO.

1 Servidora pública temporária, ocupante de cargo de livre nomeação, exonerada durante a gestação, em contrariedade ao inciso XVIII do art. 7º da CF e alínea b do inciso II do art. 10 do ADCT.

2. É devida a indenização substitutiva correspondente à remuneração desde a dispensa da servidora até cinco meses após o parto.

3. Deve ser afastada a incidência das Súmulas 269 e 271 do STF, quando o Mandado de Segurança é impetrado, na origem, antes da emergência do direito à indenização, que consistia em pedido subsidiário da recorrente, para permanecer no cargo. PRECEDENTE DO STF: RMS 24.263/DF, Rel. Min. CARLOS VELLOSO

[...]". (RMS N. 25.274 - MG - 2007/0230997-2. REL. MINISTRO NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO. 29/11/2007).

Conforme verificado, percebe-se que tais julgados indicam que a exoneração da servidora no momento da gestação é irregular. Por seu turno, a interpretação majoritária das altas Cortes, sinaliza na possibilidade da servidora poder ser exonerada, contudo, terá direito à indenização, senão vejamos:

"LICENÇA-MATERNIDADE. SERVIDORA. DISPENSA. FUNÇÃO COMISSIONADA.

1. A estabilidade provisória (período de garantia no emprego) contida no art. 10, II, b, do ADCT busca salvaguardar a trabalhadora gestante do exercício de um direito do empregador, o de rescindir unilateralmente, de forma imotivada, o vínculo trabalhista. O STF tem aplicado essa garantia constitucional, própria das celetistas, às militares e servidoras públicas civis. Assim, no caso, mesmo diante do caráter precário da função comissionada exercida, vê-se, sem sombra de dúvida, que a servidora pública estadual ocupante de cargo efetivo, ora recorrente, foi dispensada daquela função justamente porque se encontrava no gozo de licença-maternidade, dispensa que se deu com ofensa do princípio constitucional de proteção à maternidade (arts. 6º e 7º, XVIII, da CF/1988 c/c o referido artigo do ADCT). Dessa forma, diante de que não há direito da recorrente de permanecer no exercício da função comissionada, resta-lhe, porém, assegurada a percepção de indenização correspondente ao que receberia acaso não dispensada, valor devido até cinco meses após o parto. Precedentes do STF: RMS 24.263-DF, DJ 9/5/2003; AI 547.104-RS, DJ 17/11/2005)". (RMS 22.361-RJ, Re. Min. Arnaldo Esteves Lima. 8/11/2007).

No mesmo sentido, os Recursos em Mandado de Segurança nº 25.138/MG; nº 3.313/SC e nº 22.361/RJ do STJ.

Em nosso Tribunal de Justiça também prepondera esta última corrente a qual nos filiamos, por isso o Prejulgado nº 437 continua em pleno vigor.

No que se refere ao momento do pagamento da indenização, a Corte judiciária catarinense, quando da apreciação do Processo AC 2005.031329-4, de São José, relatado pelo Desembargador Luiz Cesar Medeiros assim decidiu:

"ADMINISTRATIVO. GRAVIDEZ. ESTABILIDADE. PREVISÃO CONSTITUCIONAL. CARGO COMISSIONADO.

Caracterizada a subsunção da categoria das servidoras comissionadas à prerrogativa inserta na Constituição Federal (art. 7º, inc. XVIII) pela norma de extensão correlata preconizada no art. 39, § 2º do mesmo Diploma, depreende-se que o caráter da demissibilidade ad nutum ínsita a essa forma de provimento de cargo público encontra-se obstaculizado até que o prazo normativo retro (cinco meses após o nascimento) esteja superado. Enquanto perdurar o lapso temporal, encontra-se a servidora acobertada pela estabilidade provisória. Ocorrida a dispensa, incumbe ao Poder Público indenizar o período que estaria acobertado pela garantia constitucional." (grifamos).

Isto posto, considerando que a exoneração da servidora exaure o liame entre ela e a administração, o pagamento das verbas rescisórias deverá ocorrer no momento da oficialização do ato de dispensa.

CONCLUSÃO

Em consonância com o acima exposto e considerando:

1. Que o consulente está legitimado à subscrição de consultas para este Tribunal de Contas, nos termos do inciso II, do artigo 103 do Regimento Interno do TCE/SC;

2. Que a consulta trata de matéria de competência do Tribunal de Contas, conforme determina o inciso XII do art. 59 da Constituição do Estado de Santa Catarina, bem como o inciso XV do art. 1º da Lei Complementar Estadual nº 202/2000;

3. Que apesar de não vir instruída com parecer da assessoria jurídica da Câmara consulente, conforme preceitua o art. 104, inciso V, da Resolução nº TC-06/2001 (Regimento Interno do TCE/SC), o Tribunal Pleno poderá conhecer de consulta que não atenda a esta formalidade, nos termos do § 2º do artigo 105 do referido instrumento regimental, cabendo esta ponderação ao relator e demais julgadores.

Sugere-se ao Exmo. Sr. Conselheiro Relator Salomão Ribas Junior que submeta voto ao e. Pretório sobre consulta formulada pelo Sr. Fábio Alexandre Dalonso, Presidente do Legislativo Municipal de Joinville, nos termos deste opinativo que, em síntese, propõe:

1. Conhecer da consulta por preencher os requisitos de admissibilidade previstos regimentalmente.

2. Responder à consulta nos seguintes termos:

2.1. O estado de gravidez de servidora detentora de cargo em comissão não configura impedimento à sua exoneração, a qualquer tempo, pela autoridade que a nomeou, pois é justamente esta faculdade que caracteriza a precariedade de tal tipo de provimento.

2.1.1. Na oficialização do ato de dispensa, a servidora deverá receber indenização substitutiva correspondente à remuneração desde a exoneração até cinco meses após o parto.

3. Dar ciência desta decisão, do relatório e voto do Relator que a fundamenta, bem como deste parecer ao presidente da Câmara de Vereadores de Joinville, Sr. Fábio Alexandre Dalonso.

  MARCELO BROGNOLI DA COSTA

Consultor Geral


1 Mileski, Hélio Saul. O Controle da Gestão Pública. São Paulo: Revista dos Tribunais.2003. P. 362.