ESTADO DE SANTA CATARINA
    TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO
    CONSULTORIA GERAL

Processo n°: REC - 09/00474190
Origem: Santa Catarina Turismo S.A. - SANTUR
Interessado: Marcílio Guilherme Ávila
Assunto: Referente ao PROCESSO -RPL-07/00086552
Parecer n° COG-504/09

O ato processual de dar ciência ao responsável para, querendo, defender-se, deve ser pessoal (art. 215, CPC).

A citação ou a audiência por edital são fictas, e, no caso do responsável não se defender, não gera a presunção de veracidade dos fatos.

Considera-se citado o responsável, para defender-se, no momento em que é intimado da decisão que decreta a nulidade da citação.

Senhora Consultora,

RELATÓRIO

Tratam os autos de Reexame do Acórdão 857/2009, proferido em 17/6/09, nos autos RPL 07/00086552, no qual o Sr. Marcílio Guilherme Ávila é condenado ao pagamento de multa no valor de R$ 400,00, "em face da excessiva exigência de qualificação técnica, bem como a ausência de exigência quanto às instalações e ao aparelhamento e pessoal técnico adequado e disponível para a realização do objeto do Edital de Licitação", em afronta aos §§ 1º, I, e 5º, e o inciso II do art. 30 da Lei (federal) n. 8.666/93.

O processo iniciou-se por Representação (fls. 2/31) admitida (fls. 32/40) com proposta de Audiência do Sr. Valdir Rubens Valendowski, deferida pelo Relator (fl. 60) e executada por meio do Ofício 11164/2007 (fl. 61).

A defesa foi apresentada às fls. 62/64.

A Diretoria de Controle de Licitações e Contratações - DLC propõe Audiência do Sr. Marcílio Guilherme Ávila (fls. 67/79), deferida pelo Relator (fl. 83/84).

A Audiência foi encaminhada por meio do Ofício 8852 (fl. 86), sem sucesso (fls. 87/88).

Diante da confirmação do endereço do responsável pela Secretaria da Receita Federal - SRF, a DLC propôs a audiência por edital (fl. 92), executada em 30/9/08 (fl. 94).

O responsável não apresentou defesa.

A DLC elaborou Relatório 853/2008 propondo aplicação de multa ao responsável Sr. Marcílio G. Ávila (fls. 95/101), corroborado pelo Ministério Público de Contas - MPC (fls. 102/105), acatado pelo Relator (fls. 106/109) e decidido pelo E. Plenário (fls. 110/111), nos seguintes termos:

O Acórdão foi publicado no DOTC-e nº 282, de 1/7/09 (fl. 110).

O responsável interpôs Reexame em 22/7/09.

Considerando que se trata de Representação em Processo de Licitação - RPL, vê-se que o recorrente utilizou da espécie adequada, em consonância com o art. 80 da Lei Complementar n. 202/2000.

O recorrente informa que não foi citado na fase instrutória no endereço que sempre recebeu as correspondências do Tribunal de Contas, qual seja, Rua Ver. Osni Ortiga, 622, CEP 88062-450, Lagoa da Conceição - Florianópolis. Informa, outrossim, que lá reside a 14 anos.

Compulsando-se os autos, verifica-se que a origem do endereço para a audiência, como sendo, Rua Anita Garibaldi, 35, Centro, Florianópolis, CEP 88010-500, está no Parecer de Admissibilidade 85/2007 (fl. 38), confirmado pela consulta à SRF (fl. 92).

No entanto, a correspondência direcionada a este endereço não logrou êxito, retornando com a informação "mudou-se" (fl. 88v).

Realizada a citação por edital (fl. 93), essa também não logrou êxito, pois não foi apresentada defesa.

Sem outras providências, a DLC propôs aplicação de multa ao citado por edital, sem manifestação, sendo ratificada pelo MPC, Relator e E. Plenário.

A citação é ato solene, de modo que a falta de alguma de suas formalidades legais a torna nula"1. Pode ser real ou ficta.

      No entanto, não é o que se depreende dos autos, em que houve uma tentativa de audiência pelos Correios, em endereço confirmado pela SRF, e, em seguida, a citação por edital.
        A revelia é uma sanção dada ao réu regularmente citado que não comparece aos autos para defender-se. A sanção é reputar-se verdadeiros os fatos alegados contra ele. (art. 319, CPC).
        Note-se que o pressuposto para a decretação da revelia é a citação regular. Assim, se o AR-MP não foi assinado pelo responsável ou não há defesa do responsável citado por edital (citação ficta), não há como considerá-lo regularmente citado e, portanto, não será considerado revel, por conseqüência, os fatos não poderão ser reputados verdadeiros para fins de condenação.
        A ausência de defesa em citação por edital não gera a presunção de veracidade dos fatos alegados contra o citado, sem providências de ordem processual. No art. 9º, II, do CPC há a necessidade de nomeação de curador, possibilidade esta reiteradamente rechaçada pelo E. Plenário. No art. 366 do CPP, quando o acusado, citado por edital, não comparecer, nem constituir advogado, ficarão suspensos o processo e os prazos prescricionais. A solução dada pelo E. Plenário, quando o responsável é citado por edital e não comparece, tem sido o de insistir na citação pessoal pelo correio, valorizando a citação real em detrimento da ficta.
        O que gera a certeza da citação ou da audiência não é o meio empregado, mas o resultado, que é o recebimento pessoal pelo responsável da citação ou audiência que lhe é dirigida. Nesse sentido, vale ressaltar os meios à disposição do Tribunal de Contas para a efetivação da citação ou audiência, quais sejam, diretamente ao responsável (art. 37, I, LCE 202/00) ou via postal (art. 37, II, LCE 202/00). A citação ou audiência diretamente ao responsável será feita por servidor designado (art. 57, I, Res. TC-6/01).
        Portanto, no caso dos autos, verifica-se os seguintes atos irregulares:
        A) citação por edital sem esgotar outros meios de se localizar o responsável; e
        B) considerar verdadeiros os fatos diante da ausência de defesa do responsável citado por edital (citação ficta).
        Embora ambos os atos sejam irregulares, apenas o segundo (B) é considerado relevante para fins de anulação do processo, pois, se mesmo diante da citação por edital, o responsável comparecesse aos autos para se defender, considerar-se-ia válida a citação.
        Portanto, diante do exposto é o presente parecer pela anulação do processo a partir do Relatório 853/2008 (fl. 95).
        Para fins de prosseguimento do feito aplica-se aos autos o art. 214, § 2º, do CPC, in verbis:
          Art. 214. ...
          ...
          § 2º. Comparecendo o réu apenas para arguir a nulidade e sendo esta decretada, considerar-se-á feita a citação na data em que ele ou seu advogado for intimado da decisão.

      Em decisão sobre a matéria, o Superior Tribunal de Justiça - STJ, assim se manifestou:

      REsp 602038 / RS - 2003/0199873-9 Relator(a) Ministra ELIANA CALMON

      PROCESSO CIVIL – CITAÇÃO VÁLIDA: ART. 214, § 2º, do CPC.

      1. Embora realizada a citação em nome de quem não está legitimado para responder à demanda, se o verdadeiro legitimado comparece espontaneamente para argüir a nulidade, é licito que se considere devidamente citado, a partir do seu comparecimento.

      2. Aplicação pertinente do art. 214, § 2º, do CPC, fato que dispensou o Tribunal de enfrentar a indevida argüição dos demais dispositivos legais.

      3. Recurso especial improvido.

      No entanto, se nova citação for determinada ao responsável, esse ato deverá se cercar dos requisitos próprios da citação. Assim é o entendimento do STJ, com a seguinte ementa:

      REsp 147540 / RN - 1997/0063425-6 Relator Min. EDUARDO RIBEIRO

      CITAÇÃO. NULIDADE. RECONHECIMENTO.

      COMPARECENDO O RÉU APENAS PARA ARGUIR A NULIDADE DA CITAÇÃO E SENDO ESSA RECONHECIDA, O PRAZO PARA RESPOSTA FLUIRA DA INTIMAÇÃO DA DECISÃO A SEU ADVOGADO. HIPOTESE EM QUE, ENTRETANTO, DETERMINOU-SE A RENOVAÇÃO DA CITAÇÃO, NÃO SE PODENDO APLICAR O DISPOSTO NO ART. 214, PAR. 2. DO C.P.C.

      No voto condutor do julgado, o Min. Eduardo Ribeiro esclarece:

          ... bastaria, para regularizar-se a relação processual, fosse intimado o réu, por seu advogado, da decisão que reconhecera a nulidade do ato. Aí, entretanto, se deu o equívoco. Em lugar de simplesmente declarar-se nulo o ato, disso intimando-se o advogado do réu, determinou-se fosse renovada a citação, o que, uma vez mais, se fez pelo correio. ... nova petição apresentou o réu, argüindo a nulidade da segunda citação.
          ... embora indevidamente, se determinou a renovação da citação e isso se fez. ... Reputá-lo intimado da decisão que teve como nula a primeira citação e fazer daí fluir o prazo importaria tornar tabula rasa o fato de que se determinara a repetição do ato.

      O responsável não pode alegar, daqui para frente, que desconhece os presentes autos, incumbindo-lhe a responsabilidade de acompanhá-lo por vista pessoal ou por advogado, ou por acompanhamento pelo Sistema de Processo On-line (TCE-Push), disponível para cadastramento no site www.tce.sc.gov.br, ou ainda por outros meios que lhe são permitidos.

      Portanto, o responsável não precisa ser novamente citado (termo que abrange a audiência também), basta a intimação da decisão no Reexame para que, no prazo de 30 (trinta) dias (art. 31, III, Res. TC-6/01), apresente a sua defesa, sob pena de se reputarem verdadeiros os fatos contra si alegados.

      IV. CONCLUSÃO

      Ante ao exposto, sugere-se ao E. Relator que em seu voto propugne ao Egrégio Plenário:

      1) Conhecer do Reexame proposto nos termos do art. 80 da Lei Complementar n. 202/2000, contra o Acórdão n. 857/2009, na sessão ordinária do dia 17/6/09, no processo RPL 07/00086552, e, no mérito, dar provimento para anular o processo a partir da fl. 95 (Relatório DLC 853/2008), remetendo os autos à DLC para dar regular prosseguimento ao feito.

      2) Intimar o responsável dessa decisão, para que, no prazo de 30 (trinta) dias (art. 31, III, Res. TC-6/01), apresente a sua defesa, sob pena de se reputarem verdadeiros os fatos contra si alegados.

                      COG, em de de 2009
                      HAMILTON HOBUS HOEMKE
                      Coordenador de Recursos
          DE ACORDO.
          À consideração da Exma. Sra. Relatora SABRINA NUNES IOCKEN, ouvido preliminarmente o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas.
          COG, em de de 2009
        ELÓIA ROSA DA SILVA

      Consultora Geral


      1 GRECO FILHO, Vicente. Direito Processual civil brasileiro, vol. 2, 18 ed. rev. e atual. - São Paulo: Saraiva, 2007, p. 30.

      2 Idem. p. 34.

      3 Ibidem. p. 34