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Processo n°: | REC - 08/00466144 |
Origem: | Departamento Estadual de Infra-Estrutura - DEINFRA |
RECORRENTE: | Romualdo Theophanes de França Júnior |
Assunto: | Referente ao processo - ARC-05/04086820 |
Parecer n° | COG-68/09 |
RECURSO DE REEXAME. CONHECER. PRELIMINAR DE INCONSTITUCIONALIDADE DE LEI ESTADUAL.
COMPETÊNCIA LEGISLATIVA PRIVATIVA. UNIÃO. TRÂNSITO.
A competência legislativa privativa da União para legislar sobre trânsito só pode ser exercida pelos Estados-membros quando expressamente autorizada em lei complementar.
Senhor Consultor,
Trata-se de Recurso de Reexame, interposto pelo Sr. Romualdo Theophanes de França Júnior, Presidente do Departamento Estadual de Infra-estrutura - DEINFRA, contra Acórdão nº 913/2008, proferido pelo Tribunal Pleno desta Corte de Contas, em sessão do dia 11 de junho de 2008, nos autos do processo nº ARC - 05/04086820 (fls.4622 e 4623).
Resumidamente, o Acórdão sob exame aplicou duas multas ao Recorrente, a saber:
Os autos já foram submetidos ao exame desta Consultoria Geral, que se pronunciou através do Parecer COG-599/2008 (fls. 199/220), elaborado pelo Auditor Fiscal de Controle Externo Murilo Ribeiro de Freitas, onde concluiu pelo conhecimento do recurso e, no mérito, manifestou-se pelo não provimento.
A ementa do Parecer COG-599/2008 foi lavrada nos seguintes termos:
Os autos foram remetidos ao Ministério Público Junto ao Tribunal de Contas - MPTC, que oficiou ao Recorrente para colacionar novas razões recursais (fls. 221).
Atendendo ao ofício do MPTC, o Recorrente apresentou justificativas e juntou documentos (fls. 223/236).
Sobreveio a manifestação do MPTC no sentido de cancelar as multas aplicadas pelo Acórdão recorrido (fls. 238/240).
Nas fls. 241/244 o Recorrente juntou novos documentos, alegando o que segue:
Os autos foram conclusos ao Relator que, no despacho de fls. 246, determinou a remessa do feito à Consultoria Geral para análise da extinção do processo em face da publicação da Lei Estadual nº 14.608/09.
II. MÉRITO
A Lei Estadual nº 14.608/09 estabelece as definições, as atividades e os procedimentos concernentes à engenharia de tráfego e à engenharia de campo voltadas ao Sistema Rodoviário do Estado de Santa Catarina.
De acordo com o art. 1º, a Lei Estadual nº 14.608/09 regulamenta o art. 320 do Código de Trânsito Brasileiro (Lei nº 9.503/97) que determina: "A receita arrecadada com a cobrança das multas de trânsito será aplicada, exclusivamente, em sinalização, engenharia de tráfego, de campo, policiamento, fiscalização e educação de trânsito".
Ou seja, trata-se claramente de matéria relativa a trânsito, cujo regulamento, em âmbito nacional, está consolidado na Resolução CONTRAN nº 191, de 16 de fevereiro de 20062
Ao elaborar a Lei Estadual nº 14.608/09, o Estado de Santa Catarina desrespeitou a repartição de competências federativas previstas no texto constitucional, pois invadiu a competência legislativa privativa da União, consoante o disposto no art. 22, XI da Lei Maior: "Compete privativamente à União legislar sobre:... XI trânsito e transporte;...".
Nas hipóteses previstas no art. 22, os Estados só podem legislar quando autorizados por lei complementar específica, conforme prevê o parágrafo único deste artigo: "Lei complementar poderá autorizar os Estados a legislar sobre questões específicas das matérias relacionadas neste artigo".3 Trata-se aqui da possibilidade dos Estados exercerem a chamada competência delegada, acerca da qual nos ensina Bulos.
A exigência de lei complementar autorizando os Estados a legislar sobre questões específicas das matérias relacionadas no art. 22 é corroborada pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.
No entendimento da Suprema Corte, a inconstitucionalidade das lei estaduais que regulam matéria de trânsito é pacífica.
Diante do exposto, sugere-se ao Conselheiro Relator que requeira ao Presidente do Tribunal a argüição de inconstitucionalidade da Lei Estadual nº 14.608/09 (Regimento Interno, arts. 149 e 1508 e Súmula 347 STF9).
Em face da pronúncia de inconstitucionalidade, dois desdobramentos são possíveis:
1) a Lei Estadual nº 14.608/09 ser considerada inconstitucional, negando seu cumprimento: nesse caso, acompanha-se a manifestação esposada no Parecer COG-599/2008 (fls. 199/220);
2) a Lei Estadual nº 14.608/09 ser considerada constitucional: nessa hipótese, pondera-se:
O Parecer COG-599/2008 registrou nas fls. 206:
Em sua essência, a restrição baseia-se no custeio serviços de acompanhamento, conservação e manutenção de rodovia (tapas buracos, recuperação de asfalto danificado, sinalização, roçadas, patrolamento, limpeza e recuperação), exatamente os mesmos definidos no art. 4º, incisos IV, V, VI, X e XI (da Lei Estadual nº 14.608/09), como procedimentos executivos compreendidos pela engenharia de campo.
Por isso, se a Lei Estadual nº 14.608/09 for considerada constitucional, o recurso deve ser provido.
Ante o exposto, sugere-se ao Exmo. Sr. Conselheiro Relator do processo que em seu Voto proponha ao Egrégio Plenário o que segue:
1 Preliminarmente: requerer ao Presidente do Tribunal a argüição de inconstitucionalidade da Lei Estadual nº 14.608/09 (Regimento Interno, arts. 149 e 150);
2 No mérito:
2.1 Considerada a inconstitucionalidade da Lei Estadual nº 14.608/09, conhecer e negar provimento ao recurso, nos termos do Parecer COG-599/2008 (fls. 199/220);
2.2 Considerada a constitucionalidade da Lei Estadual nº 14.608/09: conhecer e prover o recurso, em face da convalidação legislativa do ato irregular.
3. Dar ciência deste Acórdão, do relatório e voto que o fundamentam, bem como deste Parecer COG, ao Sr. Romualdo Theophanes de França Júnior, Presidente do Departamento Estadual de Infra-estrutura e ao Departamento Estadual de Infra-estrutura.
Consultor Geral 2
Citada no Parecer COG-599/2008, fls. 218 e 219. 3
Como exemplo de aplicação do disposto no parágrafo único do art. 22, CF/88, colaciona-se a Lei Complementar 103/00, que autorizou os Estados e o Distrito Federal a instituir o piso salarial a que se refere o inciso V do art. 7o da Constituição Federal: Art. 1o Os Estados e o Distrito Federal ficam autorizados a instituir, mediante lei de iniciativa do Poder Executivo, o piso salarial de que trata o inciso V do art. 7o da Constituição Federal para os empregados que não tenham piso salarial definido em lei federal, convenção ou acordo coletivo de trabalho. § 1o A autorização de que trata este artigo não poderá ser exercida: I no segundo semestre do ano em que se verificar eleição para os cargos de Governador dos Estados e do Distrito Federal e de Deputados Estaduais e Distritais; II em relação à remuneração de servidores públicos municipais. § 2o O piso salarial a que se refere o caput poderá ser estendido aos empregados domésticos. Art. 2o Esta Lei Complementar entra em vigor na data de sua publicação. 4
BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 769.
5
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 215.325. Relator: Ministro Moreira Alves. Brasília, DF, 17 de junho de 2002. Disponível em: <http://www.stf.jus.brA União Federal, dentro do seu juízo discricionário, pode delegar, por meio de lei complementar, assuntos de sua competência legislativa privativa aos Estados-membros. Para tanto, deve-se observar o seguinte:
.5 (grifo nosso)O Plenário desta Corte, ao julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 2.101, declarou a inconstitucionalidade de Lei estadual que tornava obrigatória a notificação pessoal dos motoristas pela não-utilização de cinto de segurança, por cuidar ela de matéria específica de trânsito, invadindo competência exclusiva da União, salientando, ainda, que, enquanto não editada a lei complementar prevista no parágrafo único do artigo 22 da Carta Federal, não pode o Estado legislar sobre trânsito. Em sentido análogo, o julgamento da ADI 874-MC
, rel. Min. Maurício Corrêa eÉ pacífico nesta Corte o entendimento de que o trânsito é matéria cuja competência legislativa é atribuída, privativamente, à União, conforme reza o art. 22, XI, da Constituição Federal. Precedentes: ADI 2.064
Lei 11.824, de 14.08.2002, do Estado do Rio Grande do Sul. Inconstitucionalidade. O disciplinamento da colocação de barreiras eletrônicas para aferir a velocidade de veículos, por inserir-se na matéria trânsito, é de competência exclusiva da União (art. 22, XI, da CF/1988).7
A presente restrição aponta que houve utilização imprópria de recursos provenientes de multas de trânsito, para fins de pagamento de despesas com serviços de conservação e manutenção rodoviária, no valor de R$ 1.157.227,73. Assim, em relação à utilização dos recursos arrecadados de multas por infrações de trânsito, o E. Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, em decisões em consultas (prejulgados), entende que os recursos arrecadados devem ser aplicados de acordo com as determinações e objetivos do art. 320 do Código de Trânsito Brasileiro.
Assim, na ARC-05/04086820, a área técnica relacionou algumas despesas que foram consideradas irregulares, pois foram pagas com recursos arrecadados com a aplicação de multas, quais sejam: custeio de serviços de acompanhamento, conservação e manutenção de rodovia (tapas buracos, recuperação de asfalto danificado, sinalização, roçadas, patrolamento, limpeza e recuperação) (fl. 4464 da ARC-05/04086820).
Destarte, não podem os recursos ser utilizados para construção, recuperação ou manutenção de obras viárias, pagamento de remuneração de mão de obra terceirizada, aluguel de imóveis destinados às delegacias, pagamento de fatura de telefone, seguro de imóveis etc, senão vejamos: (grifos do autor)
III. CONCLUSÃO
COG, em 19 de fevereiro de 2009.
CLAUTON SILVA RUPERTI
De Acordo. Em ____/____/____
DE ACORDO.
À consideração do Exmo. Sr. Conselheiro Salomão Ribas Júnior, ouvido preliminarmente o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas.
COG, em de de 2009.
MARCELO BROGNOLI DA COSTA
1
SANTA CATARINA. Assembléia Legislativa do Estado de Santa Catarina. Disponível em:www.alesc.sc.gov.br. Acesso em: 19 fevereiro 2009. DO: 18.521, de 07/01/09.
6 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3254. Relatora: Ministra Ellen Gracie. Brasília, DF, 16 de novembro de 2005. Disponível em: <http://www.stf.jus.br>. Acesso em: 20 fev. 2009.
7 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2718. Relator: Ministro Joaquim Barbosa. Brasília, DF, 06 de abril de 2005. Disponível em: <http://www.stf.jus.br>. Acesso em: 20 fev. 2009.
8 R.I. Art. 149. O Tribunal de Contas, no exercício de suas atribuições, poderá pronunciar-se sobre inconstitucionalidade das leis e dos atos do Poder Público. Art. 150. O Presidente do Tribunal, por sua iniciativa ou a requerimento de Conselheiro ou do Procurador-Geral do Ministério Público junto ao Tribunal, verificada a inconstitucionalidade de lei ou ato do Poder Público que esteja sob a jurisdição do Tribunal, poderá argüí-la e remetê-la ao Tribunal Pleno, para que este, preliminarmente, se pronuncie sobre a matéria.
9 Supremo Tribunal Federal. Súmula 347.O TRIBUNAL DE CONTAS, NO EXERCÍCIO DE SUAS ATRIBUIÇÕES, PODE APRECIAR A CONSTITUCIONALIDADE DAS LEIS E DOS ATOS DO PODER PÚBLICO.