ESTADO DE SANTA CATARINA
    TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO
    CONSULTORIA GERAL

Processo n°: CON - 09/00073870
Origem: Prefeitura Municipal de Caçador
Interessado: Saulo Sperotto
Assunto: Consulta
Parecer n° COG - 112/09

Servidor. Cessão. Cargo em comissão.

Senhor Consultor,

RELATÓRIO

Eis o breve relatório.

2. PRELIMINARES DE ADMISSIBILIDADE

Prefacialmente, necessário analisar as formalidades inerentes às consultas, definidas no artigo 104 do Regimento Interno desta Corte de Contas, in verbis:

Art. 104 - A consulta deverá revestir-se das seguintes formalidades:

I - referir-se à matéria de competência do Tribunal;

II - versar sobre interpretação de lei ou questão formulada em tese;

III - ser subscrita por autoridade competente;

IV - conter indicação precisa da dúvida ou controvérsia suscitada;

V - ser instruída com parecer da assessoria jurídica do órgão ou entidade consulente, se existente.

2.1. Da competência

2.2. Do objeto

A consulta prevista no inciso XII do art. 59 da Constituição do Estado de Santa Catarina, bem como no inciso XV do art. 1º da Lei Estadual Complementar n. 202/2000, objetiva esclarecer incertezas acerca de interpretação de lei ou questão formulada em tese.

Da análise dos autos verificou-se que a dúvida formulada relaciona-se à cessão de servidores municipais para exercício de cargo de direção no Instituto de Previdência Social dos Servidores Públicos Municipais de Caçador.

Assim, os questionamentos apresentados pelo Consulente possuem natureza interpretativa, bem como foram formulados em tese, razões pelas quais está preenchido o requisito previsto no art. 104, inciso II, do Regimento Interno.

Impende registrar que a resposta oferecida em processo de consulta não constitui prejulgamento de fato ou caso concreto, mas apenas prejulgamento de tese apresentada pelo Consulente.1

2.3. Da legitimidade

Nesse contexto, no tocante à legitimidade, verifica-se que o Consulente, na qualidade de Prefeito do Município de Caçador, detém legitimidade para o encaminhamento de peças indagativas a esta Corte de Contas.

2.4. Da INDICAÇÃO PRECISA DA DÚVIDA/CONTROVÉrSIA

Conforme relatado acima, o Consulente indicou de forma precisa sua dúvida, o que faz com que o requisito previsto no art. 104, inciso IV, do Regimento Interno esteja preenchido.

2.5. Do parecer da assessoria jurídica

Verifica-se que a consulta veio instruída com parecer da assessoria jurídica da entidade consulente (fls. 04-05), motivo pelo qual restou preenchido o requisito previsto no art. 104, inciso V, do Regimento Interno.

2.6. Do exame dos pressupostos de admissibilidade

Por conseguinte, sugerimos ao Exmo. Relator o conhecimento da presente consulta.

3. MÉRITO

Segundo Antônio Flávio de Oliveira, "a cessão de servidores indica o ato pelo qual, temporariamente, um determinado órgão cede servidor do seu quadro para prestar serviço em outra esfera de governo ou órgão, no intuito de colaboração entre as administrações."4

É preciso ressaltar que a cessão somente é possível se houver lei autorizativa, se referir somente a servidores efetivos e desde que fundamentada na finalidade da Administração. É o que se extrai do prejulgado n. 423 desta Corte:

Quanto à legislação do Ente Consulente, verifica-se que o ESTATUTO DOS SERVIDORES PÚBLICOS CIVIS DO MUNICÍPIO DE CAÇADOR - Lei Complementar Municipal n. 56/2004 - prevê a possibilidade de cessão como forma de afastamento de servidor efetivo para exercício em outro órgão ou ente, consoante o disposto no artigo 31, parágrafo único. Vejamos:

A seguir, o artigo 75 da referida LC 56/04 estabelece:

A análise da legislação supra permite perfeitamente afirmar que a hipótese de afastamento de servidores efetivos municipais para exercício dos cargos de diretor presidente e diretor administrativo na autarquia previdenciária municipal de Caçador preenche as características de cessão.

É preciso observar que em razão da natureza precária e transitória do ato de cessão, não há falar em vacância do cargo de origem. Portanto, o cargo do servidor não pode ser ocupado mediante nomeação de um novo servidor, contudo, outro servidor cujo cargo possua ou permita a assunção das atribuições antes exercidas pelo servidor cedido poderá, a critério da Administração, por mera designação ou relotação, suprir a falta decorrente do afastamento temporário daquele.

Assim, com o afastamento do servidor efetivo para ter exercício em outro órgão ou ente público, é possível a sua substituição por outro servidor efetivo capacitado e habilitado para o exercício das funções inerentes ao seu cargo ou do serviço por ele prestado, enquanto durar o afastamento.5

Ora, de acordo com o ordenamento legal vigente, a execução das funções típicas e permanentes da Administração Pública deve ser efetivada, em regra, por servidores de seu quadro de pessoal, ocupantes de cargos de provimento efetivo ou comissionado, estes destinados exclusivamente ao desempenho de funções de direção, chefia ou assessoramento, conforme as disposições do art. 37, II e V, da Constituição Federal.6

Excepcionalmente, a Administração poderá utilizar da contratação temporária de pessoal, prevista no inciso IX do artigo 37 da Constituição da República7. Porém, só é lícita e constitucional quando objetiva o atendimento de demanda temporária e de excepcional interesse público do Ente que contrata.

Nesse contexto, a substituição de servidor mediante contratação temporária somente é cabível caso caracterizada a necessidade temporária de excepcional interesse público, "mediante o atendimento, entre outros, dos seguintes requisitos: I - autorização para contratação através de lei municipal específica; II - fixação das funções que podem ser objeto de contratação, com limitação de vagas; III - hipóteses em que a contratação poderá ser efetivada; IV - fixação da remuneração; V - regime jurídico do contrato (especial); VI - definição do prazo máximo de contratação e a possibilidade de prorrogação ou não; VII - carga horária de trabalho; VIII - vinculação dos contratados ao Regime Geral de Previdência Social (INSS); IX - condições para contratação; X - forma e condições de realização de processo de seleção pública, previamente à contratação." (item 8 do Prejulgado 1853)

No mesmo sentido, prejulgado n. 1927:

          [...]
    Igualmente, oportuno transcrever excertos do estudo feito pelo Auditor Fiscal de Controle Externo Evaldo Ramos Moritz, consubstanciado no parecer COG n. 722/08, nos autos do processo de consulta CON 08/00526490:
          Outra ressalva, trata-se da necessidade temporária de excepcional interesse público, de acordo com o preceituado no art. 37, IX, a seguir transcrito:
          "Art. 37 - A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
          [...]
          IX - a lei estabelecerá os casos de contratação por prazo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público".
          Analisando tal enunciado, ele é bastante preciso ao admitir a contratação por prazo determinado, de modo que a mesma somente deve ser permitida quando for para suprir a ausência de servidor concursado, como por exemplo, em casos de férias, licenças ou outros motivos de força maior e quando houver necessidade da ampliação na prestação do serviço público, mas não existir servidor concursado para o cargo. Mesmo assim, o contrato não poderá ser de prazo longo, pois a Administração Publica estará obrigada a abrir o competitório de seleção (concurso público).
          [...]
          Imperioso assinalar, então, que apenas com a superveniência de lei regulamentadora determinado ente da Federação poderá implementar a contratação temporária sem concurso público. No caso da União, essa lei já foi editada, qual seja, a de nº 8.745/1993, que estabelece precisos critérios para a realização de contratação temporária, exigindo, entre outros requisitos, áreas pré-definidas, período limitativo e necessidade de processo seletivo simplificado.
          Além de edição de lei autorizativa, é fundamental, ainda, verificar, em um caso concreto de contratação, aquilo que a própria Constituição denomina de necessidade temporária de excepcional interesse público. A expressão é de nítida clareza, não deixando dúvidas de que uma eventual contratação temporária obrigatoriamente deve-se dar apenas em casos excepcionais em que uma possível demora cause danos ao interesse público ou, mais especificamente, ao princípio da continuidade do serviço público. Há, contudo, que se ter em conta que a necessidade excepcional não pode ter sido gerada pela inércia do administrador público, ou seja, é princípio norteador da Administração o planejamento, devendo os órgãos e entidades públicas adequar as suas projeções de contratação de pessoal às necessidades do serviço e à disponibilidade orçamentária.
          Pesquisando nas bases jurisprudenciais do Supremo Tribunal Federal, encontramos entendimentos sobre a interpretação do art. 37 da CF, posicionamentos estes dos próprios Ministros da Corte Suprema, apresentados em ações diretas de inconstitucionalidade (ADI), como por exemplo:
          A ADI nº 2.987 ajuizada contra a Lei nº 9.186, de 1993, do Estado de Santa Catarina, quando de seu julgamento em 2004, firmou o precedente de que é inconstitucional o comando legal que se utilize do preceito do art. 37, IX, da Carta Política, para possibilitar a admissão de servidores para funções burocráticas ordinárias e para funções permanentes durante longo prazo.
          No caso da lei de nosso Estado, segundo o parecer da Advocacia Geral da União, as atividades relativas às contratações eram permanentes, de modo que deveriam ser exercidas por servidores públicos concursados.
          O voto do relator, Ministro Carlos Velloso ao citar Celso Antônio Bandeira de Mello, reproduz que a contratação de servidores públicos por contrato administrativo temporário deve ser indispensável, isto é, quando não houver meios de suprir a contratação com remanejamento de pessoal ou com redobrado esforço dos servidores ora existentes.
          Assinala, também, o citado Ministro, que a contratação temporária a que se refere o dispositivo constitucional não pode ser efetuada, de regra, para a instalação ou a realização de serviços novos, exceto, é claro, quando de situações excepcionais e de motivos de força maior.
          No mesmo sentido as Ações Diretas de Inconstitucionalidade nºs 1500/ES, 1219/PB, 3210/PR, 890/DF, 2229/ES e 2125/DF.
          Esse era o posicionamento do STF até o julgamento da ADI-3068/DF, cuja ementa se dá nos seguintes termos:
          "AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI Nº 10.843/04. SERVIÇO PÚBLICO. AUTARQUIA. CADE. CONTRATAÇÃO DE PESSOAL TÉCNICO POR TEMPO DETERMINADO. PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE DA ATIVIDADE ESTATAL. CONSTITUCIONALIDADE. ART. 37, IX, DA CF/88.
          O art. 37, IX, da Constituição do Brasil autoriza contratações, sem concurso público, desde que indispensáveis ao atendimento de necessidade temporária de excepcional interesse público, quer para o desempenho das atividades de caráter eventual, temporário ou excepcional, quer para o desempenho de atividades de caráter regular e permanente.
          A alegada inércia da Administração não pode ser punida em detrimento do interesse público, que ocorre quando colocado em risco o princípio da continuidade da atividade estatal."
          No presente julgamento, a manifestação do relator originário foi voto vencido, sendo a votação seis votos contra cinco, oportunidade em que foi necessário o pronunciamento do então Presidente, Ministro Nelson Jobim, para desempatar a discussão.
          Transcrevemos pequeno excerto do voto do Ministro Eros Grau, cuja tese prevaleceu e sagrou-se vencedora:
          "[...]
          Não me parece correto esse entendimento. O inciso IX do art. 37 da Constituição do Brasil não separa, de um lado, atividades a serem desempenhadas em caráter eventual, temporário ou excepcional e, de outro lado, atividades de caráter regular e permanente. Não autoriza exclusivamente a contratação por tempo determinado de pessoal que desempenhe atividades em caráter eventual, temporário ou excepcional. Amplamente, autoriza contratações para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público em uma e outra hipótese. Seja para o desempenho das primeiras, seja para o desempenho de atividades de caráter regular e permanente, desde que a contratação seja indispensável ao atendimento de necessidade temporária de excepcional interesse público."

    Ademais, a cessão é um ato precário e discricionário da Administração, a título de colaboração com outros órgãos ou ente públicos, o que, por si só, desnatura o excepcional interesse público a ensejar contratação temporária com fulcro no inciso IX do artigo 37 da Constituição da República, à medida que há possibilidade de revogação do ato a qualquer momento, com o retorno do servidor ao órgão cedente.
    Como bem esclarecido pelo parecer da assessoria jurídica do ente consulente, caso as atribuições do referido servidor não puderem ser suspensas sem prejuízo das atividades essenciais, a Administração deve convocar o servidor cedido a retornar ao órgão de origem.
    A esse respeito, dispõe o artigo 29, §4º, inciso III, da LCM n. 93/06:
          § 4º Os servidores designados para os cargos de Diretor Presidente e Diretor Administrativo do IPASC cumprirão um mandato de 01 (um) ano, sendo permitida a recondução, podendo apenas retornar ao órgão de origem nas seguintes condições:
          [...]
          III - por iniciativa do Chefe do Executivo, devidamente fundamentada, mesmo antes do término do mandato;