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TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO
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Processo n°: |
CON - 08/00558502 |
Origem: |
Prefeitura Municipal de Florianópolis |
Interessado: |
Rubens Carlos Pereira Filho |
RELATOR: |
Conselheiro César Filomeno Fontes |
Assunto: |
Consulta |
Parecer n° |
777/2008 |
Aposentadoria. Fundamento legal. Alteração. Reversão.
A alteração do fundamento legal do ato de aposentadoria requer novo exame de legalidade pelo Tribunal de Contas, sendo lícita a permanência do servidor na inatividade, não se aplicando, ao caso, o instituto da reversão.
Senhor Relator,
RELATÓRIO
O Excelentíssimo Prefeito Municipal de Florianópolis, em exercício, Senhor Rubens Carlos Pereira Filho, vem por meio de expediente recepcionado nesta Corte de Contas em 11 de setembro de 2008, indagar, em síntese, acerca de providências administrativas pertinentes à constatação de possibilidade de alteração do fundamento legal do ato aposentatório quando verificada nova subsunção dos fatos às normas regentes, sem utilizar, preliminarmente, do instituto da reversão, haja vista a cessação da causa que demandou a aposentadoria por invalidez, desobrigando, destarte, o regresso do servidor à ativa.
No caso vertente é apresentada situação em que um servidor aposentado por invalidez tem atestada pela perícia a interrupção do motivo que sustentara a sua inativação, porém, no decurso do tempo da inatividade procedera às contribuições ao regime previdenciário e atingira tempo suficiente para aposentar-se por tempo de serviço.
Por não haver previsão legal no âmbito municipal quanto à alteração dos fundamentos legais do ato de aposentadoria e considerando, ainda, que a indigitada modificação reclama novo exame da legalidade do ato por este Tribunal de Contas, é que surge, por orientação do Secretário Adjunto da Administração, Dr. Sandro Ricardo Fernandes, a necessidade de formulação de consulta a este Tribunal.
PRELIMINARES DE ADMISSIBILIDADE
O Consulente, na condição de Chefe do Poder Executivo Municipal, encontra legitimidade para a subscrição de peças indagativas, por força do disposto no artigo 103, inciso, II, do Regimento Interno.
A matéria objeto da consulta atine à questão dúbia quanto ao devido procedimento administrativo frente a fato de comum ocorrência no seio da administração pública, cuja solução, entretanto, não tem resolução simples, como sói ocorrer com as situações envolvendo previdência pública, por envolver, também, normas adjetivas desta Corte de Contas e entendimento interno especializado das áreas de controle de legalidade das aposentadorias, expostas nas decisões deste Tribunal.
Nesse sentido, considerando, ainda, o proveito que a resolução da perquirição terá frente aos demais jurisdicionados, o quesito pertinente à matéria revela-se, inegavelmente, como da competência do Tribunal de Contas, envolto em interpretação legislativa.
O quesito que respeita ao necessário encaminhamento de parecer jurídico encontra-se parcialmente satisfeito pela manifestação do Senhor Secretário Adjunto, na medida em que, embora não exaustivo, evidencia o grau de dificuldade no enfrentamento da questão, expondo diante da omissão normativa municipal, segundo seu juízo, o ponto nodal da dificuldade que se apresenta.
Assim sendo, entende-se como cumpridos os pressupostos básicos estampados no artigo 104 do Regimento Interno - Res. n° TC-06/2001, de modo a restar autorizado o conhecimento da presente consulta, razão pela qual se passa ao exame do mérito.
DISCUSSÃO
Para a superação do problema ora conjecturado vê-se como medida mais imediata e eficaz a perscrutação de situações constatadas pelo Tribunal de Contas no exame de legalidade de atos de aposentadoria.
Ao verificar que o ato, na forma que se apresenta e com os fundamentos em que se calca, não encontra condições para registro, ao constatar que há a possibilidade de produção de novo ato, considerando o tempo de serviço e contribuição, requisitos estes exigidos concomitantemente ou não, conforme a legislação à época incidente, este Tribunal de Contas orienta a Administração no sentido de adotar modalidade de aposentadoria distinta embasada em diverso fundamento constitucional e legal.
Embora a incumbência constitucional ditada para os Tribunais de Contas, no que toca ao controle dos atos de aposentadoria, cinja-se ao dever de examinar a legalidade e registrar ou não o ato, costumeiramente, cumprindo de certa forma um papel orientativo e de facilitador para os jurisdicionados, esta Corte de Contas tem explicitado em suas decisões a possibilidade de edição de novo ato aposentatório.
Essa atuação de cunho pedagógico encontra amparo inclusive em decisão do Supremo Tribunal Federal, como se verifica no excerto abaixo transcrito, colhido do voto do Ministro Maurício Corrêa, Relator do Mandado de Segurança nº 23.665-5/Distrito Federal, do Supremo Tribunal Federal, in verbis:
7. Como sabido, o ato administrativo de aposentadoria de servidor público federal tem natureza composta, pois embora resulte da manifestação de vontade do órgão ao qual esteja vinculado, depende, para tornar-se exeqüível de forma definitiva, da verificação de sua legalidade pelo TCU, de modo que a concessão de aposentadoria é ato provisório enquanto não aprovado pela Corte de Contas.
8. Assim sendo, tem-se claro que o ato de aposentadoria aperfeiçoa-se em duas etapas, cada uma da competência de ente estatal distinto. Ao órgão junto ao qual o servidor completou os requisitos necessários à inativação incumbe, mediante ato administrativo formal, conceder-lhe a aposentadoria; ao Tribunal de Contas compete ratificá-lo, garantindo-lhe eficácia definitiva ou, se entender presente qualquer ilegalidade, promover diligências destinadas a saná-la, permitindo, assim, seu aperfeiçoamento; ou negar-lhe o registro (CF, artigo 71, incisos III e IX).
9. Não pode a Corte de Contas, porém, ordenar ao órgão fiscalizado que casse ou modifique o ato de aposentadoria, pois para tanto falece-lhe competência. [...]
Como exemplo de deliberações com esse teor traz-se à colação as seguintes decisões:
1. Processo n. SPE - 02/06066996
2. Assunto: Grupo 4 Solicitação de Atos de Pessoal - Aposentadoria
3. Responsáveis: Luiz Carlos Schmidt de Carvalho - ex-Secretário de Estado da Administração
Demétrius Ubiratan Hintz - Presidente do IPESC
4. Órgão: Procuradoria Geral do Estado
O TRIBUNAL PLENO, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro nos arts. 59 da Constituição Estadual e 1° da Lei Complementar n. 202/2000, decide:
6.1. Denegar o registro, nos termos do art. 34, II, c/c o art. 36, §2º, "b", da Lei Complementar n. 202/2000, do ato aposentatório de Heloísa Helena Godinho e Silva, servidora da Procuradoria Geral do Estado, matrícula n. 055.141-4, no cargo de Analista Técnico Administrativo, nível ONS-15-F, CPF n. 063.709.009-82, PASEP n. 10036111799, consubstanciado na Portaria n. 1160/94/SJA, considerado ilegal conforme pareceres emitidos nos autos, em face da contagem de tempo de serviço em inobservância aos arts. 107 e 109 da Lei n. 6745/85 e 34 da Lei n. 1139, de 28/10/92.
6.2. Determinar ao Instituto de Previdência do Estado de Santa Catarina - IPESC a adoção de providências necessárias com vistas ao imediato retorno da Sra. Heloísa Helena Godinho e Silva ao serviço, comunicando-as a este Tribunal no prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação desta Decisão no Diário Oficial do Estado, nos termos do art. 41, caput, do Regimento Interno desta Corte de Contas, sob pena de responsabilidade da autoridade administrativa omissa, ou interponha recurso, conforme previsto no art. 79 da Lei Complementar n. 202/2000.
6.3. Comunicar ao Instituto de Previdência do Estado de Santa Catarina - IPESC sobre a possibilidade da servidora aposentar-se com vigência a contar de 17/04/95, sendo necessário para isso o cancelamento dos efeitos da presente concessão com a edição de novo ato de aposentadoria, tendo em vista que o tempo em que mesma esteve aposentada conta como tempo de serviço para efeito de aposentadoria, nos termos do art. 43, § 1º, II, da Lei n. 6745/85, sendo que a fundamentação legal do ato concessório original poderá ser mantida (arts. 107 e 109, da Lei n. 6745/85).
6.4. Determinar à Diretoria de Controle da Administração Estadual DCE, deste Tribunal, que, após transitada em julgado a decisão, inclua na sua programação de auditorias a averiguação dos procedimentos adotados, pelo IPESC, decorrentes da denegação de registro de que trata o item 6.1 desta deliberação.
6.5. Dar ciência desta Decisão, do Relatório e Voto do Relator que a fundamentam, bem como do Relatório DCE/Insp.5/Div.14 n. 1146/2006, ao Sr. Demétrius Ubiratan Hintz - Presidente do Instituto de Previdência do Estado de Santa Catarina - IPESC, à Secretaria de Estado da Administração, e à Procuradoria-Geral do Estado.
8. Data da Sessão: 07/05/2007 - Ordinária
9. Especificação do quorum:
9.1. Conselheiros presentes: Wilson Rogério Wan-Dall (Presidente - art. 91, I, da LC n. 202/2000), Luiz Roberto Herbst, Moacir Bertoli, Otávio Gilson dos Santos, César Filomeno Fontes, Cleber Muniz Gavi (art. 86, caput, da LC n. 202/2000) e Gerson dos Santos Sicca (art. 86, §1º, da LC n. 202/2000).
10. Representante do Ministério Público junto ao TC: Mauro André Flores Pedrozo.
11. Auditores presentes: Sabrina Nunes Iocken.
WILSON ROGÉRIO WAN-DALL OTÁVIO GILSON DOS SANTOS
Presidente (art. 91, I, da LC n. 202/2000) Relator
Fui presente: MAURO ANDRÉ FLORES PEDROZO
Procurador-Geral Adjunto do Ministério Público junto ao TCE/SC
1. Processo n. SPE - 02/05068308
2. Assunto: Grupo 4 Solicitação de Atos de Pessoal - Aposentadoria
3. Responsáveis: Moacir Sopelsa - ex-Prefeito Municipal de Concórdia
Lucilene Lourdes Dal Prá Lazzarotti - Diretora-Presidente do IPRECON
4. Entidade: Instituto de Previdência Social dos Servidores Públicos do Município de Concórdia
O TRIBUNAL PLENO, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro no art. 59 c/c o art. 113 da Constituição do Estado e no art. 1º da Lei Complementar n. 202/2000, decide:
6.1. Denegar o registro, nos termos do art. 34, II, c/c o art. 36, §2º, "b", da Lei Complementar n. 202/2000, do ato aposentatório de Ervino Ermindo Brinkmann, da Prefeitura Municipal de Concórdia, matrícula n. 4.109/1995, no cargo de Agente Operacional - Pedreiro, nível GS02, CPF n. 195.825.289-15, PASEP n. 10108259932, consubstanciado no Decreto n. 4.109/1995, considerado ilegal conforme pareceres emitidos nos autos, em face da concessão de aposentadoria voluntária em desacordo com a Constituição Federal art. 40, III, "d", em função de averbação de tempo de serviço rural de 11 anos, sem que houvesse comprovação do efetivo recolhimento previdenciário, considerado irregular pelo Tribunal Pleno desta Corte de Contas, por contrariar o disposto no art. 202, § 2º, da Constituição Federal (redação original).
6.2. Determinar ao Instituto de Previdência Social dos Servidores Públicos do Município de Concórdia - IPRECON a adoção de providências necessárias com vistas à anulação do Decreto n. 4.109/95, de 20/12/1995, que concedeu aposentadoria ao servidor Ervino Ermindo Brinkmann. Após anulação, poderá a Unidade manter a modalidade "voluntária por idade", com base no art. 40, III, "d", da Constituição Federal, ou conceder aposentadoria compulsória com base no art. 40, II, da Constituição Federal (com redação dada pela EC n. 20), retroativa a 22/10/2000, mas quaisquer das modalidades devem ser concedidas com proventos proporcionais a 19/35 avos (tempo considerado até 16/12/1998, já excluído o rural). Após, comunicar a este Tribunal de Contas no prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação desta decisão no Diário Oficial do Estado, nos termos do art. 41, caput, da Resolução n. 06/2001 (RI do TCE/SC); ou interpor recurso na forma do art. 79 da Lei Complementar n. 202/2000, sob pena de responsabilidade solidária da autoridade administrativa omissa.
6.3. Determinar à Diretoria de Controle dos Municípios DMU, deste Tribunal, que, após transitada em julgado a decisão, inclua na sua programação de auditorias a averiguação dos procedimentos adotados, pela Prefeitura Municipal de Concórdia, decorrentes da denegação de registro de que trata o item 6.1 desta deliberação.
6.4. Dar ciência desta Decisão, do Relatório e Voto do Relator que a fundamentam, bem como do Relatório DMU n. 188/2007, à Sra. Lucilene Lourdes Dal Prá Lazzarotti - Diretora-Presidente do Instituto de Previdência Social dos Servidores Públicos do Município de Concórdia, e ao Poder Executivo daquele Município.
8. Data da Sessão: 02/04/2007 - Ordinária
9. Especificação do quorum:
9.1. Conselheiros presentes: José Carlos Pacheco (Presidente), Luiz Roberto Herbst, Moacir Bertoli, Salomão Ribas Junior, Otávio Gilson dos Santos e Gerson dos Santos Sicca (art. 86, caput, da LC n. 202/2000).
10. Representante do Ministério Público junto ao TC: Cibelly Farias.
11. Auditores presentes: Cleber Muniz Gavi (Relator) e Sabrina Nunes Iocken.
JOSÉ CARLOS PACHECO LUIZ ROBERTO HERBST
Presidente Relator (art. 91, parágrafo único, da LC n. 202/2000)
Fui presente: CIBELLY FARIAS
Procuradora do Ministério Público junto ao TCE/SC
Tendo como pacífica a possibilidade de edição de novo ato aposentatório, é obrigatório o seu encaminhamento ao Tribunal de Contas para submissão ao controle de legalidade, posto que a alteração do fundamento legal se constitui exatamente no oposto da ressalva constitucional, como se vê na dicção do artigo 59, III, da Constituição do Estado de Santa Catarina:
Art. 59 O controle externo, a cargo da Assembléia Legislativa, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas do Estado, ao qual compete:
III - apreciar, para fins de registro, a legalidade dos atos de admissão de pessoal, a qualquer título, na administração direta e indireta, incluídas as fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, excetuadas as nomeações para cargo de provimento em comissão, bem como a das concessões de aposentadorias, reformas e pensões, ressalvadas as melhorias posteriores que não alterem o fundamento legal do ato concessório;
Para findar os argumentos avalisadores do raciocínio e da prática administrativa apresentada, cita-se prejulgado desta Corte de Contas que trata de situação análoga à trazida em questão, de número 1352, cujo teor é o seguinte:
Constatando a Administração Pública que a moléstia incapacitante para o trabalho, contraída pelo servidor público inativo, era preexistente ao pedido de aposentadoria voluntária, impõe-se a retificação do ato, com efeitos retroativos, para caracterizar a inativação como aposentadoria por invalidez.
Processo: CON-03/00066945
Origem: Prefeitura Municipal de Florianópolis
Relator: Auditor Evângelo Spyros Diamantaras
Data da Sessão: 23/04/2003
Data do Diário Oficial: 23/06/2003
O prejulgado em realce revela, de forma clara, a possibilidade de inovação no ato de aposentadoria quando surge, no curso de sua validade e eficácia, fato que traduz novo enquadramento constitucional e legal na aposentadoria do servidor, sem ignorar, por notório, que a transmutação coligida na consulta dispõe via inversa à exemplificada na decisão em consulta, qual seja: aposentadoria por invalidez para aposentadoria por tempo de serviço.
Ao adentrar no exame da necessidade de proceder-se, preliminarmente, à reversão da aposentaria para posterior inovação do ato aposentatório, há que se afirmar a sua desnecessidade.
O instituto da reversão, conforme disposição doutrinária e estatutária, implica no "retorno à atividade do aposentado por invalidez quando junta médica oficial declarar insubsistentes os seus motivos, ou no interesse da Administração, no caso de aposentadoria voluntária, desde que atendidas as seguintes condições: solicitação do inativo (estável quando na atividade), haja cargo vago e a aposentadoria tenha ocorrido nos cinco anos anteriores à solicitação."1
No caso vertente, tem-se apresentada a situação referente à cessação dos motivos que ensejaram a aposentadoria por invalidez.
A anulação de um ato administrativo pode se dar por conveniência ou oportunidade e tal qual ocorre na seara legislativa, a norma revogadora ao inovar no direito antes estabelecido na norma revogada pode imediatamente ser aplicada, respeitando a coisa julgada, o direito adquirido e o ato jurídico perfeito.
Nessa senda, o novo ato de aposentadoria, ao anular o antigo e firmar uma nova realidade jurídica entre a Administração e o aposentado, ao ser efetivado em continuidade temporal ao ato pretérito, não abre espaço para o retorno do servidor, que se manterá aposentado, sendo, por essa razão, despiciendo o emprego, primeiro, da reversão.
CONCLUSÃO
Transpostos os requisitos essenciais e imperativos para o conhecimento da consulta formulada pelo Senhor Rubens Carlos Pereira Filho, Prefeito em exercício do Município de Florianópolis, sugere-se ao Exmo. Conselheiro que em seu voto, em resposta ao indagado, propugne ao egrégio Plenário o seguinte encaminhamento:
A alteração do fundamento legal do ato de aposentadoria requer novo exame de legalidade pelo Tribunal de Contas, sendo lícita a permanência do servidor na inatividade, não se aplicando, ao caso, o instituto da reversão.
À consideração do Exmo. Sr. Conselheiro César Filomeno Fontes, ouvido preliminarmente o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas.
COG, em 18 de setembro de 2008
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Marcelo Brognoli da Costa Consultor Geral |
1
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administravo Brasileiro. 33a ed. São Paulo, Malheiros, 2007. Pág. 469.