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Processo n°: | TCE - TC008210180 |
Origem: | Prefeitura Municipal de Pomerode |
Interessado: | |
Assunto: | Tomada de Contas Especial referente ao PROC.TC- 965650090 |
Parecer n° | COG - 958/08 |
Tomada de contas especial. Ação de improbidade. Independência entre as instâncias.
Senhor Consultor,
Tratam os autos de tomada de contas especial, originária do processo DEN - TC008210180, a respeito da ocorrência de desvio de verba pública na Prefeitura Municipal de Pomerode.
Em consonância com a instrução realizada (relatório DEA-019/99, fls. 232/247), o Exmo. Relator manifestou-se no sentido de julgar irregulares as contas, com imputação de débito e aplicação de multas, o que foi acolhido pelo Tribunal Pleno, conforme Acórdão n. 102/99 (fls. 267/268).
Mediante Recurso de Reconsideração (REC-TC965650090), houve a anulação do referido acórdão, com a conversão do processo em Tomada de Contas Especial, conforme decisão plenária n. 0874/2002.
Em cumprimento à decisão n. 0874/2002, houve a instauração da presente Tomada de Contas Especial, com elaboração de informação pela Diretoria de Atividades Especiais (n. 31/2007, fls. 354-355), juntada aos autos de cópia do processo - Ação Civil Pública n. 050.00.000324-7 (fls. 358-2838), e a elaboração de relatório final pela Diretoria Técnica (n. 038/2008, fls. 2846-2851).
Em seu relatório final, a Diretoria Técnica sugeriu o arquivamento do presente processo, sem apreciação do mérito.
O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas manifestou-se às fls. 2853-2856.
Ato contínuo, o Exmo. Conselheiro Relator, Luiz Roberto Herbst, mediante despacho de fls. 2857-2859, determinou a remessa dos autos a esta Consultoria Geral para análise e parecer jurídico sobre a matéria.
Eis o sucinto relatório.
II. MÉRITO
O julgamento, em matéria de tomada de contas especiais, é privativo dos Tribunais de Contas. Não pode ser delegado, transferido ou diminuído por lei ou qualquer ato normativo, nem mesmo regimental, das próprias Cortes. Desse modo, na Tomada de Contas Especial, a decisão que imputar débito e/ou multa terá força de título executivo, nos termos do artigo 70, §3º, da Constituição da República.
Não se pode olvidar que a TCE tem objetivo mais amplo do que a simples reparação do dano, pois, "diversamente da responsabilidade civil, a responsabilidade administrativa perante o Controle Externo exercido pelo Tribunal de Contas não se limita à recomposição do dano causado ao erário (patrimonial). Os tribunais de contas formulam juízo acerca da gestão dos responsáveis por bens e valores públicos, podendo condenar em débito e aplicar àqueles que praticaram irregularidades sanções de natureza pecuniária e restritivas de direitos que encontram paralelo na esfera penal."1
Igualmente, vale lembrar o reflexo decorrente do julgamento pela irregularidade das contas na seara dos direitos políticos, que torna inelegível, conforme artigo 1º, I, g, da LC n. 64/90, "os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável e por decisão irrecorrível do órgão competente".
A propósito, acórdão do e. Tribunal Regional Eleitoral Catarinense, ementado nos seguintes termos:
RECURSO - REGISTRO DE CANDIDATURA - IMPUGNAÇÃO - TOMADA DE CONTAS ESPECIAL - CONTAS JULGADAS IRREGULARES PELO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO - DANO AO ERÁRIO - DECISÃO IRRECORRÍVEL - INELEGIBILIDADE - ART. 1o, I, "g", DA LEI COMPLEMENTAR N. 64/1990 - PROVIMENTO.
A decisão irrecorrível proferida pelo Tribunal de Contas do Estado que, por tomada de contas especial, julga irregulares as contas de Prefeito Municipal, em razão de conteúdo ilegítimo e insanável, autoriza a incidência da inelegibilidade prevista no art. 1o, I, "g". da Lei Complementar n. 64/1990, ainda que coexista aprovação recomendada pela Câmara Municipal. (grifo nosso)
A condição de inelegibilidade prevalece, mesmo que se recomponha o erário e proceda-se a quitação da multa imposta, nos autos da tomada de contas especial. (TRE-SC. Recurso Eleitoral n. 148, Acórdão n. 22392, Sessão do dia 13/08/2008, Relator Juiz Volnei Celso Tomazini).
Assim, o fato de haver decisão judicial determinando o ressarcimento do débito causado ao erário, em ação civil de improbidade administrativa, não retira a competência constitucional do Tribunal de Contas para apreciar as contas públicas. Na análise de qualquer ato da administração, poderão os Tribunais de Contas e o Poder Judiciário atuar concomitantemente, cada qual no exercício de sua competência.
A respeito, oportuno transcrever excertos do Voto proferido pelo Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais, Antônio Carlos Andrada:
Dessa forma, o arquivamento da presente Tomada de Contas Especial só poderia ocorrer no caso de absolvição na esfera penal por inexistência de fato ou negativa de autoria, conforme preceituam os artigos 66 e 67 do Código de Processo Penal e artigo 935 do Código Civil, a seguir transcritos:
Ademais, a Suprema Corte se pronunciou a respeito, no sentido de que o ajuizamento de ação de improbidade não retira do Tribunal de Contas da União a competência para, no âmbito do processo próprio de Tomada de Contas Especial, apurar indício de dano ao erário, conforme se infere da ementa a seguir transcrita:
Quanto ao aspecto da possibilidade de ocorrência de bis in idem, caso haja a condenação de reparar o dano tanto na esfera judicial (ação civil pública de improbidade) quanto em decisão proferida por este Tribunal de Contas, vem a calhar as observações de Mônica Nicida Garcia3:
Que a existência de decisão judicial determinando o ressarcimento do débito causado ao erário, em ação civil de improbidade administrativa, não retira a competência constitucional do Tribunal de Contas para apreciar as contas públicas;
Que o arquivamento da presente Tomada de Contas Especial só poderia ocorrer no caso de absolvição na esfera penal por inexistência de fato ou negativa de autoria, conforme preceituam os artigos 66 e 67 do Código de Processo Penal e artigo 935 do Código Civil;
Consultor Geral 2
Processo n. 703753, TCE/MG, sessão realizada em 11/9/2007, Relator Conselheiro Antônio Carlos Andrada. Disponível em: www.antoniocarlosandrada.com.br/adm_v3/UPLOAD/image/File/703753representaonv24-0815HORAS.pdf 3
Op.cit., p. 302.
2Primeiramente, o constituinte pátrio, ao estabelecer no texto constitucional as competências exclusivas das Cortes de Contas, mormente no art. 71 da CR/88, o fez no sentido de que essas atribuições não poderiam e não podem ser mitigadas pelo legislador infraconstitucional. Nessa esteira, a autonomia constitucional atribuída aos Tribunais de Contas não conflita com a inafastabilidade da tutela jurisdicional prevista no art. 5º, XXXV à medida que ao analisar um edital de licitação, por exemplo, o Tribunal de Contas o faz sob ótica própria, em razão de sua estrutura técnica multidisciplinar, podendo, com isso, focar-se inclusive em questões que não se cingem meramente ao aspecto de conformação do ato ao ordenamento jurídico. Por isso é que se afigura perfeitamente possível que tramitem concomitantemente uma representação, uma tomada de contas especial ou um processo administrativo no âmbito desta Casa e um Mandado de Segurança, ação civil pública ou ação de improbidade no Poder Judiciário idôneos a questionar matérias de conteúdo análogo em ambas as Casas como, por exemplo, um Edital de Licitação. (grifo nosso)
Art. 66. Não obstante a sentença absolutória no juízo criminal, a ação civil poderá ser proposta quando não tiver sido, categoricamente, reconhecida a inexistência material do fato.
Art. 67. Não impedirão igualmente a propositura da ação civil:
I - o despacho de arquivamento do inquérito ou das peças de informação;
II - a decisão que julgar extinta a punibilidade;
III - a sentença absolutória que decidir que o fato imputado não constitui crime.
Art. 935, CC. A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal.
EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA. TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. COMPETÊNCIA. ART.71, II, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL E ART. 5º, II E VIII, DA LEI N. 8.443/92. TOMADA DE CONTAS ESPECIAL. VIOLAÇÃO AOS ARTS. 148 A 182 DA LEI 8.112/90. INOCORRÊNCIA. PROCEDIMENTO DISCIPLINADO NA LEI N. 8.443/92. AJUIZAMENTO DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PREJUDICIALMENTE DA TOMADA DE CONTAS ESPECIAL. IMPOSSIBILIDADE. INDEPENDÊNCIA ENTRE AS INSTÂNCIAS CIVIL, PENAL E ADMINISTRATIVA. QUESTÃO FÁTICA. DILAÇÃO PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. SEGURANÇA DENEGADA.
1. A competência do Tribunal de Contas da União para julgar contas abrange todos quantos derem causa a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte dano ao erário, devendo ser aplicadas aos responsáveis, em caso de ilegalidade de despesa ou irregularidade de contas, as sanções previstas em lei, que estabelecerá, entre outras cominações, multa proporcional ao dano causado aos cofres públicos [art. 71,II, da CR/88 e art. 5º, II e VIII, da Lei n.º 8.443/92].
2. A tomada de contas especial não consubstancia procedimento administrativo disciplinar. Tem por escopo a defesa da coisa pública, buscando o ressarcimento do dano causado ao erário. Precedente [MS n.º 24.961, Relator o Ministro Carlos Velloso, DJ 04.03.2005].
3. Não se impõe a observância, pelo TCU, do disposto nos artigos 148 a 182 da Lei n.º 8.112/90, já que o procedimento da tomada de contas especial está disciplinado na Lei n.º 8.443/92.
4. O ajuizamento de ação civil pública não retira a competência do Tribunal de Contas da União para instaurar a tomada de contas especial e condenar o responsável a ressarcir ao erário os valores indevidamente percebidos. Independência entre as instâncias civil, administrativa e penal. (grifo nosso)
[...]
(STF. Mandado de Segurança n. 25880/DF Relator Ministro Eros Grau. Decisão em 07/02/2007, DJ publicado em 16/03/2007)
A solução, em casos como tais, haverá que ser encontrada na fase de execução. Vale dizer, apenas uma das sanções impostas (desde que sejam iguais, evidentemente) deverá ser executada, devendo a outra execução ser oportunamente julgada extinta por já ter sido cumprida. Parece ser nesta fase de execução que se torna aplicável o princípio do non bis in idem.
[...] Caberá ao agente público multissancionado invocar em sua defesa o cumprimento, em outra esfera, de sanção que lhe for imposta e estiver sendo executada em uma determinada esfera. (grifo nosso)
No caso dos presentes autos, o fato de haver sentença judicial em ação civil pública condenando os agentes públicos ao ressarcimento do débito ao erário, sobre os mesmos fatos analisados pelo Tribunal de Contas em sede de Tomada de Contas Especial, não retira a competência constitucional desta Corte para exercer o controle externo da Administração Pública, a qual, frise-se, é indelegável.
Portanto, somente na fase executiva, em caso de haver o ressarcimento do débito em outro processo, poderá se tornar inexigível o título executivo proveniente da decisão do Tribunal de Contas, no tocante à imputação de débito, pois as demais sanções eventualmente aplicadas manterão a eficácia executiva.
III. CONCLUSÃO
Em consonância com o acima exposto e considerando:
Que a possibilidade de ocorrência de bis in idem, no que concerne ao ressarcimento do débito ao erário, deve ser resolvida eventual fase de execução do título executivo constituído em decisão desta Corte de Contas.
É o parecer pelo prosseguimento do presente processo, com o ulterior julgamento do mérito da Tomada de Contas Especial em análise.
COG, em 18 de novembro de 2008.
De Acordo. Em ____/____/____
Coordenadora de Consultas em Exercício
À consideração do Exmo. Sr. Conselheiro Luiz Roberto Herbst, ouvido preliminarmente o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas.
COG, em de de 2008.
MARCELO BROGNOLI DA COSTA
1
CAVALCANTE, Shirley Gildene Brito. Analista de Controle Externo do TCU. Material disponibilizado no Curso sobre Matriz de Responsabilização TURMA II, realizado neste Tribunal de Contas, em 17-21/nov/2008.