TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE SANTA CATARINA

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PROCESSO TCE 06/00337979
   

UNIDADE

Prefeitura Municipal de Praia Grande
   

RESPONSÁVEIS

Sr. Eliseu Lima - Prefeito Municipal no exercício de 2004 e Sr. João José de Matos - Prefeito Municipal na Gestão 2005-2008
   
ASSUNTO Auditoria "in loco" para apuração de supostas irregularidades denunciadas a este Tribunal, com abrangência aos exercícios de 2004, 2005, 2006 e 2007 - Reinstrução
   
RELATÓRIO N° 138/2008

INTRODUÇÃO

Cumprindo as atribuições de fiscalização conferidas ao Tribunal de Contas pela Constituição Federal, art. 31, pela Lei Complementar nº 202, de 15/12/2000, art. 65, §§ 1º ao 5º e pela Resolução nº TC 16/94, a Diretoria de Controle dos Municípios realizou inspeção "in loco" para apuração de supostas irregularidades cometidas no âmbito da Prefeitura Municipal de Praia Grande.

Tratam os autos de inspeção decorrente da manifestação do Conselheiro Relator, através do Despacho datado de 07/02/2007, juntado às fls. 33 e 34 dos autos, que determinou a adoção de providências para apuração dos fatos denunciados.

O Despacho foi proferido em razão das irregularidades denunciadas, quando o Processo mereceu apreciação da Diretoria de Denúncias e Representações, através do Relatório de Admissibilidade nº 390/2006, de 04/12/2006 (fls. 05 a 07 dos autos).

Assim sendo, realizou-se inspeção "in loco", conforme Of. TCE/DMU nº 7.125/2007 (fl. 66), para verificação de irregularidades cometidas no âmbito da Prefeitura Municipal de Praia Grande.

Os trabalhos foram confiados aos Srs. Clóvis Coelho Machado, Eduardo Correa Tavares, Hemerson José Garcia e Marcos André Alves Monteiro.

Das ações de inspeção procedidas, originou-se o Relatório nº 1.412/2007, constante às fls. 127 a 149 dos autos e considerando o resultado da análise do processo em causa, consubstanciado em documentos, e a decisão do Tribunal Pleno, datada de 24/10/2007, convertendo o processo DEN 06/00337979 em Tomada de Contas Especial (TCE 06/00337979) com fulcro no artigo 32 da Lei Complementar nº 202/2000 c/c o artigo 34, caput da Resolução TC 06/2001 - Regimento Interno do Tribunal de Contas, foi remetido, em data de 03/12/2007 ao Sr. João José de Matos - Prefeito Municipal na Gestão 2005-2008, o Ofício nº 17.340/2007 e ao Sr. Eliseu Lima - Prefeito Municipal no exercício de 2004, o Ofício nº 17.341/2007, os quais determinaram a citação dos mesmos, para manifestação por meio documental, no prazo de 30 (trinta) dias, acerca do conteúdo do referido Relatório.

O Sr. João José de Matos, através do Ofício s/nº, datado de 13/12/2007, protocolado neste Tribunal sob nº 387, em 10/01/2008 e o Sr. Eliseu Lima, através do Ofício s/nº, datado de 13/12/2007, protocolado neste Tribunal sob nº 388, em 10/01/2008, apresentaram justificativas sobre as restrições anotadas no Relatório supracitado.

II - DA TRAMITAÇÃO DO PROCESSO

Por força dos artigos 1º e 2º, da Resolução TC nº 10/2007, de 26 de fevereiro de 2007, que altera a estrutura e as competências dos órgãos auxiliares do Tribunal de Contas de Santa Catarina e artigo 1º, Inciso I, alínea "b" e III da Portaria nº TC 136/2007, de 27/02/2007 o presente processo foi encaminhado à Diretoria de Controle dos Municípios.

III - DA DENÚNCIA

1 - Da Matéria Enfocada

No mérito, vê-se que a matéria-objeto do expediente denunciatório versa sobre a não utilização de bem público (obra), qual seja o Terminal Rodoviário do Município, o qual, embora concluído há cerca de um ano, à época do expediente (20/06/2006), não estaria sendo utilizado, demonstrando, a priori, o mau uso do dinheiro público.

2 - DA INSPEÇÃO E DA ANÁLISE DOS FATOS DENUNCIADOS

A análise da não utilização do Terminal Rodoviário Municipal, objeto da Denúncia, foi realizada através dos seguintes procedimentos:

- inspeção no local da obra, onde foi fotografado o estado atual do imóvel em questão (Anexo 1, deste Relatório);

- verificação dos documentos relacionados ao processo de doação do terreno, da licitação da obra e do convênio;

- análise dos documentos e relatórios contábeis dos gastos efetuados com a construção e manutenção do Terminal; documentos e relatórios do setor de tributação;

- busca de informações e documentos junto aos servidores e assessor jurídico do Município; e

- consulta junto aos Cartórios de Registro de Imóveis de Turvo, Santa Rosa do Sul e Sombrio da área ocupada pela obra (propriedade, área efetiva, etc).

Da análise do fato denunciado, restam caracterizadas as restrições a seguir:

2.1 - Emprego indevido de verbas públicas na construção de Terminal Rodoviário Municipal em terreno de particular, no montante de R$ 79.900,00, com infração ao disposto no artigo 83, XXII c/c 121, I, da Lei Orgânica do Município de Praia Grande e ao artigo 1º, § 1º, da Lei Complementar nº 101/2000

O Poder Legislativo de Praia Grande aprovou a Lei Municipal nº 1.162/2004, de 27/04/2004, que autoriza o Município a receber em doação imóvel urbano, situado à Rua Humberto Oenning, com área de 900 m², de Virgilino Francisco Pereira, com destinação exclusiva para a construção do Terminal Rodoviário Municipal, segundo o disposto no artigo 2°, da referida lei.

Posteriormente, conforme informações prestadas na Unidade, o Sr. Virgilino Francisco Pereira assinou termo de doação do imóvel em questão em favor do Município de Praia Grande, documento que não foi apresentado à equipe de inspeção.

Em 14/06/2004, a Secretaria de Estado da Infra-Estrutura, através do Departamento de Transportes e Terminais - DETER, celebrou convênio com o Município de Praia Grande para construção do Terminal Rodoviário de Passageiros, com a previsão de repasse de R$ 80.000,00, conforme documentos juntados às fls. 08 à 18 dos autos.

Após a homologação do convite nº 35/2004, em 05/10/2004, foi assinado o Contrato Administrativo nº 46, com a empresa Balthazar Engenharia & Construções Ltda, vencedora do certame, para a construção da obra sob análise, pelo valor de R$ 79.900,00.

Com base no contrato supracitado, a Unidade emitiu a Nota de Empenho nº 5.279/2004, de 20/12/2004, no valor de R$ 79.900,00, tendo efetuado os pagamentos em 29/12/2004 (R$ 32.000,00) e em 31/08/2005 (R$ 47.900,00).

Já na data de 18/04/2005 foi lavrado o Termo de Recebimento da Obra e, em 27/07/2005, o Termo de Aceitação Definitiva da Obra.

A instrução realizou inspeção in loco, a fim de verificar a situação de utilização e aplicação dos recursos públicos e constatou que o Terminal Rodoviário Municipal ainda não se encontra em funcionamento, conforme fotos constantes do Anexo 1 deste Relatório.

Dentro do local observou-se a existência de latas de cerveja vazias e marcas de enchente, evidenciando a não utilização para os fins a que se destina e provável necessidade de reparos, antes mesmo da inauguração.

Indagada sobre a situação, a Administração Municipal informou que o terreno em questão havia sido doado pelo Sr. Virgilino Francisco Pereira, o que foi perfectibilizado através da mencionada lei e do termo de doação.

Foi apurado ainda que, com base apenas nestes elementos, a Administração Municipal:

- logrou êxito no convênio firmado com o DETER para a construção do terminal;

- realizou licitação, da qual resultou a contratação da empresa Balthazar Engenharia & Construções Ltda para execução da obra; e

- recebimento da obra e quitação da obrigação, com os recursos advindos do convênio.

Ocorre que a situação jurídica da área sobre a qual foi construído o terminal é controversa, existindo divergências relativas à titularidade da propriedade e suas dimensões.

Na busca de documentos que comprovassem a propriedade da área na Prefeitura de Praia Grande, foram encontradas apenas procurações dos herdeiros da antiga proprietária, Sra. Francisca Gonçalves da Luz, em favor de Erian da Silva Pereira (provavelmente um parente de Virgilino Francisco Pereira). Os instrumentos, arquivados junto ao processo licitatório da obra (terminal), outorgaram poderes para transacionar os direitos hereditários sobre a área em questão, de acordo com as informações até então prestadas.

No Cartório de Registro de Imóveis de Turvo1, obteve-se a certidão do registro do terreno objeto das procurações, onde consta área de apenas 300 m². Já o cadastro imobiliário utilizado pela Administração Tributária Municipal, apresenta como contribuinte Virgilino Francisco Pereira, com uma área de 530,90 m².

Questionada sobre a evidente incompatibilidade entre as dimensões existentes (lei, registro de imóveis e cadastro imobiliário), bem como sobre os conseqüentes problemas com a propriedade do terreno ocupado pelo terminal, a Administração Municipal informou sobre a ação de usucapião intentada pelo Sr. Virgilino Francisco Pereira. Para obter a propriedade do terreno, a atual Administração, ao verificar a situação, vem buscando regularizá-la, antes de iniciar as atividades no terminal.

Para comprovar as informações prestadas, e considerando o exíguo tempo disponível, seria enviada pela Assessoria Jurídica à equipe de auditoria a seguinte documentação, de acordo com o solicitado:

    - instrumento utilizado para realizar a doação;
    - informações sobre a ação de usucapião (petição inicial, e documentos sobre a área discutiva);
    - registro imobiliário do restante da área, considerando as informações obtidas no Cartório de Registro de Imóveis de Turvo.

No dia 13/06/07 foi protocolado nesta Corte de Contas o Ofício nº 151/07, da Prefeitura Municipal de Praia Grande, com os documentos solicitados (exceto os termos de doação) e informações, indicando que a área de 900 m², mencionada na Lei Municipal nº 1.162/2004, é composta por dois terrenos:

a) a área objeto da ação de usucapião, já mencionada, que teria 538,38 m²; e

b) uma área de 361,62 m², de propriedade do Sr. Plínio Lima, que também teria sido doada à municipalidade para a construção do terminal.

Através da inspeção in loco e dos documentos obtidos até a presente data, conclui-se que não houve a observância da legislação vigente, pela Administração anterior, pela qual responde o Sr. Eliseu Lima (Prefeito Municipal à época), e pela atual Administração, de responsabilidade do Sr. João José de Matos (Prefeito Municipal).

A validade de uma doação pressupõe a adequação às regras dispostas na Lei nº 10.406/02 (Código Civil), que estabelece:

        "Art. 104. A validade do negócio jurídico requer: (...)
        II - objeto lícito, possível, determinado ou determinável;
        III - forma prescrita ou não defesa em lei.
        Art. 538. Considera-se doação o contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra."

O Código Civil determina, ainda, a forma a ser adotada para a doação de bens imóveis:

        "Art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País.
        Art. 541. A doação far-se-á por escritura pública ou instrumento particular."

E, finalmente, como se opera a transferência da propriedade do doador para o donatário:

        "Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis."

Da leitura destes artigos, depreende-se a invalidade da doação, uma vez que:

- o doador era pessoa que não detinha a propriedade junto ao Registro de Imóveis à época (e ainda não detêm) - artigos 104, II, e 538;

- não havia escritura pública através do qual operaram-se as doações dos terrenos - artigos 104, III, 108 e 541;

- não havia registro do título translativo no Registro de Imóveis - artigo 1.245.

A simples inviabilidade de registro do termo de doação do Sr. Virgilino Francisco Pereira deveria ter suspendido os projetos da Administração na área em questão. O registro de lote com dimensões inferiores no Registro de Imóveis de Turvo (fls. 68), e as certidões negativas de propriedade dos cartórios de Santa Rosa do Sul e de Sombrio, evidenciam controvérsias sobre a área, impondo à Administração a regularização antes da realização de qualquer obra.

Além disso, percebe-se a necessária existência de dois doadores, considerando que a área ocupada pelo terminal é de 900 m², composta por dois terrenos, de proprietários distintos.

Não há, no entanto, nenhum documento comprovando a doação do Sr. Plínio Lima, com exceção da informação prestada pelo atual gestor (fls. 36) e dos croquis atuais apresentados (fls. 44 a 48).

Tal fato caracteriza a impropriedade da autorização concedida pela Lei Municipal nº 1.162/04, considerando que a redação coloca o Sr. Virgilino Francisco Pereira como proprietário da área total, o que reforça a ilegalidade das ações subseqüentes da Administração.

Este conjunto de vícios na aquisição da propriedade pela Administração Pública, que descaracteriza a transmissão, evidencia a ilegalidade dos atos praticados pelos gestores e o conseqüente prejuízo ao erário, composto pelos gastos públicos efetuados na área, abrangendo a construção, as contas de água e luz, e a ausência de lançamento e arrecadação de tributos (IPTU).

Sem embargo, o aporte de recursos públicos para a construção do terminal em propriedade particular, caracteriza a inobservância dos procedimentos prévios estabelecidos nos art. 83, XXII, c/c art. 121, I , da Lei Orgânica:

      "Art. 83. Compete ao Prefeito (...)
      XXII. aprovar projetos de edificação (...)
      Art. 121. Nenhum empreendimento de obras e serviços do Município poderá ter início sem prévia elaboração do plano respectivo, no qual, obrigatoriamente, conste:

Destarte, a construção nestes termos caracteriza descumprimento à orientação prevista no art. 1º, § 1º, da LRF:

Ressalta-se que os atos praticados pelos gestores estão sujeitos à apreciação pela Câmara de Vereadores, pelas infrações político-administrativas, e pelo Poder Judiciário, pelos crimes de responsabilidade, conforme dispõe os artigos 1º, III, e 4º, VIII, do Decreto-Lei nº 201/67:

Assim, a instrução entende que o Sr Eliseu Lima - Prefeito Municipal no exercício de 2004 não deveria ter deflagrado processo licitatório e autorizado o pagamento da 1ª parcela, e o Sr. João José de Matos - Prefeito Municipal na Gestão 2005-2008 não poderia ter autorizado o pagamento da 2ª parcela, sem possuir o registro do imóvel em nome do Município de Praia Grande.

Demonstra-se, a seguir, os pagamentos efetuados à empresa Balthazar Engenharia & Construções Ltda, por conta do Convite nº 35/2004:

NE DATA VALOR NE (R$) OP DATA OP VALOR (R$)
5.297 20/12/04 79.900,00 5297.01/2004 29/12/04 32.000,00
      5297.01/2004 31/08/05 47.900,00
TOTAL   79.900,00     79.900,00

(Relatório nº 1.412/2007, de auditoria "in loco" - Citação, item 2.1)

A manifestação dos Srs. Eliseu Lima e João José de Matos, apesar de ter sido protocolada separadamente, apresenta idêntico teor, conforme a seguir transcrito:

Considerações da Instrução:

Os responsáveis, além dos esclarecimentos prestados, encaminharam cópia da Lei Municipal nº 1.162/2004, que autoriza o Chefe do Poder Executivo Municipal a receber em doação do Sr. Virgilino Francisco Pereira, imóvel urbano com área de 900,00 m², bem como, cópia do projeto de lei nº 040/2007 que altera o texto da referida Lei, no sentido de incluir como doador o nome do Sr. Plinio Lima, corrigindo também para 1.010,10 m² a área total objeto da doação.

Os responsáveis encaminharam ainda cópia de petição inicial, protocolada em 19/01/2006 na Comarca de Santa Rosa do Sul pelo Sr. Virgilino Francisco Pereira, através da qual foi proposta ação de usucapião de imóvel localizado no Município de Praia Grande, com área de 538,38 m², que foi julgada procedente em sentença daquele Juízo, publicada em 11/10/2007 e transitada em julgado em 29/10/2007, conforme informações extraídas do sistema de consulta do Poder Judiciário, juntadas às fls. 193 a 195 dos autos.

Posteriormente, em data de 10/07/2008, os responsáveis protocolaram neste Tribunal de Contas, sob nº 14977, o Ofício nº 167/08, de 09/07/2008, por meio do qual encaminham as escrituras públicas de doação, bem como, as certidões de registro dos imóveis matriculados sob nº 3.737 e 4.283 no Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Santa Rosa do Sul, restando assim, comprovada a regularização da situação apontada.

Impende ressaltar que a efetiva incorporação ao patrimônio do Município, dos imóveis supracitados, somente veio a ocorrer quando do registro das escrituras públicas de doação ou seja, em 20/02/2008 no caso do imóvel matrículado sob nº 3.737 e 09/07/2008 naquele matrículado sob nº 4.283, posteriormente, portanto, a 27/07/2005, data em que foi considerada concluída a obra do Terminal Rodoviário Municipal, mediante lavratura do Termo de Aceitação Definitiva de Obra.

Assim, referida regularização, apesar de afastar a possibilidade de imputação de débito, não possui o condão de sanar a restrição apontada, vez que, a conduta do Sr. Eliseu Lima, ao deflagrar o processo licitatório e contratar a empresa vencedora do certame, bem como, do Sr. João José de Matos, ao consentir a continuidade da execução da obra em terreno que ainda não havia sido incorporado ao patrimônio do Município, além de temerária, considerando o risco de prejuízo ao erário, não observou a legislação vigente, mormente o disposto no artigo 83, XXII c/c 121, I, da Lei Orgânica do Município de Praia Grande e ainda o artigo 1º, § 1º, da Lei Complementar nº 101/2000.

Diante do exposto, mantém-se a restrição com a seguinte redação:

2.1.1 - Realização de obra pública sem a observância dos requisitos legais, evidenciando descumprimento ao disposto no artigo 83, XXII c/c 121, I, da Lei Orgânica do Município de Praia Grande e artigo 1º, § 1º, da Lei Complementar nº 101/2000

2.2 - Ausência de lançamento de IPTU dos exercícios de 2004, 2005, 2006 e 2007 no montante de R$ 818,07, em desacordo ao disposto no art. 30, III, da Constituição Federal, art. 11 da Lei Complementar n.° 101/2000 c/c os artigos 205 caput e parágrafo único, 228 e 229, da Lei Municipal nº 642/93 (Código Tributário do Município)

Conforme discorrido no item 2.1 deste Relatório, a Prefeitura Municipal de Praia Grande não possui o registro dos imóveis sobre os quais foi construído o Terminal Rodoviário Municipal. Verificou-se ainda a inexistência de desapropriação, servidão administrativa, imissão provisória na posse, ou qualquer outra forma de intervenção nas propriedades indicadas que justificassem a omissão no lançamento do IPTU.

Assim sendo, pertencendo a área em questão a particulares, deveria a municipalidade ter procedido o lançamento e a cobrança do Imposto sobre a Propriedade Territorial e Urbana - IPTU, nos termos do art. 30, III, da Constituição Federal:

"Art. 30. Compete aos Municípios: (...)

Quanto à área de 538,38m², em nome de Virgilino Francisco Pereira, no exercício de 2004 foi lançado o valor de R$ 97,47, o que não ocorreu nos exercícios seguintes. Verificando os lançamentos relativos à 2005, 2006 e 2007, constatou-se a omissão da Administração.

No que tange à área de 361,62 m², em nome de Plínio Lima, conforme documentos juntados à fl. 125 dos autos, a Prefeitura não procedeu o cadastro no sistema de tributação, razão pela qual o IPTU dos exercícios de 2004, 2005, 2006 e 2007 deixou de ser lançado.

O procedimento adotado em relação às áreas mencionadas caracteriza a renúncia de receita tributária, em confronto com o disposto no art. 11, da LRF:

Segundo informado pelo setor de tributação, nos exercícios de 2005, 2006 e 2007 ocorreram apenas alterações da Unidade Fiscal do Município - UFM, como constam dos Decretos Municipais nºs 004/2005, 005/2006 e 002/2007 (fls. 94 a 96 dos autos).

Deste modo, demonstra-se a seguir o valor do IPTU que deixou de ser lançado nos exercícios em tela, com a aplicação das UFM's fixadas para os respectivos exercícios, calculado até 31/05/2007:

Contribuinte: Virgilino Francisco Pereira
Descrição do Imóvel: Terreno com área de 538,38m2 situado à Rua Padre Humberto Oenning

Exercício Quantidade de UFM's Valor da UFM Valor Original (R$) Atualização Monetária (R$)1 Multa

(R$) 2

Juros (R$) 3 Valor Atual

(R$)

Situação
2004 3,76332 25,90 97,47 19,49 11,58 42,10 170,64 Lançado
2005 3,76332 29,12 109,59 7,37  11,58 28,07  156,61 Não Lançado
2006 3,76332 29,93 112,64 4,32  11,58 14,04  142,58 Não Lançado
2007 3,76332 31,08 116,96 0,00  11,58 0,00  116,96 Não Lançado
                 
TOTAL ATUALIZADO DO VALOR NÃO LANÇADO       416,15   
         
1 Valor calculado conforme variação da Unidade Fiscal Municipal.
2 Valor calculado segundo o artigo 2º, da Lei Municipal nº 873/97 (0,33% ao dia até o limite de 9,9%)
3 Valor calculado à razão de 1% ao mês, à partir do mês de vencimento.

Contribuinte: Plínio Lima
Descrição do Imóvel: Terreno com área de 361,62m2 situado à Rua Padre Humberto Oenning

Exercício Quantidade de UFM's Valor da UFM Valor Original (R$)1 Atualização Monetária (R$)2 Multa

(R$) 3

Juros (R$) 4 Valor Atual

(R$)

Situação
2004 2,52780 25,90 65,47 13,09 7,78 28,28 114,62 Não Lançado
2005 2,52780 29,12 73,61 4,95 7,78 18,85 105,19 Não Lançado
2006 2,52780 29,93 75,66 2,90 7,78 9,43 95,77 Não Lançado
2007 2,52780 31,08 78,56 0,00  7,78 0,00  86,34 Não Lançado
                 
TOTAL ATUALIZADO DO VALOR NÃO LANÇADO       401,92   
         
1 Valor definido com base no preço do m², de acordo com o zoneamento do imóvel.
2 Valor calculado conforme variação da Unidade Fiscal Municipal.
3 Valor calculado segundo o artigo 2º, da Lei Municipal nº 873/97 (0,33% ao dia até o limite de 9,9%)
4 Valor calculado à razão de 1% ao mês, à partir do mês de vencimento.

A Lei Municipal nº 642/93, que dispõe sobre o Sistema Tributário do Município de Praia Grande, nos seus artigos 205, 228 e 229, assim estabelece:

Art. 205. O imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana – IPTU, tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou por acessão física, localizado na zona urbana do Município.

Parágrafo único – Considera-se ocorrido o fato gerador anualmente, no primeiro dia do mês de janeiro.

(Relatório nº 1.412/2007, de auditoria "in loco" - Citação, item 2.2)

A manifestação dos Srs. Eliseu Lima e João José de Matos, apesar de ter sido protocolada separadamente, apresenta idêntico teor, conforme a seguir transcrito:

Considerações da Instrução:

Os responsáveis alegaram em sua defesa, que não poderiam lançar o IPTU de terrenos que eram de propriedade do próprio Município de Praia Grande, pois ainda que houvesse pendência na transferência formal do domínio, os proprietários já haviam firmado o compromisso de doar gratuitamente ao Município os imóveis.

Conforme discorrido no item 2.1 deste Relatório, as irregularidades originaram-se da imprudência dos gestores em aceitar o imóvel em doação, antecipadamente à transferência efetiva da propriedade do mesmo, edificando o terminal rodoviário no local, sendo que sequer havia sido verificada a titularidade do domínio do doador, e ainda, que se tratavam de dois imóveis de proprietários diferentes.

Cabe ressaltar que ao contrário do que afirmam os responsáveis, o Município não era proprietário dos imóveis até a efetiva incorporação dos mesmos ao patrimônio do Município, até porque, o doador também não tinha a propriedade do imóvel e aguardava a tramitação do processo de usucapião.

A transferência da propriedade somente veio a ocorrer quando do registro das escrituras públicas de doação ou seja, em 20/02/2008 no caso do imóvel matrículado sob nº 3.737 e 09/07/2008 naquele matrículado sob nº 4.283, portanto, até essa data, não há como invocar os arts. 205 e 243 do Código Tributário do Município para eximir a responsabilidade do lançamento e a efetiva arrecadação do IPTU.

Ante ao exposto, fica mantida a restrição em comento.

2.3 - Despesas sem caráter público, com a manutenção de imóvel construído sobre propriedade particular, no montante de R$ 796,55, em descumprimento ao artigo 4° c/c artigo 12, § 1°, da Lei Federal n° 4.320/64

Como já exposto no item 2.1 deste Relatório, a Prefeitura Municipal de Praia Grande construiu o Terminal Rodoviário Municipal sobre terreno não registrado em seu nome.

Analisando-se as despesas dos exercícios de 2005, 2006 e 2007, constatou-se que a Administração vem incorrendo em gastos com as faturas de energia elétrica e consumo de água.

Vale ressaltar que além da edificação ter sido construída em propriedade particular, não se encontra em uso. Desta forma, as despesas a seguir são consideradas sem caráter público, não podendo o orçamento municipal suportá-las:

Credor: CEPRAG - Cooperativa de Eletricidade de Praia Grande
Finalidade: Despesas Empenhadas para fornecimento de Energia Elétrica, na qual consta o medidor n° 451521, cfe. fls. 99 a 123 dos autos
Nota de Empenho Data Valor Nota de Empenho Valor Irregular Mês de Referência
4545 29/09/05 16,05 16,05 09/2005
5228 07/11/05 262,15 16,05 10/2005
5572 30/11/05 362,74 16,05 11/2005
2 02/01/06 63,13 16,05 12/2005
407 24/01/06 250,37 16,05 01/2006
761 20/02/06 203,31 16,05 02/2006
1387 03/04/06 225,24 16,05 03/2006
1849 28/04/06 202,23 16,05 04/2006
2363 24/05/06 16,05 16,05 05/2006
2889 26/06/06 32,10 16,05 06/2006
3256 20/07/06 209,72 16,05 07/2006
3721 24/08/06 32,10 16,05 08/2006
4142 25/09/06 138,57 16,05 09/2006
4536 26/10/06 16,05 16,05 10/2006
5002 01/12/06 251,45 16,05 11/2006
228

08/01/07

698,19

16,05 12/2006
16,05 01/2007
644 23/02/07 430,14 16,05 02/2007
1011 26/03/07 481,50 16,05 03/2007
1451 20/04/07 543,03 16,05 04/2007
TOTAL CEPRAG: 4.434,12 321,00   

Credor: CASAN - Companhia Catarinense de Águas e Saneamento
Finalidade: Despesas Empenhadas para fornecimento de Água, na qual consta o hidrometro n° A96C148575 e matrícula n° 13336576, cfe. fls. 57 dos autos
Nota de Empenho Data Valor Nota de Empenho Valor Irregular Mês de Referência
797 21/02/06 27,89 27,89 02/2006
1349 27/03/06 254,30 83,40 03/2006
1822 28/04/06 27,89 27,89 04/2006
2440 24/05/06 27,89 27,89 05/2006
3023 05/07/06 27,89 27,89 06/2006
3358 26/07/06 27,89 27,89 07/2006
3797 24/08/06 65,89 28,45 08/2006
4192 29/09/06 61,59 28,46 09/2006
4575 01/11/06 64,77 27,89 10/2006
5024 01/12/06 69,26 27,89 11/2006
5204 22/12/06 69,26 27,89 12/2006
507 02/02/07 106,14 27,89 01/2007
732 01/03/07 56,90 28,45 02/2007
1157 26/03/07 142,08 27,89 03/2007
1560 20/04/07 91,72 27,89 04/2007
TOTAL CASAN: 1.121,36 475,55   
       
TOTAL GERAL: 5.555,48 796,55   

(Relatório nº 1.412/2007, de auditoria "in loco" - Citação, item 2.3)

Manifestação do Sr. João José de Matos, em resposta à Citação:

Considerações da Instrução:

O Sr. João José de Matos, alegou em sua defesa que as despesas com água e energia elétrica decorreram da necessidade de preservar a edificação contra possíveis atos de vandalismo, bem como de manutenção e conservação do imóvel.

Entretanto, conforme consta no presente Relatório, a equipe de auditoria encontrou no local sinais visíveis de abandono (sujeira, mato crescendo ao redor e marcas de enchente) e utilização para fins diversos (latas de cerveja vazias), evidenciando a necessidade, mesmo antes da inauguração do terminal, da realização de despesas adicionais para que o local tenha condições de funcionamento.

Sem embargo, todas as despesas decorreram da desídia dos gestores no trato dos recursos públicos, executando obra em terreno particular e por conseguinte, gerando gastos com manutenção da edificação, sem que revertessem em qualquer benefício à sociedade. Dessa forma, as despesas em questão caracterizam prejuízo ao erário, restando mantida a restrição em comento.

CONCLUSÃO

À vista do exposto e considerando a inspeção in loco realizada na Prefeitura Municipal de Praia Grande, entende a Diretoria de Controle dos Municípios - DMU, com fulcro nos artigos 59 e 113 da Constituição do Estado c/c o artigo 1º, inciso III da Lei Complementar n.º 202/2000, que possa o Tribunal Pleno, decidir por:

1 - CONHECER do presente Relatório de Reinstrução, decorrente do Relatório de Inspeção nº 1.412/2007, resultante da inspeção in loco realizada na Prefeitura Municipal de Praia Grande, para, no mérito:

2 - JULGAR IRREGULARES:

2.1 - com débito, na forma do artigo 18, inciso III, alínea "c" c/c o artigo 21 caput da Lei Complementar nº 202/2000, as contas referentes à presente Tomada de Contas Especial e condenar os responsáveis qualificados a seguir, ao pagamento das quantias abaixo relacionadas, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias a contar da publicação do acórdão no Diário Oficial do Estado para comprovar, perante este Tribunal, o recolhimento dos valores dos débitos aos cofres públicos municipais, atualizados monetariamente e acrescidos dos juros legais (artigos 40 e 44 da Lei Complementar n.º 202/2000), calculados a partir da data da ocorrência até a data do recolhimento sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial (artigo 43, II da Lei Complementar n.º 202/2000):

2.1.1 - Sr. Eliseu Lima - Prefeito Municipal de Praia Grande no exercício de 2004, CPF 082.671.469-20, residente à Rua 19 de Julho, 43, Centro, Praia Grande, CEP 88.990-000, responsável pelo seguinte débito:

2.1.1.1 - R$ 114,62 pela ausência de lançamento do IPTU no exercício de 2004, em desacordo ao disposto no art. 30, III, da Constituição Federal, art. 11 da Lei Complementar n° 101/2000 c/c os artigos 205 caput e parágrafo único, 228 e 229, da Lei Municipal nº 642/93 (Código Tributário do Município) (item 2.2, deste Relatório);

2.1.2 - Sr. João José de Matos - Prefeito Municipal de Praia Grande na gestão 2005-2008, CPF 009.941.469-49, residente à Rua Ricardo Inácio, 248, Centro, Praia Grande, responsável pelos seguintes débitos:

2.1.2.1 - R$ 703,45 pela ausência de lançamento do IPTU nos exercícios de 2005, 2006 e 2007, em desacordo ao disposto no art. 30, III, da Constituição Federal, art. 11 da Lei Complementar n° 101/2000 c/c os artigos 205 caput e parágrafo único, 228 e 229, da Lei Municipal nº 642/93 (Código Tributário do Município) (item 2.2, deste Relatório);

2.1.2.2 - R$ 796,55 pelas despesas sem caráter público, com a manutenção de imóvel construído sobre propriedade particular, em descumprimento ao artigo 4° c/c artigo 12, § 1°, da Lei Federal n° 4.320/64 (item 2.3, deste Relatório).

3 - APLICAR multa ao Sr. Eliseu Lima - Prefeito Municipal de Praia Grande no exercício de 2004, CPF 082.671.469-20, residente à Rua 19 de Julho, 43, Centro, Praia Grande, CEP 88.990-000 e ao Sr. João José de Matos - Prefeito Municipal de Praia Grande na gestão 2005-2008, CPF 009.941.469-49, residente à Rua Ricardo Inácio, 248, Centro, Praia Grande conforme previsto no artigo 70 da Lei Complementar nº 202/2000, pelo cometimento da irregularidade abaixo relacionada, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias a contar da publicação do acórdão no Diário Oficial do Estado para comprovar ao Tribunal o recolhimento da multa ao Tesouro do Estado, sem o que fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos artigos 43, II e 71 da Lei Complementar nº 202/2000:

3.1 - (inciso II) Realização de obra pública sem a observância dos requisitos legais, evidenciando descumprimento ao disposto no artigo 83, XXII c/c 121, I, da Lei Orgânica do Município de Praia Grande e artigo 1º, § 1º, da Lei Complementar nº 101/2000 (item 2.1.1);

4 - DAR CIÊNCIA da decisão aos Denunciados Sr. Eliseu Lima e Sr. João José de Matos, e ao Denunciante, Sr. Leonardo Pelegrini Tiscoski.

É o Relatório.

TCE/DMU, em 03/09/2008.

Clóvis Coelho Machado Eduardo Correa Tavares
Auditor Fiscal de Controle Externo Auditor Fiscal de Controle Externo

 
Hemerson José Garcia Marcos André Alves Monteiro
Auditor Fiscal de Controle Externo Auditor Fiscal de Controle Externo

De acordo

EM, 03/09/2008.

Luiz Carlos Wisintainer

Coordenador de Controle

Inspetoria 1

 

TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE SANTA CATARINA

DIRETORIA DE CONTROLE DOS MUNICÍPIOS - DMU

Rua Bulcão Viana, 90, Centro – Florianópolis – Santa Catarina

Fone: (048) 3221 - 3764 Fax: (048) 3221-3730

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PROCESSO TCE 06/00337979
   

UNIDADE

Prefeitura Municipal de Praia Grande
   
ASSUNTO Auditoria "in loco" para apuração de supostas irregularidades denunciadas a este Tribunal, com abrangência aos exercícios de 2004, 2005, 2006 e 2007 - Reinstrução

ÓRGÃO INSTRUTIVO

Parecer - Remessa

Ao Senhor Conselheiro Relator, ouvida a Douta Procuradoria, submetemos à consideração o Processo em epígrafe.

TC/DMU, em 03/09/2008.

GERALDO JOSÉ GOMES

Diretor de Controle dos Municípios


1 Os imóveis localizados no Município de Praia Grande possuem registros em Turvo, Sombrio e Santa Rosa do Sul, segundo informações do Cartório de Registro de Imóveis de Turvo, em decorrência da contemporaneidade dos desmembramentos na região.