|
TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO
|
Processo n°: |
REC - 09/00496320 |
Origem: |
Secretaria de Estado da Saúde |
Interessado: |
Ramon Da Silva |
Assunto: |
eferente ao Processo -PCA-07/00336923 |
Parecer n° |
COG-554/09 |
Cancelamento de Restos a Pagar. Processados. Impossibilidade.
O cancelamento de restos a pagar processados apenas é permitido quando constatado o irregular cumprimento das obrigações pelo contratado, quando haja ausência de liquidação da despesa ou outras situações incompatíveis com o pagamento.
Senhora Consultora,
RELATÓRIO
Tratam os autos de Recurso de Reconsideração, em face do Acórdão nº 0851 (fls. 2959/2961) proferido nos autos do Processo PCA nº 07/00336923.
O processo acima mencionado refere-se à Prestação de Contas do Administrador, do exercício de 2006, da Secretaria de Estado da Saúde.
Em análise as contas do administrador, a Diretoria de Controle da Administração Estadual - DCE elaborou o Relatório nº 060/2008 (fls. 2872/2890), onde o órgão técnico propugnou recomendação no sentido de proceder-se à Citação do Responsável em razão do cometimento de irregularidades, conforme conclusão do referido relatório. Os autos foram encaminhados ao Relator, que determinou a citação do responsável (fl. 2891/2892).
A Diretoria de Controle dos Municípios, após análise das justificativas apresentadas (fls. 2899/2923), elaborou o Relatório nº 093/2008 (fls. 2925/2944), onde sugeriu que as contas relativas ao exercício de 2006 fossem julgadas regulares com ressalva, dando quitação ao responsável e, ainda, determinou à Secretaria de Estado da Saúde que adote as medidas a fim de cumprir as prescrições legais.
O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, por meio do Parecer nº 205/2009 (fls. 2945/2951), não acompanhou a manifestação do Corpo Técnico, manifestando-se pela irregularidade das contas anuais da Secretaria da Saúde, relativas ao exercício de 2006, em face do indevido cancelamento de restos a pagar processados no exercício de 2006, em descumprimento aos arts. 36 e 63 da Lei Federal nº 4.320/64 e art. 13, § 1º do Decreto Estadual nº 4.687/2006.
Em seguida, a Exmª. Conselheira Substituta Sabrina Nunes Iocken, proferiu voto (fls. 2952/2957) acompanhando em parte as manifestações da Diretoria Técnica e na integralidade a manifestação do Ministério Público. E, através do Acórdão nº 0851/2009, na Sessão Ordinária de 15/06/2009, o Tribunal Pleno confirmou o voto do Relator, nos seguintes termos:
ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro nos arts. 59 da Constituição Estadual e 1º da Lei Complementar n. 202/2000, em:
6.1. Julgar irregulares, sem imputação de débito, na forma do art. 18, III, alínea b, c/c o art. 21, parágrafo único, da Lei Complementar n. 202/2000, as contas anuais de 2006 referentes a atos de gestão da Secretaria de Estado da Saúde, de acordo com os pareceres emitidos nos autos.
6.2. Aplicar ao Sr. Ramon da Silva - Superintendente de Gestão Administrativa da Secretaria de Estado da Saúde em 2006, CPF n. 082.558.659-34, multa prevista no art. 69 da Lei Complementar n. 202/2000 c/c o art. 108, parágrafo único, do Regimento Interno, no valor de R$ 1.000,00 (mil reais), em face do cancelamento de Restos a Pagar processados (despesas empenhadas e liquidadas) no valor de R$ 313.074,48 até o mês de julho de 2006, antes portanto, da vigência do Decreto (estadual) n. 4.687, de 31/08/2006, que estabelece os procedimentos com vistas ao encerramento do exercício financeiro de 2006, além de afrontar o planejamento e a programação das ações de saúde no exercício, e desatendendo aos arts. 60 a 63 da Lei (federal) n. 4.320, de 1964, e 5º da Lei Complementar (federal) n. 101/2000, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial Eletrônico deste Tribunal de Contas, para comprovar ao Tribunal o recolhimento da multa ao Tesouro do Estado, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts. 43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000.
6.3. Determinar à Secretaria de Estado da Saúde que:
6.3.1. regularize e promova a baixa de pendências inscritas no Balancete do Razão de dezembro/2006, registradas nas contas 1.1.2.2.9.01 e 1.1.2.2.9.99.03 como "Pagamentos Indevidos e Responsabilidades em Apuração" - relativos aos exercícios de 1991 a 1998, de acordo com os arts. 10 da Lei Complementar (estadual) n. 202, de 2000, e 136 a 139 e 143 a 147 da Lei Complementar (estadual) n. 381, de 2007; a Nota Técnica n. SEF-003/2007 e o Decreto (estadual) n. 442/2003 (item 2.3 do Relatório DCE);
6.3.2. doravante, classifique de forma apropriada a despesa pública quando da realização de lançamentos contábeis para evitar divergências, tais como, entre a Relação do Estoque em Almoxarifado e o registro contábil do Balancete do Razão, atentando para a finalidade da despesa, conforme previsto no Decreto (estadual) n. 2.895, de 2005, c/c os arts. 83, 85, 89, 94 e 95 da Lei (federal) n. 4.320, de 1964 (item 2.4 do Relatório DCE);
6.3.3. doravante, anexe ao Balanço Anual, quando de sua remessa a este Tribunal, a "Declaração de Regularidade do Inventário dos Bens de Consumo e Permanentes" existentes no Almoxarifado e a "Declaração de Regularidade do Inventário Físico dos Bens Móveis Permanentes", assinados, respectivamente, pelos membros da Comissão designada e pelo Responsável pelo Setor de Patrimônio, e pelo Ordenador de Despesas, de acordo com os arts. 96 da Lei (federal) n. 4.320, de 1964, e 22 e 23 do Decreto (estadual) n. 681, de 2007 (item 2.5 do Relatório DCE).
6.4. Alertar a Secretaria de Estado da Saúde, na pessoa do Secretário de Estado e do Superintendente de Gestão Administrativa daquele Órgão, que o não-cumprimento das determinações constantes do item 6.3 desta deliberação implicará a cominação das sanções previstas no art. 70, VI e § 1º, da Lei Complementar (estadual) n. 202/00, conforme o caso.
6.5. Determinar à Secretaria Geral - SEG, deste Tribunal, que comunique à Diretoria Geral de Controle Externo - DGCE, após o trânsito em julgado, acerca da/s determinações constantes do item 6.3 retrocitado para fins de registro no banco de dados e encaminhamento à Diretoria de Controle competente para juntada ao processo de contas do gestor.
6.6. Recomendar à Secretaria de Estado da Saúde que, doravante, observe o prazo de até 60 (sessenta) dias subsequentes ao encerramento do exercício para remessa documental a este Tribunal do Balanço Anual e seus Anexos, considerando o atraso de 1 (um) dia constatado neste processo, em atendimento ao disposto no art. 17 da Resolução n. TC-16/1994 e a determinação constante do item 6.2 do Acórdão n. 1226/2007, relativo à prestação de contas do exercício de 2005 (item 2.1 do Relatório DCE e Parecer MPjTC n. 205/2009).
6.7. Dar ciência deste Acórdão, do Relatório e Voto do Relator que o fundamentam, bem como do Relatório de Instrução DCE/Insp.2/Div.4 n. 093/2008, à Secretaria de Estado da Saúde, ao Sr. Ramon da Silva - Superintendente de Gestão Administrativa daquele Órgão em 2006, e ao responsável pelo controle interno da Secretaria de Estado da Saúde.
Por meio do Ofício TCE/SEG nº 9241/2009 realizou-se a comunicação acerca da decisão plenária.
Foi interposto o Recurso de Reconsideração nº 09/00336923.
II. DA ADMISSIBILIDADE
Quanto à legitimidade, o Sr. Ramon da Silva, nos termos do artigo 77 da LC nº 202/2000, é parte legítima, para interpor o presente Recurso de Reconsideração, na qualidade de interessado, pois ocupava o cargo de Superintendente de Gestão Administrativa da Secretaria de Estado da Saúde.
O artigo 77 da Lei Complementar nº 202/2000 diz o que segue:
Art. 77. Cabe Recurso de Reconsideração contra decisão em processo de prestação e tomada de contas, com efeito suspensivo, interposto uma só vez por escrito, pelo responsável, interessado ou pelo Ministério Público junto ao Tribunal, dentro do prazo de trinta dias contados da publicação da decisão no Diário Oficial do Estado.
Já o artigo 133, parágrafo 1º, alínea b, considera interessado o administrador que, sem se revestir da qualidade de responsável pelos atos objeto de julgamento ou de apreciação pelo Tribunal de Contas, deva se manifestar nos autos na condição de atual gestor.
No que tange à tempestividade tem-se que o Acórdão foi publicado no Diário Oficial Eletrônico - DOTC-e nº 280 em 29/06/2009, sendo que o recurso foi protocolado sob o nº 015421 em 28/07/2009, portanto, no prazo legal estabelecido no artigo 77 da LC nº 202/200.
No que se refere à singularidade observa-se que houve respeito a mesma, já que o presente recurso foi interposto uma única vez, de acordo com o estabelecido no artigo 77 da LC nº 202/2000.
Por estarem preenchidos todos os pressupostos de admissibilidade, sugere-se ao Exmo. Sr. Relator que conheça do presente Recurso de Reconsideração, nos termos do artigo 77 da LC nº 202/2000.
III. MÉRITO
III. 1 Cominação de multa no valor de R$ 1.000,00 (mil reais), em face do cancelamento de Restos a Pagar processados (despesas empenhadas e liquidadas) no valor de R$ 313.074,48 até o mês de julho de 2006, antes portanto, da vigência do Decreto (estadual) n. 4.687, de 31/08/2006, que estabelece os procedimentos com vistas ao encerramento do exercício financeiro de 2006, além de afrontar o planejamento e a programação das ações de saúde no exercício, e desatendendo aos arts. 60 a 63 da Lei (federal) n. 4.320, de 1964, e 5º da Lei Complementar (federal) n. 101/2000.
O recorrente argumenta que o fato apontado como irregular (cancelamento de restos a pagar) não guarda qualquer correspondência ou relação com os dispositivos legais (art. 60 e 63 da Lei nº 4.320/64) que fundamentaram a cominação de multa. Mesmo porque, em seu entendimento, não se verifica qualquer impedimento ou vedação do cancelamento de determinada despesa empenhada e liquidada e o simultâneo reempenho desta mesma despesa em outra fonte de recursos com disponibilidade financeira.
Justifica que a medida tomada (cancelamento de restos a pagar) foi adotada visando unicamente viabilizar o pagamento da despesa ao credor, tendo em conta que no orçamento público a despesa é fixada, mas a receita é estimada e, se esta não se realiza conforme o planejamento efetuado, cabe ao gestor a tomada de providências visando o equilíbrio na sua execução.
Aduz que o ato de cancelar despesas processadas durante a execução orçamentária, sem alteração da ação, do projeto/atividade e do elemento despesa, modificando-se apenas a fonte de recursos é ato típico de gestão orçamentária e financeira, visando restabelecer o equilíbrio entre a receita arrecadada e a despesa realizada.
Defende-se, ainda, afirmando que o artigo 48, "b" da Lei nº 4.320/64 determina que se mantenha, durante o exercício e na medida do possível, o equilíbrio entre a receita arrecadada e a despesa realizada, de modo a reduzir ao mínimo as eventuais insuficiências de tesouraria, não há sentido algum que se penalize o gestor que buscou o cumprimento da 3ª fase da despesa pública (pagamento), mediante cancelamento de despesa empenhada e liquidada em fonte de recursos sem suporte financeiro, com simultâneo reempenho da despesa na mesma ação, projeto/atividade e elemento despesa, alterando apenas a fonte de recursos com provisão financeira disponível.
Esclarece que o procedimento adotado durante a execução orçamentária do exercício de 2006 não pode ser considerado como cancelamento de restos a pagar processados, visto que as despesas canceladas foram empenhadas ainda no exercício de 2006, enquanto a definição legal de restos a pagar diverge frontalmente do entendimento prevalente na decisão, conforme dispõe o art. 36 da Lei nº 4.320/64.
Mantém seus argumentos no seguinte sentido:
" Ora, se o fato gerador da penalidade aplicada refere-se ao cancelamento de despesas processadas até o mês de julho de 2006, antes da vigência do Decreto (estadual) n. 4.687, de 31/08/2006, não é possível classificar estas despesas processadas canceladas não são oriundas de exercício encerrados, vez que ocorreram durante a vigência da execução orçamentária de 2006.
Por seu turno, o Decreto n. 4687, de 31/08/2006, mencionado na decisão impugnada como desatendido, e que estabelece os procedimentos com vistas ao encerramento do exercício de 2006, quando trata de restos a pagar processados ou não processados menciona os restos a pagar do exercício de 2005, isto é, do exercício anterior ao da análise, enquanto as despesas canceladas e apontadas são do exercício de 2006, comprovando-se desta forma que não há sintonia entre o fato julgado irregular e a hipótese legal.
Por outro lado e apesar de discordarmos do entendimento da instrução quanto aos fundamentos da restrição apresentada, deve-se dar crédito à conclusão do Relatório de Instrução DCE/INSP.2/DIV.4 n. 093/2008, que tem no item 3.3, em fls. 2943 sugeriu que este apontamento fosse apontado como Recomendação e não como infração legal sujeita à aplicação da penalidade multa, pois não está caracterizada qualquer violação à expressa disposição legal.
Somente a título de observação, a instrução aduziu e a Cons. Relatora acolheu como razão de decidir, precisamente em fls. 2954, que o cancelamento de restos a pagar foi objeto de recomendação no Parecer Prévio emitido pela Tribunal de Contas quando da apreciação das Contas prestadas pelo Governador do estado - exercício de 2007."
Exposta a justificativa do recorrente, passa-se a sua análise:
Cotejando-se as argumentações constantes nos autos originários, em especial às fls. 2900/2902, com a dos autos de recurso, constata-se que o recorrente não trouxe qualquer inovação em sua defesa, mantendo seu posicionamento no sentido de que o procedimento realizado, cancelamento de Restos a Pagar processados (despesas empenhadas e liquidadas), com o fim de manter o equilíbrio entre a receita e a despesa, está em consonância com os arts. 60 a 63 da Lei nº 4.320, de 1964, e artigo 5º da Lei Complementar nº 101/2000.
A instrução desta Corte de Contas, no Relatório de Reinstrução nº 093/2008, embora tenha sugerido somente Recomendação, sem cominação de multa, ressaltou a impropriedade do cancelamento de Restos a Pagar (despesas empenhadas e liquidadas), nos moldes realizado pela Unidade, em inúmeras passagens do referido relatório. Transcreve-se:
" Portanto, para o cancelamento de despesas liquidadas, incluindo-se os restos a pagar processados, por se tratar de procedimento previsto em lei, deveriam ser formalizadas as razões e os motivos que levaram a ocorrência, devidamente fundamentados e autorizados, em atendimento ao princípio da motivação dos atos administrativos.
O argumento apresentado, de que nenhuma ilegalidade poderá ser imputada ao gestor, pois a admissão deste procedimento (cancelamento e simultâneo empenhamento da despesa na mesma ação, projeto-atividade e elemento de despesa, modificando-se apenas a fonte de recursos), encontra respaldo legal na própria lei orçamentária, onde a despesa foi reempenhada, não prospera. Haja vista que o procedimento não se resumiu apenas a troca da fonte de recursos e, neste sentido, deve ser interpretado à luz dos princípios contábeis e orçamentários, pois constituem antecedentes relevantes do processo de implementação do conjunto de ações e objetivos que foram planejados, visando ao melhor atendimento e bem-estar da coletividade.
No caso das despesas liquidadas, ou seja, já realizadas, a possibilidade de cancelamento de empenho ou restos a pagar processados não seria admissível, haja vista a configuração plena de obrigação da despesa contraída pelo Poder Público, restando apenas o seu pagamento e, em não ocorrendo, caberia procedimento administrativo, devidamente autorizado pela autoridade competente, com as justificativas e razões de interesse público, tendo como suporte norma legal.
Em certo trecho de sua defesa o Sr. Gestor afirma que a Secretaria de Estado da Saúde, apesar de integrar um sistema administrativo, não possui autonomia orçamentária e financeira, pois depende de outros órgão de governo, especialmente da Secretaria de Estado da Fazenda, que exerce o controle e libera cotas orçamentárias e financeiras. Contudo, mesmo que a receita arrecadada pelo Fundo Estadual de Saúde esteja sob a guarda da Secretaria de Estado da Fazenda, para cumprir rito formal de controle pelo Poder Executivo, a Receita Pública pertence ao órgão arrecadador e este possui competência legítima para a utilização destes recursos, pois na sua maior parte são vinculados.
Destarte, que o Sr. Ramon da Silva, como gestor da Unidade ora tratada, não adotou a necessária cautela, em obediência aos princípios regentes da Contabilidade Pública, considerado que não apresentou as justificativas formais fundamentadas para a ocorrência de cancelamento de restos a pagar.
O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, por meio do Parecer nº 205/2009 ( fls. 2945/2951), entendeu estar comprovado o cancelamento indevido de restos a pagar, ponto sob o qual não restam quaisquer dúvidas. Entretanto, diverge a Procuradoria, com a Instrução, no que tange a ausência de sanção pecuniária. No entendimento Ministerial, corroborado na Decisão nº 1760/2008 referente ao PCA 07/00184058 e Decisão nº 1715/2008 referente ao PCA 07/002991147, as contas referentes ao exercício de 2006 são irregulares, em face do indevido cancelamento de restos a pagar processados, portanto, passíveis de cominação de multa.
A Conselheira Substituta Sabrina Nunes Iocken entendeu que os procedimentos adotados pela Unidade " além da distorção que ocasionam na execução das ações de saúde pública - pois o planejamento e a programação, que deve abranger todas as fontes de recurso, ficam prejudicados -, também podem afetar o resultado financeiro-orçamentário das contas da Unidade, que deixa de refletir a situação real existente." E, acompanhou o entendimento da Procuradora esposado no Parecer, supramencionado, no sentido de que a irregularidade em questão é passível de sanção pecuniária.
Esta Corte de Contas assentou entendimento no que tange o cancelamento de restos a pagar, por meio do Prejulgado nº 1372:
1. A partir do momento da liquidação, as despesas contraídas, ainda que inscritas em Restos a Pagar, atendendo ao disposto no art. 36 da Lei nº 4.320/64, resultam em compromisso de pagamento assumido pelo ente, gerando ao credor direito à contraprestação pecuniária.
2. Incabível o cancelamento de Restos a Pagar (despesas contraídas com folha de pagamento de servidores e agentes políticos, fornecedores, empreiteiras, prestadores de serviço etc.), salvo quando constatado irregular cumprimento das obrigações pelo contratado, ausência de liquidação da despesa ou outras situações incompatíveis com o pagamento, pois as dívidas de curto e longo prazos são de responsabilidade do ente (Município) e não do governante que a contraiu, resultando em dever do titular da unidade promover o pagamento após constatada a legitimidade e liquidação (contratado tenha cumprido as obrigações a seu encargo estipuladas na avença), inclusive as resultantes de contratação de pessoal a qualquer título.
3. omissis
O item 2, do Prejulgado nº 1372 diz textualmente que em regra o cancelamento de restos a pagar não é admitido, excetuando-se a situação em que for constatado o irregular cumprimento das obrigações pelo contratado, ausência de liquidação da despesa ou outras situações incompatíveis com o pagamento. A justificativa apresentada pelo recorrente, no sentido de que procedeu o cancelamento de restos a pagar para manter o equilíbrio entre a receita e a despesa, encontra-se dissonante com as exigências desta Corte de Contas. Ademais, é direito do credor, que teve a despesa empenhada regularmente e cumpriu suas obrigações contratuais com a Administração receber o devido pagamento.
Quanto ao argumento do recorrente no sentido de que reempenhou as despesas para restabelecer o equilíbrio financeiro, é também razão de irregularidade e foi rechaçado pelo voto do Relator, pois distorcem a execução das ações de saúde pública, e afetam o resultado financeiro-orçamentário (fls. 2954)
A Secretaria do Tesouro Nacional, editou Manual de Contabilidade Aplicado ao Setor Público - Aplicado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios1 - Procedimentos Contábeis Orçamentários, onde deixa claro a impossibilidade do cancelamento dos restos a pagar processados. Eis o trecho do referido Manual que trata do assunto:
No final do exercício, as despesas orçamentárias empenhadas e não pagas serão inscritas em restos a pagar e constituirão a dívida flutuante. Podem-se distinguir dois tipos de restos a pagar: os processados e os não-processados.
Os restos a pagar processados são aqueles em que a despesa orçamentária percorreu os estágios de empenho e liquidação, restando pendente apenas o estágio do pagamento.
Os restos a pagar processados não podem ser cancelados, tendo em vista que o fornecedor de bens/serviços cumpriu com a obrigação de fazer e a administração não poderá deixar de cumprir com a obrigação de pagar sob pena de estar descumprindo o princípio da moralidade que rege a Administração Pública, previsto no art. 37 da Constituição Federal, abaixo transcrito. O cancelamento caracteriza, inclusive, forma de enriquecimento ilícito, conforme Parecer nº 401/2000 da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional. (grifo nosso)
Á título de esclarecimento, é bom frisar que a afirmação do recorrente, no sentido de que a Conselheira Substituta acolheu como razão de decidir, que o cancelamento de restos a pagar é somente objeto de recomendação no Parecer Prévio, mostra-se inconsistente, isto porque a Relatora, apenas menciona o posicionamento da Diretoria Técnica, contrapondo-o ao do Ministério Público. O entendimento da Relatora, posteriormente acolhido em Plenário, foi no sentido de acatar o posicionamento do Ministério Público, já mencionado acima.
Cumpre ressaltar que a recomendação tem caráter de advertência, não carrega força impositiva e necessita do consentimento do gestor, que a atenderá por conveniência, vislumbrando, nesse proceder, maior eficiência, ou eficácia ou efetividade2. Nesta Corte de Contas a recomendação está positivada no artigo 3º, parágrafo único, "f", da Resolução TC nº 16/94. No caso em tela, as contas foram julgadas irregulares, com fulcro no artigo 18, III, "b", da Lei Complementar, portanto, passível de cominação de multa, com caráter sancionatório, conforme determina o artigo 69, do mesmo diploma legal.
Diante de todo o exposto, sugere-se a manutenção da multa aplicada, eis que as justificativas trazidas pelo recorrente são insuficientes para desconstituir a restrição em comento.
CONCLUSÃO
Ante o exposto, sugere-se ao Relator que em seu voto propugne ao Egrégio Plenário:
4.1) Conhecer do Presente Recurso de Reconsideração, nos termos do artigo 77 da Lei Complementar nº 202/2000, interposto contra o Acórdão nº 0851/2009, proferido na sessão ordinária de 15/06/2009, nos autos PCA nº 07/00336923, para no mérito, negar-lhe provimento, mantendo-se na íntegra a decisão recorrida;
4.2) Dar ciência do acórdão, relatório e voto do Relator, bem como deste parecer, ao recorrente, Sr. Ramon da Silva e a Secretaria de Estado da Saúde.
MARIANNE DA SILVA BRODBECK
Auditora Fiscal de Controle Externo
De Acordo. Em ____/____/____
À consideração do Exmo. sr. conselheiro herneus de nadal, ouvido preliminarmente o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas.
|
ELOIA ROSA DA SILVA Consultora Geral |
1
Manual de Contabilidade do Setor Público - Aplicado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios - Procedimentos Contábeis Orçamentários - 2ª edição. www.tesouro.fazenda.gov.br.Conteúdo acessado em 28/08/092
SANTA CATARINA, Tribunal de Contas do Estado. Comentários à Lei Orgânica e ao Regimento Interno. Instit Módulo III - Julgamento de Contas. Marcelo Brognoli da Costa. p.52