ESTADO DE SANTA CATARINA
    TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO
    CONSULTORIA GERAL

Processo n°: CON - 09/00473541
Origem: Câmara Municipal de Guaramirim
Interessado: Marcos Mannes
Assunto: Consulta
Parecer n° COG - 566/2009

Administração Pública. Serviço voluntário.

Senhora Consultora,

1. RELATÓRIO

Eis o breve relatório.

2. PRELIMINARES DE ADMISSIBILIDADE

Prefacialmente, necessário analisar as formalidades inerentes às consultas, definidas no artigo 104 do Regimento Interno desta Corte de Contas, in verbis:

Art. 104 - A consulta deverá revestir-se das seguintes formalidades:

I - referir-se à matéria de competência do Tribunal;

II - versar sobre interpretação de lei ou questão formulada em t4ese;

III - ser subscrita por autoridade competente;

IV - conter indicação precisa da dúvida ou controvérsia suscitada;

V - ser instruída com parecer da assessoria jurídica do órgão ou entidade consulente, se existente.

2.1. Da competência

2.2. Do objeto

A consulta prevista no inciso XII do art. 59 da Constituição do Estado de Santa Catarina, bem como no inciso XV do art. 1º da Lei Estadual Complementar n. 202/2000, objetiva esclarecer incertezas acerca de interpretação de lei ou questão formulada em tese.

Da análise dos autos verificou-se que a dúvida formulada diz respeito à possibilidade de servidores da Câmara Municipal prestarem serviço voluntário de assessoria ao Municipal em horário que não haja expediente na Câmara.

Assim, o questionamento apresentado pelo Consulente possui natureza interpretativa, bem como fora formulado em tese, razões pelas quais está preenchido o requisito previsto no art. 104, inciso II, do Regimento Interno.

Impende registrar que a resposta oferecida em processo de consulta não constitui prejulgamento de fato ou caso concreto, mas apenas prejulgamento de tese apresentada pelo Consulente.1

2.3. Da legitimidade

Nesse contexto, no tocante à legitimidade, verifica-se que o Consulente, na qualidade de Presidente da Câmara Municipal de Guaramirim, detém legitimidade para o encaminhamento de peças indagativas a esta Corte de Contas.

2.4. Da INDICAÇÃO PRECISA DA DÚVIDA/CONTROVÉrSIA

Conforme relatado acima, o Consulente indicou de forma precisa sua dúvida, o que faz com que o requisito previsto no art. 104, inciso IV, do Regimento Interno esteja preenchido.

2.5. Do parecer da assessoria jurídica

2.6. Do exame dos pressupostos de admissibilidade

Por conseguinte, sugerimos ao Exmo. Relator o conhecimento da presente consulta.

3. MÉRITO

O Consulente questiona a possibilidade de servidores da Câmara Municipal prestarem serviço voluntário de assessoria à Prefeitura Municipal em horário que não haja expediente na Câmara.

Trabalho voluntário é aquele prestado com ânimo e causa benevolentes. É fundamental que a causa benevolente de tais serviços esteja presente, quer no tocante à figura do tomador, quer no tocante aos objetivos e natureza dos próprios serviços.2

As condições de exercício do serviço voluntário estão definidas nos arts. 1º e 2º da Lei Federal n. 9.608/98, assim redigidos:

          Art. 1º Considera-se serviço voluntário, para fins desta Lei, a atividade não remunerada, prestada por pessoa física a entidade pública de qualquer natureza, ou a instituição privada de fins não lucrativos, que tenha objetivos cívicos, culturais, educacionais, científicos, recreativos ou de assistência social, inclusive mutualidade.
          Parágrafo único. O serviço voluntário não gera vínculo empregatício, nem obrigação de natureza trabalhista, previdenciária ou afim.
          Art. 2º O serviço voluntário será exercido mediante a celebração de termo de adesão entre a entidade pública ou privada, e o prestador do serviço voluntário, dele devendo constar o objeto e as condições de seu exercício.

Com efeito, a lei menciona atividade não remunerada que tenha objetivos cívicos, culturais, educacionais, científicos, recreativos ou de assistência social.

Além disso, nos termos do art. 2º da referida Lei, o serviço voluntário será exercido mediante a celebração de termo de adesão entre a entidade pública ou privada e o prestador do serviço voluntário, dele devendo constar o objeto e as condições de seu exercício.

Deve-se atentar, igualmente, para o fato de que o serviço voluntário não gera vínculo empregatício com o Ente Público, uma vez que a função administrativa é exercida por agentes administrativos, ou seja, por servidores públicos, regularmente investidos em cargo ou emprego público, cuja investidura ocorre mediante a aprovação em concurso público de provas ou provas e títulos, ressalvados os cargos em comissão de livre nomeação e exoneração.

Essa é a exegese que se extrai dos incisos I e II do artigo 37 da Constituição Federal:

          Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
          I - os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei, assim como aos estrangeiros, na forma da lei;
          II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração.

Destarte, os serviços voluntários não podem ter como objeto atividade-fim da Administração. O Ente Público não pode suprir deficiências de pessoal utilizando voluntários para atividades que devem ser exercidas por servidores públicos.

Portanto, inadmissível o exercício de funções relativas a atividades permanentes da Administração Pública por pessoa que não foi investida regularmente no serviço público, sob pena de violação ao princípio da legalidade bem com ao preceito constitucional que impõe que o acesso aos cargos e às funções públicas deve se dar por meio de concurso público.

Outrossim, abordando mais especificadamente o caso indagado na consulta, a qual remete a servidor público prestar serviço público voluntariamente, cumpre relevar que a Lei Federal n. 8.112/90, que cuida do Regime Jurídico dos Servidores Públicos Federais, dispõe em seu art. 4º que "é proibida a prestação de serviços gratuitos, salvo os casos previstos em lei."

Em simetria com a legislação federal, o Estatuto dos Servidores Públicos deste Estado (Lei Estadual n. 6.745/85) contém, em seu art. 4º, a proibição expressa de prestação de serviços gratuitos ao Estado.

Aliás, o art. 3º do referido Estatudo3 veda atribuir ao servidor outros serviços além dos inerentes ao cargo de que seja titular, exceto quando designado, mediante gratificação, para o exercício de função de confiança ou em outras situações ali descriminadas.

Por conseguinte, no caso dos autos, o servidor legalmente investido no cargo público para o qual prestou concurso, está vinculado às atribuições e responsabilidades inerentes ao cargo de que seja titular, sendo que a realização de outros serviços (assessoria) impõe a necessária percepção de gratificação, sob pena de enriquecimento ilícito por parte da Administração Pública, fatores estes que não são condizentes com o conceito de serviço voluntário, nos termos da indagação sob exame.

4. CONCLUSÃO

Em consonância com o acima exposto e considerando:

1. Que o Consulente está legitimado à subscrição de consultas para este Tribunal de Contas, nos termos do inciso II do art. 103 do Regimento Interno desta Corte de Contas, o que atende ao requisito do inciso III do art. 104 da Resolução nº TC-06/2001;

2. Que os questionamentos formulados na presente consulta tratam de situações em tese e de interpretação de lei, conforme determina o inciso XII do art. 59 da Constituição do Estado de Santa Catarina, bem como o inciso XV do art. 1º da Lei Complementar Estadual 202/2000;

Sugere-se ao Exmo. Sr. Relator que submeta voto ao Egrégio Plenário sobre consulta formulada pelo Presidente da Câmara Municipal de Guaramirim, Sr. Marcos Mannes, nos termos deste parecer, que em síntese propõe:

1. Conhecer da consulta, por preencher os requisitos de admissibilidade previstos no Regimento Interno.

2. Responder a consulta nos seguintes termos:

    2.1. A prestação de serviço voluntário em Entidades Públicas, nos termos da Lei Federal n. 9.608/98, deve ter objetivos cívicos, culturais, educacionais, científicos, recreativos ou de assistência social, inclusive mutualidade, e concretizada mediante celebração de termo de adesão entre a entidade pública e o prestador do serviço voluntário, dele devendo constar o objeto e as condições de seu exercício.
    2.2. Não podem ser objeto de voluntariado, em virtude do caráter benevolente que reveste o serviço voluntário, atividades que devam ser desenvolvidas por servidores regularmente investidos em cargo ou emprego público, sob pena de afronta ao princípio da legalidade e ao disposto no art. 37, inciso II, da Constituição Federal.

3. Dar ciência da decisão, do relatório e voto do Relator que a fundamenta, bem como deste parecer ao Presidente da Câmara Municipal de Guaramirim, Sr. Marcos Mannes.

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      Á consideração superior.
      COG, em 10 de setembro de 2009.
      ANA SOPHIA BESEN HILLESHEIM
      Auditora Fiscal de Controle Externo
                  De Acordo. Em ____/____/____
                  MARCELO BROGNOLI DA COSTA
                  Coordenador

      DE ACORDO.
      À consideração do Exmo. Sr. Conselheiro Júlio Garcia, ouvido preliminarmente o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas.
      COG, em de de 2009.
  ELÓIA ROSA DA SILVA

Consultora Geral


    1 MILESKI, Hélio Saul. O Controle da Gestão Pública. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 362

    2 Conforme DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 6. ed. São Paulo: LTr., p. 343-346.

    3 Art. 3º É vedado atribuir ao funcionário outros serviços, além dos inerentes ao cargo de que seja titular, exceto quando designado, mediante gratificação, para o exercício de função de confiança ou para integrar grupos de trabalho ou estudo, criados pela autoridade competente, e comissões legais, salvo na hipótese do art. 35, deste Estatuto.

    § 1º Entende-se por função de confiança a situação funcional provisória criada por ato administrativo e cometida a funcionário público estadual, mediante livre escolha, para desempenho de atribuições regimentais. (grifou-se).