ESTADO DE SANTA CATARINA
    TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO
    CONSULTORIA GERAL

Processo n°: REC - 05/03958409
Origem: Secretaria de Estado da Infra-Estrutura
responsável: Romualdo Theophanes de França Júnior
Assunto: (Recurso de Reconsideração - art. 77 da LC 202/2000) -SPC-04/04991203
Parecer n° COG-604/08

Recurso de reconsideração. Solicitação de prestação de contas de recursos antecipados. Despesas com viagem. Necessidade de comprovar a efetiva realização. Ordem de tráfego. Documento hábil. Cancelamento da multa. Conhecer e dar provimento.

Conforme o art. 62, II, da Resolução n. TC-16/94, é necessária a apresentação do documento comprobatório da efetiva realização da viagem - ordem de tráfego, bilhete de passagem, relatório, ata de presença, nota fiscal ou outros documentos. Impõe-se o cancelamento da multa quando comprovadas as despesas por meio das respectivas ordens de tráfego.

Senhor Consultor,

RELATÓRIO

Tratam os autos de recurso de reconsideração interposto nos termos do art. 77 da Lei Complementar nº 202/00 por Romualdo Theophanes de França Júnior, Diretor-Geral do Departamento Estadual de Infra-Estrutura (DEINFRA), em face do acórdão nº 0438/2005, proferido nos autos da solicitação de prestação de contas de recursos antecipados (SPC) nº 04/04991203, que, com fulcro no art. 18, III, "b" c/c art. 21, parágrafo único, daquela lei, julgou irregulares as contas sem imputação de débito, e, com fundamento no art. 69, aplicou multa de R$ 600,00.

O processo originário resulta de solicitação da remessa de documentos a este Tribunal depois de auditoria realizada pela Diretoria de Controle da Administração Estadual (DCE).

Os autos foram instruídos com os documentos de fls. 02-366.

O corpo técnico emitiu o relatório de auditoria nº DCE/INSP.2/Nº 312/2004 (fls. 367-370), sugerindo a citação do responsável, que foi determinada pelo relator à fl. 370.

A unidade requereu cópia da documentação original constante no processo, no que foi atendida à fl. 372.

Após, o responsável encaminhou sua justificativa (fls. 376-377).

Com o retorno dos autos à DCE, elaborou-se o relatório de reinstrução DCE/INSP.2/Nº 469/2004, por meio do qual se propôs julgar irregulares as contas analisadas com imputação de débito (fls. 379-382).

O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas discordou do corpo técnico, ao opinar pela quitação integral do débito (parecer MPTC nº 156/2005, fls. 384-385).

O relator proferiu voto no sentido de julgar as contas irregulares sem débito, propondo a aplicação de multa (fls. 386-387). O pronunciamento foi acolhido pelo Tribunal Pleno conforme se extrai do acórdão nº 0438/2005, proferido na sessão ordinária de 04/04/2005 (fls. 391-392):

ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro nos arts. 59 da Constituição Estadual e 1° da Lei Complementar n. 202/2000, em:

6.1. Julgar irregulares, sem imputação de débito, com fundamento no art. 18, III, "b", c/c o art. 21, parágrafo único, da Lei Complementar n. 202/2000, as contas de recursos antecipados referentes à Nota de Empenho n. 13856/000, de 15/09/2003, P/A 8684, item 339015.00, fonte 40, no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais).

6.2. Aplicar ao Sr. Romualdo Theophanes de França Júnior - Diretor-Geral do Departamento Estadual de Infra-Estrutura - DEINFRA, CPF n. 486.844.499-91, multa prevista no art. 69 da Lei Complementar n. 202/2000 c/c o art. 108, parágrafo único, do Regimento Interno, no valor de R$ 600,00 (seiscentos reais), em face da inadequada comprovação da efetiva realização da viagem, em descumprimento ao art. 62, II, da Resolução n. 16/94, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial do Estado, para comprovar ao Tribunal o recolhimento da multa ao Tesouro do Estado, ou interpor recurso na forma da lei, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts. 43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000.

6.3. Determinar ao Departamento Estadual de Infra-Estrutura - DEINFRA que instrua seus processos de prestação de contas com outros elementos comprobatórios da efetiva realização das viagens (recibo de hotel ou restaurante, certificado de participação em seminário ou documento equivalente, etc., dependendo do objeto da viagem), além da Ordem de Tráfego, sob pena de, caso não seja cumprida esta determinação, imputar-se débito por toda a despesa efetuada.

6.4. Dar ciência deste Acórdão, do Relatório e Voto do Relator que o fundamentam, bem como do Relatório de Auditoria DCE/Insp.2/Div.4 n. 469/2004, ao Sr. Romualdo Theophanes de França Júnior - Diretor-Geral do Departamento Estadual de Infra-Estrutura - DEINFRA.

A decisão foi publicada no Diário Oficial do Estado nº 17.652, de 07/06/2005.

Inconformado, Romualdo Theophanes de França Júnior interpôs recurso.

É o relatório.

PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE

O art. 77 da Lei Complementar nº 202/2000 elenca como pressupostos de admissibilidade do recurso de reconsideração: a legitimidade, a singularidade e a tempestividade.

No que se refere à legitimidade, verifica-se que o recorrente a possui, já que tem interesse recursal em razão da multa imputada em seu desfavor. Enquadrou-se, ademais, na definição de responsável prevista no art. 133, § 1º, "a", do Regimento Interno.

A singularidade também foi observada, pois interposto o recurso uma única vez.

A tempestividade restou atendida, porquanto o acórdão recorrido foi publicado no Diário Oficial do Estado nº 17.652, de 07/06/2005, e o recurso, protocolizado em 30/06/2005, respeitando-se, assim, o prazo regimental de trinta dias para a interposição.

Logo, deve ser conhecido.

MÉRITO

O recorrente se insurge contra a multa de R$ 600,00 aplicada em face da inadequada comprovação da efetiva realização da viagem (art. 62, II, da Resolução n. 16/94).

Por meio de comunicação interna subscrita pelo Diretor de Administração do DEINFRA, o responsável assevera, preliminarmente, que efetivamente foram realizados pagamentos de diárias em razão do deslocamento de servidor daquela unidade.

Invoca o princípio da legalidade (art. 5º II e 37, caput, da Constituição Federal) para aduzir que nos termos do Decreto Estadual nº 133 (art. 12) e da Resolução nº TC 16/94 deste Tribunal (art. 62, II), foi apresentado o necessário documento comprobatório da despesa.

Sustenta a tese de que, analisando conjuntamente os dispositivos acima, "dentre os documentos entendidos como bastantes suficientes para comprovar o efetivo deslocamento está o roteiro de viagem, sendo expressamente consignada no texto da Resolução mencionada a expressão "ou outros documentos", portanto exemplificativa, adequando-se a exigência de quaisquer outras documentações conforme o caso assim permitir" (fl. 04). Ademais, entende que basta a apresentação de um único documento, não sendo razoável que os gestores fossem obrigados a exigir do servidor beneficiado todos os mencionados no inciso II do art. 62.

No mais, assevera que todos os atos administrativos, a exemplo do questionado nestes autos, gozam de presunção de legitimidade.

Esclarece que a unidade vem adotando rotinas administrativas para assegurar o cumprimento da lei. Salienta que foi editada "a Resolução CA - nº 0397/2004, disciplinando aos seus servidores o cumprimento do Decreto 133/99 e da Resolução nº TC 16/94" (fl. 07).

Conforme a letra da Resolução, são admitidos para a comprovação do pagamento de diárias:

Art. 62 - O pagamento de diárias deverá ser comprovado com os documentos seguintes:

I - Roteiro de viagem, que deverá consignar:

a) Identificação do servidor - nome, matrícula, cargo, função ou emprego;

b) Deslocamentos - data e hora de saída e de chegada à origem e local de destino;

c) Meio de transporte utilizado;

d) Descrição sucinta do objetivo da viagem;

e) Número de diárias e cálculo do montante devido;

f) Quitação do credor;

g) Nome, cargo ou função e assinatura da autoridade concedente;

II - Documento comprobatório da efetiva realização da viagem: ordem de tráfego, bilhete de passagem, relatório, ata de presença, nota fiscal ou outros documentos;

III - Justificativa, firmada pelo ordenador da despesa, da urgência e inadiabilidade ou da conveniência de uso de transporte aéreo ou de veículo particular do servidor, este quando cadastrado no órgão público, na forma da legislação vigente, quando cabível. (grifei)

De fato, o dispositivo destacado admite a comprovação da efetiva realização da viagem por meio da ordem de tráfego e também por outros documentos.

A instrução, no entanto, pronunciou-se de maneira diversa, apesar da expressa disposição acima. Confira-se (fl. 380):

No caso em tela, durante a realização da auditoria, cabe ressaltar, que verificou-se a existência de Ordem de Tráfego, atendendo dessa forma o disposto no artigo 62, da Resolução TC 16/94.

Ocorre porém que o documento público, no caso a Ordem de tráfego é regido pelo disposto no art. 364 do CPC, ou seja, tem presunção de veracidade "juris tantum", e não "juris et de jure", admitindo assim, prova em contrário, podendo dessa forma ter o seu conteúdo infirmado por outros elementos de convicção. (grifei)

Esse argumento, à toda evidência, não é hábil a fomentar uma restrição. Um dos atributos dos atos administrativos é justamente a presunção de legitimidade. Em razão dessa característica, presumem-se verdadeiros e conformes ao Direito até prova em contrário.1 Como bem asseverou o então Procurador-Geral César Filomeno Fontes no parecer MPTC nº 156/2005 (fls. 384-385),

a) em todos os processos até hoje analisados pela douta Instrução, foi aceita a Ordem de Tráfego como documento hábil para comprovação da viagem e, por conseqüência, para comprovação das diárias;

b) a Resolução TC 16/94, no item II do art. 62, cita textualmente: "Documento comprobatório da efetiva realização da viagem: ordem de tráfego, bilhete de passagem...";

c) inova agora a Instrução, partindo para aplicação do art. 364 do CPC, considerando a Ordem de Tráfego um documento com "presunção de veracidade";

d) cabe a quem põe dúvida no documento, provar sua incapacidade de uso ou sua ilegalidade, fato que caberia a Instrução que expediu o presente Relatório;

e) além disto, a suposição de presunção de veracidade não invalida o documento apresentado, mantendo-se a legalidade dos procedimentos efetuados;

No caso dos autos, verifica-se a existência de 54 (cinqüenta e quatro) ordens de tráfego, que comprovam, na forma exigida pela Resolução, a utilização dos recursos empenhados para o pagamento de diárias.

Confira-se a tabela:

Nota de Empenho nº 13856/000, no valor de R$ 30.000,00

ORDEM DE TRÁFEGO Nº VALOR (R$) FOLHA DO PROCESSO
2003/233 783 18
2003/234 990 29
2003/235 210 36
2003/236 100 43
2003/237 100 48
2003/238 100 53
2003/239 100 58
2003/240 210 63
2003/241 2.080 70
2003/242 2.040 83
2003/243 2.120 96
2003/244 2.448 109
2003/246 312 122
2003/247 220 127
2003/248 220 134
2003/249 200 139
2003/250 200 146
2003/251 200 151
2003/252 200 156
2003/253 266 161
2003/254 549 168
2003/255 128 179
2003/256 624 186
2003/256 300 193
2003/257 1.230 200
2003/258 1.260 211
2003/257 1.428 224
2003/259 1.860 237
2003/261 128 256
2003/262 1.068 263
2003/263 1.230 272
2003/264 1.230 284
2003/262 1.428 299
2003/265 1.860 312
2003/266 128 329
2003/267 320 336
2003/268 1.064 345
2003/269 522 352
2003/270 250 363
2003/271 250 368
Estorno 44 14
TOTAL 30.000  

Apenas a título de elucidação, vale dizer que os demais documentos arrolados não confirmam a efetiva realização das viagens - nem mesmo considerando que a Resolução n. TC-16/94 admite várias maneiras para a comprovação. Os relatórios resumo de viagem consistem, na verdade, em documentos que satisfazem a exigência do inciso I do art. 62. Os recibos de adiantamento financeiro e as autorizações de viagem/uso de veículo, por sua vez, não tem o condão de demonstrar, de forma inequívoca, que os servidores de fato estiveram presentes aos compromissos que justificaram os deslocamentos. Por isso, não podem ser enquadrados na definição de "outros documentos" capazes de satisfazer a exigência (art. 62, II).

Diante da comprovação da aplicação regular dos recursos da Nota de Empenho nº 13856/000, sugere-se dar provimento ao recurso para cancelar a multa.

CONCLUSÃO

Ante o exposto, o parecer é no sentido de:

A) Conhecer do presente recurso de reconsideração, nos termos do art. 77 da Lei Complementar Estadual nº 202/00, interposto contra o acórdão nº 0438/2005 proferido na sessão ordinária de 04/04/2005, nos autos da solicitação de prestação de contas de recursos antecipados (SPC) nº 04/04991203, e, no mérito, dar-lhe provimento, a fim de cancelar a multa aplicada;

B) Dar ciência do acórdão, relatório e voto do relator, bem como deste parecer, ao DEINFRA, ao recorrente Romualdo Theophanes de França Júnior, Diretor-Geral em 2004 e à sua procuradora, a advogada Vívian Sandoval Barbosa Jorge.

  MARCELO BROGNOLI DA COSTA

Consultor Geral