ESTADO DE SANTA CATARINA
    TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO
    CONSULTORIA GERAL

Processo n°: CON - 08/00483901
Origem: Prefeitura Municipal de Gaspar
Interessado: Adilson Luis Schmitt
Assunto: Consulta
Parecer n° COG - 670/08

Entidade subvencionada. Licitação. Prejulgado 1241.

Em havendo precedente sobre o assunto objeto da consulta, deve-se remeter cópia do respectivo prejulgado ao consulente.

Administrador público. Poder regulamentar.

O Poder regulamentar da Administração não pode impor obrigações não previstas em lei.

Tomada de contas especial. Atos ilegais e antieconômicos.

A tomada de contas especial deve ser instaurada pelo Administrador Público sempre que praticado qualquer ato ilegal, ilegítimo ou antieconômico pelas entidades subvencionadas.

Senhor Consultor,

Trata-se de Consulta protocolizada em 05 de agosto de 2008 neste Tribunal de Contas pelo Prefeito Municipal de Gaspar, Sr. Adilson Luis Schmitt, relativa à utilização de recursos públicos por entidades privadas subvencionadas pelo município, formulada nos seguintes termos:

É o relatório.

2. PRELIMINARES DE ADMISSIBILIDADE

O Regimento Interno deste Tribunal de Contas - Resolução nº TC-06/2001 - define as formalidades inerentes à consulta:

Art. 104 - A consulta deverá revestir-se das seguintes formalidades:

I - referir-se à matéria de competência do Tribunal;

II - versar sobre interpretação de lei ou questão formulada em tese;

III - ser subscrita por autoridade competente;

IV - conter indicação precisa da dúvida ou controvérsia suscitada;

V - ser instruída com parecer da assessoria jurídica do órgão ou entidade consulente, se existente.

Art. 105 - A consulta dirigida ao Tribunal de Contas será encaminhada ao órgão competente para verificação dos requisitos de admissibilidade, autuação e instrução dos autos.

§ 1º - O Tribunal de Contas não conhecerá as consultas que não se revestirem das formalidades previstas nos incisos I, II e III do artigo anterior.

2.1 DA COMPETÊNCIA

Quando o Município concede subvenções sociais a entidades que tenham seus objetivos sociais voltados à promoção de assistência social, médica, educacional ou cultural, não se torna mantenedor da referida entidade, assim como não há possibilidade de que o mesmo venha a ser condenado de forma solidária em demandas trabalhistas movidas contra a entidade beneficiária. Caso obedecidas às formalidades legais relativas à concessão de subvenções sociais, não se vislumbra a possibilidade de responsabilização do Prefeito Municipal por ações trabalhistas movidas por empregados da entidade contra esta.

2.2 DO OBJETO

Foi a decisão nº 1555/2007, exarada no processo CON-07/00021345, em sessão plenária de 11 de junho de 2007, que modificou o entendimento do Tribunal Pleno para não conhecer consultas envolvendo situações cotidianas de fácil resolução.

O Relator do Processo, Auditor Gerson dos Santos Sicca, proferiu o seguinte voto aprovado pelo Plenário:

O Consulente, na condição de Prefeito do Município de Gaspar, está legitimado a encaminhar consultas de acordo com o disposto no art. 103, II, do Regimento Interno desta Corte, motivo pelo qual o requisito previsto no art. 104, inciso III, encontra-se preenchido.

2.4 DA INDICAÇÃO PRECISA DA DÚVIDA/CONTROVÉRSIA

Conforme relatado acima, o Consulente indicou de forma precisa sua dúvida, o que faz com que o requisito previsto no art. 104, inciso IV, do Regimento Interno esteja preenchido.

2.5 DO PARECER DA ASSESSORIA JURÍDICA

A Consulta não veio instruída com parecer da assessoria jurídica da entidade consulente.

Dessa forma, o requisito previsto no art. 104, inciso V, não está preenchido, contudo, por força do que dispõe o § 2º do art. 105, ambos do Regimento Interno, o Tribunal Pleno poderá conhecer de consulta que não atenda a esta formalidade, cabendo essa ponderação ao Relator e aos demais julgadores.

3. MÉRITO DA CONSULTA

Antes de adentarmos especificamente nas respostas aos questionamentos do consulente, interessante explicitar o que seja subvenção social. Para tanto, iremos nos valer dos ensinamentos emanados pelo parecer COG - 735/05, cujo teor transcrevo parcialmente in verbis:

[...]

Dentro da doutrina pátria, é possível conceituarmos teoricamente o convênio como sendo "um instrumento jurídico de acordo ou ajuste na qual as partes - instituições com ou sem fins lucrativos, governamentais e não governamentais - são envolvidas para realização de objetivos de interesses comuns e, principalmente, que resultem obrigatoriamente em benefícios de interesse comum." (Daniel Arruda, Política Pública, Publicações, p.7).

O Tribunal de Contas da União, através da Secretaria-Geral de Controle Externo em edição do texto "Convênios: principais informações para Municípios", define convênios como "(...) acordos firmados por entidades públicas de qualquer espécie, ou entre estas e organizações particulares, para a realização de objetivos de interesse comum dos partícipes."

Podemos ainda completar numa maneira simplista que o termo convênio consiste no compromisso firmado entre órgãos do governo, ou entre um desses, que se compromete a repassar certa quantia de recursos do orçamento público, e um outro órgão do seu mesmo nível de administração, ou organização particular sem fins lucrativos, que se comprometem a realizar ações combinadas de interesse mútuo mas com fins de atender interesse público e, posteriormente, prestar contas do que foi feito.

De outra forma, o convênio público é o instrumento que disciplina a transferência de recursos dos cofres públicos para entes não-governamentais, e que tem como partícipe fundamental e indispensável um órgão da administração pública, que esteja gerindo recursos do Orçamento Público, visando à execução de programas, projetos ou eventos de interesse recíproco e de cunho público, em regime de mútua cooperação.

Após a breve análise sobre os convênios, cumpre-nos examinar o aspecto referente às subvenções sociais, os auxílios e contribuições, que são o objeto primordial da consulta suscitada.

É possível dizer que as subvenções representam um dos meios que a administração pública utiliza para intervir econômica e financeiramente em áreas estratégicas de interesse do governo, transferindo recursos previstos no orçamento para entidade sociais, econômicas ou mesmo públicas, visando a dois objetivos básicos junto a essas entidades: o primeiro ao financiamento de suas atividades normais (manutenção, custeio e operações - Subvenções) e o segundo à realização de investimentos (criação de bens de capital - Auxílios), ora sem qualquer exigência de retorno de bens, direitos ou capital, ora com retorno sob a forma de direito de propriedade sobre os investimentos realizados.

São através desses elementos que a administração pública se utiliza, na maioria dos casos, para operacionalizar as transferências de recursos, previstos no orçamento, para as entidades conveniadas. É fundamental aqui destacar que essas entidades beneficiadas através de tais transferências não devem ter fins lucrativos, para não afrontar normas de execução orçamentária que vetam esta prática.

Doutrinariamente, o autor anteriormente citado, afirma:

Abordando a conceituação sob a égide da Lei Federal nº 4.320/64 que estatui normas de direito financeiro para a elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal, temos:

a) Subvenções: fazem parte das transferências correntes, considerando-as como as destinadas a atender à manutenção de outras entidades de direito público ou privado, especificando a sua destinação para cobrir despesas de custeio dos entes beneficiados.

A mesma Lei classifica as subvenções em dois grupos:

1. Subvenções Sociais - aquelas que se destinam a instituições públicas ou privadas de caráter assistencial ou cultural, sem finalidade lucrativa e

2. Subvenções Econômicas - as que se destinam a empresas públicas ou privadas de caráter industrial, comercial, agrícola ou pastoril.

Dessa forma, de imediato, deduz-se que as subvenções visam atender, através de transferência de recursos dos cofres públicos, às despesas de custeio ou manutenção operacional das entidades de natureza filantrópica sem fins lucrativos, quando caberá as ditas subvenções sociais, e a empresas públicas de direito privado que têm como objetivo de lucro sendo, neste caso, utilizadas as subvenções econômicas. Aqui reside a principal diferença entre as subvenções sociais e as econômicas.

As subvenções sociais especificamente compreendem uma forma de incentivo financeiro do "Estado" em áreas de serviços essenciais de assistência social, cultural e educacional, tendo como premissa o princípio da economicidade, uma vez que a suplementação financeira de instituições privadas, através de subvenção, deve visar à economia de recursos públicos desde que a sua intervenção direta nessas áreas geraria maiores dispêndios.

[...]

Em decorrência, podemos definir que as contribuições são transferências correntes ou de capital, previstas na lei orçamentária ou especial, concedidas por entes governamentais a autarquias e fundações e a entidades sem fins lucrativos e que os auxílios são transferências utilizadas pela administração pública para promover investimento e inversões financeiras às entidades beneficiadas, sejam elas públicas ou privadas.

[...]

Verificada a matéria a nível conceitual, depreende-se que o Poder Público, ao construir um cenário incorporado em sua política pública, deve levar em conta variáveis econômicas, tecnológicas, político-legais, demográficas, geográficas, culturais e sociológicas.

A inserção do instrumento do convênio público nesse contexto, representa a forma juridicamente adequada às realidades regionais, de maneira a atingir níveis superiores de qualidade na prestação de serviços públicos, bem como de eficiência na utilização dos recursos humanos, financeiros e materiais. Esse instrumento jurídico do direito administrativo funciona, assim, como forma de compatibilização das ações da Administração com participação ativa da sociedade organizada.

É certo que os órgão de controle, dentre eles o Tribunal de Contas, não devem perder de vista o efetivo atendimento do objeto no exame das prestações de contas dos recursos transferidos ao setor privado. Se é certo que a forma e os meios de execução são fundamentais para assegurar a regularidade na aplicação dos recursos e o atendimento aos princípios constitucionais norteadores da Administração Pública, também é fundamental que o objetivo pretendido com a destinação de recursos públicos para o setor privado seja encaminhado para gerar desenvolvimento e benefícios destinados à comunidade.

[...]

3.1. Questões nº 1 e 2:

O primeiro questionamento foi formulado nos seguintes termos:

O segundo questionamento possui o seguinte teor:

Sobre a matéria, este Tribunal de Contas já se manifestou no sentido não estarem sujeitas à lei de licitações as entidades de direito privado subvencionadas pelo Poder Público, quando da aplicação dos recursos públicos, nos seguintes termos:

No mesmo sentido, o Parecer COG 89/07, que instruiu o processo REC 02/01745194 (Decisão 767/07):

As entidades privadas sem fins lucrativos e que atuam de forma independente da administração, quando subvencionadas pelo Executivo têm o dever de prestar contas dos valores repassados, mas não estão sujeitas à Lei Federal 8.666/93 quando da aplicação dos recursos financeiros recebidos do Poder Público.

O município não pode exigir das entidades subvencionadas três orçamentos para compras acima de certo valor, pois o princípio da legalidade assegura ao particular, nos termos do artigo 5º, inciso II, da Constituição Federal, o direito de não ser obrigado a fazer ou deixar de fazer senão em virtude de lei.

O art. 5º, inciso II, da Constituição Federal in verbis:

Nesse sentido, Maria Sylvia Zanella Di Pietro2, ao comentar o poder regulamentar da Administração, ensina que o ato normativo exarado pelo administrador público não pode contrariar a lei, criar direitos, impor obrigações e penalidades nela previstos, sob pena de ofensa ao princípio da legalidade, nos seguintes termos:

Desse modo, tendo em vista os limites do poder regulamentar da Administração acima vistos, o município não pode exigir das entidades subvencionadas três orçamentos para compras acima de certo valor, dado que não há previsão legal respaldando o ato.

As disposições do art. 116, da Lei Federal 8.666/93 são aplicáveis aos órgãos e entidades da administração pública. Como trata-se de entidade privada sem fins lucrativos não há impedimento que o fornecedor seja sempre o mesmo, desde que os valores pagos e comprovados documentalmente sejam compatíveis com os de mercado. A verificação de prática irregular, quando da prestação de contas da entidade subvencionada, enseja a instauração de Tomada de Contas Especial.

Ao ser verificada a ocorrência de atos ilegais ou antieconômicos, o Administrador deverá proceder à tomada de contas especial da entidade subvencionada, nos termos do 10, da Lei Orgânica deste Tribunal de Contas, que possui a seguinte redação:

A instauração e o encaminhamento da Tomada de Contas Especial deverá observar os procedimentos estabelecidos pela Instrução Normativa nº 03/2007.

3.2. Questão nº 7:

Eis a indagação de número 7:

Da sua redação, depreende-se que o consulente deseja saber se o pagamento dos salários dos funcionários de entidade sem fins lucrativos podem ser pagos com os recursos da subvenção repassada pelo município. A resposta é positiva. Vejamos os precedentes desta Corte de Contas:

Prejulgado nº 613

É regular e legítimo que entidade de direito privado comprove a aplicação de recursos financeiros recebidos a título de subvenções sociais, também com documentos (recibos, notas fiscais, folha de pagamento, guia de encargos sociais e de tributos, entre outros), cuja data de emissão seja anterior a do recebimento dos valores conveniados, mas coincidente com o período de vigência do acordo e desde que posterior à extração da nota de empenho respectiva. Na hipótese da associação civil ter desembolsado antecipadamente dinheiro seu para realizar gastos vinculados ao convênio (constatada a precedente emissão da nota de empenho pelo órgão ou entidade pública), o uso dos comprovantes destas despesas, no processo regular de prestação de contas, permitirá a conseqüente devolução aos cofres da associação dos valores que lhe pertencem; deverá, porém, ficar claramente evidenciado a que dispêndios se refere cada valor transposto da conta bancária vinculada ao convênio para a conta própria da associação. (grifei)

Quando da aplicação de recursos, recebidos a título de subvenções sociais, pode a associação civil conveniada pagar, através de um só cheque nominal, despesas relativas a diversas notas fiscais emitidas por uma mesma empresa comercial. As notas fiscais de mesmo credor, cujos valores integram o montante de despesas a ser pago com apenas um só cheque nominal, deverão ser adequadamente identificadas.

A oposição de declaração formal, datada e assinada por pessoa competente, no documento comprobatório da despesa a que se refere o art. 44, inc. VII, da Res. nº TC-16/94, tem por fim confirmar o controle de que realmente se efetivou o recebimento do material comprado, ou a prestação do serviço contratado, e que alguém assumiu a função de assim verificar e reconhecer, respondendo pelo ato; não é exigido o uso da palavra "certifico" como única forma de ser atestado o recebimento do objeto contratual; importa que fique expresso, de forma indubitável, ter sido aceito o material ou o serviço, independentemente das expressões usadas.

Prejulgado nº 1211

O prejulgado nº 1241, anteriormente citado, também dispõe que as subvenções visam cobrir as despesas de custeio das entidades recebedoras de dinheiro público.

4. CONCLUSÃO

Em consonância com o acima exposto e considerando:


1 CHACON, Paulo Eduardo de Figueiredo. O princípio da segurança jurídica . Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 118, 30 out. 2003. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4318>. Acesso em: 20 ago. 2008.

2 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 20ª. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 81.