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Processo n°: | REC - 08/00468511 |
Origem: | Prefeitura Municipal de Caçador |
RECORRENTE: | Conselheiro José Carlos Pacheco |
Assunto: | Referente processo -SPE-02/07713200 + REC-07/00175652 |
Parecer n° | COG-616/08 |
RECURSO DE REEXAME DE CONSELHEIRO. CONHECER. PROVER.
Empregado rural. Aposentadoria. Contagem de tempo.
Havendo prova da relação de emprego, é legítima a contagem de tempo de serviço prestado como empregado rural para aposentadoria no serviço público.
Senhor Consultor,
Trata-se de Recurso de Reexame de Conselheiro interposto pelo Exmo. Sr. José Carlos Pacheco, nos termos do art. 81 da Lei Complementar nº 202/2000 (LC 202/2000) c/c o art. 142 da Resolução TC nº 06/2001 (RI), contra a Decisão nº 0154/2007, proferida em 12/02/2007 nos autos do Processo nº SPE-02/07713200:
É o breve Relatório.
II. ADMISSIBILIDADE
Consoante o estabelecido no artigo 81 da LC 202/2000, é deferido ao Conselheiro do Tribunal de Contas o direito de interpor Recurso de Reexame, o que confere ao subscritor legitimidade para o manejo do presente recurso.
Quanto à tempestividade, verifica-se que o presente Recurso foi interposto dentro do prazo de dois anos previsto no artigo 81 da LC 202/2000, pois a Decisão recorrida foi publicada em 29/03/20071 e a peça recursal protocolada em 30/07/20082.
Presentes os requisitos de admissibilidade, passo ao mérito.
III. MÉRITO.
Empregado rural. Aposentadoria. Contagem de tempo.
Havendo prova da relação de emprego, é legítima a contagem de tempo de serviço prestado como empregado rural para aposentadoria no serviço público.
A decisão recorrida denegou o registro do ato de aposentadoria de Leonildo Gonçalves Thibes, considerando-o ilegal em face da averbação de tempo de serviço rural de 06 anos, 11 meses e 07 dias, sem que houvesse comprovação do efetivo recolhimento previdenciário.
Em nova sede recursal, é colacionada a tese segundo a qual os documentos constantes dos autos comprovam que o aposentando tem direito ao cômputo do tempo de serviço rural, pois, nesse período, trabalhou como empregado rural contratado por pessoa jurídica.
A tese ora suscitada foi apontada pela Diretoria de Controle dos Municípios - DMU.
Procedendo ao novo exame da causa, a DMU, em proficiente manifestação, apresentou a Informação nº 227/20083, que acolho como razões deste Parecer.
O entendimento esposado pela DMU está em consonância com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça - STJ que, ao analisar a reciprocidade da contagem do tempo de contribuição na atividade privada para aposentadoria no serviço público prevista no art. 94 da Lei nº 8.213/914, considerou o empregado rural como segurado obrigatório a partir do advento da Lei nº 4.214/63, impondo ao empregador o dever de recolhimento das contribuições previdenciárias de seus empregados.
Na mesma assentada, o STJ registrou que, havendo prova documental da relação de emprego, a ausência de recolhimento das contribuições "na época própria" não deve resultar em prejuízo do beneficiário5, já que o INSS dispõe dos instrumentos jurídicos necessários para a execução de seus créditos.
Na hipótese dos autos, o período referido pela DMU vem consignado em certidão emitida pelo próprio Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, fls. 04, e medeia entre 13/01/71 e 19/12/77. Ou seja, existe expresso reconhecimento da relação de emprego estabelecida entre o beneficiado e seu empregador.
Diante das provas e dos princípios de direito aplicáveis à espécie, devem ser providas as razões recursais para ordenar o registro do ato de aposentadoria de Leonildo Gonçalves Thibes, tornando sem efeito o itens 6.2 e 6.3 em face da perda de objeto.
Ante o exposto, sugere-se ao Exmo. Sr. Conselheiro Relator do processo que em seu Voto proponha ao Egrégio Plenário o que segue:
1. Conhecer do Recurso de Reexame de Conselheiro interposto contra a Decisão nº 154/2007 exarada na Sessão de 12/02/2007, nos autos do Processo nº SPE-02/07713200, e, no mérito, dar-lhe provimento para:
1.1 Conferir ao item 6.1 a seguinte redação:
1.2 Tornar sem efeito os itens 6.2 e 6.3.
2. Dar ciência deste Acórdão, do relatório e voto que o fundamentam, bem como deste Parecer COG, ao Sr. Saulo Sperotto, Prefeito Municipal de Caçador.
Trata os autos de processo de aposentadoria do ex-servidor Leonildo Gonçalves Thibes, cuja a decisão definitiva do Tribunal Pleno denegou o registro do ato de aposentadoria em virtude de ilegalidade constatada face ao cômputo de tempo rural de 06 anos, 11 meses e 07 dias.
Ocorre Sr. Relator que esta instrução técnica ao considerar o tempo rural constante na Certidão de Tempo de Serviço, emitida pelo Instituto de Seguridade Social, fls. 04 dos autos, deixou de observar que o tempo rural não se tratava de atividades ditas como "economia de regime familiar", mas sim de empregado cuja atividade era "serviço rural geral", tendo como pessoa jurídica a Prestadora Monte Carlo LTDA, o que significa dizer que o Sr. Leonildo Gonçalves Thibes não tinha a obrigação de comprovar os recolhimentos previdenciários, mas sim a pessoa jurídica, o que conseqüentemente lhe outorga o direito de ter seu tempo como trabalhador rural legal para fins de benefício previdenciário e o conseqüente registro pelo Tribunal de Contas.
De plano, cabe registrar alguns conceitos básicos acerca da expressão economia familiar que comumente engloba os seguintes termos: atividade rural, trabalhador rural, produtor rural e serviço rural, termos usados na legislação e doutrina brasileira.
Essas atividades, quando realizadas em família, são pressupostos para se enquadrar no conceito de economia familiar.
É de bom alvitre que esse conceito deva ser retratado com precisão nesta informação para não prejudicar o ato concessor do benefício, evitando assim prejuízo ao interessado.
Assim, a fim de melhor compreensão, uma vez que o ato de aposentadoria em questão encontrava-se íntegro ao registro, discorre-se o seguinte:
A Constituição Federal, consoante previsão no § 8º do art.195, refere-se ao trabalho em regime de economia familiar aquele exercido pelo produtor, pelo parceiro, pelo meeiro e pelo arrendatário rural e o pescador artesanal, bem como pelos respectivos cônjuges, sem empregados permanentes. Esta atividade, segundo se depreende do dispositivo constitucional em comento exige a contribuição para a seguridade social mediante a aplicação de uma alíquota sobre o resultado da comercialização da produção.
A doutrina expõe com maior precisão e caracteriza o regime de economia familiar, como se pode verificar na citação de Paixão1 (2005) que trata do conceito em questão com o seguinte ensinamento:
"Entende-se por economia familiar a forma de produção que tem por base a utilização de mão-de-obra no âmbito da própria família. A principal preocupação dessa forma de produção é a auto-sustentação familiar e, apenas a parte excedente da produção, é disponibilizada para a comercialização e viabilização da aquisição de outros bens necessários à família, mas que são produzidos fora da matriz familiar. Os produtos adquiridos são de extrema necessidade para assegurar a reprodução social.
O conceito de economia familiar é recente no Brasil, existe há alguns anos. Antes disso, falava-se em pequena produção, fosse ela uma unidade produtiva urbana ou rural. Em linhas gerais, hoje, entende-se por economia familiar, um empreendimento com duas características principais: gestão ou administração familiar e trabalho predominantemente familiar. Trata-se, por assim dizer, de uma unidade de produção, de consumo e de reprodução social."
A posição do autor deixa claro alguns requisitos para que se caracterize o trabalho rural em regime de economia familiar. Destaca-se, portanto, dentre todos, a inexistência de subordinação e dependência econômica.
Ainda que conjugados os conceitos, e que embora são capazes de per si, deixar límpida o julgamento de economia familiar, para acrescentar, deve ser citado o parágrafo 1o do art. 11 da Lei 8.213/91, que reza o seguinte:
"[...]
Parágrafo 1o. Entende-se como de regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados.
[...]"
Do dispositivo referido, entende-se que deve ser absorvida toda a força de trabalho da família para caracterizar a economia familiar.
Entretanto, há que se ressaltar que em havendo membro da família exercendo outra atividade remunerada, ainda que trabalhe na atividade rural, fica descaracterizado o regime de economia familiar. A jurisprudência acompanha tal raciocínio. Confira-se o acórdão abaixo colacionado:
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. CUMULAÇÃO COM APOSENTADORIA DE CARÁTER URBANO. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. EXCLUSIVIDADE. 1. Para caracterização do regime de economia familiar, imprescindível à concessão de aposentadoria por idade de rurícola, exige-se que a atividade exercida 'absorva toda a força de trabalho do obreiro.' (Resp. 265.705/RS; Rel. Min. Fernando Gonçalves; 6a T.; DJU 25-E 05.02.01; p. 144)."
Diante das definições anteriores, o regime de economia familiar decorre das agregações de todas as atribuições ligadas ao meio rural, onde todos os membros da família auxiliam na labuta mutuamente, sem qualquer vínculo empregatício. O núcleo familiar se faz necessário para que se concretize o termo economia familiar. De outra forma, retirando-se a expressão família tem-se, a idéia do individual, pois sempre que um membro do referido grupo estiver realizando atividade independente, aí restará descaracterizado o regime de economia familiar.
As atividades exercidas em regime de economia familiar são as mesmas desenvolvidas pelo trabalhador rural, produtor rural ou serviço rural, com a diferença da atuação familiar.
No que tange ao conceito de trabalhador rural, a CLT no artigo 7º, "b", assim descreve:
"Art. 7º [...]
[...]
b) aos trabalhadores rurais, assim considerados aqueles que, exercendo funções diretamente ligadas à agricultura e à pecuária, não sejam empregados em atividades que, pelos métodos de execução dos respectivos trabalhos ou pela finalidade de suas operações, se classificam como industriais ou comerciais;
[...]"
Do dispositivo reproduzido, o trabalhador rural não é aquele empregado, não há vínculo empregatício com indústria ou comércio.
Trabalhador rural nas concepções de Castro e Lazzari2 (2005, p. 619), merecem destaque:
"O trabalhador rural, ele mesmo, individualmente considerado, deve, para que albergado na seguridade social, unicamente demonstrar o exercício da atividade rural, uma vez que a legislação protecionista alcança todos aqueles indivíduos que, sem qualquer vínculo com os demais membros da família, trabalhem fora do regime de economia familiar, como segurados especiais na condição de produtor rural."
Para ilustrar ainda mais o entendimento, descreve-se o artigo 3º da Lei Complementar nº 11, de 25 de maio de 1971, que versa sobre o trabalhador rural, da seguinte forma:
"Art. 3º [...]
§ 1º Considera-se trabalhador rural, para os efeitos desta Lei Complementar:
a) a pessoa física que presta serviços de natureza rural a empregador, mediante remuneração de qualquer espécie;
b) o produtor, proprietário ou não, que, sem empregado, trabalhe na atividade rural individualmente ou em regime de economia familiar, assim entendido o trabalho dos membros da família indispensável à própria subsistência e exercido em condições de mútua dependência e colaboração.
[...]"
Portanto, a atividade rurícola concernente à economia familiar, requer obrigatoriamente a comprovação previdenciária, pois cabe a esta unidade econômica verter suas contribuições previdenciárias.
Diferentemente dos conceitos até aqui estudados, demonstra-se a seguir, conforme preceitua o Decreto nº 73.626, de 12 de fevereiro de 1974, artigo 3º, a expressão "empregado rural":
"Art 3º Empregado rural é toda pessoa física que, em propriedade rural ou prédio rústico, presta serviços de natureza não-eventual a empregador rural, sob a dependência deste e mediante salário."
Percebe-se nesse conceito o vínculo empregatício, a subordinação, uma relação de emprego, o que se dissipa totalmente do conceito anterior.
Neste interregno, quando se tratar de empregado rural as contribuições previdenciárias estão sob a responsabilidade do empregador rural.
De efeito, o objetivo de trazer à baila referido conceito de atividade rural como economia familiar é apenas de alertar da digressão ocasionada por este corpo instrutivo quando da análise do processo em epígrafe, que resultou na interpretação equivocada, motivando a denegação do registro do ato de aposentadoria, pois conforme frisado, a responsabilidade dos recolhimentos previdenciários é do empregador e não do empregado.
Diante de todo o exposto, esta inspetoria sugere a V.Exa., mui respeitosamente, que seja proposto ao egrégio Tribunal Pleno o registro da aposentadoria do ex-servidor Sr. Leonildo Gonçalves Thibes.
PREVIDENCIÁRIO. EMPREGADO RURAL. ATIVIDADE DE FILIAÇÃO OBRIGATÓRIA. LEI N.º 4.214/1963. CONTRIBUIÇÃO. OBRIGAÇÃO. EMPREGADOR. EXPEDIÇÃO. CERTIDÃO. CONTAGEM RECÍPROCA. POSSIBILIDADE. ART. 94 DA LEI N.º 8.213/1991.
1. A partir da Lei n.º 4.214, de 02 de março de 1963 (Estatuto do Trabalhador Rural), os empregados rurais passaram a ser considerados segurados obrigatórios da previdência social.
2. Nos casos em que o labor agrícola começou antes da edição da lei supra, há a retroação dos efeitos da filiação à data do início da atividade, por força do art. 79 do Decreto n.º 53.154, de 10 de dezembro de 1963.
2. Desde o advento do referido Estatuto, as contribuições previdenciárias, no caso dos empregados rurais, ganharam caráter impositivo e não facultativo, constituindo obrigação do empregador. Em casos de não-recolhimento na época própria, não pode ser o trabalhador penalizado, uma vez que a autarquia possui meios próprios para receber seus créditos. Precedente da Egrégia Quinta Turma.
3. Hipótese em que o Autor laborou como empregado rural, no período compreendido entre 1º de janeiro de 1962 e 19 de fevereiro de 1976, com registro em sua carteira profissional, contribuindo para a previdência rural.
4. Ocorrência de situação completamente distinta daquela referente aos trabalhadores rurais em regime de economia familiar, que vieram a ser enquadrados como segurados especiais tão-somente com a edição da Lei n.º 8.213/91, ocasião em que passaram a contribuir para o sistema previdenciário.
5. Reconhecido o tempo de contribuição, há direito à expedição de certidão para fins de contagem recíproca.
IV. CONCLUSÃO
6.1. Ordenar o registro, nos termos do art. 34, II, c/c o art. 36, §2º, "b", da Lei Complementar nº 202/2000, do ato aposentatório de Leonildo Gonçalves Thibes, da Prefeitura Municipal de Caçador, matrícula nº 301, no cargo de Operador de Máquina I, referência 14, CPF nº 220.632.779-15, PASEP nº 10207945506, consubstanciado no Decreto nº 1.322/1996, considerado legal conforme pareceres emitidos nos autos.
COG, em 07 de agosto de 2008.
CLAUTON SILVA RUPERTI
De Acordo. Em ____/____/____
DE ACORDO.
À consideração do Exmo. Sr. Conselheiro Salomão Ribas Júnior, ouvido preliminarmente o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas.
COG, em de de 2007.
MARCELO BROGNOLI DA COSTA Consultor Geral |
2 REC., fls. 02.
3 SPE., fls. 97/100.
4 Art. 94. Para efeito dos benefícios previstos no Regime Geral de Previdência Social ou no serviço público é assegurada a contagem recíproca do tempo de contribuição na atividade privada, rural e urbana, e do tempo de contribuição ou de serviço na administração pública, hipótese em que os diferentes sistemas de previdência social se compensarão financeiramente.
5 Nesse sentido, também: BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 263425/SP Rel. Min. Gilson Dipp. Órgão Julgador: Quinta Turma. Data do Julgamento: 21/08/2001. Data da Publicação/Fonte: DJ 17/09/2001, p. 182.
6 BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 554068/SP. Rel. Min. Laurita Vaz. Órgão Julgador: Quinta Turma. Data do Julgamento: 14/10/2003. Data da Publicação/Fonte: DJ 17/11/2003, p. 378.