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Processo n°: | CON - 09/00270438 |
Origem: | Companhia de Gás de Santa Catarina - SCGÁS |
Interessado: | Ivan Cesar Ranzolin |
Assunto: | Consulta |
Parecer n° | COG - 277/2009 |
Empresa Estatal. Diretor. Empregado celetista.
Senhora Consultora,
2.2. Do objeto
A consulta prevista no inciso XII do art. 59 da Constituição do Estado de Santa Catarina, bem como no inciso XV do art. 1º da Lei Estadual Complementar n. 202/2000, objetiva esclarecer incertezas acerca de interpretação de lei ou questão formulada em tese.
Assim, os questionamentos apresentados pelo Consulente possuem natureza interpretativa, bem como foram formulados em tese, razões pelas quais está preenchido o requisito previsto no art. 104, inciso II, do Regimento Interno.
Impende registrar que a resposta oferecida em processo de consulta não constitui prejulgamento de fato ou caso concreto, mas apenas prejulgamento de tese apresentada pelo Consulente.1
2.3. Da legitimidade
O Consulente, na condição de Diretor-Presidente da Companhia de Gás de Santa Catarina - SCGÁS, detém legitimidade para o encaminhamento de peças indagativas a esta Corte de Contas.
2.4. Da indicação precisa da dúvida/controvérsia
O Consulente indicou de forma precisa sua dúvida, o que faz com que o requisito previsto no art. 104, inciso IV, do Regimento Interno esteja preenchido.
2.5. Do parecer da assessoria jurídica
2.6. Do exame dos pressupostos de admissibilidade
Por conseguinte, desde que superada a ausência de parecer jurídico, sugerimos ao Exmo. Relator o conhecimento da presente consulta.
Depreende-se que o prejulgado acima transcrito é suficiente para responder aos questionamentos ora formulados.
Entretanto, o Consulente reiterou a consulta quanto à nomeação de empregado de empresa privada ao cargo de Diretor de Sociedade de Economia Mista.
A fim de evitar a confecção de novo prejulgado acerca do mesmo assunto, oportuno esclarecer as dúvidas remanescentes do Consulente no presente parecer, sem a feitura de um novo prejulgado.
Impende esclarecer que os Diretores das Sociedades de Economia Mista não são empregados da Companhia. Na verdade, os Diretores constituem-se em órgão da entidade vez que representam a pessoa jurídica que dirigem (arts. 138 e 139 da Lei Federal n. 6.404/76), o que afasta sua aproximação à figura do empregado.
1. Que o Consulente está legitimado à subscrição de consultas para este Tribunal de Contas, nos termos do inciso II do art. 103 do Regimento Interno desta Corte de Contas, o que atende ao requisito do inciso III do art. 104 da Resolução n. TC-06/2001;
2. Que os questionamentos formulados na presente consulta tratam de situações em tese e de interpretação de lei, conforme determina o inciso XII do art. 59 da Constituição do Estado de Santa Catarina, bem como o inciso XV do art. 1º da Lei Complementar Estadual 202/2000;
Sugere-se ao Exmo. Sr. Relator que submeta voto ao Egrégio Plenário sobre consulta formulada pelo Diretor-Presidente da SCGÁS, Sr. Ivan Ranzolin, nos termos deste parecer, que em síntese propõe:
1. Conhecer da consulta, por preencher os requisitos de admissibilidade previstos no Regimento Interno.
2. Responder a consulta nos seguintes termos:
2.1. É possível a designação de empregado de empresa privada para o exercício de cargo de diretor de empresa estatal.
2.2. O vínculo de trabalho mantém-se hígido com a empresa privada, enquanto exercer o cargo de diretor de Sociedade de Economia Mista, No entanto, o contrato de trabalho deverá permanecer suspenso.
2.3. Não há falar em reembolso de valores de remuneração, uma vez que no exercício do cargo de Diretor Estatutário o empregado terá direito, tão-somente, aos valores fixados em assembléia-geral, não recaindo ônus para a empresa ao qual está vinculado, em razão da suspensão do contrato de trabalho.
3. Dar ciência desta decisão, do relatório e voto do Relator que a fundamenta, bem como deste parecer ao Diretor-Presidente da SCGÁS, Sr. Ivan Ranzolin.
Consultora Geral 2
BARROS, Aline Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 1ª edição. São Paulo: Ltr, 2005. p. 826 . 3
Delgado, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 2ª edição. São Paulo: Ltr, 2003, p. 1067. 4
LAMARCA, Antônio. Contrato Individual de Trabalho. Contrato Individual de Trabalho. São Paulo: RT, 1969, p. 274/275. 5
CATHARINO, Martins José, citado por Délio Maranhão em Direito do Trabalho, 7ª edição. Fundação Getúlio Vargas, 1979, p. 63. 6
BARROS, Aline Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 1ª edição. São Paulo: Ltr, 2005. p. 831. 7
1 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 5. Ed. São Paulo: Ltr, 2006. P. 356-357.
A consulta não se faz acompanhada de parecer jurídico do órgão consulente, desatendendo o que dispõe o artigo 104, V, da Res. nº TC-06/01.
Como a preliminar não é absoluta, mas relativa, mister se faz que o egrégio Plenário supere a falta do parecer do órgão consulente para o conhecimento da presente consulta.
3. ANÁLISE DA CONSULTA
Primeiramente, imperioso asseverar que a matéria afeta à consulta em apreço já foi objeto de análise por esta Corte de Contas.
De fato, o Consulente, Sr. Ivan Ranzolin, nos autos do processo CON 08/00186028, dentre os questionamentos formulados, indagou acerca da utilização de empregados de empresas privadas para o exercício de cargo de Diretor Estatutário, bem quanto à possibilidade de reembolso dos valores à empresa privada cedente. Referida consulta foi vazada nos seguintes termos:
1) É possível a Administração Pública direta ou indireta do Estado de Santa Catarina, em especial as sociedades de economia mista, receber servidores e/ou empregados cedidos por empresas públicas e/ou privadas para o exercício de cargo de DIRETORES ESTATUTÁRIOS eleitos pelo Conselho de Administração?
1.1) Em sendo afirmativa a resposta, é possível o reembolso de valores à entidade ou empresa cedente quanto àqueles desembolsados por estas para o pagamento de tais DIRETORES ESTATUTÁRIOS eleitos pelo Conselho de Administração cedidos à administração indireta?
1.2) Em sendo possível o reembolso referido no item "1.1)", quais os parâmetros devem ser usados para apurar os valores do referido reembolso, salários e encargos?
O Egrégio Plenário respondeu a consulta mediante decisão n. 3856/2008, sessão realizada em 17/11/2008, a qual resultou na elaboração do prejulgado n. 1970, in verbis:
Prejulgado n. 1970:
1. Os diretores eleitos pelo conselho de administração das sociedades de economia mista serão remunerados conforme os valores fixados em assembléia-geral, não recaindo ônus ao órgão ou entidade ao qual estava vinculado antes da escolha.
2. Quando o novo dirigente, eleito pelo conselho de administração, for servidor estatutário será necessário ato de cessão à sociedade de economia mista nos termos da legislação regulamentar de cada Ente da Federação.
3. Na hipótese do diretor eleito ser celetista, estando sujeito às normas da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, seu contrato de trabalho deverá ser suspenso quando assumir a direção da sociedade de economia mista e retomado com o fim do encargo.
A respeito do tema, oportuno transcrever excertos do parecer COG - 154/08, da lavra do auditor fiscal de controle externo Guilherme da Costa Sperry, o qual serviu de subsídio para a elaboração do referido prejulgado:
[...]
Conforme pode-se observar da Lei Federal 6.404/76, aplicável a todas as sociedades de economia mista, compete ao conselho de administração eleger e destituir, na forma do estatuto, a diretoria executiva da companhia, cuja remuneração será fixada pela assembélia-geral.
Os reflexos da eleição, pelo conselho de administração, de determinada pessoa para dirigir uma sociedade de economia mista independerá da relação laboral que o escolhido mantém fora da companhia, pois o diretor deverá perceber os valores que forem fixados pela assembléia-geral, nos termos do art. 152 da Lei Federal 6.404/76, não cabendo, por conseqüência, ressarcimento.
Na hipótese do diretor eleito ser celetista, não importa se seu vínculo empregatício se dá com a administração direta, com a indireta (autarquia, fundação, sociedade de economia mista ou empresa pública) ou com empresa privada, pois, estando sujeito às normas da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, seu contrato de trabalho deverá ser suspenso quando ele assumir a direção da companhia estatal.
É preciso aduzir que a relação de emprego exige troca efetiva e ininterrupta da prestação do serviço ou da atividade contratada, com a conseqüente remuneração do trabalho do empregado. Entretanto, existem situações excepcionais que ocasionam interrupção ou suspensão do contrato de trabalho.
A hipótese sob consulta se enquadra no conceito de suspensão do contrato de trabalho, nesse sentido, importante transcrever o caput do artigo 472 e o §1º do artigo 483, ambos da CLT, verbis:
Art. 472. O afastamento do empregado em virtude das exigências do serviço militar ou de outro encargo público, não constituirá motivo para a alteração ou rescisão do contrato de trabalho por parte do empregador. (grifei)
Art. 483. [...]
§1º - O empregado poderá suspender a prestação dos serviços ou rescindir o contrato, quando tiver de desempenhar obrigações legais, incompatíveis com a continuação do serviço.
A doutrina trabalhista considera o encargo público (munus público) como causa de suspensão do contrato de trabalho.
1[...]
A suspensão do contrato de trabalho implica cessação de seus efeitos por determinado lapso de tempo. Recupera sua eficácia quando cessarem as causas que a motivaram. Essas causas poderão ter: natureza biológica, como ocorre com os afastamentos por gravidez, parto e enfermidade, provocada ou não por acidente de trabalho; político-administrativa, na hipótese de afastamento por serviço militar, ou atividade cívica, como munus público, desempenho de mandato sindical; político-social, na hipótese de greve e lock out; jurídico-penal, nas hipóteses de afastamento do empregado por motivo de prisão2. (grifei)
[...]
[...]
Por outro lado, enquadram-se como suspensão do contrato de trabalho as situações de atendimento de encargo público de larga duração no tempo. São exemplos que confirmam esse segundo critério geral o afastamento para cumprir mandato político eletivo (arts. 472, caput, e 483, §1º, CLT) e o afastamento para assumir cargo público de direção (arts. 472, caput, e 483, §1º, CLT).3 (grifei)
[...]
O empregado afasta-se por ter de se afastar. No caso, por exemplo, de eleger-se deputado, terá a garantia de voltar ao emprego, do qual se afastara para cumprir o dever cívico de exercer o mandato popular. [...]
[...]
De forma não diversa entendeu o Tribunal do Trabalho da 22ª Região:
CONTRATO VÁLIDO - EXERCÍCIO DE MUNUS PÚBLICO - SUSPENSÃO DO PACTO LABORAL - Abandono de emprego não configurado uma vez que o obreiro é detentor de contrato válido, e não tendo sido provado que o mesmo teve o animus de romper o pacto laboral, assegura-se-lhe o direito de retornar às funções anteriormente exercidas tão logo se desvencilhe do exercício do munus público, durante o qual o contrato de trabalho permanecerá suspenso, sendo resguardada, porém, a manutenção do vínculo e do o retorno ao serviço. (inteligência do art. 472, caput, da CLT). (TRT 22ª R. - RXOF 00072-2003-999-22-00-4 - (1274/2003) - Relª. Juíza Liana Chaib - DJT 29.08.2003 - p.22)
Também é aceita pela doutrina, como causa de suspensão do contrato de trabalho, a assunção da direção de Sociedade Anônima:
Em princípio, à luz da doutrina pátria, entende-se que o diretor ou administrador de sociedade anônima, como pessoa física e representante legal da pessoa jurídica, não pode ser, simultaneamente, empregado, porquanto integra um dos órgãos indispensáveis à existência dessa sociedade e é por meio dele que a sociedade se exterioriza. Ou, como doutrina José Martins Catharino5, "quando a intensidade da colaboração suplanta a subordinação, no plano jurídico, desaparece a relação de emprego".
Ocorre, porém, que um empregado pode galgar a esse cargo, ou seja, o contrato de trabalho poderá preceder à eleição para exercício do cargo de diretoria.
Nesse caso, divergem os doutrinadores. Entendem uns tratar-se de interrupção e outros, de suspensão contratual.
Entendemos que, no plano jurídico, ocorre a suspensão contratual quando, modificando-se a relação jurídica, o empregado passa a autêntico diretor de sociedade anônima (e não diretor empregado, situação em que os efeitos são os inerentes aos empregados de confiança), integrante de um de seus órgãos, assumindo, como conseqüência, a posição de empregador (Enunciado n. 269 do TST)6.
[...]
Vejamos o que dispõe o Enunciado nº 269 do TST:
DIRETOR ELEITO. CÔMPUTO DO PERÍODO COMO TEMPO DE SERVIÇO (mantida) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003
O empregado eleito para ocupar cargo de diretor tem o respectivo contrato de trabalho suspenso, não se computando o tempo de serviço desse período, salvo se permanecer a subordinação jurídica inerente à relação de emprego.Entendo que a direção de empresa estatal caracteriza exercício de munus público, ensejando assim, a suspensão do contrato de trabalho do empregado até o fim deste encargo. Portanto, não há que se falar em ressarcimento ou ônus pelo cedente quando um empregado é eleito para dirigir uma companhia estatal.
Consoante entendimento da Justiça Laboral (súmula n. 269 do TST), empregado celetista nomeado a cargo de diretor de Sociedade de Economia Mista tem seu contrato de trabalho suspenso enquanto permanecer no exercício do referido cargo. A regra só é quebrada quando permanece a subordinação jurídica, conforme súmula n. 269 do TST.
Frise-se, "na hipótese do diretor eleito ser celetista, não importa se seu vínculo empregatício se dá com a administração direta, com a indireta (autarquia, fundação, sociedade de economia mista ou empresa pública) ou com empresa privada, pois, estando sujeito às normas da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, seu contrato de trabalho deverá ser suspenso quando ele assumir a direção da companhia estatal". (parecer COG n. 154/08)
Destarte, é possível a designação de empregado de empresa privada para o exercício de cargo de diretor de empresa estatal, o qual é de livre nomeação e exoneração.
Outrossim, não se trata da função de confiança prevista no art. 62, inciso II, da CLT, exercidas exclusivamente pelos empregados públicos da Sociedade de Economia Mista, nos termos do art. 37, inciso V, da Constituição da República.
Por tais razões, o contrato de trabalho com a empresa privada deverá ser suspenso enquanto o empregado exercer o cargo de diretor da sociedade de economia mista.
Inclusive, a permanência da subordinação jurídica com a empresa a qual mantém vínculo de trabalho é incompatível com o exercício do cargo de Diretor de Sociedade de Economia Mista, vez que "as situações jurídicas, de natureza diretiva e de natureza subordinada, seriam reciprocamente excludentes, conduzindo à inviabilidade de se acatar a presença de relação empregatícia para tais diretores."17
Dessa forma, não há falar em reembolso de valores de remuneração, uma vez que, enquanto exercer o cargo de Diretor Estatutário o empregado terá direito, tão-somente, aos valores fixados em assembléia-geral, não recaindo ônus para a empresa ao qual está vinculado, em razão da suspensão do contrato de trabalho.
4. CONCLUSÃO
Em consonância com o acima exposto e considerando:
COG, em 26 de maio de 2009.
De Acordo. Em ____/____/____
DE ACORDO.
À consideração do Exmo. Sr. Conselheiro Otávio Gilson dos Santos, ouvido preliminarmente o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas.
COG, em de de 2009.
ELÓIA ROSA DA SILVA
1
MILESKI, Hélio Saul. O Controle da Gestão Pública. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 362