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Processo n°: | CON - 08/00534670 |
Origem: | Prefeitura Municipal de Papanduva |
Interessado: | Humberto Jair Damaso Ribas |
Assunto: | Consulta |
Parecer n° | COG-753/08 |
Declaração de inconstitucionalidade. Incompetência.
A consulta não deve ser conhecida quando a análise da matéria não for da competência do Tribunal de Contas.
Senhor Consultor,
Traslado in verbis o teor da Lei Municipal n° 1126/91, com a redação dada pela Lei Municipal n° 1838/08:
Lei Municipal n° 1126/91
Art. 1º. A prefeitura municipal de Papanduva, poderá conceder, incentivos econômicos e fiscais as empresas que estabeleçam suas atividaeds industriais, comerciais ou prestadoras de serviços, no município, bem como, as já existentes que ampliem sua capacidade de produção, comercialização e demanda de mão-de-obra local.
Art. 2º. Os incentivos econômicos e fiscais a que se refere o artigo primeiro poderão contituir-se isolado ou acumulativamente em: [...]
Lei Municipal n° 1838/08
Art. 1º. O Art. 2° da Lei Municipal n° 1.126, de 15 de julho de 1991, passa a constar e vigorar acrescido dos seguintes parágrafos: [...]
§ 6°. No caso da empresa selecionada ser a proprietária da área de terras, urbana ou rural, o município poderá conceder ou fazer a doação, com encargos e cláusula de reversão, de galpões, pré-moldados ou não, e se descumpridas essas condições pelo proprietário, tanto as edificações físicas, tais como galpões ou outras anexas ou similares, retornarão ao domínio do município, acompanhadas das respectivas áreas de terras, sem que caiba qualquer forma de indenização à empresa.
I - no caso de imóveis rurais, a reversão mencionada neste parágrafo, se dará sobre a área onde foram edificadas as benfeitorias pelo município, na fração mínima de um módulo rural, com servidão de passagem para acesso de veículos e caminhões.
§ 7°. As regras e condições para aplicação do disposto no parágrafo anterior, serão, obrigatoriamente, estabelecidos e dispostos no respectivo contrato, a ser celebrado entre o município e a empresa interessada.
De plano cumpre-nos asseverar que os dispositivos acima transcritos estão em colisão com o que preceitua o Código Civil Brasileiro, uma vez que invertem a regra estatuída no referido diploma, qual seja, o bem acessório segue o principal.
Lei Federal 10.406/02 (Código Civil)
Art. 1.253. Toda construção ou plantação existente em um terreno presume-se feita pelo proprietário e à sua custa, até que se prove o contrário.
Art. 1.255. Aquele que semeia, planta ou edifica em terreno alheio perde, em proveito do proprietário, as sementes, plantas e construções; se procedeu de boa-fé, terá direito a indenização.
Parágrafo único. Se a construção ou a plantação exceder consideravelmente o valor do terreno, aquele que, de boa-fé, plantou ou edificou, adquirirá a propriedade do solo, mediante pagamento da indenização fixada judicialmente, se não houver acordo.
Art. 1.256. Se de ambas as partes houve má-fé, adquirirá o proprietário as sementes, plantas e construções, devendo ressarcir o valor das acessões.
Parágrafo único. Presume-se má-fé no proprietário, quando o trabalho de construção, ou lavoura, se fez em sua presença e sem impugnação sua.
Os dispositivos acima transcritos são muito didáticos. Não existe como o município assumir a propriedade do solo (bem principal) pelo fato de ter construído galpões (bem acessório) em área de particular. Pelas regras do Código Civil Brasileiro o bem acessório é incorporado ao patrimônio do proprietário, pois em regra o acessório segue o principal.
Inexiste a possibilidade da municipalidade tomar a propriedade do terreno e reaver a edificação sem indenizar o proprietário e essa regra é uma exceção, que somente ocorrerá caso presentes as condições do artigo 1255, parágrafo único, da Lei Federal 10.406/02.
Também não se pode confundir os dispositivos da lei local, que estão sob análise, com o instituto jurídico civil do direito real de superfície (arts. 1369 a 1377, do Código Civil e arts. 21 a 24, do Estatuto da Cidade - Lei Federal 10.257/01), até porque não será o município que irá utilizar os galpões e sim o próprio particular, dono do solo.
Sabe-se que a Constituição da República definiu ser da competência privativa da União legislar sobre direito civil (art. 22, I). O Supremo Tribunal Federal (STF) ao analisar Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI), onde levantou-se essa questão assim se pronunciou:
"Normas que cuidam dos institutos da posse, da aquisição de propriedade por decurso do tempo (prescrição aquisitiva) e de títulos legitimadores de propriedade são de Direito Civil, da competência legislativa da União. CF, art. 22, I, II." (ADI 3.438, Rel. Min. Carlos Velloso, julgamento em 19-12-05, DJ de 17-2-06) (grifei)
O Regimento Interno deste Tribunal de Contas - Resolução nº TC-06/2001 - define as formalidades inerentes à consulta:
Deste modo, a seguir será visto se presentes os requisitos de admissibilidade acima mencionados.
3.1. DA COMPETÊNCIA
Prejulgado nº 1179
A apreciação de inconstitucionalidade de artigo de lei municipal, à vista do disposto nos arts. 149 e seguintes do Regimento Interno desta Casa, somente poderá se dar em caso concreto submetido a julgamento pelo Tribunal Pleno.
O art. 37 da Lei Complementar nº 164/99, do Município de Concórdia, está em consonância com o entendimento dado pelo STF à expressão "efetivo exercício em funções de magistério", bem assim com o art. 40, §5º, da Constituição Federal; logo, resta vedada a ampliação de interpretação do referido artigo.
Prejulgado nº 1736
A regulamentação de matéria por lei ordinária, quando deveria ser por lei complementar, viola o princípio do devido processo legislativo, por vício formal, devendo os Poderes constituídos promoverem a regularização pelos meios e instrumentos que lhes são assegurados, inclusive com a proposição de projeto de lei complementar em substituição à lei ordinária, se necessário, respeitando a competência e legitimidade atribuídas por lei.
A afronta à norma da Constituição da República por meio de lei ou ato normativo municipal pode ser contestada no Supremo Tribunal Federal (STF), por intermédio de argüição de descumprimento de preceito fundamental (art. 1º da Lei nº 9.882/99); se afrontar a norma da Constituição Estadual pode ser contestada no Tribunal de Justiça, por meio de representação de inconstitucionalidade (art. 125, § 2º, da Constituição Federal). Não há controle de constitucionalidade de lei ou ato normativo municipal em face da respectiva Lei Orgânica Municipal.
O Poder Judiciário tem jurisdição para apreciar qualquer lesão ou ameaça a direito (art. 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal).
Prejulgado nº 1783
A apreciação de inconstitucionalidade de artigo de lei municipal, à vista do disposto nos arts. 149 e seguintes do Regimento Interno desta Casa, somente poderá se dar em caso concreto submetido a julgamento pelo Tribunal Pleno.
A exigência prevista no inciso II do art. 21 da Lei Federal nº 8.666/93 permanece em vigor no nosso ordenamento jurídico e deve ser cumprida por todos que se subordinam ao referido diploma.
Como não se pode responder ao primeiro questionamento (se a lei municipal é constitucional ou não), ficam prejudicadas as respostas da segunda e terceira perguntas.
3.2. DO OBJETO
A consulta prevista no inciso XII do art. 59 da Constituição do Estado de Santa Catarina, bem como no inciso XV do art. 1º da Lei Estadual Complementar 202/2000, objetiva esclarecer incertezas acerca de interpretação de lei ou questão formulada em tese.
De acordo com as transcrições explicações realizadas nos itens 1, 2 e 3.1, vê-se que a consulta deseja interpretação de lei, motivo pelo qual está preenchido o requisito estabelecido no art. 104, inciso II, do Regimento Interno.
3.3. DA LEGITIMIDADE
O consulente, na condição de Prefeito Municipal de Papanduva, está legitimado a encaminhar consultas de acordo com o disposto no art. 103, II, do Regimento Interno desta Corte. Dessarte, encontra-se preenchido o requisito previsto no art. 104, inciso III, do Regimento Interno.
3.4. DA INDICAÇÃO PRECISA DA DÚVIDA/CONTROVÉSIA
Conforme relatado no item 2 supra, o consulente indicou de forma precisa sua dúvida, o que faz com que o requisito previsto no art. 104, inciso IV do Regimento Interno esteja preenchido.
3.5. DO PARECER DA ASSESSORIA JURÍDICA
Observa-se que a consulta não veio instruída com parecer da assessoria jurídica da entidade consulente, conforme preceitua o art. 104, V, da Resolução n. TC-06/2001 (Regimento Interno do TCE/SC). Contudo, o Tribunal Pleno poderá conhecer da consulta que não atenda a esta formalidade, conforme autoriza o parágrafo 2º do artigo 105 do referido Regimento, cabendo essa ponderação ser efetuada pelo Relator e pelos demais julgadores.
Esclarece-se que o parecer de fs. 03/08 não foi firmado para a presente consulta, bem como foi dado quando a atual norma municipal ainda estava na condição de projeto de lei.
3.6. CONSIDERÇÕES FINAIS ACERCA DA ADMISSIBILIDADE
Ex positis, em razão do não preenchimento dos incisos I e V do artigo 104 da Resolução n. TC-06/2001, sugerimos ao Relator o não conhecimento da consulta.
1. Que o Consulente está legitimado à subscrição de consultas para este Tribunal de Contas, nos termos do inciso II do art. 103 do Regimento Interno desta Corte de Contas, o que atende ao requisito do inciso III do art. 104 da Resolução nº TC-06/2001;
2. Que encontram-se também preenchidos os requisitos dos incisos II e IV do art. 104 da Resolução nº TC-06/2001;
3. Que ao Tribunal de Contas do Estado, em sede de consultas, não tem competência para declarar inconstitucionais dispositivos de lei municipal, razão pela qual o requisito previsto no art. 104, inciso I, do Regimento Interno não se encontra preenchido;
4. Que apesar de não vir instruída com parecer da assessoria jurídica do órgão ou entidade consulente, conforme preceitua o art. 104, inciso V, da Resolução n. TC-06/2001 (Regimento Interno do TCE/SC), o Tribunal Pleno poderá conhecer de consulta que não atenda a esta formalidade, conforme autoriza o parágrafo 2º do artigo 105 do referido Regimento, cabendo essa ponderação ao Relator e aos demais julgadores;
Sugere-se ao Exmo. Conselheiro Moacir Bertoli que submeta voto ao Egrégio Plenário sobre consulta formulada pelo Prefeito Municipal de Papanduva, Sr. Humberto Jair Damaso Ribas, nos termos deste parecer, que em síntese propõe:
1. Não conhecer da Consulta, por deixar de atender aos requisitos dos artigos 59, XII, da Constituição do Estado de Santa Catarina; 1º, XV, da Lei Estadual Complementar 202/2000 e 104, I e V, do Regimento Interno do Tribunal;
COG, em 3 de setembro de 2008.
GUILHERME DA COSTA SPERRY
Coordenador de Consultas
DE ACORDO.
À consideração do Exmo. Sr. Conselheiro Moacir Bertoli, ouvido preliminarmente o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas.
COG, em 22 de setembro de 2008.
HAMILTON HOBUS HOEMKE Consultor Geral, em exercício |