ESTADO DE SANTA CATARINA
    TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO
    CONSULTORIA GERAL

Processo n°: REC - 07/00128301
Origem: Companhia Águas de Joinville
RESPONSÁVEL: Henrique Chiste Neto
Assunto: (Reexame - art. 80 da LC 202/2000) - DIL - 05/04187260
Parecer n° COG - 826/08

Recurso de Reexame. Administrativo. Dispensa de Licitação. Superfaturamento. Justificativa de Preço.

O superfaturamento se caracteriza pelo prática de preço abusivo decorrente de uma elevação injustificada para a execução de uma certa prestação.

A contratação de serviço pelo mesmo preço praticado pelo prestador a dois anos para outra entidade da administração não caracteriza ausência de justificativa de preço, ou pressupõe em prática de preço fora do preço de mercado.

Senhor Consultor,

RELATÓRIO

Tratam os autos de manifestação recursal interposta contra a Decisão nº 2565/2007, prolatado no Processo DIL - 05/04187260, proferido na sessão ordinária do dia 11/12/2006, publicado no Diário Oficial do Estado do dia 08/03/2007. As razões recursais firmadas pelo Diretor-Presidente da Companhia Águas de Joinville, Senhor Henrique Chiste Neto, autuados nesta Corte de Contas como Recurso de Reexame, protocolo nº 006864 de 09/04/2007, com o objetivo de ver modificada a decisão proferida na forma a seguir transcrita:

ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro nos arts. 59 da Constituição Estadual e 1° da Lei Complementar n. 202/2000, em:

6.1. Conhecer da Dispensa de Licitação n. 022/2005 (e Contrato n. 025/2005 decorrente), encaminhados pela Companhia Águas de Joinville, cujo objeto é a contratação de empresa de gerenciamento para montar e gerir o cadastro comercial dos usuários do sistema de águas e esgoto, com valor máximo previsto de R$ 2.610.756,00, para considerar irregulares, com fundamento no art. 36, § 2º, alínea "a", da Lei Complementar n. 202/00, os atos analisados.

6.2. Aplicar ao Sr. Henrique Chiste Neto - Presidente da Companhia Águas de Joinville, CPF n. 541.663.308-53, com fundamento no art. 70, II, da Lei Complementar n. 202/2000 c/c o art. 109, II, do Regimento Interno, a multa no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais), em face da não-comprovação da justificativa dos preços praticados quando da Dispensa de Licitação n. 022/2005 (e Contrato n. 025/2005 decorrente), contrariando o disposto no art. 26, parágrafo único, inciso III, c/c art. 25, § 2º, da Lei Federal n. 8.666/93 (item 2.2 do Relatório DCE), fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial do Estado, para comprovar ao Tribunal o recolhimento da multa ao Tesouro do Estado, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts. 43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000.

6.3. Recomendar à Companhia Águas de Joinville que adote providências visando à quebra do monopólio da empresa Raiz Soluções e Informática Ltda.

6.4. Dar ciência desta Decisão, do Relatório e Voto do Relator que a fundamentam, bem como do Relatório de Instrução DCE/ECO n. 200/2006, ao Sr. Henrique Chiste Neto - Presidente da Companhia Águas de Joinville.

Este é o relatório.

PRELIMINARES DE ADMISSIBILIDADE.

O recurso foi autuado pela Secretária Geral desta Corte de Contas como sendo Recurso de Reexame, a teor do disposto nos artigos 79 e 80 da Lei Complementar 202/2000, em face da Decisão recorrida ter sido proferido em processo de fiscalização de registros contábeis e execução orçamentária.

Os dispositivos de Lei que regulam o procedimento assim determinam:

Art. 79. De decisão proferida em processos de fiscalização de ato e contrato e de atos sujeitos a registro, cabem Recurso de Reexame e Embargos de Declaração.

Art. 80. O Recurso de Reexame, com efeito suspensivo, poderá ser interposto uma só vez por escrito, pelo responsável, interessado, ou pelo Ministério Público junto ao Tribunal, dentro do prazo de trinta dias contados a partir da publicação da decisão no Diário Oficial do Estado.

No que tange aos pressupostos de admissibilidade da peça recursal, considerando o princípio da ampla defesa, o recorrente é parte legítima para o manejo do recurso na modalidade de Reexame, tendo proposto o recurso tempestivamente, considerando-se que o acórdão recorrido foi publicado no Diário Oficial no dia 08/03/2007, quinta feira, e a manifestação recursal foi protocolada nessa Corte de Contas no dia 09/04/2007, segunda feira.

Uma vez presente os pressupostos para a admissibilidade do recurso sugere-se o seu conhecimento.

DISCUSSÃO.

O recorrente busca afastar a multa que lhe foi aplicada no item 6.2 do Acórdão 2565/2006, decorrente do entendimento de que na Dispensa de Licitação n. 022/2005, não foi comprovado a justificativa dos preços praticados, fato que segundo a tese esposada contraria o disposto no artigo 26, parágrafo único, inciso III, c/c art. 25, § 2º , da Lei Federal n. 8.666/93, remetendo as justificativas contida no item 2.2 do Relatório DCE.

Argumenta o recorrente em preliminar a improcedência da utilização do art. 25, § 2º , da Lei Federal nº 8.666/93 como fundamento para a imposição da multa aplicada.

Oportuno a transcrição do dispositivo legal mencionado para a análise da preliminar suscitada:

Art. 25. É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição em especial:

§ 2º Na hipótese deste artigo em qualquer dos casos de dispensa, se comprovado superfaturamento, respondem solidariamente pelo dano causado à Fazenda Pública o fornecedor ou o prestador de serviços e o agente público responsável, sem prejuízo de outras sanções legais cabíveis.

Merece amparo a preliminar suscitada pelo recorrente, uma vez que a multa decorre da não comprovação da justificativa dos preços praticados, não tratando portanto de superfaturamento, que é o que trata o dispositivo legal em questão.

Além do mais, expresso está no dispositivo suscitado que necessário se faz a comprovação do superfaturamento, o que não é o caso dos autos do processo de conhecimento.

Não existe na análise da Diretoria Técnica um levantamento dos preços de mercado do serviço prestado, assim, diante da ausência de parâmetro, não há que se falar de superfaturamento, que na dicção do professor Marçal Justen Filho1 entende-se:

Nessa acepção é que se deve entender a expressão "superfaturmento", contida no art. 25, § 2º. O superfaturamento não se caracteriza nem como preço "falso" nem como um lucro excessivo, mas como uma elevação injustificada do valor para execução de uma certa prestação. Se o particular pratica certos preços, que lhe asseguram lucro elevado, não se caracteriza um superfaturamento se propuser preço equivalente para contratar com o Estado. O problema reside então, na prática abusiva prejudicial ao Estado, consistente na alteração das condições usuais de negócio e na oneração injustificada dos cofres públicos. (grifamos).

Discorrendo sobre o tema, tem-se então que o superfaturamento origina-se quando o particular pelo simples fato de estar contratando com a administração eleva os preços usualmente praticado em seu negócio de forma abusiva, injustificada buscando oneração prejudicial ao erário.

Não se observa tal ocorrência na descrição feita pela Diretoria de Controle em seu relatório de instrução uma vez que se reconhece que o preço contratado é o mesmo praticado pelo prestador do serviço a mais de dois anos, cobrado da Prefeitura Municipal de Joinville.

Portanto, entende-se procedente a preliminar, o que leva a correção da decisão proferida no Acórdão 2565/2006, uma vez que o dispositivo não é aplicável aos fatos que conduziram a aplicação da multa.

No tocante ao mérito o recorrente busca afastar a multa aplicada afirmando em suas razões recursais dentre outras coisas que os preços pagos pelos serviços eram os mesmos anteriormente praticados pela empresa quando em serviço com a Prefeitura Municipal de Joinville.

Destaca-se da argumentação trazida pelo recorrente o que segue:

Quanto à ausência da "Justificativa do Preço", prevista no art. 26, III, da Lei Federal nº 8.666/93, utilizada com razão e fundamento para a imputação da multa de R$ 3.000,00 (três mil reais) ao peticionário, entendermos deve esse Tribunal de contas levar em consideração o seguinte:

[...]

b) os preços praticados para a Companhia Águas de Joinville, através da Dispensa de Licitação nº 022/2005 e Contrato nº 025/2005 eram os mesmos pagos pela Prefeitura Municipal de Joinville e pela própria companhia, em razão do contrato anteriormente existente;

[...]

Visando se assegurar da procedência dos preços ofertados pela empresa Raiz Soluções e Informática Ltda, a Companhia buscou informações referenciais, constatando a especificidade do mercado na oferta de tais serviços, face a complexidade das atividades a serem desenvolvidas. Ainda assim conseguiu a obtenção de proposta da empresa ATLANTIS Obras e Serviços Ltda (documentos anexos), onde fica demonstrado que os preços praticados pela empresa Raiz Soluções e Informática Ltda. é consentâneo com aqueles praticados no mercado.

Assim, por entender que os preços praticados pela empresa Raiz soluções e Informática Ltda eram razoáveis, pois refletiam aqueles praticados no mercado e correspondiam àqueles praticados pela própria empresa em contratos de mesma natureza, foi aceita a proposta e contratada a empresa para a prestação dos serviços do Contrato nº 025/2005.

Para melhor situar a análise em questão vejamos o que registra o item 2.2 do Relatório DCE, que serviu de base para a decisão guerreada:

Conforme as justificativas apresentadas pela Companhia de águas de Joinville (sic) com relação ao preço praticado fl. 66, a mesma alega que "desde 2004 a empresa apresenta o mesmo preço, não sofrendo qualquer tipo de reajuste ou modificação".

O que se deve observar neste caso, é o fato de que a informática tem se tornado cada dia mais acessível, com preços cada vez mais baixos e competitivos. O fato da empresa Raiz Soluções e Informática estarem praticando o mesmo preço há 2 anos, não quer dizer que este seja o melhor preço.

Outro aspecto levantado para justificar o preço cobrado, é o fato de "o preço apresentado na proposta comercial ser compatível com o princípio da razoabilidade e, pois perfeitamente adequado ao preço de mercado".

A análise aqui deve ser a respeito da necessidade de se fazer uma pesquisa de mercado para saber de fato qual o melhor preço e conseqüentemente averiguar qual é o preço de mercado para, daí sim concluir se o preço que a empresa Raiz Soluções e Informática está cobrando está de acordo com o que o mercado de fato apresenta.

Da análise dos documentos constantes dos autos do processo de conhecimento verifica-se as folhas 84/92, o contrato de prestação de serviço que enseja a aplicação da multa, onde o objeto do contrato, expressa na cláusula primeira o que segue:

CLÁUSULA PRIMEIRA - OBJETO DO CONTRATO.

O objeto do presente contrato é a contratação de empresa de gerenciamento para montar e gerir o cadastro comercial dos usuários do sistema de água e esgoto da CONTRATANTE, compreendendo: cadastramento, as medições de consumo de água e respectivo faturamento, a arrecadação, o atendimento ao cliente e o gerenciamento destas atividades, como segue:

1.1 - Serviços de Cadastro

Cadastramento, recadastramento e respectivas atualizações de todos os clientes no sistema Gerencial de Informações, com a coleta e respectiva inserção de informações abrangendo: nome, endereço, localização, dados da ligação de água ou esgoto, dados para faturamento.

1.2 - Faturamento

O sistema de faturamento abrange desde a leitura do hidrômetro até a emissão e entrega da fatura ao cliente.

1.3 - Arrecadação

Este sistema compreende o gerenciamento dos valores faturados e respectiva cobrança. Para sua implementação, inicialmente, serão providênciados e cadastros de agências bancárias e argentes arrecadadores. (sic)

1.4 - Atendimento

O atendimento ao público será pessoal e por telefone, com implantação gradual de atendimento via internete, tendo como objetivo cadastrar solicitações de ligações novas, alterações de dados cadastrais e reclamações quanto ao serviço e/ou faturamento.

1.5 - Gerenciamento de Serviços

Cabe ao sistema comercial, através do sistema de atendimento o cadastramento de todas as solicitações de serviços efetuadas tanto por cliente externo como clientes internos. Os serviços são cadastrados através de códigos previamente definidos, onde estão determinadas todas as suas particularidades tais como: preço, forma de pagamento, prazo para execução, prioridade.

Ainda, o contrato na cláusula oitava, quando trata da responsabilidade da contratada, no item 8.6 estabelece que os serviços compreendem:

a) leitura de hidrômetro e entrega de faturas;

b) encaminhamento dos dados de leitura para rede bancária;

c) Emissão de fatura de água e esgoto;

d) Conciliação bancária;

e) Administração e gestão do cadastro comercial. com envio quinzenal de backup à Companhia Águas de Joinville;

f) Guarda, manutenção e processamento de dados dos setores comerciais;

g) Atendimento ao público (balcão/telefone);

h) Fazer a interface entre a área comercial e a operacional do sistema (ordens de serviço/baixa/cobrança);

i) Administração e gestão do cadastro físico (técnico) do sistema;

j) fornecimento/aluguel do software para processamento;

k) Fornecimento quinzenal de backup da massa de dados cadastrais e de leitura do sistema;

l) Fornecimento de rede e equipamento de informática para execução dos serviços;

m) Sistema de telefonia.

A instrução ao sustentar a justificativa da aplicação da multa em seu relatório afirma que o fato de a empresa contratada estar praticando o preço de dois anos passados, não justifica uma vez que os serviços de informáticas tem-se tornado cada dia mais acessível pela evolução tecnológica.

No entanto pode-se verificar facilmente que o contrato não se restringe tão somente a serviços de informática, conforme aventa a instrução em sua análise, mas também emprega mão-de-obra de pessoal para a feitura por exemplo da leitura e do atendimento ao público, sendo o reajustamento dos salários um premissa inafastável com o passar dos tempos, o que leva a concluir que o preço praticado a dois anos não se constitui em um preço fora do mercado.

Ademais informa o recorrente na fase recursal juntando documentos, que buscou à época informações referenciais no tocante ao preço do mercado, obtendo de uma terceira empresa preços que demonstraram que a oferta da empresa contratada condizia com o preço praticado no mercado.

Desta forma, reconhecendo-se que o preço contratado era o mesmo praticado pelo prestador do serviço a dois anos atrás, quando o serviço era prestado para a Prefeitura Municipal de Joinville; e ficando configurado que não se trata se serviço exclusivamente de informática mas que envolve outros parâmetros, o que afasta a conjectura da análise feita pela Diretoria Técnica quanto a possibilidade do custo do serviço ser menor e conseqüentemente haver diminuição do preço praticado; não se vislumbra a existência de superfaturamento assim como não se vislumbra a ausência de justificativa de preço, em razão de o preço contratado ser o mesmo pago anteriormente pela administração municipal.

sugere-se assim, o cancelamento da multa aplicada.

CONCLUSÃO

Ante o exposto, sugere-se ao relator que em seu Voto propugne ao Pleno para:

1) Conhecer do Recurso de Reexame, nos termos do art. 80 da Lei Complementar nº 202/2000, interposto contra o Acórdão 2565/2006, proferido na Sessão Ordinária do dia 11/12/2006, no Processo DIL - 05/04187260, e, no mérito, dar-lhe provimento para:

1.1) Cancelar a multa constante do item 6.2. do Acórdão 2565/2006;

1.2) Dar nova redação ao item 6.1 conforme segue:

6.1. Conhecer da Dispensa de Licitação n. 022/2005 (e Contrato n. 025/2005 decorrente), encaminhados pela Companhia Águas de Joinville, cujo objeto é a contratação de empresa de gerenciamento para montar e gerir o cadastro comercial dos usuários do sistema de águas e esgoto, com valor máximo previsto de R$ 2.610.756,00, para considerar regulares, com fundamento no art. 36, § 2º, alínea "a", da Lei Complementar n. 202/00, os atos analisados

2) Manter na íntegra os demais termos do acórdão recorrido.

3) Dar ciência desta Decisão, bem como do Parecer e Voto que a fundamentam ao Sr. Henrique Chiste Neto, Diretor-Presidente da Companhia Águas de Joinville, bem como a entidade auditada.

  HAMILTON HOBUS HOEMKE

Consultor Geral em Exercício


1 FILHO. Marçal Justen. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. Malheiros. São Paulo. 2005. p. 295/296.